Crônicas do Inferno escrita por Megurine Jackie


Capítulo 3
Sem Escrúpulos


Notas iniciais do capítulo

Cuidado com o que deseja...



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Ouço gritos vindos de todas as partes. São gritos de horror, gemidos de dor ou de luxúria. Mas na maioria das vezes são pedidos de socorro.

Suas vozes são sempre tristes, desesperadas. E parece que estão dentro de sua mente, mesmo tapando os ouvidos você consegue ouvi-las. Quase pode senti-las.

Você sente também as mãos que tocam suas pernas, puxando minhas pernas, arranhando minha pele. São mãos masculinas, femininas e até mesmo de crianças.

Aquele ar pesado, toda aquela escuridão. Os gritos, os toques e arranhões. E aquela lua púrpura no céu. Aquele rio negro... Toda aquela atmosfera só me dá a certeza de uma coisa: estou no inferno!

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- Oh, Maya! Vai se atrasar de novo!

- Já to saindo, mãe! - Batendo a porta atrás de mim.

Vejo Hina me esperando. Sempre sorrindo.

- Oi, Maya!

- Como consegue estar tão animada há essa hora?

Ela nem me respondeu. 

- Semana que vem começam as provas. Estou preocupada... - Diz a menina, com cara de quem não andou estudando.

- Eu mal tenho tempo para respirar, depois que entrei para o clube de jornalismo. E se minhas notas caírem, minha mãe me mata!

- Nós bem que podíamos fazer um grupo de estudos. Quem sabe o Kurume Sempai não nos ajuda a estudar... - Ela rindo.

- Você só pensa nisso, não é, Hina? - Rindo também.

Longe dali, vemos no alto de um grande edifício, na sala da presidência, um homem com olhos escurecidos pelo ódio em seu coração. Ele tem um sorriso sinistro nos lábios, olhando atentamente para o boneco de palha preta que está em suas mãos.

- Hehehe, vou te mandar para o inferno, maldito Katsuragi!

Ele começa a se lembrar do primeiro dia que entrou naquele enorme edifício. Ele tinha sonhos para aquele novo emprego. Ele era recém casado e sua esposa estava grávida.

Aquele emprego era uma esperança de dias mais tranquilos para ele e sua esposa, uma melhora nas finanças da família. 

Ele fora empregado pelo Gerente Geral, o senhor Yuko Katsuragi. Ele conheceu esse homem em uma festa de fim de ano da empresa que ele trabalhava anteriormente. Por algum estranho motivo, Katsuragi afeiçoou-se a ele e sua esposa naquela noite.

Em alguns dias o senhor Katsuragi entrou em contato com ele. Ofereceu-lhe uma vaga na empresa em que trabalhava. A promessa era de um salário bem melhor de onde ele trabalhava atualmente. Ele pediu um tempo para pensar na proposta, e foi correndo para casa, contar à sua esposa.

Por algum motivo, sua jovem esposa não ficou animada com a proposta recebida.

- Mas querido, você gosta tanto de seu atual emprego...

Ele não conseguia entender, mas sua família estava crescendo, ele precisava ganhar mais. Então acabou aceitando o emprego.

Ele desempenhou bem sua função por meses. Sempre pontual e prestativo. E seu chefe, senhor Katsuragi, o tratava muito bem. Ele pensava:

'Consegui um ótimo emprego! Sou um homem de sorte!'

Mas ele sempre chegava em casa e via o olhar triste de sua esposa, que a essa altura estava prestes a dar a luz.

Em alguns dias ele seria pai, estava em um ótimo emprego, mas não conseguia entender por que sua esposa não ficava feliz.

Um dia, seu chefe o pediu para que ele viajasse para Hamura, uma cidade próxima a sede, em Tokio. As passagens estavam marcadas para a data prevista para o nascimento de seu filho. Ele tentou negociar.

- Mas senhor Katsaragi, eu poderia viajar na outra semana sem prejudicar os negócios...

- Não! Você precisa ir agora. - Irredutível.

 O gerente parecia estar muito nervoso, então ele resolveu não insistir mais no assunto e decidiu fazer a tal viagem.

 Durante a viagem, ele recebeu a ligação de que sua filha havia nascido. E ele não estava lá. Aquilo caiu como uma bomba sobre sua cabeça. Ele voltou para casa o mais rápido que pode.

Chegou em sua casa e viu sua esposa deitada com sua pequena filha nos braços. Ela lhe sorriu e entregou a menina para ele segurar. Como ele ficou emocionado com aqueles olhinhos.

- Que pena que você não estava aqui... - Disse tristemente sua esposa.

- Você voltou antes da reunião... - O senhor Katsuragi parecia estar muito aborrecido.

- Minha filha nasceu e eu não estava presente.

- A mim isso não interessa! Volte às suas responsabilidades! - Gritou seu chefe.

Os dias se passaram, e ele notava que sua esposa se entristecia mais e mais. Ele tentou com que ela falasse o que a aborrecia, mas nada. 

Certo dia, uma reunião que estava agendada foi cancelada, pois o cliente teve um problema urgente. Ele ficou muito contente de poder chegar mais cedo em sua casa. Parou em uma floricultura e comprou um grande bouquet de rosas.

Quando ele se aproximava do portão de sua casa, notou que havia um carro parado em frente à sua garagem. Ele estranhou, estacionou atrás do carro. Quando ele abriu a porta da sala ele soltou as flores que segurava. Sua esposa e o senhor Katsuragi estavam seminus, entrelaçados no sofá da sala. Ele não pode acreditar no que via. Katsuragi ao vê-lo levantou-se rapidamente e perguntou-lhe:

- Você não tinha que estar em uma reunião agora? O que faz aqui?

Ele olhou para sua esposa, que tentava cobrir seus seios expostos com as roupas. Ele não ouviu mais nada, virou as costas e saiu pela porta, pisando nas rosas que havia comprado.

 Ele dirigiu como um louco, sem direção. Sua mente não funcionava direito nesse momento.

'Aquela vagabunda! Ela me traía esse tempo todo! É por isso que o maldito Katsuragi me fazia trabalhar até tarde todos os dias! E as viagens de trabalho?! Malditos!'

Ele pensou em parar em um bairro pouco seguro e tentar comprar uma arma. Ele estava desesperado.

'Não! Eu vou matá-lo com minhas próprias mãos! Vou esperar que ele chegue amanhã na sua sala e vou matá-lo! Depois eu mato aquela mulher maldita e me mato!'

Seu ódio era tanto que ele nem lembrou de sua filhinha pequena.

 Já na sala da presidência, o homem sentou atrás da grande mesa onde o homem que lhe tirou a felicidade se sentava. Ficou horas parado, tentando racionalizar seu ódio. Sem um motivo ele se lembra de uma conversa banal que ele ouviu uma vez:

'- Hey, você já ouviu falar do 'Jigoku Tsuushin' ? É uma página na internet que, se você enviar o nome da pessoa que você odeia, a alma dessa pessoa vai direto para o inferno! Mas só funciona se você estiver com muito ódio da pessoa e se acessar o site a meia noite.'

 Ele resolveu ligar o computador da sala para ver se era possível que existisse uma coisa como aquela.

- Página não encontrada?! - Desesperado.

Ele olha para o relógio da mesa e vê que ainda não é meia noite. Ele espera mais alguns minutos e tenta novamente. Surpreende-se quando a página negra abre, com um campo para por o nome da pessoa odiada e a frase: "Nós vingaremos seu rancor" escrito no meio da tela.

Ele não pensa duas vezes e escreve o nome do Yuko Katsuragi e clica no botão "ENVIAR".

- Maldito! Vá para o inferno!

 - Você me chamou?

Ele se assusta com a voz infantil que ouve atrás dele.

- Quem é você? - Levantando-se da cadeira e se afastando.

- Meu nome é Ai Enma. Você me chamou.

- Hell Girl? Então é verdade?

Ela estende a mão que segura o boneco de palha.

- Tome, pegue-o. Se você deseja vingança deve puxar o laço vermelho. Puxar o laço significa que você me contratou oficialmente e a pessoa que você odeia será enviada  para o inferno imediatamente.

Ele olha para o boneco atentamente. Seu ódio finalmente será vingado. Ele segura a ponta do laço vermelho, mas é interrompido por Ai.

- Entretanto existe um preço. O ódio é uma faca de dois gumes: se você mandar a pessoa que odeia para o inferno a sua alma também será mandada para lá.

Ele arregala os olhos.

- Como assim, minha alma irá para o inferno? Mas eu não fiz nada!

- Esse é o preço do serviço. Mas isso só ocorrerá quando você morrer. Sua alma ficará pairando entre dor e sofrimento durante a eternidade.

Nesse momento o homem se vê no meio de chamas que queimam seu corpo. Ele sente a dor das queimaduras e sente o cheiro de sua carne sendo queimada.

- Não, pare, ahhhhhh!!!

Ele abre os olhos e não vê mais nada disso. Só o boneco preto de palha em suas mãos. Ele ouve um sussurro no seu ouvido:

- Agora, cabe a você decidir...

 Ele fica lá parado, olhando para o boneco. Ele já tem certeza do que fará mas espera que o Katsuragi entre pela porta.

Na Zona do Eterno Crepúsculo vemos Ren e Hone Onna conversando.

- Você não acha a senhorita muito distraída ultimamente? - Hone Onna pergunta.

- Acho que ela anda meio cansada. Não vê que ela sempre está encostada em algum canto, ou cochilando?- Ren parece preocupado.

 - Pobre senhorita... Ela já faz esse serviço há quatrocentos anos! Esse castigo está sendo muito penoso para ela...

Nesse momento Wanyūdō chega.

- Do que vocês estão falando? - Pergunta, pressentindo se tratar de algum assunto importante.

- É a senhorita, Wanyūdō, ela anda se comportando estranho ultimamente. E parece muito cansada... - Hone Onna com a expressão triste.

- Acho que ela já aguentou o que podia do seu castigo. Mas ela é a única que pode decidir quando deve parar... - Wanyūdō diz, pensativo.

Já é de manhã, o homem aguarda ansiosamente a chegada de Katsuragi. Suas mãos estão trêmulas de nervoso. Finalmente ele teria sua vingança!

O Gerente entra em sua sala e vê o homem transtornado, sentado em sua cadeira.

- O que faz aqui? Secretária! Chame a segurança!

- Não precisa se preocupar! - Diz o homem com um sorriso insano nos lábios. - Para onde vou mandá-lo ninguém vai conseguir te proteger!

Nesse momento ele puxa o laço vermelho. Ele consegue ouvir a voz de Wanyūdō dizendo:

“Seu pedido será atendido!"

 Katsuragi acha que aquele homem enlouqueceu. Alguns segundos depois entram dois seguranças na sala e retiram o homem, que está gargalhando alto como um maluco.

' Que homem maluco! Tentou me enfeitiçar com um boneco...' - Pensou Katsuragi.

Ele vai se sentar em sua grande cadeira quando de repente sente o chão se abrindo debaixo de seus pés. Ele cai em um buraco que parecia sem fim.

 Ele gritava desesperadamente. Pensava que morreria naquela queda. Mas ele ouve uma risada feminina. Quando ele olha para o lado, ele vê Hone Onna rindo.

- Como se sente sem o chão sob seus pés? Foi assim que aquele pobre homem se sentiu quando viu o que você fazia com sua mulher.

Ele, ainda em pânico, olha para cima e vê aquele olho imenso no teto, olhando para ele.

- E eu vi tudo! - Ren expondo sua verdadeira forma.

- Eu não sei do que vocês estão falando! Aquela mulher já era minha antes daquele idiota casar-se com ela! Aquele filho nem é dele!

- Ouviu isso, senhorita? - Pergunta Hone Onna.

Ele olha para o lado e vê o rosto de Ai, com seus enormes olhos vermelho, pairando ao lado de sua cabeça.

- Pobre sombra perdida na escuridão, por ferir e desprezar os outros Sua alma maculada afoga-se na culpa... Quer saber, como é a morte?

O guizo toca. Ele acorda deitado no barco que Ai guia.

- Onde... Onde eu estou? Para onde está me levando?

Ele tenta se levantar no barco, mas vários bebês agarram suas roupas, choram olhando para ele. Ele grita, desesperado.

Ai, com seu olhar voltado para o portal da fronteira, apenas diz:

- Esse rancor será levado para o inferno.

 Maya está sentada a mesa tomando o café da manhã. Finalmente sua mãe a acorda em um horário mais plausível.

A TV está ligada no noticiário da manhã.

- Mais uma tragédia aterra os moradores de Harajuku, distrito de Shibuya. Um homem assassinou sua mulher a tiros e depois se matou. A polícia acaba de encontrar, no local do crime, uma garotinha de apenas três meses de vida! As autoridades locais...

- Nossa! Mas que coisa horrível! Bem que a mamãe disse que isso é muito ruim de assistir logo de manhã... - Diz isso enquanto desliga a TV.

Repentinamente ela se lembra do sonho estranho que ela teve essa noite. Acho que tinha a ver com gritos de terror.

Maya não pressente Ai em um canto da copa, observando-a atentamente.


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Notas finais do capítulo

Espero que gostem do capítulo.
Domo aregatou!