Herança de Amor escrita por Lewana


Capítulo 9
Capítulo 9




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  Carolina desceu da caminhonete e fechou a porta:
   - Obrigada, Rob. Obrigada, mesmo.
   - Não há o que agradecer.
   Tinham passado o dia juntos, andando pelo rancho. Rob lhe mostrara a terra e os animais, contara coisas a respeito do rancho. Ao meio-dia, haviam parado à beira do córrego e feito um piquenique, depois o passeio continuara durante a tarde de primavera.
   Várias vezes Carolina decidira contar a Rob o que acontecera entre ela e Laura, mas sempre acabara desistindo. Era doloroso demais e não queria criar mais problemas entre os irmãos.
   Mesmo não conseguindo esquecer Laura, Carolina gostara do passeio e da companhia. Até agora, Rob era a pessoa com quem melhor se entendera. Tinha ótimo senso de humor e a tratava como gente, não como objeto sexual. Além disso, não sentia nada por ele a não ser uma carinhosa amizade. Laura tinha toda sua atenção no que se referia a amor, a sexo.
   Laura a fizera sentir-se uma mulher completa pela primeira vez. Carolina sentiu um prazer enorme e uma vontade louca de se entregar aquela mulher como jamais sentira antes, e depois ela fora embora daquele jeito, deixando-a arrasada. No entanto, ela a defendera na frente dos caubóis. Por quê?
   Devia ser porque a haviam ensinado a respeitar os outros. Assim, não tivera coragem de humilhá-la publicamente e...
   - ... e o jantar vai ser uma festa.
   Carolina havia esquecido. Não queria saber de festas.
   - Tenho muito trabalho - desculpou-se.
   - Se acha que vai conseguir escapar, está enganada. Você vai à festa e vai dançar comigo.
   Ela imaginou o que Laura pensaria disso. Talvez nem notasse. E daí? Não passara a vida tentando não ser notada?
   - Está combinado? - insistiu Rob.
   - Acho que sim...
   Sorrindo, Carolina acenou enquanto Rob pôs a caminhonete em movimento. Ao encaminhar-se para casa, percebeu que alguém a observava. Voltou-se e viu Laura no cercado central, olhando-a com desaprovação. Lutando contra o impulso de entrar na casa, Carolina dirigiu-se a ela.
   Praguejando ao ver que Carolina se aproximava, Laura lembrou-se do que acontecera ao chegarem, no dia anterior. Defendera Carol porque era o que devia fazer: não podia permitir que alguém ridicularizasse os momentos bonitos que tinham compartilhado. Justificou-se, afirmando que teria feito o mesmo por qualquer mulher, mas era honesta o bastante para admitir que Carolina a perturbava de um modo que nenhuma mulher perturbara.
    Carol era uma inimiga e era também a pessoa diante da qual mais se revelara emocionalmente. Mas ela fizera o mesmo... ou não? Será que Carolina era mesmo tão vulnerável quanto parecia ou era apenas dez vezes mais sutil e esperta do que imaginava?
     E agora ali vinha ela, em sua direção, pressionando, depois de passear o dia inteiro com seu irmão. O que teriam feito? As possibilidades faziam Laura ter vontade de dar um soco em algo. Ou alguém.
     A égua jovem que estava amansando teve percepção da raiva que fervia nela e escoiceou, nervosa. Laura forçou-se a relaxar e murmurou palavras suaves para o animal.
     " Droga! Que desejo é esse que eu sinto por essa mulher?"
     - Importa-se se eu olhar? - perguntou Carolina, apoiando-se na cerca.
     - Você se importaria se eu dissesse que sim? - respondeu sem coragem de encará-la.
     Cerrando os dentes, Laura pegou um saco com aveia e aproximou-o do focinho da égua, assegurando-lhe com voz tranquila e baixa que ninguém ia machucá-la. Então, lentamente, passou a tira do saco por cima da cabeça dela.
     - O que você está fazendo, Laura?
     - Este é o primeiro passo para domar uma égua arisca: acostumá-la a aceitar o contato de uma pessoa.
     - Pensei que para domar bastava montar o cavalo selvagem numa área fechada.
     Deslizando as mãos no pescoço da égua, Laura considerava que era difícil imaginar o quanto Carolina era quente, diante do seu ar de inocência.
     - Nunca me imponho: isso pode acabar com uma boa égua. Começo devagar, acaricio o animal inteiro...
    A voz densa, cálida, fez Carolina corar. Laura prosseguiu:
     - Assim que esta égua reconhecer meu toque e se acostumar com a manta e a sela, vou colocar meu peso sobre ela, preparando-a para o que virá.
     Fascinada, Carolina acompanhava o movimento das mãos de Laura e cerrou os punhos, lembrando-se das carícias dela.
     - Quando por fim eu montar nela, estará ansiosa por me levar aonde eu quiser ir.
     - E aí?
     Laura fitou-a diretamente:
     - Aí eu a passo para outra pessoa.
     Carolina sentiu com se Laura a esbofeteasse, virou-se e foi para a casa, forçando-se a andar devagar. Foi acompanhada pelos olhos azuis até entrar pela porta da cozinha.
     - Laura...
     Ela atendeu ao chamado e viu Dudu montando na tábua de cima do cercado.
     - Já acabei de cuidar do Zack. Posso ajudar a domar a Prissy?
     - Claro que pode.
     Laura continuou a trabalhar a égua, explicando ao menino tudo que fazia, mas pensando no modo que Carolina olhara para ela e não sentia nem um pouco de orgulho como esperava. Em vez de se orgulhar, tinha um profundo desgosto. E dessa vez era desgosto por si mesma.
   

~//~


     Carolina olhava sem ver para a tela do monitor, os dedos digitando de forma automática enquanto a voz de Ted soava no ambiente. De súbito, a fita acabou. Quando foi pegar a fita seguinte, ela derrubou a pilha toda e agachou-se para recolhê-lhas, praguejando: só fazia besteiras porque não parava de pensar na atitude cruel de Laura.
      Esfregando os olhos cansados, colocou outra fita no gravador e acionou-o. Já escrevera algumas palavras quando percebeu que não era a continuação da fita anterior. Ia desligar quando o que Ted dizia chamou-lhe a atenção:

    Quando recebi a notícia da morte da companheira de Laura, vi que era a oportunidade pela qual esperava há tanto tempo. Sentia que, de algum modo, eu tinha que me aproximar dela, tinha que ajudar minha filha num momento que necessitava de ajuda. Àquela altura, com Ben Bittencourt morto e Laura adulta, depois de já ter cometido seus próprios erros, achei que poderíamos falar sobre o passado, que eu poderia finalmente explicar por que havia decidido nossas vidas do modo que o fizera.
    No hospital, tive de revelar nosso grau de parentesco para poder vê-la.
    A enfermeira entrou na minha frente e me anunciou:
    - Srta. Bitencourt, seu pai está aqui.
    Laura me olhou, virou a cabeça enfaixada para a parede e disse quatro palavras que acabaram a nossa reconciliação antes dela começar:
    - Meu pai está morto.
    Sua rejeição era precisível, mas ainda hoje sinto a dor que me causou. Mesmo assim, não mudaria nenhuma das decisões que tomei em relação a ela. Minha recusa em aceitá-la quando era criança, minha total ausência da vida dela, foram os presentes mais valiosos que pude oferecer a Laura. Ah! Se conseguisse fazê-la entender isso, creio que morreria feliz.

    Lutando para não chorar, Carolina retirou os fones e os colocou na mesa. Por fim, descobrira algo importante. Apesar do relacionamento com a filha ter sido ruim, Ted não se tornara amargo. Não culpara Laura por rejeitá-lo. Portanto, não tivera intenção de feri-la ao não deixar o rancho para ela.
    Carolina chegou a levantar-se para ir dizer a Laura o que ouvira, então percebeu que estava sendo tola. Nada lhe devia e, além disso, ela não acreditaria em nada do que Ted declarara.
     - Você ainda não se vestiu?
     Voltando-se, Carolina viu Rob parado à porta. Um Rob elegante, com traje de caubói muito refinado.
     - Confesso que não estou com clima de festa - disse ela.
     - Nem eu, para dizer a verdade. Mas decidi que devia a mim mesmo não ceder ao desânimo. Minha ex-noiva fez a escolha dela e não vou passar a vida lamentando algo que não posso mudar.
     Carolina sentiu-se culpada: na preocupação com os próprios problemas, esquecera a dor de Rob. Percebeu que a observação dele aplicava-se a ela também.
     - Tem razão, Rob - concordou mais com determinação do que com entusiasmo. - Fico pronta em um minuto.
     Rob assentiu e se retirou.
    Quinze minutos depois Carolina estava pronta, diante do espelho. Num impulso, resolvera usar maquiagem, o que não fazia há muito tempo. O vermelho do vestido contrastava com sua pele marfim. Os cabelos presos não estavam bem. Hesitou um momento, então soltou-os e as ondas louras desceram-lhe pelos ombros.
    Bateram quando ela se perfumava.
    - Entre.
    Rob abriu a porta e ela voltou-se, esperando pela reação dele, que a surpreendeu ao dizer, tenso:
    - Espere, não saia daí.
    Desapareceu e retornou um minuto depois com uma criada. Apontou-a, falando num espanhol tão rápido que não deu sequer para Carolina tentar entender. Em seguida, foi a criada que desapareceu. Voltou quando Carolina já se impacientava e comeceu a mexer na roupa dela. Pouco depois, a criada a fez virar-se de novo de frente para o espelho. Ela tinha feito um corte na lateral do seu vestido, onde uma de suas pernas assim que andasse, poderiam ser vista facilmente, os cabelos desciam em cachos dourados e sapatos vermelhos, de salto alto, conferiam a elegância. Pela primeira vez depois de muitos anos gostou do que via.
    Encontrou o olhar de Rob no espelho e animou-se:
    - Vamos para a festa!
    Não podia esperar para mostrar a Laura o que ela estava perdendo.


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Notas finais do capítulo

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