Verdade e Consequências escrita por Lara Boger


Capítulo 3
Reações Alheias


Notas iniciais do capítulo

Como isso é possível?!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/10435/chapter/3

- Mas... mas... – Baxter gaguejou, sem encontrar palavras. Não era algo comum, e Adam poderia achar até engraçado se não fosse a situação. – Mas como isso é possível?!

- Isso pode acontecer com todo mundo, com qualquer um. Não há uma explicação possível para todos os casos.

Baxter estava agora visivelmente tenso, aborrecido. Estarrecido talvez fosse a melhor palavra. Talvez nunca tivesse de ter lidado com uma situação daquelas. O máximo poderia ser resfriados, gripes, lesões ou drogas em atletas. Nunca uma doença grave. Como lidaria com isso??

Dovner permanecia no mesmo lugar com olhos fixos em Adam, esperando alguma reação mais perceptível que seu rosto pálido numa expressão neutra, mas dele obteve apenas um suspiro: gesto mais como de quem tenta se acostumar do que susto ou tristeza.

- O que fazemos agora?

- Ele precisa de tratamento e deve começar o mais rápido possível. Imagino que...

Adam dessa vez estava semi presente na conversa. Os três falavam na necessidade de avisar a família, porque era menor de idade e a família estava longe. Que obviamente não poderia continuar treinando, porque o tratamento era penoso... nada que conviesse uma palavra sua. Ele não tomava suas próprias decisões... quando saiu de casa, a responsabilidade só passou para uma outra pessoa. Apenas nos tempos de ranger teve a liberdade para decidir o que fazer... tanta liberdade que agora estava ali, naquela situação.

- Por favor, com licença. – pela primeira vez a voz dele soou, interrompendo a discussão dos adultos – Eu ainda preciso ficar aqui?

A pergunta fez com que eles despertassem para sua presença. Por que ainda precisava estar ali? De acordo com as conclusões dos adultos, ele deveria estar com a família, e não longe de casa, apesar da doença ter se manifestado enquanto estava sob responsabilidade de Baxter. Não iria começar o tratamento agora. Era apenas uma criança, precisava dos pais e dos amigos. Era consenso.

Voltaram para o ginásio. O silêncio era dominante. Baxter olhava constantemente para o retrovisor, em busca de algum sinal de vida de Adam, no banco traseiro, perdido em pensamentos enquanto olhava para a paisagem que passava em alta velocidade. Baxter não conseguia dirigir numa velocidade normal, e Dovner não parava de alertá-lo quanto a isso... mas naquele momento ninguém tinha coragem suficiente para uma advertência ou um gracejo. Talvez fosse melhor chegar rápido para não serem forçados a encarar Adam tão de frente. Lá, poderiam desviar dele, cuidar de outros assuntos... pelo menos enquanto não assimilavam a idéia ou decidissem o que fazer. Não sabiam como agir, como fazer, ou simplesmente o que poderiam lhe dizer. O silêncio era o melhor remédio, e pelo menos por hora, também era o máximo que poderiam oferecer.

Ao chegarem, entraram sem dizer nada. Baxter decidiu, silenciosamente não dizer nada aos outros rapazes. Ninguém precisava saber a menos que fosse necessário. Também delegou a Dovner a responsabilidade de cuidar do assunto até que algo fosse feito com relação à decisão dos pais.

- Dr. Dovner... pode me responder uma pergunta?

- Qual seria essa?

- O senhor já sabia o que eu tinha, não sabia?

Ele pareceu não entender, então se virou para Adam, querendo prestar atenção.

- Desculpe, Park, não entendi. Será que pode repetir?

- O senhor sabia o que eu tinha, antes daquele resultado chegar, não foi?

O tom de voz de Adam era decidido. Dovner havia entendido, mas pedira para repetir, pois não achava que pudesse ter coragem. Mas ele prevaleceu, sem hesitar, sem qualquer emoção: totalmente ponderado.

- Venha comigo. – decidiu, apontando para a enfermaria.

Obedeceu. Entraram e sentaram, prevendo que talvez fosse uma conversa longa.

- De onde tirou uma idéia dessas?

- Não sei, era algo que já estava na minha cabeça. O modo como conversou comigo e fez as perguntas. O diagnóstico não foi uma surpresa, e aquele último exame foi uma formalidade.

- Não era exatamente uma formalidade. Era necessário para saber que forma da doença que se manifestou, o estado de sua medula, indicar o tratamento mais adequado. – tentou explicar melhor, achando mais eficiente mudar um pouco o rumo da conversa - Os sintomas eram característicos, eu conversei com o médico e ele levantou a possibilidade, não achei que ter uma reação efusiva fosse te ajudar em alguma coisa.

Adam meneou a cabeça, indicando que entendeu e concordava, mas sua expressão estava estranha.

- Está se sentindo mal?

- Não, nada disso. Só estou pensando no que vou fazer agora, em como vai ser meus pais sabendo disso.

- Não tem que se preocupar com isso. Nós somos responsáveis por você enquanto estiver aqui, então nós cuidaremos desse assunto... ou por acaso está pensando em pegar um avião sozinho, chegar de surpresa dizendo que desistiu ou não foi aceito e não contar nada?

- Tenho medo da reação deles.

- Mesmo que esse plano maluco desse certo, não duraria muito tempo. Do jeito que está, os sintomas viriam cada vez mais fortes. Uma consulta médica e descobririam tudo.

- Já está tão na cara assim?

- Que está doente? Sim, está. Vou ser franco com você: disseram que o estágio é avançado... isso significa que os sintomas já existem há tempo, ainda que não tenha percebido ou nos contado, mas não vou falar nisso agora. A questão é que não pode ficar sem tratamento, Park. Os efeitos são desconfortáveis, eu sei, mas sem isso, os sintomas vão ficar ainda piores. Não podemos demorar pra contar a eles. É a sua família, vão querer estar por perto.

- Sei disso. Sei mesmo. Mas é que não dá pra evitar. – suspirou – Quando vão contar?

- Amanhã, não sei, o mais rápido possível. – disse, preocupado e querendo encerrar logo aquele assunto. – Melhor você ir descansar. Sua noite foi terrível.

Adam concordou. Levantou e saiu da enfermaria, deixando para trás Dovner, preocupado com seu estado e pensando em como poderia fazer isso.

- Ei, cara, não vai treinar? – perguntou um dos rapazes que aguardava para entrar no tatame.

- Não, hoje não. Fui dispensado.

- Êêêê... boa vida, queria estar no seu lugar. Tô precisando mesmo de um descanso.

- Não, você não iria querer. Acredite em mim. – disse, num tom não de lamento, mas de quem se conformou, para em seguida se afastar e ir para os alojamentos.

Algumas poucas horas se passaram. Já estavam perto do horário do almoço quando Baxter se afastou para falar com Dovner.

- Onde ele está?

- No alojamento. Deve estar dormindo, depois daquela noite de cão.

- Vocês conversaram?

- Pouco. Ele não parece ter se afetado com a notícia, não sei o que dizer.

- É, eu também não tenho a mínima idéia, nem pra ele e nem pros pais.

- Temos que ser rápidos, Baxter. O estágio está avançado... os sintomas vão piorar e talvez nem haja mais tratamento.

- Acha que devemos telefonar hoje?

- Acho que devemos fazer isso o quanto antes. Se agora for possível...

Suspiraram. Estavam frente à situação mais delicada que enfrentaram na vida. Tiraram a responsabilidade que ele parecia tomar para si, mas até mesmo para dois homens vividos e experientes aquilo era pesado demais. Dovner e Baxter já haviam dado notícias ruins, como lesões que tiravam atletas de campeonatos e torneios, ou expulsar alguém por uso de drogas ou bebida... mas nunca algo que poderia ser tão mais próximo de uma sentença de morte.

Foram para o escritório. Baxter pegou a agenda para conferir o número da família. Ao encontrar o sobrenome, sentiu algo na garganta. Pegou o telefone e começou a discar sob o olhar de compreensão do amigo médico, que imaginava o quão penoso seria aquilo.

- Alô? Senhora Park? Aqui é Gregory Baxter, do ginásio Golden Phoenix...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Verdade e Consequências" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.