Pétalas Negras escrita por Jade Amorim


Capítulo 1
Capítulo 1




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Pétalas Negras

 

As pétalas infelizes

Das rosas do canteiro finado

Caiem sem raízes

Deixando o chão humilhado.

As pétalas inofensivas

Com sede de terra molhada

Cortam-se nas ramas agressivas

Deixando a beleza na estrada.

As pétalas intransigentes

Não balançam com a ventania

Mandam ódio com remetentes

De insipidez e monotonia.

 

 

Um barulho metálico era a única coisa que se ouvia na calada da noite de Londres, além, é claro, dos barulhos dos caros, sirenes policiais e ambulâncias; coisa comum em grandes metrópoles.

Um suspiro. A noite gélida apenas transcrevia algo comum nas noites tensas de inverno, o ar condensado era visível a olho nu e, provavelmente, mataria um ou dois mendigos naquela madrugada. Ele ajeitou o cachecol, pondo-o sobre o rosto para proteger-se do frio, enquanto se abraçava por dentro do grosso casaco de camurça.

Sasuke odiava o caminho até sua casa, ou melhor, até seu fétido e minúsculo quarto-e-sala. Lugar cheio de infiltração, canos entupidos e ratos mortos, o único lugar que conseguira arranjar com a porcaria que ganhava; um lugar que não era digno nem de ser chamado de lar. Porém o que mais lhe incomodava não eram os defeitos da locação, e sim as pessoas que era obrigado a encarar todos os dias. O sindico era um velho careca e carrancudo, com meia dúzia de dentes e uma perna manca. De acordo com boatos a perna do Sr. Mitashi havia sido acertada em um tiroteio entre os traficantes do subúrbio onde fica a pensão, o osso fora estraçalhado, mas mesmo em toda essa situação o homem se recusou a ir a um médico ou um pronto-socorro e o osso se reconstituiu de maneira torta, deixando-o manco. Seus vizinhos eram traficantes de drogas, viciados que nem se agüentavam em pé - que cheiravam a mijo - e prostitutas. Garotas que vendiam o corpo por meio pacote de arroz ou algumas notas de dinheiro. Algumas faziam isso por necessidade, tinham filhos sem pais e eram as ovelhas negras da família. Outras não passavam de vagabundas que não queriam trabalhar e faziam isso por puro prazer.

O caminho era um emaranhado de becos, com postes cheios de luzes falhas e outras até mesmo queimadas, que faziam com que ele até hoje se perdesse ou ficasse confuso ao caminho que devia seguir.

Quando mais novo, o orfanato era o lugar que chamava de lar, superlotado de crianças, algumas sem dentes e sempre machucadas. As verbas do lugar eram totalmente desviadas, pois quando lhes faltavam comida os diretores apareciam com novos carros importados. À noite era o pior, era nesses horários que agradecia por ser um pouco estranho e não sofrer o que as garotas de lá sofriam. Eram apenas gritos. O silêncio era cortado apenas por vozes finas e infantis que imploravam por socorro. Aos cinco anos de idade já eram brinquedos nas mãos de velhos barrigudos, nojentos e pedófilos. Fora uma infância de lodo, choro e sangue.

Quando completou 18 anos saíra de lá quase que fugido e acabou conseguindo um emprego como mecânico, onde aprendeu o oficio. Entretanto o jovem era muito sonhador, queria se tornar alguém, estudar e ser importante algum dia. O mundo trágico não o abalava.

Sasuke começou a sentir o peso de uma das noites mais frias de toda a estação quando começou a ficar com falta de ar. Parou em um dos becos já meio perdido da cidade para se apoiar na parede e tentar respirar melhor, com mais força. A luz do poste era falha e isso dava um ar assustador a toda situação.

Passo a passo ia se adiantando, apoiado à parede ele virou e entrou em um outro beco, este estava totalmente no breu. O vento soprava como um leve assobio de uma criança, a noite escura era iluminada apenas pelas estrelas, já que a lua ainda jazia curva, brilhando quase que inexistentemente prateada.

Parou subitamente, agora que o ar não entrava em seus pulmões mesmo. Tirou a mão da parede tentando decifrar o que era o liquido viscoso que tinha na sua palma. A pele já pálida ficou pior, quase transparente enquanto os olhos negros saiam de foco. Levou o punho ao nariz e cheirou. Não, não podia ser. Era sangue.

Sobressaltou-se quando ouviu a badalada dos dois imensos relógios da Catedral de Westminster, que marcava meia-noite. Aos poucos a luz voltou falha e quando olhou para frente ficou apavorado, pela primeira vez na vida tivera medo da morte.

Os dois corpos jaziam um sobre o outro, os membros decepados e ensanguentados, as bocas abertas e os olhos semifechados, sem brilho e sem vida. Quando levantou o pé para sair dali percebeu que os mesmos estavam embebedados de sangue e isso fez com que desse um pulo para trás.

Virou-se apavorado, para ver se tinha rastros do autor de tal crime, e como quem procura acha ele o viu. Um homem alto e corpulento, escondido por um imenso sobre - tudo negro e um chapéu de feltro. Ele tinha em mãos uma rosa, não uma rosa qualquer, mas sim uma rosa negra. Deu um passo para trás, e sentiu o sangue respingar-lhe sobre a calça. Estava encurralado.

O ar já não existia, estava sem fôlego e o corpo não queria lhe obedecer. Sentiu o mundo parar quando viu o homem esticar-lhe o braço e arremessar a rosa. Não esperou ver o fim dessa história e saiu correndo.

A noite fora uma longa tortura, não conseguia fechar os olhos sem ver os corpos e o homem tão misterioso. Apenas ficou encolhido embaixo das cobertas, tremendo não de frio, mas de medo. E quando mal havia amanhecido saiu de seu esconderijo, em busca de gente, de preferência viva.

Mais um dia nublado, vestido como de costume saiu da pensão para tomar um café na padaria da esquina. Cabisbaixo nem enxergava para onde ia, os olhos apenas passavam aquelas mesmas cenas da noite anterior, e por consequência, trombou em alguém.

— Me descul... - começou, gaguejando e tentando retomar o equilíbrio.

— Tudo bem, não se... - Começou a mulher e, assim que vira o rosto de quem havia trombado, aliviou-se. - Ah Sasuke! Que susto. - começou animada e quando notou o rosto do amigo e falou: - Deus, você está mais pálido que o normal, aconteceu alguma coisa?

— Está tudo bem Ino, pode deixar. - respondeu.

Ino era uma das boas pessoas que tinham naquele lugar. Com uma filha pequena e sem muito sucesso na vida ela tinha que vender o corpo para não só se sustentar, mas também para pagar a faculdade de canto. Uma pena, porém não podia fazer nada a não ser incentivá-la a continuar com a aula.

— Não, não está. Vamos! Eu lhe pago o café de hoje. - ele balbuciou algo, tentando se esquivar da loira, mas não teve jeito. Deu-se por vencido e foi com ela.

"Hoje os peritos da polícia, em mais uma de suas rondas pelos becos do subúrbio da cidade, encontraram o casal Haruno, grandes empresários que estavam desaparecidos há uma semana. Os corpos estavam esquartejados, porém tudo amontoado no mesmo lugar junto a uma rosa negra, embebedada no sangue das vitimas. Os policiais procuram pistas sobre o assassino e investigam se a filha deles, Sakura Haruno, que estava brigada com os pais um pouco antes deles desaparecem, tem algo a ver com o incidente. Ficamos aqui com mais um Jornal Matinal. Tenham um bom dia."

— Nossa! Que horror, não é Sasuke? - Ino perguntou, amedrontada com a noticia e as fotos que vira. - Depois dessas imagens qualquer um perde a fome.

— E a pobre garota ainda está sendo acusada de algo que nem fez. - ele balbuciou, mais para si do que para qualquer outra pessoa.

— Oras, talvez sim, talvez não. Você viu como ela se veste e se comporta? Não duvido que aquela rebeldezinha sem causa tenha feito realmente isso. - Torceu o nariz.

Sasuke sabia que não era ela, mas não podia - e nem queria - abrir a boca com medo do que podia acontecer consigo. Ele, mais do que qualquer outra pessoa, sabia que a aparência não significava nada e que, por trás de toda aquela maquiagem, roupa preta cheia de tachões e piercings, aquela garota de olhos esverdeados estava triste pela morte dos pais, mesmo mantendo o semblante neutro. Talvez ela não soubesse expressar seus sentimentos, ou não quisesse se mostrar fraca. Apesar de não querer contar a verdade e nem nada a ninguém, resolveu ir atrás daquela garota e falar com ela.

— Ei, o que vai fazer amanhã? - Ino perguntou finalizando suas torradas e tomando o ultimo gole de seu café com leite. A padaria fedia a fumaça de cigarro, tinha garçonetes sem educação, mal vestidas e um monte de gente mal-encarada.

Ele tinha se esquecido, amanhã era seu dia de folga. Perfeito, iria procurá-la no sábado. Ao começar a pensar nisso acabou se distraindo e se esquecendo de responder a mulher ao seu lado. Ino, temerosa com o jeito que o amigo estava, lhe chamou a atenção pondo as mãos em seus ombros chacoalhando-o de leve, para que quando ele lhe dirigiu a atenção repetir a pergunta.

— Desculpe, me distraí.

— Tudo bem, sem problemas, mas e então... O que vai fazer no sábado? - seu sorriso era terno e amistoso.

— E-eu? Vou estar muito ocupado, acho que vou passar o dia todo fora de casa, então, me desculpe. - Respondeu, mandando a primeira desculpa que veio à cabeça. Disse que estava atrasado para o trabalho (o que era verdade) e saiu quase que correndo dali.

Assim que chegou em casa se jogou na cama exausto. Havia cometido vários erros na hora do serviço e isso lhe proporcionou belos puxões de orelha do chefe. Ainda estava muito perturbado com o que acontecera e não conseguiu se concentrar.

Aquela foi mais uma noite sem conseguir dormir, rolara na cama por cerca de três horas inteiras enquanto escutava o barulho das infiltrações do quarto e o irritante ruído dos ratos no foro. Levantou-se. Ficaria louco se ficasse rolando de um lado para o outro por mais cinco minutos e foi para a janela. Seu maior erro.

A luz do poste estava falhando, nenhuma novidade. Porém ele ainda pôde ver o vulto negro. Era o mesmo homem do dia do assassinato, o mesmo chapéu o mesmo sobre - tudo e a mesma rosa, de pétalas negras. Sasuke, assustado, correu novamente para a cama.

O homem agora já sabia onde morava. E se ele tentasse matá-lo? O que será que ele queria? Pelo visto teria que descobrir isso por si só, ou seria apenas mais uma vítima. Resolveu esperar para amanhecer e ir atrás da tal Haruno Sakura.


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Notas finais do capítulo

Aí está o primeiro capítulo, num total de três. O poema é de Becas Duarte, e não está completo, continuarei-o conforme for postando os outros capítulos.
Espero que gostem e deixem reviews!

Beijos!



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