Herança de Amor escrita por Lewana


Capítulo 10
Capítulo 10




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    A primeira pessoa que Carolina viu quando entrou na sala lotada foi Eduardo, que correu ao seu encontro e quase derrubou o copo de refrigerante em cima dela.
   - Fiquei com saudade de você, querido. Que tal um abraço?
   - Abraço não, mãe! E se os outros garotos me virem?
   Carolina sentiu tristeza e orgulho: seu filho estava mesmo crescendo.
   - Rob e eu demos um passeio pelo rancho. Eu gostaria que você tivesse ido. Por que quis ficar, Dudu?
   - Eu tinha que ajudar a treinar Prissy e aprender a cuidar do Zack.
   Antes que ela pudesse perguntar quem era Prissy, o filho já saía correndo:
   - Vou pegar mais refrigerante, mãe!
   - Só mais um!
   Ficou olhando; era ótimo ver Dudu tão bem, mas sentia falta da ligação que tinham quando moravam sozinhos. Estaria sendo superprotetora ou tinha, mesmo, motivos para se preocupar?
   - Carol, gostaria que conhecesse Dan e Clara Jenkins - Rob estava ao lado dela. - São os donos do rancho Lazy J.
   Foram trocados cumprimentos e depois tudo tornou-se um borrão de rostos e nomes novos, enquanto Rob a levava pela sala.
   Grata pelo apoio, Carolina ficou perto dele, comeu o que ele lhe serviu e fez o possível para conversar com animação. Só não queria parecer apreensiva. Todos ali achavam que Laura fora injustiçada e estavam do lado dela. Mostravam-se educados e até amigáveis, mas Carolina sabia o que pensavam de verdade.
    Alguns, como Sybil Perry, eram mais transparentes do que outros. A esposa do advogado de Ted sorriu-lhe, mas seus olhos negros eram gelados e a mesma não conseguia apagar completamente o tom desdenhoso sempre que falava.
    Carolina gostou quando Rob a tirou de perto dos Perry, conduzindo-a ao espaço que fora aberto no centro da sala para dançar.
    Rob ensinou-lhe alguns passos enquanto ela ria da própria falta de jeito.
    - Nunca aprendi a dançar... - confessou, ruborizada.
    - Vai ser mestra até o fim da noite.
    Dançaram tanto que Carolina perdeu o fôlego.
    - É divertido, mas os saltos muito finos cansam! - queixou-se.
    Como ele não respondeu, ela segui-lhe o olhar e viu que Laura os observava. Propôs:
    - Não acha melhor irmos sentar um pouco?
    - De jeito nenhum! - opôs-se Rob. - Estou começando a esquentar.
    A música acabou e os pares separaram-se, aplaudindo. Então, começou uma conhecida música lenta e Rob enlaçou-a.


~//~

   
    Laura observava Carolina, que estava mais linda do que nunca e... nos braços de seu irmão. Ela imaginava a que ponto as coisas teriam chegado entre eles. Certificara-se da inocência dela na tarde anterior, mas ainda não conseguia confiar em Carol.
    Será que ela tentava deixá-la com ciúme ou decidira dar em cima de Rob, agora que a tentativa com ela falhara? Carolina podia usar seu irmão para ganhar a aceitação dos outros rancheiros e se era astuta como ela imaginava, ir atrás de Rob era a jogada mais esperta.
     Tomando mais um gole do vinho, Laura disse a si mesma que não ligava a mínima! Seu irmão idiota já era adulto e que fizesse o que queria... Mas continuava desejando Carolina tanto que até doía.
    Nesse momento, Rob sorriu para Carol e ela retribuiu o sorriso. Então, ele ajeitou um cacho dourado atrás da orelha dela.
    Laura colocou a taça na mesa mais próxima e encaminhou-se para o casal que dançava. Nenhum dos dois notou a aproximação, até que ela bateu no ombro do irmão.
    - É a minha vez.
    - Laura - observou Rob, sorrindo -, seria educado da sua parte se perguntasse a Carolina se ela quer dançar com você.
    Pensando na última conversa que tivera com Carol, Laura calculou que suas chances eram mínimas. Insistiu:
    - Eu disse que é a minha vez.
    - Você convive com animais há tanto tempo que está agindo como uma! - bradou Rob, voltando-se para confrontar a irmã.
    Ignorando-o, Laura segurou o braço de Carolina e ia puxá-la, porém uma mão segurou-a pelo ombro e a girou. Ela viu-se de frente para o irmão, tão tensa que não notou que a música parara.
    - Você deve pedir, Laura. Lembra o que isso quer dizer?
    - Saia do meu caminho.- disse entre os dentes.
    Carolina deu um passo na direção de Laura, disposta a dançar com ela desde que não brigassem. Mas o filho interferiu antes dela. De repente, Dudu encontrava-se entre os dois irmãos, fitando-os com lágrimas nos olhos.
    - Não briguem! - implorou. - Por favor, não briguem!
    - Ninguém vai brigar, Dudu - garantiu Laura, percebendo o que estava a ponto de fazer. - Não é mesmo, Rob?
    - Não, Dudu, ninguém vai brigar.
    Carolina abraçou o filho, procurando acalmá-lo:
    - Irmãos brigam o tempo todo, querido. Assim como você e os seus amigos. Mas depois que brigam eles fazem as pazes e continuam se amando, querendo ficar juntos.
    - Eu achei que eles iam se machucar - o garoto ainda estava inseguro. - A Laura está muito nervosa.
    - Não vão fazer isso, filho. Venha, vou colocar você na cama e contar uma história.
    - Não preciso mais disso! Posso me deixar sozinho!
    E Dudu atravessou a sala sem olhar para trás, enquanto a mãe olhava. Ele estava mesmo crescido! Carolina endireitou os ombros e voltou-se para Rob:
    - Você não quer ir com ele? Só para dar uma olhada. Acho que Eduardo vai aceitar melhor isso de você do que de mim.
    A expressão nos olhos de Rob dizia que ele compreendia e desaprovava.
    - Tem certeza?
    - Sim, tenho certeza.
    Com um último olhar de advertência para Laura, Rob seguiu Dudu.
    - Carol...
    - Me deixe em paz! - respondeu em voz baixa. - Você não me quer. Deixo isso bem claro. Só não suporta a idéia de que seu irmão mais novo pode me tirar de você!
    Carolina juntou-se ao grupo de Sam Perry deixando Laura sozinha na área de dança.
    - Carolina, como vai o trabalho com O Legado? - perguntou Sam.
    - Bem, creio que é uma autobiografia - respondeu ela.
    - Autobiografia? - interessou-se a sra. Perry - Deve ser mais interessante do que os aborrecidos livros de mistério. Ted era mesmo louco como as histórias que contam dele fazem pensar?
    Carolina hesitou em fazer comentários sobre a vida particular de Ted. Claro que ele contava tudo no livro, mas não se achava no direito de falar. Antes dela dizer qualquer coisa, a voz de Laura soou às suas costas.
    - Vocês nunca vão saber como Ted Emory realmente era lendo esse livro, que não passa de uma fantasia adocicada. Ted escolheu a pessoa perfeita para prepará-lo... Carolina acha que ele era a imagem viva da virtude.
    - Isso não é verdade! - protestou Carolina. - Nas fitas Ted é muito crítico consigo e suas ações.
    - Você gostava mesmo dele, não? - comentou Sybil Perry com malícia. - Dá para entender como o Double Diamond foi parar nas suas mãos. E agora os irmãos Bittencourt também estão brigando por você. Diga-me, existe alguma pessoa que seja imune aos seus encantos?
   - Muitos. Só as pessoas cheias de inveja conseguem ver apenas esse tipo de "qualidade" nos outros.
   - Não use esse tom de superioridade comigo! - irritou-se Sybil. - É óbvio que tipo de mulher você é. Daquelas cuja ganância não tem limites. O tipo que qualquer pessoa se mata tentando satisfazer!
   As palavras da mulher continham uma verdade que gelou Carolina: tinha que sair dali!
   Pálida, nem soube como conseguiu atravessar o salão. Só queria escapar. Depois do que pareceu uma eternidade, viu-se na segurança de seu quarto. Atirou-se na cama, abraçou o travesseiro, fechou os olhos e o tempo tornou-se irrelevante, deixou de existir. Ficou imersa em culpa e arrependimento.
   Então, de súbito, viu que não estava mais sozinha.
   O corpo de Laura colou-se ao seu e ela abraçou-a. Carolina nem sequer tentou afastá-la. Não havia raiva nela, só desespero.
   - Seja o que for que esteja errado, Carol, eu quero consertar. Quero acreditar em você. Quero acreditar que a sua doçura não é só  uma miragem e quando estamos juntas, eu acredito. Ainda quero você, Carol. Pensei que podia ficar longe de você, mas não posso. Ainda não.
    Carolina não notou qualquer promessa nas palavras dela, mas reconheceu que Laura era sincera. E sempre que ela a abraçava, Carol acreditava em finais felizes.
    - O que é, Carol? Do que você está se escondendo?
    Carolina respirou fundo e começou a falar:
    - Depois que nos casamos, Erick não me deixou trabalhar. Fiz alguns cursos, aprendi muitas coisas em casa mesmo e mais nada. No entanto, ele sempre quis que tivéssemos o melhor.
    Uma pausa e ela tornou a falar, cheia de dor:
    - Um dia cheguei em casa e o encontrei caído no piso do porão, ainda segurando a arma. Não pude entender por que tirara a própria vida, depois descobri que se enterrara em dívidas para manter o alto nível que tinhamos. Em vez de me contar a verdade, ele preferiu se matar. Como foi suicídio, não pude receber o seguro. Alguns dias depois da morte dele fui despejada. Se não fosse Ted me dar trabalho e abrigo, não sei o que teria acontecido.
    - Você devia estar revoltada com o que seu marido fez! - Laura não ocultava a admiração. - Mas em vez disso culpa-se pelas decisões erradas dele.
    Bem no íntimo, Carolina concordava com Laura: tinha o direito de ficar ressentida com Erick, mas assim que o pensamento emergiu, sentiu-se profundamente culpada.
    - Erick me amava tanto! Ele tentou me dar o que achava que eu queria. Creio que... por causa da minha aparência... temia que eu me voltasse para outro homem se não desse tudo. Meu marido morreu tentando me dar felicidade e não fui capaz de fazê-lo feliz nem na cama. Eu queria, mas não conseguia!
    Laura sentia o corpo de Carol abalar-se com soluços e de repente as dúvidas que tinha a respeito dela pareceram-lhe estúpidas. Acreditava no seu sofrimento e queria acabar com ele.
    - Carol, você não exigiu nada do seu marido, quis trabalhar para ajudá-lo, mas ele não deixou. Erick levou todas as inseguranças e problemas que tinha para o casamento, não foi você quem os causou. Se não a tivesse conhecido, ele teria tido a mesma vida e terminaria do mesmo modo.
    As palavras de Laura eram como um bálsamo para Carolina. O fato dela poder dizê-las e acreditar no que dizia fez com que Carolina questionasse a validade de suas dúvidas e culpa. Girou nos braços de Laura e encarou-a acariciando seu rosto, querendo ajudá-la como ela a ajudara.
    - Você também não devia se culpar pelo acidente - disse e sentiu o corpo dela enrijecer -, precisa livrar-se da culpa e da dor que carrega há tanto tempo. Se quiser ter paz de espírito, deve perdoar sua companheira e também Ted. Ele lamentava não ter sido um pai de verdade para você. É verdade, Laura! Está tudo nas fitas. Se você as ouvisse...
    Carolina estava preparada para uma reação negativa e Laura não a desapontou: largou-a e sentou-se na beira da cama.
    - Talvez minha mãe precise acreditar que Ted se importava - resistiu, sombria -, eu não. Se Ted ligava tanto para mim, por que não me deixou o rancho?
    - Essa é a única coisa que não compreendo. Mas a resposta pode estar nas fitas. - Hesitante, Carolina estendeu a mão para Laura. - É um bom livro, um livro honesto. Eu pensava que Ted era um santo antes de começar a transcrever as fitas, mas agora não penso assim. Ele era um homem com defeitos, alguns bem grandes e que eu aceitaria ainda menos do que você.
     - Duvido!
     - Como você me disse antes da leitura do testamento, e não acreditei, Ted era mulherengo, beberrão e jogador compulsivo. Foi com o jogo que ele saiu da favela e chegou à classe alta. Ganhou este rancho num jogo de pôquer. Quando a esposa por fim cortou o acesso dele ao dinheiro, Ted escreveu o primeiro livro na base de uma aposta de o drobo ou nada, para cobrir um grande débito que tinha com um homem perigoso. Se perdesse aquela aposta, ele provavelmente teria morrido.
      - E você ainda o defende, Carol!
      - Se há um homem que merece ser defendido, esse homem é Ted. Reconheço que era culpado de muitas coisas, mas pagou caro por seus pecados. No fim ele não tinha nada, Laura. Você estava certa quanto a ele perder toda sua fortuna e uma boa parte da fortuna da esposa também. Ela terminou se divorciando dele. E, o pior de tudo, ele perdeu o respeito da única filha.
      - Ele não perdeu meu respeito: nunca o teve! Ted Emory agiu a vida inteira como se merecesse ser admirado por todo mundo. O fato de estar recebendo ainda mais esse respeito imerecido depois de morto é insurportável para mim!
      - Laura, eu não admiro mais Ted e também não o condeno, porque acho que era um homem diferente do homem que você conheceu. Acho que o Ted que conheci foi um homem que você nunca conheceu.
      Laura saltou da cama, a voz vibrando de raiva:
      - E não quero conhecer esse homem, entende? Pode falar até perder a voz que não vai fazer diferença! Sei tudo que preciso saber sobre Ted Emory!
      Quando a porta do quarto bateu depois de Laura sair, Carolina teve impressão que não chegariam a nada enquanto ela não resolvesse seus problemas relacionados com o pai. E talvez Laura nunca os resolvesse, a menos que Carolina descobrisse o motivo de Ted ter mudado o testamento.
      Cansada, levantou, foi sentar-se à mesa e ligou o computador. Seus olhos embaçavam de tanto cansaço, mas Carolina entregou-se ao trabalho, determinada a descobrir a resposta pelo bem de Laura. E de si mesma.


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Notas finais do capítulo

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