Sem Ensaios para a Vida escrita por Lara Boger


Capítulo 19
Um convite


Notas iniciais do capítulo

Desculpe a demora (para quem estiver lendo, duvido muito que alguém faça isso), mas último ano de fakul... sabe como é...



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Manhã.

            Os corredores estavam bastante movimentados em certos horários, especialmente pouco depois das aulas, quando iam para o refeitório ou trocavam de sala. Mesmo assim, nada impedia que encontros acontecessem.

 

- Olá, Katherine, boa tarde.

- Oi, Nash. Tudo bem?

- Tudo certo, e você?

- Tudo indo. – concordou, meneando a cabeça.

- Eu sei que está com pressa, mas eu só queria saber se você tinha sobrevivido ao almoço ontem.

- Sobrevivi, sim... apesar daquelas calorias não terem sido boas pra mim.

- Aquelas calorias te mantiveram de pé! Aliás, pouquíssimas já que comemos no refeitório.

 

            Viu-a gesticulando algo. Talvez estivesse pedindo para que falasse mais alto. Por mais que o corredor fosse um dos pontos de encontro mais corriqueiros também era dos mais barulhentos. E Nash viu-se obrigado a repetir.

 

- ... além disso as calorias te fizeram bem.

- Como disse?

- Humm... nada, nada. – ele pareceu constrangido. – Esquece.

- Ah... – Kat não pareceu entender muito bem – Certo, tá bom. Agora eu preciso ir, já está quase na minha hora. Até logo.

- Até logo. – respondeu, acenando discretamente vendo-a ir até a amiga que a esperava próxima a porta e pensando que escolhera um horário muito impróprio pra puxar uma conversa.

 

            Jenny e Kat não demoraram nada a chegar no salão. Olhando para o relógio sabia que faltavam ainda alguns minutos, mas estavam falando de Dechamps. Ela costumava chegar pouco antes da aula, e tratar aquelas que chegassem depois dela como se estivessem atrasadas. Kat já fora uma delas, e decidiu que não precisava de mais constrangimentos.

            Sentou-se no chão, ciente de que se tivesse problemas, não seria por esse motivo. Bem tranqüila, ou pelo menos tentando parecer assim, tirou o calçado para colocar as sapatilhas. Os pensamentos daquela noite ainda estavam em sua mente, mas tentava deixá-los de lado. Naquele dia estava muito disposta a esquecer, a pensar em outras coisas. Talvez para isso as aulas de Dechamps pudessem ser úteis.

            Bastou ouvir os sons dos passos e Kat soube que ela estava chegando. Não precisava de mais sinais ou indícios... era como uma marca registrada. E estava certa.

 

- Bom dia, garotas. – sua entrada foi como todas as outras: altiva, com expressão sisuda e nada convidativa, pontual e impecável. Não imaginava se um dia pudesse ser diferente. – Vamos lá, acabou a hora do recreio!

 

            Fez o alongamento com relativa tranqüilidade. Fez o aquecimento com pouco mais de vigor. Os exercícios nas barras foram mais complicados, assim como os de centro. Não por dificuldades técnicas, mas sim por causa de sua professora. Os olhares dela pesavam sobre seus ombros

            Deus... tomara que ela saia daqui logo! pensou, enquanto era obrigada a executar os saltos e passos com uma expressão tão impassível quanto a dela.

            Passos, pontas e giros. Kat deslizava pelo salão junto com as outras, esforçando-se para parecer igual a todas as outras e passar despercebida. Não deveria parecer tão difícil, afinal ainda havia outras quatorze ou quinze garotas naquela aula...

            Mas não adiantava. O olhar de Dechamps continuava a pesar. Não sabia como definir a sensação. Só sabia que era horrível, que lhe subia algo pelo estômago, algo ácido e quente... e que poderia sair a qualquer momento.

            Como um simples olhar poderia causar tanto estrago?

            Respirou fundo para agüentar firme, mas o movimento não passou despercebido.

 

- Srta. Hillard, corrija a sua respiração.

 

            Aquilo só a fez piorar. Sabia que qualquer correção não teria qualquer outro tipo de efeito naquele momento. Sem poder sequer respirar fundo, restou-lhe tentar apelar para o poder de abstração. Tudo bem que sua mente não teria grande utilidade, mas como não tinha nada mais a fazer, apelar era sua única alternativa. Pior que isso, não poderia ficar.  

            No fim da aula, teve de sair correndo para o banheiro. Só teve tempo de pegar um suéter que estava por cima da bolsa antes de praticamente disparar para fora.

 

- Kat...! Kat! O que houve? – Jenny seguiu-a até o banheiro e se assustou com o barulho estranho que ouvia.

 

            A porta se abriu logo depois, e a visão de sua amiga a assustou ainda mais. Kat estava pálida, e o coque já não estava mais tão perfeito. Não soube bem como foi reparar nisso, mas parecia incrivelmente relevante naquela hora.

 

- Eu vomitei. – disse, limpando a boca com as costas da mão, indo direto para a pia.

- Vomitou o quê? Você mal comeu no café da manhã!

- Nem me fala. – fez uma pausa, rindo até se lembrar. – Ai que droga! Minha bolsa... de novo!

- Não esquenta, eu pego depois. Não deve ter nada lá que alguém possa roubar. – viu a amiga dar uma risadinha, não muito feliz e riu também. – Vem, vamos sair daqui. Lugares como esse me deprime.

 

            Saíram assim que Kat conseguiu se recompor um pouco e melhorar sua aparência. Pretendia ir ao dormitório, queria deitar um pouco, simplesmente ficar quieta, mas os planos mudaram quando encontraram Gabriel no meio do caminho.

 

- Ei, Kat? O que houve? – perguntou, sem ao menos cumprimentar, vendo a aparência estranha da amiga.

- Não estou nos meus melhores dias.

- Ela tá passando mal. – disse Jenny, preferindo ir direto ao assunto.

- O quê?! Como assim?! – assustou-se. – O que está sentindo?

- Exagero dela, Gabriel. Já estou melhor.

- Ela vomitou. – respondeu, sem dar importância a reclamação de Kat.

- Vomitou?!

- Ei? Eu já disse que estou ótima! Só quero chegar nos alojamentos e dormir um pouco.

- É, mas antes precisa comer. – ele disse, com um olhar preocupado mas conciliador. – Depois disso não pode ficar com o estômago vazio. Pode te fazer mal.

- Ele tem razão, Kat.

- E adianta argumentar? Vocês vão me arrastar até lá de qualquer forma.

- Ainda bem que você sabe.

 

            Os dois a acompanharam até o refeitório. Pediram algo para Kat sem deixar que ela escolhesse. Vigiaram para que comesse e no fim a acompanharam até o alojamento. Ali, Gabriel deu sua participação por encerrada. Ali era uma barreira intransponível, e além disso ela poderia querer ficar sozinha. Então, despediu-se no corredor, em frente a porta e assim que foi fechada, seguiu o seu caminho.

 

- Jen, não precisa ficar aqui comigo.

- Por que não?

- O dia ainda não acabou. Ainda tem aula. Além disso já estou bem melhor.

- Tem certeza que vai ficar bem?

- Mas é claro. Vou tomar um banho e depois deito pra descansar. Um cochilo vai fazer bem.

- É, vai sim. – Jenny não parecia muito segura em deixá-la. – Tem certeza disso, então?

- Absoluta. – respondeu, sorrindo. – Agora sai daqui, que não estou precisando de babá.

 

            Jenny sorriu, pegou a bolsa e saiu.

            Kat passou alguns minutos sentada na cama, curtindo um pouco o silêncio, reunindo forças e esperando que o gosto ruim da boca melhorasse antes de ir para o chuveiro. Passados esses minutos, levantou-se e abriu uma gaveta para pegar roupas. Já estava entrando no banheiro quando ouviu alguém batendo a porta. Estranhou, mas atendeu já sabendo que não era sua companheira de quarto.

 

- Nash?

- O que foi? Esperava outra pessoa?

- Pra falar a verdade eu não estava esperando ninguém.

- Estou atrapalhando? Espera, nem precisa responder. Só vim aqui entregar uma coisa. – levantou a mão e mostrou sua bolsa. – Você esqueceu no salão.

- Puxa, obrigada. Achei que ia ter que sair daqui pra buscar. Logo hoje que não estou que não estou lá essas coisas.

- Realmente você não está com uma cara muito legal. Está pálida... aconteceu alguma coisa?

- Eu não passei muito bem na aula.

- Foi tão sério assim a ponto de ter largado a bolsa?

- Não dava pra esperar. – respondeu, fazendo um gesto que indicou o que tinha acontecido.

- Ah, entendi. E como está agora?

- Melhor.

- Você comeu alguma coisa? É que não dá pra ficar de estômago vazio depois que algo assim acontece.

- Sim, comi... o pessoal me obrigou.

- Pessoal? – fez um esforço para lembrar. – Ah, sim... seus guarda-costas.

- Por quê “guarda-costas”?

- Hunter está com você em todos os lugares.

- Ela é minha companheira de quarto.

- O Sobiesky também é o seu companheiro de quarto?

- É meu amigo. – pareceu ficar na defensiva ao falar nele.

- Não tenho dúvidas disso – ele sorriu, parecendo sem graça por estarem naquele assunto. – Bom, você está precisando de alguma coisa?

 

            Ela balançou a cabeça negativamente.

 

- Não precisa nem de companhia?

- O dia ainda não acabou, Nash. Os outros ainda tem aula.

- Não estou muito a fim de ir pra aula. Acho que também estou passando mal.

- Ah, meu Deus... você não quer mesmo me deixar sozinha...

- Estou te dando essa impressão? – perguntou, sorrindo ironicamente enquanto ela concordava. – Sério? Eu nem percebi!

 

            Os dois riram. Era uma piadinha simples, e a risada caia bem naquela situação, mas aos poucos os risos foram morrendo a medida que o gracejo foi ficando mais distante.

 

- Bem, sério agora... sei lá. Se você passar mal de novo não vai ter ninguém pra te ajudar se ficar aí. Não estou com vontade nenhuma de ir para a aula... então se quiser vir comigo... acho que um pouco de ar puro pode te fazer bem.

 

            Kat pareceu pensativa, mas não foi uma expressão que durou muito.

 

- Acho bom que seja um convite sério...

- É sério. Hipersério. Você aceita?

- Se puder esperar um pouco.

- Eu espero.

 

            Kat sorriu antes de fechar a porta. Olhou-se no espelho querendo saber se o seu mal estar ainda era muito evidente. O rosto continuava pálido, mas era algo que poderia passar perfeitamente por uma pele clara. Soltou o cabelo para amenizar o conjunto e deu-se por satisfeita. Então abriu uma das gavetas e de lá tirou um bloquinho de papel onde escreveu um bilhete para Jenny. Sabia que ela ficaria preocupada se chegasse e não a encontrasse lá. Nem precisou pensar muito e logo já estava tudo escrito. Por fim, pegou sua bolsa e deu mais uma última olhada no espelho antes de sair.

 

- E ainda dizem que as mulheres demoram dias se arrumando. – disse, ao vê-la saindo – E então? Vamos?

- Vamos.

 

            Atravessaram o corredor, desceram as escadas e passaram pelos portões, saindo dos territórios pouco convidativos da Royal Academy.

 

 

 


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Notas finais do capítulo

Hãããã... mereço alguma review??????



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