Verdade e Consequências escrita por Lara Boger


Capítulo 13
Segredos




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De manhã, sozinho no quarto num dia qualquer, Adam quis seguir a sua rotina. Levantar e ir ao banheiro. Normalmente seu pai insistia em querer ajudar, até mesmo forçando a barra pra isso. Normalmente fingia não querer ir, só pra escapar. Agora que estava sozinho, era a chance.

Sentou-se na cama e colocou as pernas para fora. Agarrando-se no pedestal do soro e dos outros remédios, começou a caminhar para o banheiro, a passos lentos e incertos.

“Mais um pouco” disse para si mesmo, como se precisasse apenas de um incentivo. Na realidade, não poderia fazer mais que isso. Já estava quase se arrastando, sentia que talvez não fosse conseguir. De qualquer modo insistiu, fazendo aquilo parecer uma prova de resistência, ou uma questão de honra.

Escorado na pia, sentindo-se mal, contemplou o reflexo pálido que o espelho lhe apresentava. Nada animador. Cabelos desgrenhados, lábios sem cor, rosto molhado de um suor frio. Com uma mão só, tentou lavar o rosto, esperando que a água fria o reanimasse daquela maratona e aliviasse o cansaço, mas, sentir sua respiração entrecortada e o coração disparado tiveram o efeito contrário. A saliva acumulada embaixo da língua quando estava deitado, agora lhe despertou o enjôo. Não havia muito que fazer e nem impedir que acontecesse. Desviou rapidamente da pia para o vaso sanitário, vomitando. As mãos segurando a parede, temendo que a fraqueza o levasse a uma queda. Olhos fechados com força, como se não quisesse ver, num instinto natural do seu corpo. O mesmo instinto que o levou novamente a pia, para lavar a boca, e aliviar ainda que minimamente, o desconforto do tratamento ao qual estava sendo submetido. > 

- Adam? O que houve?

Ele levantou os olhos para o espelho e viu o reflexo de Tanya, logo a porta. Parecia assustada, em alerta. Logo se aproximou segurando-lhe o braço, como quem quer impedir que alguém caia.

- Está tudo bem. – respondeu, olhando para ela, percebendo o susto quando olhou para o rosto.

- Não, não está. Vem.

Segurando-o delicadamente pelo braço, levou-o de volta a cama. Os passos eram incertos. Adam parecia fraco, tonto como se estivesse prestes a desmaiar. Ajudou-o a ajeitar-se no colchão, enquanto observava-o atentamente. A respiração falha, a palidez evidenciada pelo esforço físico.

- Eu vou chamar alguém...

- Não. Não precisa. Eles não podem fazer nada mais sem ser um remédio pra enjôo.

- Mas...

- Não se preocupa, daqui a pouco eu melhoro. – sorriu para ela, tentando aliviar a preocupação que causou. – O que está fazendo aqui tão cedo?

- Eu quis saber como você estava antes de ir para a rádio. Acho que cheguei na hora certa.

- E o meu pai?

- Lá fora, no corredor. Quer que eu chame?

- Não, pelo amor de Deus! Se ele me vir desse jeito vai querer ficar aqui que nem um cão de guarda.

- E não seria o certo? Quer dizer, é o seu pai. Já é de se esperar.

- E por isso mesmo, não precisa ficar mais preocupado do que está. Ele já tem um monte de coisas na cabeça, e desde que voltei ele não foi mais para o escritório. Isso não me ajuda em nada. – suspirou, dando uma pausa e normalizando a respiração, aos poucos. – Por favor, não conta pra ele. É preocupação à toa. Faz parte do meu tratamento.

Sentiu o peso do olhar dela, preocupado. Quase um peso físico e não uma frase poética. Tanya hesitava em dar uma resposta, certamente com medo de que aquele mal estar fosse sinal de algo mais grave. Entendia o seu temor, mas torcia para que ela concordasse.

- Tá bom. Não vou falar nada. – abaixou a cabeça, fechando os olhos brevemente como se soubesse que mais tarde iria se arrepender. – Como você está agora?

- Melhor, foi só um mal estar.

- Espero mesmo que sim. – ela levantou e colocou a bolsa no ombro, prestes a ir embora. Parecia sem jeito. – Bem, eu preciso ir agora. Só vim pra fazer uma visita rápida. Volto mais tarde.

Afastou-se, indo para a porta, numa despedida muito breve com um aperto de mão. Um tom de voz triste. Estava cabisbaixa

Já estava próxima a porta quando ouviu novamente a voz dele, chamando-a. Virou-se imediatamente, como se fosse um ato reflexo, preocupada. Mas o que ouviu foi outra coisa.

- Obrigado, Tannie.

Ela não conseguiu responder. Apenas meneou a cabeça pra indicar que tinha ouvido. Talvez não quisesse, talvez não conseguisse. Preferiu não saber a razão, mas aquele gesto foi tudo que conseguiu oferecer a ele.

Saiu, fechando a porta, deixando-o sozinho enquanto tentava esquecer a cena e melhorar sua expressão, tentando tirar o ar de ansiedade do seu rosto para não despertar as suspeitas do pai do amigo que estava no corredor, próximo a máquina de café. Sabia que ele não ficaria sozinho por muito tempo.

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Algum tempo depois...

>>Na sala fechada da emissora de rádio, Tanya lidava com a mesa de som com a perícia de quem aparentemente nascera para isso. Quem a via através dos vidros diria que estava totalmente concentrada mas não era o caso. Ela queria se concentrar, estava realmente tentando... mas a imagem de Adam passando mal não saía de sua cabeça. Nem o seu pedido.

“Por favor, Tanya... não conta isso pra ele.”

A frase não saía de sua mente. Estava preocupada com a possibilidade de ajudar a encobrir sintomas sérios, coisas que deveriam ser comunicadas ao médico. Tinha medo de fazer mal atendendo ao seu pedido.

Não sabia se tinha sido ríspida ao se despedir. Não pôde lhe oferecer mais do que gestos, embora quisesse ter as palavras. Era muito ruim não saber o que dizer a alguém, e Adam parecia ter esse dom. Nunca sabia o que dizer a ele.

“Se não souber o que dizer, não diga nada”. Uma das máximas de sua mãe. Tanya não sabia se era verdade, mas naquele momento sentia que algo precisava ser dito. Deveria ter articulado algumas palavras. Deveria ter falado qualquer coisa.

Ao menos havia um alívio: Adam não conseguiria esconder nada por muito tempo. Seu pai estava lá, como um cão de guarda, de olhos atentos. Talvez não precisasse sentir culpa. Ele não poderia esconder. Não aquilo.

Um pensamento que lhe traria segurança? Apesar de sua crença, não era o caso. Não tinha qualquer certeza, e isso fez com que um nó atormentasse seus pensamentos. Vê-lo daquele jeito não era fácil. Em sua mente, Adam era forte, saudável, inatingível... e presenciar aquele cena fez com que tudo mudasse: seu amigo, aquela fortaleza humana, seu protetor era humano.

E ainda queria se fazer de forte.

Era triste pensar no que estava acontecendo, lembrar da cena e saber que não era algo isolado. Do quanto ele deveria ter suportado sem contar... as suspeitas da mãe dele que ouvira, sem querer...

Mais uma vez a sensação de culpa por ter prometido manter segredo.

E ainda teria que encontrá-lo novamente! Seria muito constrangedor de sua parte não saber o que lhe dizer? Não seria a primeira vez, mas seria muito mais difícil lidar com isso. Aquela era uma situação diferente: era sua saúde, sua vida!

Suspirou, pensando que deveria ser uma grande burrada da qual não poderia voltar atrás.

“Ah, Adam... que droga...”


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Notas finais do capítulo

E então? Reviews ajudam com a auto estima de iniciantes, sabiam?



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