Consequências escrita por LiaLune


Capítulo 2
Conversas


Notas iniciais do capítulo

Tinha feito uma nota que presta, mas como meu computador me ama, ele travou :)
Então.. A história vai começar a rolar no próximo cap., quando o Matthew entrar na história.



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Domingos são dias bons. Sempre que eu acordo, posso ouvir o belo cantar dos pássaros e as conversas animadas das pessoas. Vejo o lindo sol que bate na minha janela e o encantador céu azul. É tudo bom. Mas não hoje, ah, não hoje mesmo.

    Como as pessoas nunca perceberam o quanto é irritante o piar dos passarinhos? Eles ficam berrando e nos incomodando o tempo inteiro. Pássaros malditos! Será que não podem calar essas bocas? Digo, esses bicos? E as conversas animadas das pessoas! Eu to nem ai pra elas. Por que estão felizes? A vida é uma droga e agente só se ferra. Então pra que se animar? E céu e o sol? A cortina ta fechada! Como eu posso ver o céu desse jeito?

    Eu queria muito dizer que era TPM. Eu juro, eu estava muito afim que aquilo fosse a tal da “Pressão pré-menstrual”. Mas, por um motivo que eu suspeito que seja o fato de eu não rezar à noite, Deus me castigou. E agora eu não vou ter TPM por alguns meses. Porque eu não vou menstruar por alguns meses. Isso porque nesses meses, o meu útero estará preenchido por um feto.

    Não sei se foram esses pensamentos que me fizeram passar mal, mas o lanchinho que eu havia feito à noite (com direito a torradas, bolachas e pedaços de bolos cobertos com doce de leite) foi para fora. Bacana.

    Pelo menos tive tempo de empurrar a cortina e me debruçar na janela. Oh, deve ter caído na cabeça de alguém que andava animado! Puxa, que pena! Só espero que ninguém tenha me visto.

    Foi quando eu me joguei de volta na cama que eu me lembrei da minha vida feliz. Também me lembrei das quinhentas coisas que eu deveria fazer. Que eu simplesmente não deveria adiar.

1) Resolver o que fazer da minha vida. E da do ser dentro de mim.

2) Ter coragem para falar com minha mãe/Matthew

3) Contar à minha mãe

4) Contar a Matthew

5) Escovar os dentes.

6) Falar com Sam

7) Escovar os dentes

8) Visitar um médico

9) Sem ninguém saber

10) Tentar ter uma vida social normal, o que será impossível. Todos nós já vimos o que acontece com adolescente grávidas –ou que tem um filho-, no colégio. São chamas de galinhas, putas e qualquer nome ofensivo. Todos se distanciam delas e os pais de seus amigos os proíbem de serem amigos. Na maioria das vezes, não há quem cuidar do bebê e assim, a menina tem que largar os estudos. Para mais tarde trabalhar como empregada doméstica, faxineira, garçonete com salários que não são bons suficientes para sustentar uma família. Vinda de uma família pobre, a criança tem o mesmo destino.

Pensei em ligar para Sam, talvez ela me ajudasse. Mas então me lembrei da pequena discussão que tivemos ontem. Talvez essa não seja a melhor ideia no momento. Hoje era domingo, nós não tínhamos aula e poderíamos ficar o dia inteiro na cama, dormindo e fingindo estar com dor de cabeça para que nossas mães não fiquem nos interrogando a cada meio segundo.

Eu estava estranha hoje. Eu não estava em pânico como ontem. Hoje, eu estava com raiva. Sim, com raiva, com ódio e braba com a vida. Eu não sei porque. De repente, senti as lágrimas descerem pelo meu rosto. Novamente. E comecei a chorar feito um bebê. Novamente.

Levantei da cama – aonde havia me deitado novamente-, e fui até o banheiro. Fiz minha higiene matinal e me certifiquei de escovar os dentes duas vezes. Foi quando eu vi um objeto que me chamou atenção. Ele brilhava, ele gritava por mim. Encarei por alguns segundos o objeto com um sinal de positivo e depois, por algum motivo idiota, o guardei na gaveta e a tranquei. 

Troquei de roupa e, após pentear meu cabelo, dirigi-me até a cozinha aonde encontrei minha mãe. Ela assistia á televisão enquanto tomava café. Sentei ao seu lado e despejei o leite na minha caneca das Meninas Super Poderosas, que era quase mais velha que Sleeper. Sleeper, nosso vira-lata, era uma graça. Nunca latia. Não, porque sempre estava ocupado dormindo. Ele tinha pelo louro e grandes orelhas que sempre se levantavam quando alguém pronunciava seu nome. Isso é, quando não estava dormindo feito uma pedra.

Nesse exato momento Sleeper entrou na cozinha saltitando. Ele se deitou nos meus pés e ficou balançando o rabinho, esperando que eu lhe desse algum alimento. Tsc, coitado.

- Bom dia, filha – minha mãe, Lauren, me cumprimenta. – Dormiu bem?

Achei desnecessário dizer que não havia dormido quase nada, graças à notícia de que eu estava esperando um filho de um cara que, conforme sua irmã disse, nunca desejaria ter alguma espécie de relacionamento comigo. Que tranquilizante.

- Sim – eu respondo adicionando Nescau ao meu leite enquanto empurrava Sleeper com os pés. Esse cachorro precisava urgentemente de uma dieta. Enquanto tentava tirar o bicho dali, acabei derramando metade da caneca na mesa.

- Droga! – digo irritada, tentando achar algum pano que pudesse limpar  sujeira que eu havia feito.

- Alguém está estressada – mamãe comenta, sem tirar os olhos do jornal. – Então, vai me contar de uma vez o que houve ou vai continuar escondendo?

A olhei incrédula. Como ela sabia? Ela tinha visto o teste no meu banheiro? Mas por que ela foi ao meu banheiro se o dela é bem maior? Não tem sentido. Talvez ela nem saiba de nada. Talvez ela só esteja preocupada e se eu desmentir, ela irá deixa de lado isso tudo.

- Eu não estou escondendo nada – eu afirmo, tremendo nervosa enquanto pegava um pano qualquer e secava a sujeira. Dei um sorriso forçado para minha mãe e pergunto. – Por que a pergunta?

Surpreendi-me com minha falsidade. Ela era minha mãe, eu de modo algum poderia fazer isso com ela mas... Ela era minha mãe. Eu não podia contar para ela.

- Não sei – ela diz, me encarando com a sobrancelha erguida. Depois sua atenção voltou ao jornal a sua frente. – Está a fim de ir ao cinema?

    Era por isso que eu amava minha mãe. Quando nasci, ela tinha vinte anos. E agora, tinha trinta e cinco anos, então, ela era bem jovem. Seu cabelo era preto e seus olhos azuis faziam uma combinação bonita. Eu havia herdado seus olhos. E os cabelos de meu pai, que morava do outro lado do mundo e trabalhada em uma empresa importante. Nos víamos no máximo uma vez por mês. Mas sempre que podia, ele me mandava algum presente ou algum cartão.

    Só que apesar de tudo isso, eu não estava em clima de filmes.

    - Eu não sei – eu digo e vejo ela cerrar os olhos, confusa. – Talvez no final de semana que vem...

    Ela franze a testa e termina com seu café. Continua na mesa me aguardando terminar de comer para depois se sentar no sofá, ao meu lado, como sempre fazemos nas manhãs de domingos para assistir aos clipes do Multishow.

    O programa não estava nem na metade quando ela me lembrou que eu deveria passear com Sleeper. Arrumei sua coleira e a corrente e o levei – ou melhor, fui levada-. para fora do apartamento.

    Ali fora, a onde o vento era forte e o céu estava fechado, os pensamentos me atormentavam. Parecia que cada pessoa que passava por mim sabia exatamente o que estava acontecendo comigo. Parecia que elas sabiam o que havia acontecido há alguns meses na festa de John. Eu nunca deveria ter ido. Mas era a festa pós Festival de Primavera. Todos estavam bebendo e eu, idiota como sempre, fui na deles. Eu estava deslocada e nervosa por ir a uma festa como aquela com pessoas mais velhas. Não lembro exatamente do que aconteceu quando me encontrei com Matthew, mas felizmente ou não, lembro.

     Perdida em meus pensamentos, não percebi quando esbarrei em Luke, meu vizinho. Com o impacto, soltei a corrente de Sleeper, que logo foi pega novamente por Luke.

    - Ei – ele diz segurando firmemente a corrente, para que o grande cachorro não fugisse. – Desculpa, não tinha visto você. Está bem?

     - Ah, sim, estou – eu digo tentando pegar a corrente de suas mãos de volta e terminar com a conversa.

    - Ei, calminha – Ele sorri. – Já vou devolver a corrente.

     - Não, tudo bem – eu digo devolvendo um sorriso tímido. – Desde que passeie com ele e o traga às onze horas, está ótimo.

    Ele finge uma cara apavorada e me entrega o cachorro rapidamente, balançando a cabeça em negação.

     - O cachorro é todo seu! – ele afirma, fazendo que eu risse. – Então, como vão as coisas? – ele pergunta com a sobrancelha erguida.

    Uma merda, seria a resposta ideal. Apenas deixei para lá e respondi um “vai bem” sem muita emoção. De modo algum minha vida vai bem. Ignorei esse fato também e continuei com um “e a sua?”.

    - Ótima – ele responde e se encosta ao muro de uma casa qualquer. – Mas não irei fazer nada hoje. Aluguei uns filmes mas no fim, meus amigos estão ocupados. É uma pena.

    Dei um sorriso forçado e abaixei o rosto, encarando Sleeper, que parecia querer dormir no chão frio da rua.

    - É. Tenho que ir... A gente se vê – Chuto discretamente Sleeper para que esse acordasse e andasse de uma vez. Ele acorda com um pulo para logo ser puxado de volta para o apartamento.

    - Espera – Ouço Luke gritar e em minha direção. – Eu vou com você.

    Tentei segurar o suspiro de descontentamento. Não que eu não apreciasse a companhia dele nem nada, só não estava com vontade de conversar hoje. Entramos no elevador em completo silêncio e assim continuamos até que Luke me surpreendeu com uma pergunta.

- O que houve? – ele pergunta me fitando pelo espelho.

- Nada – Dou um riso forçado.

- Tem certeza? Você podia passar lá em casa pra gente conversar e, talvez, ver uns filmes... – ele propôs com um grande sorriso.

    Sentia-me mal por negar o convite dele e ser tão distante quando ele só queria ser amigável comigo. Mas eu não podia fingir que está tudo bem e ir à casa do meu vizinho e ver um filme. Não seria nada legal.

     Desculpei-me da forma mais educada que havia e empurrei Sleeper porta afora quando o elevador parou em meu andar. Larguei sua corrente em um lugar qualquer e fui ao meu quarto, aonde desabei a chorar novamente.

     Era tão injusto. Eu não merecia passar por aquilo. Tirando ter bebido até ficar bêbada e dormir com o irmão mais velho da minha melhor amiga sem me proteger, eu nunca havia feito nada de tão mal. Eu era uma aluna exemplar. Ok, quase exemplar. Mas eu tentava. Sempre lavava a louça e limpava as fezes fedorentas do Sleeper.

    O dia continuou assim. Eu, minha cama e lenços descartáveis. Na hora da janta, sem coragem de encarar mamãe, fiz um miojo e o trouxe para meu quarto. Dei a desculpa que estava estudando para uma prova, evitando mais problemas e questionamentos.

     À noite, não consegui dormir. Fiz de tudo, eu juro, desde tomar leitinho morno a ouvir Elvis for Babys – um cd que mamãe tocava para que eu dormisse quando era criança. Por fim, o sono finalmente chegou enquanto eu dormia ao lado de Sleeper, que já havia dormido há horas.

\t\t 

    Acordei com o latido do cachorro que pulava na porta tentando abri-la. Depois de manda-lo para lugares não muito bonitos, levantei, tomei um banho quente e me troquei. Penteei o cabelo que estava estranhamente embaraçado e peguei minha mochila. Durante o trajeto até a escola, eu e mamãe não trocamos uma palavra qualquer. Nós duas tinhamos plena consciência do nosso terrível mau-humor matinal.

     Quando desci do carro e bati a porta do mesmo, a ficha caiu. Como eu encararia Sam? E o pior, Matthew? Eu nunca falava com ele, mas depois daquela festa, nunca mais nos encarávamos. A situação era constrangedora.

     Cheguei em frente ao meu armário e retirei os livros que seriam necessários hoje. Pulei de susto quando ouvi a voz de Sam.

    - Oi. Então – ela diz, olhando para baixo. – Acho que te devo um pedido de desculpas, certo?

    Sorri em resposta e nós continuamos nosso caminho até nossa sala, aonde nos sentamos em nossos apropriados lugares. As aulas passaram devagar e rápido demais ao mesmo tempo. Eu queria de qualquer modo evitara  conversa que teria com Sam, mas eu também não estava aproveitando muito a aula de religião.

    O sinal bateu e o intervalo começou. Não demorou muito para que Sam e eu compassemos um Doritos no bar e depois nos sentássemos em um banco no meio do pátio da escola.

    - Você deve falar com ele – ela diz, fitando o salgadinho de forma triangular em sua mão. – Eu não consigo falar com ele sem sentir raiva ou então, constrangimento. Só de olhar para cara dele e pensar que os espermatozóides dele percorreram o caminho da sua vagina até encontrar o seu óvulo e...

    - Sam – eu digo séria.

    - Ah, ta. Desculpa – Ela pega mais um salgadinho e fica o olhando de vários ângulos. – Eu me pergunto o que vocês vão fazer.

    - Eu... Eu não sei – Eu suspiro e coloco a mão instantaneamente na minha barriga. Encaro as pessoas andando e as árvores se mexendo com o vento. – Não vou contar a ele – concluo firmemente.

    - O quê? – ela grita, jogando o salgadinho pro lado. – Como assim? Você é louca? Ta achando o que, que a criança se formou do vento? Você não vai poder esconder para sempre o pai dela. E ainda mais, meu irmão tem o direito de saber e de escolher o futuro dessa criança!

    Sinto um aperto no peito mas respiro fortemente e a encaro.

    - Ninguém precisa saber dessa criança – eu digo. – Estou pensando em aborto.

    Sam me encara com os olhos arregalados por alguns segundos. Depois joga o saco de Doritos no chão e sai andando furiosamente, sem ao menos olhar para trás. Fico perplexa.

    Há dois dias atrás, ela parecia quer se livrar de toda e qualquer maneira da criança. Disse que Matthew não me ajudaria e que era muito sério para mim e eu estava apenas levando na brincadeira. E agora ela sai desse jeito sem mais nem menos. Não, ela me devia explicações agora.

    - Samantha! – grito e corro até ela, que para de andar. – Eu não entendo! Pensei que você achasse isso certo.

    Sua expressão aborrecida se transforma em tristeza.

    - Eu não sei – ela diz. – O bebe não é meu, mas... Eu não sei. Esqueça, Becky.

    - Não, me fale – eu digo seriamente.

    - Olha, Becky. Deixe isso pra lá. Você deve conversar com ele e depois, decidirem o que fazer, certo? Sem decisões precipitadas.

    - É muito mais complicado que isso, Sam – eu falo. – E falar com o Matthew... Você sabe o que ele vai dizer.

    - Não importa – ela diz confiante. – Essa não é a hora de ter vergonha de seus atos.

    Ai, eu pensei. Essa indireta doeu. Olhei para o chão, envergonhada. Quer dizer, puxa. Ela é a irmã dele.

    - Ah, eu não quis dizer isso – ela se desculpa sem jeito. – Sei que a culpa não foi sua e nem de Matthew. Mas, com aquelas notas altas dele, ele deveria ao menos saber alguma coisa sobre reprodução e métodos anticoncepcionais.

    - Nós estávamos bêbados – eu a lembrei novamente, ainda encarando o chão.

    - É, sei – ela responde. – Mas mesmo assim!

    - Não há mesmo assim – eu lhe digo encarando o chão. Então, sinto que o Doritos não foi a melhor opção de lanche.

     Enjoada, corri até o banheiro mais próximo. De repente, me vi agradecendo a Deus e ao mundo por guardar uma escova de dente na mochila.


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Notas finais do capítulo

Mandar reviews não mata, então mandem e façam uma "escritora" feliz :3 /uhul-n
Beijos e tudo de bom õ/ e obrigada por gastarem seus minutos com a minha fic