O caminho pareceu durar anos e anos de caminhada. Por mais rápido que eu tentasse ir, meu desânimo se manifestava. O carro da Kathy não estava na vaga, fiquei assustada. Ela poderia ter se machucado e foi até o pronto socorro. Não me dei ao luxo de subir até o apartamento. Liguei do meu celular pro dela e na primeira chamada caiu na caixa postal. Sentei no paralelepípedo do estacionamento e fiquei esperando um tempo pra voltar a ligar mais uma vez. Vi alguma sombra se mexendo e me levantei assustada. Quem seria o idiota que estava cabulando aula logo no estacionamento? Respirei fundo e tentei ligar mais uma vez.

- Alô?- disse ela

- Graças a Deus Kathy, onde é que você esta?

- Ahn, na casa da minha vó, em Atlantic City!- na casa da vó dela? Em Atlantic City?  Ela nem gosta da vó dela. E isso era hora de estar na vó dela?

- O que aconteceu?

- Nada ué. Vim visitar ela. Ela esta gripada e eu vou passar em casa pra pegar os diários daqui a pouco. Tudo bem?

- Visitar Kathy? Ah, tudo bem Best. Eu vou estar em casa. Vou avisar na secretaria que você não foi à escola por que estava doente e que ficarei com você.

- Ótimo. Logo chego a casa. Te amo amiga- disse ela desligando o celular

Era muito estranho a Kathy ter saído e não ter me avisado. Eu iria até a casa do Edu se não estivesse em horário de aula, mas agora iria ser melhor ir para casa e quem sabe não dormir mais cedo. Fui até a secretaria e menti descaradamente. A secretaria parecia muito desconfiada, mas não se importou em ver se era verdade. Estranho.

Subi de escadas, pois no horário de aula eles aproveitam para limpar os elevadores desativando-os. Meu Deus, que subida longa. Dez andares eram de matar qualquer um, mas pelo menos estava queimando todas as calorias daqueles malditos salgadinhos Dorittos. Mais uma vez vi uma sombra se mexendo. Quase gritei de desespero, mas logo imaginei como seria se uma inspetora me pegasse na escada gritando e mentindo dizendo que minha amiga estava doente quando nem em casa estava.

O hall estava quieto de acordo como eu esperava. Peguei a chave na minha bolsa e abri a porta.

- Parabéns pra você, nessa data querida... - cantaram todos juntos

- O que? Vocês lembraram? Meu Deus!- Até sabia quem tinha planejado tudo. Olhei feio pra Kathy e ela me deu aquele sorriso encantador de volta.

- Parabéns Best. Vim correndo da casa da minha vó quando me contaram que estava tendo uma festa no apartamento- disse ela rindo de sua mentira esfarrapada

- Obrigada Kathy. Não sei como conseguiu que eles viessem, mas obrigada mesmo assim amiga- eu disse dando um abraço nela

- Não fui eu não amiga. Isso tem cara de namorado.

Olhei em volta procurando pelo Edu, mas nem sinal.

- Onde ele esta?- perguntei um pouco decepcionada

- Ahn, aqui- disse ele sussurrando o meu ouvido. Espera ai, eu estava na porta ainda. Como ele estava aqui fora o tempo todo e eu nem percebi?

- Meu Deus Du, que susto. Obrigada pela festa, você é impossível.

- Nada meu amor. É sempre bom ter amizade com o diretor. Não deu pra arranjar tão em cima da hora uma festa em Atlantic City, me desculpe. Mas o pior dessa historia é ter ficado te vigiando e ter subido dez andares atrás de você. O pessoal daqui ficou segurando o elevador para que tivéssemos mais tempo- disse ele balançando a cabeça

- Não acredito. Foi você que me seguiu. Isso é ilegal, você sabe não é?

- Ilegal é o que faremos depois- disse ele sussurrando no meu ouvido e me apertando em seus braços- Eu te amo, e feliz aniversario meu amor.

- Obrigada Du. Parabéns pra você também amor- disse encostando a cabeça em seu ombro

- Parabéns pra mim?- disse ele levantando uma sobrancelha

- Você me conquistou, não merece os parabéns Kathy?- eu disse me virando pra ela

- Com toda certeza Senhor sortudo- concordou ela

- Então Obrigado por me dar a oportunidade de ser feliz.

- Minha obrigação- disse indo em direção ao pessoal

Era uma reunião simples, mas com direito a cerveja escondida de baixo da cama e muita pizza. Fiquei ali com todo o pessoal rindo, dançando e cantando umas musicas dos anos 80. Estava morrendo de fome, mas todas aquelas brincadeiras não me deixaram sair da rodinha de amigos. O Du meu deu seu presente. Era um urso de pelúcia lindo. A Kathy e o Beto me deram o novo CD do Mc Fly. Eu amei também, mas o que eu iria gostar mesmo era o presente ilegal do Edu.

- Feliz aniversário Ash- Blair disse

- Oh, obrigada Blair.

- Não é nada querida. Pelo menos no dia do aniversario você tem que ser feliz- disse ela piscando pra mim.

- Como é?- perguntei indignada

- O que foi? Acha que sou idiota? Eu vejo o que estão fazendo contra mim, e pode apostar vocês irão pagar muito caro por isso.

- Sra. Katheriny, você não é bem vinda aqui. Ou melhor, dizendo, você nunca será bem vinda em nenhum lugar- disse deixando escapar um sorrisinho malicioso

- Veremos quem não é bem vinda. Você virá depois de sua amiga. Cada uma irá pagar pelo que fizer- ela deu uma pausa batendo o dedo na bochecha como quem esta pensando- Alias o namorado de vocês estão na lista também.

Fiquei paralisada quando a ouvi dizer isto. Ela nunca faria mal a alguma de nós. Ela era nossa amiga, mas queria nossa morte.

Não, ela não era nossa amiga e eu podia jurar que era tudo fingimento barato. Tudo bem, discutimos os quatro juntos e percebemos que talvez ela esteja possuída, mas isso ocorre com tanta freqüência?

- Blair, não a deixe fazer isso com você. Assuma as rédeas de seu corpo- Edu disse

Ele estava ali o tempo todo ou só tinha percebido minha reação e veio me ajudar?

- Blair?- perguntei vendo o ataque histérico dela.

- Ash, ta tudo bem. Leva ela no quarto que ela só precisa deitar um pouco- Kathy disse

- Ahn? Como você sabe disso? Só me ajudem a colocá-la de pé!- pedi desesperada

- Ash, leve-a até o quarto.

- Vem Blair, vamos pro quarto- Edu disse pegando ela no colo.

Ela tremia dos pés a cabeça, eu podia jurar que ela ia morrer ali mesmo. E aquela história de eu vou me vingar de vocês três? Cara, que estranho isso.  Meu Deus, eu também estava tremendo. Sentia um calafrio percorrer todo meu corpo, isso estava me deixando muito nervosa.

- Amor, tudo bem, tudo bem. Estou aqui- disse Edu me segurando firme.

- Edu, essa menina ta louca- Kathy gritou chutando tudo o que via pela frente- Ela é uma desgraçada, fica fazendo showzinho agora. Fingida!

- Me desculpe por ter estragado a festa- a voz de Blair me fez perder o equilibro mais uma vez. Ela estava começando a me assustar- Ash, você esta com medo de mim.

- Não Blair, não é nada disso. É que eu estava, bem, eu estava... - busquei as palavras certas, mas nenhuma veio a mente.

- Tudo bem, você tem direito de estar assim.

Mas espere! Ela era a culpada de tudo isso. Ela procurou esses problemas. Por mais que tentemos ajudá-la, ela não merece essa ajuda. Ela acha que vamos lutar por ela, mas não é bem assim. Eu tinha que fazer alguma coisa, ela não iria manipular a gente com esse joguinho de possuída. Não mesmo!

Fiquei olhando pro rosto de cada um dos meus colegas e o que eu via era desespero. Ninguém tinha ouvido a conversa, disso eu tinha certeza. Eles olhavam pra mim como se estivessem querendo me ajudar. Ajudar? Ah, então aquilo não era desespero, aquilo era pena.

- Ash, eu vou mandar todo mundo embora. Você dorme no meu apartamento- Edu murmurou de modo que só entendi por estar olhando pra rosto dele agora.

- Não- gritei de modo assustador- Não, ninguém sai daqui. Isso daqui é uma festa, ninguém vai sair daqui sem comemorar. Kathy! Trás cerveja pra todo mundo e vocês ai no canto, vem comer agora- disse com os olhos já marejados por lagrimas.

Os meninos que estavam no canto conversando levantaram e foram até a porta dando um aceno com a mão.

- Ash, ta tudo bem meu amor. Eles vão entender. A gente faz outra festa. Quantas festas você quiser- disse ele me segurando pelo braço

- Tchau Ash- Beto disse se afastando com um pedaço de pizza na mão- Logo eu volto.

Ouvi vários outros tchau enquanto olhava fixamente pra porta do quarto. Como isso poderia estar acontecendo? Ela acabou com minha festa. Ela estava passando dos limites. Eu iria matar ela antes que ela me matasse. Eu nunca iria perder. Eu não a deixaria ferir uma pessoa que fosse. Ela engoliria aquelas palavras.

Fiquei horas ali pensando no que fazer. No que falar a ela. Eu sabia que no fim ela seria transferida de dormitório e tudo poderia voltar ao normal. Mas tudo o que ela disse vai parecer mentira aos outros ouvidos de meus amigos e quem sabe do diretor. Ela iria nos matar nos machucar mesmo que se mudasse de quarto. Ela só cessaria essa guerra quando aprendesse a não mexer comigo e com meus amigos.

Quando dei por mim estava olhando agora pra uma faca. Seria assim. Eu bateria na porta, ela abriria, eu enfiaria a faca no coração dela e pum. Ela morreria e deixaria todos livres. Era assim que seria. Eu só precisava me soltar do Edu e pegar a faca em cima da mesa. E... Pronto!

- Ash, solta essa faca- Kathy gritou por detrás de uma cadeira- Você vai machucar alguém amiga, por favor.

- Ash, vem aqui. Você esta nervosa. Vamos conversar amor, você pode até dormir em minha casa. Vem comigo- Edu falava sem parar, aquilo já estava dando nos nervos.

- Calem essas bocas os dois. Eu não vou sair daqui até matar aquela vadia. Não deixarei que ela pegue ninguém. Eu mato ela antes- disse limpando com uma fúria inevitável as lagrimas que escorriam na minha face

Eles ficaram olhando com olhos esbugalhados pra mim até que eu decidi agir. Não iriam me impedir, eu estava protegendo-os.

- Abre essa porta Blair- disse soando infantil de certo ponto de vista- Abra coleguinha, vamos acertar os erros do passado.

- Ash, vem pra cá agora- Edu disse derrubando a cadeira que estava perto dele- Você não mata ninguém, você é a Ash.

- Sai Eduardo, sai agora- disse apontando a faca pra ele- Ela me feriu e eu vou feri-la.

- Vó, deixa a Ash em paz. Ela não tem nada a ver. Ela vai morrer- disse a Kathy chorando descompassada

- Eu não sou sua vó Kathy. E eu não vou morrer, ela vai morrer- disse apontando para a porta do quarto.

- A senhora não vai morrer porque já esta morta. Mas a Ash vai.

- Não vai não. Eu sou eu, só que estou puta com ela- disse empurrando a porta com toda a força- Edu, sai de perto. Eu nunca iria deixar que ferissem vocês.

A porta da sala abriu e o Beto entrou todo maloqueiro como quem não quer nada. Foi quando ele viu a faca na minha mão.

- Meu Deus do Céu- disse batendo as costas na parede

- Chama o diretor Beto- gritou a Blair de dentro do quarto

- Não- gritamos juntos os três

- Imagina. Se ele te vê com essa faca na mão ele te bota pra fora da escola. Você quer morar nas ruas de Harrison?- perguntou ele com um sorrisinho besta na boca

- Filho da mãe, eu te mato ouviu bem? Eu não tenho família, mas não vou morar na rua!- disse apontando a faca agora pra ele

- Ei Ash, é brincadeira. O que ta pegando?- perguntou ele assustado

- O que ta pegando? Essa menina vai matar nós quatro se não matarmos ela agora. Ela esta louca, esta possuída, ou brincando com nossa cabeça- rosnei olhando pro rosto dos três

- Ash, você esta possuída- Kathy disse num choro entrecortado

- Não acredito nisso Best. Pensei que você me entenderia- disse soltando a faca. A faca caiu no chão fazendo um barulho irritante, mas logo eu estava do lado dela caída no chão também. Chorar de nervoso era a melhor forma de reagir naquela cena.

O Edu abaixou do meu lado jogou a faca pro Beto e me fez deitar no colo dele. Eu estava acabada, torturada. Aquela menina tinha me feito gastar todas as energias que me restavam. Eu não era mais a mesma, não mesmo.

- Ash, toma isso daqui- disse o Beto me passando um copo de água com açúcar