Hanako ainda não havia assimilado bem os fatos. Sabia que o estado de Yoko era grave, e a própria Aiko havia dito que ela não tinha muitas chances. Mas ainda assim, saber que nunca mais ela estaria ali, era angustiante. Hanako sentia-se mal, por nunca ter sido capaz de desejar sorte à Yoko. O amor que ela sentia por Kaoru, e o que Hanako sentia… os dois eram o mesmo. Apesar de serem rivais, neste sentido, Yoko e Hanako tinha algo que as conectava.

E, além disso, ela era irmã de Aiko. Hanako sabia que a amiga precisaria dela nessa hora. Foi somente por Aiko que Hanako se motivou a ir até a casa da família Hazuki, uma mansão senhorial e antiga no tradicional estilo japonês, onde estariam os familiares dela depois do enterro. Recusou o pedido de Hikaru para acompanhá-la – era algo que ela queria fazer sozinha.

Chegando lá, a primeira coisa que fez foi prestar suas condolências aos pais dela. Eles foram muito educados, e faziam o possível para parecer fortes, mas era evidente o quanto estavam abalados com a situação. Hanako saiu rapidamente de dentro da casa, onde a foto de Yoko bem no centro do altar parecia estar a observando, e foi para o quintal.

Aiko estava lá, em um simples vestido negro que chegava até abaixo dos seus joelhos, com os longos cabelos amarrados em duas tranças cor de lavanda. Ela estava sentada na varanda da velha casa da sua família. Seus olhos fitavam o chão com melancolia, e já deviam ter a muito secado todas as lágrimas que poderia chorar, era o que as marcas vermelhas no rosto de boneca denunciavam.

— Aichii… - Hanako chamou, ao chegar perto da amiga.

— Ah, Hanako… você veio – Aiko levantou os olhos apenas o suficiente para saber quem estava ali – Eu sabia que você viria.

— Aqui, eu trouxe… - ela não soube como completar a frase, deixando-a solta no ar, e entregou um pequeno buquê de lírios que havia trazido consigo e não havia tido coragem de entregar antes.

— Ah, obrigada. – ela respondeu, aceitando a flor – A Yoko não gostava lírios. Mas ela não gostava de você também, então acho que vai combinar… - Aiko riu sem graça, e Hanako a acompanhou naquele som estranho sem sentido.

— C-como… como está todo mundo?

— Meus pais estão na mesma. Acho que eles já vinham se preparando para isso há bastante tempo, de qualquer forma. Mas eu vi minha mãe chorando abraçada a um vestido dela na outra noite… não esperava por isso. E… o Kaoru, eu sei que você quer saber… está lá dentro. Ele parece bem abalado, mas… nós não conversamos direito. Ele sente por ela da sua própria maneira, eu o entendo.

— Entendo… - Hanako murmurou apenas para não ficar em silêncio. Não, ela não entendia. Por mais que a explicação fosse bem clara em sua mente, ela não compreendia as ações de Kaoru. Não conseguia entender o que se passava em sua mente, e em seu coração atualmente. Não como antes. Cada vez que o via, parecia mais como um estranho para ela. Isso era tão doloroso… mas de certa forma, inevitável.

— Hanako… tem… tem algo que eu quero dizer a você. Algo que eu devia ter dito há muito tempo. Pode me ouvir? – Aiko pediu com uma voz de soprano, mal passando de um sussurro. Hanako nunca a ouviu pedir algo de forma tão branda. Também nunca havia visto um olhar tão triste na amiga. Sem dizer nada, sentou ao seu lado.

— Pode me contar tudo o que quiser, Aichii, sabe que eu estou aqui para ajudar – Hanako disse, segurando a pequena mão de Aiko entre as suas. Ela assentiu, tomando fôlego para começar a falar. Não era um assunto fácil.

— Hanako… v-você me perdoa? – Aiko balbuciou, e então, grossas e brilhantes lágrimas novas emergiram, escorrendo pelo seu rosto. Ela soluçou, como uma criancinha desamparada, sem conseguir falar nada.

— Perdoar? Do que você está falando?

— Esse tempo… esse t-tempo todo… eu não fui capaz de torcer por você sinceramente – ela pranteou, enxugando as lágrimas abundantes – E-eu tive inveja de você, Hanako-chan. Eu senti ciúmes… p-por que… assim como a Yoko… e-eu… eu também amei o Kaoru-kun. Desde que éramos crianças, eu sempre… sempre…

— Aichii… - Hanako murmurou, com a voz tremida.

— Eu fui uma mentirosa. Diferente da Yoko, que dizia claramente o que sentia… eu menti durante todo esse tempo. Eu a enganei, enganei o Kaoru-kun… enganei a mim mesma. Eu não queria sentir essas coisas, Hanako-chan… eu queria muito que você e ele fossem felizes, queria mesmo… Eu pensei que assim iria sufocar esse sentimento errado… mas… mas… eu não conseguia! Era impossível para mim desejar a sua felicidade sinceramente… e isso doía tanto…

— Aiko… eu nunca… percebi – Hanako baixou os olhos, tentando relembrar de alguns fatos, notar algum sinal de que aquilo fosse evidente.

— Me perdoe, Hanako-chan… eu sou uma pessoa horrível por…

— Não, Aichii! Você não é uma pessoa ruim! – Hanako se apressou em dizer, segurando ambas as mãos de Aiko. Ela sobressaltou, com o rosto manchado pelas lágrimas, e um semblante incrédulo – Ninguém escolhe por quem se apaixona… eu sei disso, eu já tentei… e você não precisa pedir perdão. Nós duas… nós duas somos amigas, está bem? Nada mudou! – ela disse, e abraçou Aiko com toda a força que dispunha, quase a quebrando em duas – E… eu não estou mais com o Kaoru, Aichii… você pode… você pode tentar se declarar para ele e…

— Não! – Aiko quase gritou, e Hanako desfez o abraço – Eu nunca poderia… Bem, mesmo se eu fizesse… eu não tenho chances. Diferente da minha irmã, eu nunca fui capaz de me declarar. Primeiro, por que Kaoru sempre me viu como uma irmãzinha, e para ele, é isso o que eu sou, sempre será. E depois, com alguém como a Yoko como rival, eu sabia que jamais teria chances. Ela sempre foi mais bonita, e mais inteligente… ela era alguém que podia estar ao lado dele. Era o que eu pensava, até ver vocês dois juntos. Vocês eram tão felizes! Eu jamais seria capaz de interferir nessa felicidade.

— Mas agora… você pode ter a chance de…

— Por que diz essas coisas? – Aiko interrompeu – Você ainda o ama, não ama? E ele também ama você, todo mundo sabe disso! Ele está livre, agora. Ele sempre esteve. Yoko dizia todos os dias que ele deveria deixa-la e ir atrás dele. Ela não queria mais obriga-lo a estar com ela, e tinha compreendido que ele só seria feliz com você. Ela estava arrependida também, das coisas que fez. Kaoru… Kaoru deveria ter ido atrás de você…

— Mas ele não foi, não é? – Hanako sorriu fracamente – A culpa que ele sentiu foi maior do que o amor que ele tinha por mim, eu acho… mas isso não importa mais. Eu já superei – ela disse essas palavras, mas pelo canto dos seus olhos, algumas lágrimas escapavam e fugiam do seu controle. Sua voz embargou, e ela foi incapaz de continuar.

— Viu? Eu disse… - Aiko ergueu a mão, enxugando a lágrima de Hanako.

— Eu estou com o Hikaru agora! Eu não posso simplesmente…

 – Para de pensar nos outros um pouco, Hanako, e pensa em você! O que você quer? O que você precisa para ser feliz? Não precisa responder. É o Kaoru, não é? Eu sei só de olhar. Por que a maneira que você olha para ele… é a mesma maneira que eu olho.

— Aiko…