Dia infeliz.

Finalmente voltei ao balé, com ele eu esqueço os problemas de casa, pelo menos por um tempo.

Meu pai?Como está ele?Lastimável, está com depressão. Sua frase preferida é  “Preciso encontrar um trabalho”. Lamento muito o estado dele, mas não posso deixar tais pensamentos me dominarem, minha cabeça está cheia.

No fim da aula, fui falar com Juliana, ela sempre observa as aulas, mas não pode participar porque está morrendo de leucemia. Tudo ao meu redor é triste.

Ela é simpática, com certeza a melhor parte do meu dia foi essa conversa.

Volto para casa, e a tristeza toma conta de mim novamente. Hoje vou evitar falar com a Cláudia e o Albert.

Meu tio não percebe a situação que minha família está enfrentando, ou finge que não percebe. Ele simplesmente acorda, dorme, ri de suas próprias piadas e “vai arrumar o sótão com minha mãe”. Essa rotina só durou ontem e hoje, meu pai estava em casa, mas isso não impediu o segredo dos dois.

“Não há nada que sustente tanta maldição como um segredo”. Isso deve ser verdade, pois segredos não fazem bem para si mesmo e quando revelado não faz bem aos outros.

Cada minuto do dia que se passa, é como se eu fosse explodindo aos poucos. Só tenho agora a mim mesma, até as lágrimas que antes eu tinha, secaram, me deixando.

Não quero mais falar sobre coisas deprimentes, eu preciso fazer alguma coisa que me deixe alegre por mais um momento.

Uma coisa que eu gosto de fazer é relembrar do passado, mas eu não sei se isso me faz bem ou mal, eu simplesmente faço.

“Era uma época feliz, estava toda família reunida na mesa: eu, meu pai, minha mãe e meu irmão. Alguém bate na porta, é a namorada do Bryan que vai ser apresentada para meus pais, hoje.

Eu já sabia que eles estavam namorando. Meu irmão ,é meu melhor amigo e fiquei com um pouco de ciúmes por ter que dividir a atenção.

O jantar foi tranquilo, ela é muito legal e convenceu meus pais a aceitarem o namoro. Meu irmão parece feliz, minha família está feliz. Isso é uma sensação maravilhosa.”

Lembranças boas, que guardo com carinho em minha cabeça. A contagem regressiva começa 1, 2, 3, 4, 5, 6,7.......Quanto tempo mais eu aguento aqui?Juliana, minha amiga do balé, também deve se fazer a mesma pergunta. Realidades diferentes, com o mesmo fim. Nós temos uma coisa em comum, talvez uma grande amizade possa surgir pela frente.

Tudo que eu preciso, é de uma pessoa com quem eu possa falar dos meus problemas.

A vontade de arrancar meus olhos me invadiu, como no dia do meu aniversário de 7 anos, tudo que eu queria era não ter olhos para não ver a maldade que é feita contra outras pessoas. O problema não deve ser meus olhos, mas sim a minha pessoa que nasceu na hora errada, que vê o que não se deve, a criancinha tola que todos manipulam, essa sou eu.

As surras que levo, as humilhações que passo, nada, nada se compara a perda do meu irmão Bryan. Agora eu sei que sem ele eu não sou capaz de ser feliz, mas também sei que ele me preparou a cada minuto que passava comigo para enfrentar os desafios da vida.

Bryan, se estiver me ouvindo me ajude nessa vida, eu sinto tanta saudade de ti, eu te amo muito e preciso de você do meu lado. Agradeço pelos momentos bons que me deu e me perdoe por ser tão fraca em não conseguir te ajudar, no momento em que você mais precisava de mim. Te amo.

Pego a foto de Bryan, vou até o escritório e tiro cópias, e mais cópias. Quero me castigar por ser tão fraca e tão boazinha a todos, por não ter coragem de fazer justiça, eu quero morrer.

Quero morrer, porque amanhã completo oito anos, amanhã eu vou lamentar a morte de meu irmão em vez de comemorar meu aniversário. Eu sei que tudo poderia ser diferente, eu só sei que eu poderia ser feliz.

Amanhã, dia 13/07 eu darei um presente a mim mesma. Deixarei meu coração ser dominado pela justiça. Vou me libertar das correntes que me mantinham presa à minha bondade, estou cansada de ser manipulada pelas pessoas. Amanhã eu não vou mais pensar igual a uma garota de 8 anos comum, vou pensar como uma garota mais velha, porque eu conheci a crueldade do ser humano, provei dela e isso fez com que eu não pensasse mais como uma garota normal. A raiva estava presa dentro de mim e ela cansou de esperar.

Agarrei-me à foto de meu irmão, e fiquei com a esperança de um dia encontrar-me com ele ,e poder dizer que eu demorei muito para reagir, mas eu dei o meu melhor.

Olhei pela cortina aberta, e encontrei um lindo céu, estampado de estrelas, mas o que mais se destacava era a lua. Fiquei olhando-a, e pensei que talvez lá em cima fosse melhor do que aqui.