O Novo Mundo Perdido:2094 escrita por Ravenheart


Capítulo 6
Simpatia




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Confuso, olhei a minha volta. Perguntei:

- Quem é? Quem está aí?

Ouvi risadinhas e galhos sendo pisados. A voz continuou:

- Desculpe-me se o assustei! Jon me avisou de sua chegada, vim recepcioná-lo.

           

            Percebi que a voz vinha de cima, olhei rapidamente e me assustei: uma mulher vinha descendo pelas trepadeiras que surgiam do buraco no teto. Ágil como um felino, parecia estar se divertindo com a situação...

            - Peço-lhe desculpas novamente pelo susto – ela disse ao “aterrissar” à minha frente – O senhor demorou tanto que tive de subir para checar se não havia acontecido alguma coisa.

            Respondi meio sem jeito:

            - Err, obrigado pela preocupação...

            Ela media-me de cima a baixo com os olhos, curiosa. Rodeando-me, respondeu:

            - Que isso! Adoro passear pelas ruínas! Além disso, Jon me mataria se acontecesse algo com o senhor...

            Constatei então que não era bem uma mulher, e sim uma adolescente. Talvez tivesse dezesseis ou dezessete anos, a julgar por seus traços. Tinha cabelos negros encaracolados, e olhos castanhos. Vestia um tipo de colete verde vivo, sem mangas e cheio de bolsos, uma calça jeans azul e um lenço vermelho no pescoço. Aparentemente não portava arma alguma.

           

            - Vamos então? Jon e os outros estão esperando. Siga-me!

            E saiu apressada em direção aos fundos do supermercado. Mas antes mesmo de eu me mover, ela parou subitamente e olhou para trás:

            - Oh! Esqueci de seus ferimentos! Pode deixar que vou mais devagar.

            Virou-se novamente e recomeçou a andar mais lentamente. Segui-a para fora do supermercado, através do entulho acumulado em seus fundos. Aliás, uma boa parte daquele lugar havia desabado. Logo estávamos caminhando pela rua novamente.

            Seguíamos por um tipo de avenida, bastante larga apesar das plantas tomarem as laterais quase completamente. Comecei a prestar atenção em minha guia: era baixa e magra, muito magra. "Alimentação não é uma coisa muito fácil de arranjar por aqui... ’ – pensei enquanto a analisava – ‘Pois é, são tempos difíceis esses..."

            - Então Derek, de onde você veio? Jon não me contou nada sobre você, apenas disse para te guiar até o hospital.

            "Maldição Jon, você não disse pra ela que eu não me lembro de nada?"

            Atrapalhei-me para responder, minha condição de amnésico não dava muitas pistas sobre isso... Mas, antes mesmo de eu abrir a boca, ela disse:

            - Desculpe te perguntar isso, mas é que suas roupas são muito esquisitas! Nunca vi nada disso por aqui! E olha que já viajei até a zona 41, bem pro sul mesmo, perto do setor 30. Lá é bem perigoso, mas não tanto como aqui. Foram eu e mais uns três pra lá, incluindo o Jon, sabe, e...

            Para minha sorte, ela adorava falar. Usei isso como vantagem: apenas concordava ou exclamava sobre seus ‘feitos’, e também aproveitava para perguntar sobre o setor 43, evitando questões sobre mim. Funcionou durante um bom tempo, mas...

            -... enfim, a fronteira fica a norte daqui, em direção ao rio. Mas, senhor Derek, o senhor ainda não me disse de onde veio...

            Pensei rápido e disse:

            - E você não me falou seu nome ainda. Como posso falar sobre mim se nem mesmo sei como você se chama?

            - Nossa! É mesmo! Esqueci-me completamente! – sorrindo para mim, estendeu a mão – Meu nome é Mirella, prazer!

            - Mirella, hein? Bonito nome...

            - Hihi, obrigada... - envergonhada, abaixou a cabeça. Um silêncio constrangedor abateu-se sobre nós. Para 'quebrar o gelo', tentei puxar assunto:

            - Então, Mirella, você vive com seus pais na zona 43?

            - Não... - A resposta veio em um tom de voz baixo e grave – vivo com o tio Ricardo. Meus pais morreram há muito tempo atrás...

            “Era melhor eu ter ficado calado...” – Errr, desculpe por tocar no assunto, eu não...

            - Tudo bem! Não tinha como você saber! – respondeu ela sorrindo.

            Caminhamos mais um tempo até chegarmos ao que parecia ser o portão de um parque. Era feito de ferro, escuro, media no mínimo três metros e parecia ser bem cuidado a julgar pela limpeza. Mirella virou-se e disse:

            - Bem vindo à Primeira Cerca! A última linha de defesa!

            Estranhei aquelas palavras, contrastantes. Lembrei-me do que Jon havia me perguntado quando me encontrou:

            “- O que faz aqui, tão longe da 3ª cerca?”

            Perguntei a Mirella:

            - Mas não são três ‘cercas’? Nós não passamos por nenhuma outra pelo caminho...

            - Lembra-se do lugar aonde te encontrei? Se você tentasse contorna-lo, não iria conseguir. Aquele lugar é uma das portas da Segunda Cerca, a mais alta das três. Ela foi “construída” com entulho e concreto. Sabe, restos de prédios e outras coisas a mais, se é que me entende...

            Imaginei vários quilômetros de prédios demolidos, com o intuito de construir uma proteção.

“Destruir para construir. Irônico.”

Mirella alguns passos para frente e gritou em direção ao portão:

            - Hey Jaime, sou eu, a Mirella! Abre logo o ...

            E ouvi o som de correntes se arrastando e vários outros sons metálicos antes mesmo da garota terminar de falar. O portão começou a abrir lentamente, . Mirella recomeçou a andar e me puxou pelo braço:

            - Vamos, senhor Derek! Já está quase na hora do almoço...

            Adentramos o portão, que antes de terminar de abrir já estava se fechando rapidamente. Notei as grandes engrenagens do mecanismo funcionando, e percebi que não era uma máquina que o movimentava, mas humanos. Dois homens muito fortes giravam cabrestantes com correntes ligadas ao portão, um sistema parecido com aquele das pontes levadiças de castelos medievais.

            “Castelos medievais? De onde eu tirei isso...” – a imagem de um imponente forte feito de pedra no alto de uma colina formou-se em minha mente. A visão do mecanismo de correntes evocou o que seria uma lembrança, talvez um delírio...

            Minha vista turvou-se, e apenas vi escuridão à minha frente...


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