— Ah! Eu não aguento mais... – eu cai de joelhos no tatame, tentando recuperar o fôlego. Honey-senpai deve estar se divertindo muito me torturando dessa maneira...

Esse era o meu primeiro dia de atividades no clube de karate. Eu nem acredito que passei! Parece um sonho, eu e Kaoru-kun no mesmo clube... eu posso morrer feliz agora...! Se bem que eu já estou prestes a morrer mesmo, com todo esse treinamento do Mori-senpai, acho que eu não duro mais nem uma semana...

— Vamos, Wakamiya-san, ânimo! – o meu carrasco dizia, sem mudar o tom de voz calmo de sempre. Há! Eu juro que posso ver uma sombra de sorriso passar pelo rosto dele! Eu sabia! Mori-senpai está se divertindo com a minha morte precoce!

—Ei! Hanako-chan! Já vai desistir? – ouvi a voz mais doce do mundo todo me perguntar. Kaoru-kun estava me observando? Kyaaaaa, o que eu faço?

— Claaro que não! – eu levantei num salto, recuperando todas as minhas energias num passe de mágica – Vê? – dei uns pulinhos para mostrar que ainda não estava acabada.

Kaoru-kun ria da minha demonstração, quando ouvimos o barulho da porta do dojo sendo arrastada. Um visitante há essa hora? Que inesperado!

— Primeiro Ano, classe A, Hitachiin Hikaru – Aquela voz irritante se apresentou em tom de desafio – Gostaria de entrar para esse clube.

Aaaaaaaaanh? Porque ele quer entrar no karate?

— Se você quer entrar ...– Honey senpai apareceu, todo animado, pulando e gesticulando sem para enquanto falava. Ele nem deve saber quem é ele... mas porque ele não fica surpreso em ver alguém exatamente igual ao Kaoru-kun bem na sua frente? Acho que a mente do Honey-sepai é complexa demais para se deter a esses detalhes... ele continuou, tão agitado como sempre – ...Tem que passar no teste de entrada – Mori senpai surgiu as suas costas, mais ameaçador do que nunca, em posição de defesa.

Hikaru-kun rapidamente entendeu a ideia de Honey, e pulou no tatame, também pronto para lutar. Ele e Mori lutavam em igualdade, os movimentos de Hikaru-kun eram precisos e avançados, aposto que ele já freqüentou algum dojo... A luta foi bem curta, rapidamente Mori-senpai imobilizou Hikaru e o deixou de cara no chão, enquanto ele praguejava.

— Você lutou bem... passou.

O sorriso de escárnio apareceu no rosto, enquanto ele se levantava e ajeitava a roupa, que estava mais amassada do que nunca.

Kaoru-kun mantinha sua face sem expressão alguma, enquanto fitava incrédulo o seu... bem... irmão!

— Ele não disse que me odeia? Porque quer entrar no mesmo clube? – ele sussurrou, com aquela feição preocupada.

Será que...

Será que Hikaru-kun veio até aqui para conseguir ser amigo do Kaoru-kun?

Ele deve ter ouvido o que eu falei pra ele, e vai seguir meus conselhos... Agora tudo vai ficar bem, não é mesmo?

Eu já posso até imaginar... os dois... num piquenique embaixo das sakuras... se abraçando.... ou então... Hikaru com medo de dormir sozinho, vai com seu ursinho de pelúcia pedir para dormir junto com o Kaoru-kun....Kyaaaaaaaa! Meu nariz vai sangrar.... Amor fraterno é tão excitante!!!!

Hikaru, que tinha entrado  numa sala com Mori-senpai para tratar dos papéis da inscrição, agora estava indo embora, com um sorriso amplo de vitória adornando o rosto.

Ele já ia longe, quando eu resolvi ir falar com ele. Saí correndo bem rápido do dojo, talvez aqueles treinos sirvam para alguma coisa, já consigo correr mais rápido em apenas um dia!

— Hikaru! HIKARU! – ele parou, e se virou para mim, e eu pude finalmente alcançá-lo – você entrou no clube... por que queria ficar amigo do Kaoru-kun, certo? – Não pude evitar sorrir – Obrigada! Você não sabe o quanto isso me deixa feliz! Eu queria muito ver vocês dois...

— Não diga coisas tão estúpidas – ele me interrompeu rudemente – eu não quero ficar amigo daquele cara, nunca! Aquele cara é apenas o meu alvo!

As suas palavras me assustaram, involuntariamente eu comecei a tremer. Aquele olhar... tanto ódio... mas... também, tristeza?

— Você planeja fazer algo ruim ao Kaoru-kun...?

— E se eu estiver – ele me olhou com desdenho, as mãos no bolso em uma atitude despreocupada.

Senti algo ferver em eu peito enquanto lia a expressão debochada em seu rosto.

— Eu não vou deixar...! –  segurei sua camisa com força. Ele se mexeu minimamente e segurou meus pulsos, me deixando sem ação.

— Isso me irrita! Você só tem aquele idiota na sua mente, não é? – ele subiu as mãos, segurando as minhas um pouco mais delicadamente, entrelaçando meus dedos nos seus. Meu coração acelerou ao sentir ele se aproximando de mim. Ele pressionou minha mão contra seu peito, sem me soltar, e eu pude sentir seus batimentos, acelerados também.

O que está acontecendo...?

 Ele olhava para mim, e eu me perdi na imensidão dos olhos dourados, nem sabia mais aonde estava... Seu rosto estava diferente, parecia perturbado, imperceptivelmente corado, e sorria de um jeito calmo que eu nunca tinha visto antes.

— Você sabe como eu me senti quando vi você e aquele cara indo para casa juntos? Você parecia tão feliz... sorria de um jeito.... mas é só quando está com ele... comigo, não... Tudo se resume ao ‘Kaoru-kun’, não é? – ele me fitou novamente, e agora seus olhos brilhavam intensamente... ele estaria prestes a chorar...? Há! Claro que não, afinal, esse aqui é o Hikaru!

— Hanako! – Kaoru-kun gritava me procurando. Tentei me desvencilhar, para mostrar a ele onde estávamos, mas Hikaru me puxou de volta, envolveu seu braço na minha cintura, prendendo meu corpo. Sua respiração descompassada batia no meu rosto, era de certa forma inebriante...

Tentei dizer algo, mas antes que pudesse, meus lábios foram selados. Senti os lábios macios e quentes contra os meus, e não consegui me mexer. A expressão no rosto de Hikaru era de puro desespero, eu não conseguia entender mais nada.

Fiquei estática, sem mover nenhum músculo, apesar de sentir minhas bochechas pegando fogo, e minhas pernas bambearem, enquanto ele continuava a pressionar seus lábios nos meus. É isso o que chamam de estado de choque?

Me recuperei ao menos um pouco, e então processei toda aquela situação. Tive uma pequena conclusão: estava sendo beijada.

— Mmmm... – eu tentei me soltar, mas ele apenas me abraçou com mais força, ainda segurando um dos meus pulsos no ar.

Ele abriu os olhos, mirando para o lado, e suas sobrancelhas arquearam em raiva. Nem precisei virar a cabeça para saber para quem era aquele olhar.