Dark Entries escrita por KendraKelnick


Capítulo 6
Capítulo 6 – Incursões sombrias




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Capítulo 6 – Incursões sombrias
Hospital Darrow, Crystal Cove, 7 de janeiro de 2023.
08:30 pm

Após gritar o nome dela, Fred viu o corpo desacordado de Daphne cair no chão, a poucos metros da entrada do hospital. Sem demora, ele a pegou em seus braços e correu para o pronto-atendimento, temendo pela vida da garota.
Daphne sangrava tanto que assustou todas as pessoas do local. Imediatamente, enfermeiros, seguranças e estudantes de medicina providenciaram um leito na emergência, Fred a deitou e os enfermeiros iniciaram o atendimento. Inacreditavelmente, Fred não soube o que fazer. Ao invés de agir, a imagem horrível de Daphne perdendo a vida lentamente lhe paralisou, e o medo somente lhe permitiu aferir o pulso fraco, quase imperceptível, no braço frio da moça. Porém, ele não foi o único a não agir: nenhum de seus colegas de estágio conseguiu entender o que estava acontecendo com ela. Por sorte, o caos causado pela chegada de Daphne chamou a atenção dos médicos mais experientes, inclusive Brad Chiles e Judy Reeves, e eles correram em direção aos enfermeiros para ajudá-los salvar a moça.
Imediatamente, o grupo de estudantes se retirou da sala e deu lugar aos médicos mais velhos. Apenas Fred permaneceu onde estava, em pânico, intercalando o olhar entre o monitor de sinais vitais e o corpo ensanguentado de Daphne. Durante alguns segundos, os médicos gritaram frases que, sabia ele, que eram muito ruins. Até que o barulho contínuo do monitor cardíaco mostrou que a vida de Daphne havia acabado. Fred reagiu com um grito indignado e segurou as mãos dela com força. No mesmo momento, Judy afastou o filho bruscamente do corpo de Daphne, para que os outros médicos fizessem as manobras de ressuscitação. Em choque, Fred assistiu a duas ou três tentativas sem sair do lugar, segurando, de maneira tensa, os pertences da moça. Ao perceber que Daphne não voltaria, Judy arrastou o filho para fora da sala e fechou a porta, para que ele não presenciasse o que estava por vir. Mesmo do lado de fora, Fred ouviu seu pai dizer: “Hora da morte, 8:38”, indicando que não havia mais o que fazer.
Era a primeira vez que Fred via alguém morrer. Para piorar, não era alguém qualquer: Era Daphne Blake. A jovem, doce e linda Daphne Blake. Os sentimentos confusos que Fred nutriu durante os curtos períodos em que ela esteve em sua vida tornavam aquela tragédia ainda mais terrível, e ele sentiu parte dele morrer quando percebeu que tais sentimentos não existiriam mais. Fred notou que os olhares questionadores dos demais estudantes se voltaram contra ele. Porém, a tristeza o mantinha imóvel, distante, alheio a tudo, exceto à imagem daquela bela garota. De repente, Judy abriu a porta e Fred saiu do transe. Imediatamente, ela abraçou o filho com lágrimas nos olhos e disse alguma coisa sobre “avisar os pais da Daphne”. Fred não concordou nem discordou. Apesar de ter voltado para aquela realidade, ele ainda não conseguia acreditar nela. Pouco tempo depois, foi a vez de seu pai sair da sala. Ao contrário de Judy, Brad não chorava. Ele parecia assustado e furioso com o que havia presenciado, e por isso, pegou Fred pelo braço e o conduziu pelo corredor.

Brad: Cale a merda da boca até chegarmos a minha sala!

O tom ameaçador o impediu de dizer alguma coisa. De qualquer forma, ele não sabia o que dizer, a imagem de Daphne sem vida o deixou totalmente sem palavras. Quando Brad chegou em sua sala, ele conduziu o filho para dentro e o ameaçou antes de fechar a porta.

Brad: Eu vou chamar advogado e eu volto em um minuto. E quando eu voltar, eu acho bom você me contar cada detalhe sobre o tipo de estupidez que você fez com essa garota, Frederick, ou então, eu o farei sangrar da mesma maneira que ela sangrou!

Fred nunca havia visto seu pai tão nervoso. Nem havia visto seu pai desconfiar de sua índole. Nada daquilo fazia sentido. Mesmo assim, ele não conseguiu se importar, somente a morte sem sentido de Daphne ocupava os seus pensamentos. Após Brad fechar a porta, Fred se lembrou do pedido de sua mãe: “avisar os pais da Daphne”. Então, ele decidiu vasculhar a bolsa dela, em busca de seu celular. No momento em que Fred a abriu, ele se deparou com o tecido sujo e o exemplar de “Numerologia Cabalística”, de Frank Melker. E então, ele compreendeu o sentido de tudo o que havia acontecido minutos atrás.

Hospital Darrow, Crystal Cove, 7 de janeiro de 2023.
08:38 pm

A sensação de sufocamento diminuiu lentamente, até que Daphne sentiu seu corpo inteiro adormecer, imerso em uma tranquilidade sem fim. O ambiente ao seu redor parecia muito frio e ecoava sons contínuos, repetitivos e arrepiantes, similares a uma máquina desconhecida em funcionamento. De repente, os sons misteriosos deram lugar a um chiado contínuo e estridente, semelhante a um rádio fora de sintonia. O barulho era tão alto que a incomodou e fez suas mãos dormentes taparem seus ouvidos. Quando ela abriu os olhos, se assustou com o que viu: ao invés da sala de emergência do hospital Darrow, ela estava em um quarto muito antigo e sem janelas. A cama em que ela estava era igualmente antiga, estava bastante suja e cheirava a mofo, assim com todo o quarto. Assustada, Daphne se levantou rapidamente e procurou por sua bolsa e seu casaco, mas não havia nada naquele lugar além da mobília, que parecia ser do século passado. As paredes do local eram revestidas de tecido estampado em arabescos, nas cores vermelho e preto, e nelas havia quadros com grandes fotos antigas de paisagens. Com lágrimas nos olhos, ela correu até a porta de madeira e girou a maçaneta desesperadamente, mas a porta estava trancada. No mesmo momento, ela entendeu que havia sido sequestrada. Por isso, ela começou a chorar e a implorar por ajuda, mas ninguém lhe atendeu. Após alguns minutos, no instante em que ela se sentiu fraca de tanto chorar, ela ouviu o barulho da fechadura sendo destrancada. Sem hesitar, ela abriu a porta, mas não havia ninguém ali. Pelo contrário, havia um grande e sinistro corredor, cheio de portas como aquela, e o barulho irritante de rádio vinha do fim dele. Mesmo com medo, Daphne correu pelo corredor, com a esperança de sair daquele lugar.
Para o seu desespero, o corredor terminava em uma sala de estar sem janelas, com mobília muito antiga, um tapete marrom em seu centro, e uma televisão de tubo no meio do tapete. Ao redor da televisão, havia três crianças muito pálidas, com olheiras, olhando fixamente para a imagem de chuviscos brancos na tela. Ao se aproximar e olhar para os rostos daquelas crianças, Daphne percebeu que elas pareciam assustadas, seus os olhos e bocas estavam ligeiramente abertos, fixados em uma expressão de horror, como se suas faces tivessem congelado após um susto. Daphne sentiu horror quando um menino desviou o olhar da TV e olhou fixamente para ela, com um olhar vidrado e apático, semelhante a um zumbi. Apesar de saber que, provavelmente, aquelas crianças também eram vítimas do mesmo sequestrador, ela não conseguiu ajudá-las, pois, estranhamente, elas não pareciam humanas, nem vivas. Imediatamente, Daphne caminhou para trás até voltar ao corredor, e evitou fazer qualquer tipo de barulho que chamasse a atenção daquelas crianças apavorantes.
Porém, no corredor, ela sentiu mais medo: a quatro portas de distância estava o mesmo velho que ela viu na garagem de James Arthur. Felizmente, ele estava de costas e não a notou. Daphne entrou em pânico e paralisou. Provavelmente, o homem sinistro era o sequestrador. Enquanto ele entrava em uma das portas, ela prendeu a respiração para evitar fazer qualquer tipo de barulho. Quando o velho finalmente desapareceu, ela sentiu uma mão fria tocar o seu ombro, e ao olhar para trás, ela viu Hannah Renner, esposa do prefeito Jones e mãe de Fred. Hannah estava exatamente do mesmo jeito que a fotografia que Daphne viu no recorte de jornal, exceto pelas roupas, que eram antigas e amareladas. No rosto dela, havia a mesma expressão assustada e mórbida, e apesar de seus lábios se moverem, Daphne não conseguia ouvir sua voz. Naquele momento, Daphne entendeu que havia sido levada pelo sequestrador de Hannah, por ela ter descoberto o seu sinistro modus operandi envolvendo números e manchas.

Daphne: Eu sei quem você é! Eu vou te ajudar a escapar, precisamos sair daqui!

Daphne se espantou quando percebeu que suas palavras também não foram vocalizadas. Ao invés de tentar falar novamente, Hannah a pegou pelo braço e a conduziu até a próxima porta. Daphne, então, se viu em uma cozinha antiga e iluminada por grandes janelas, revestida em azulejo floral cor de rosa e com eletrodomésticos típicos dos anos 80. Sem demora, Daphne correu até uma janela de madeira e forçou a vidraça incessantemente. Ao perceber que não era possível abri-la, ela tentou fazer o mesmo em outra janela. Para o seu espanto, ao invés de Hannah ajudá-la a escapar daquele lugar, ela apenas olhou conformadamente pelo vidro, da mesma maneira apática com que as crianças olhavam para a TV. Daphne estremeceu ao perceber que, do lado de fora, havia uma vizinhança típica dos anos 80. Os carros, as casas, os brinquedos nas ruas, as roupas das pessoas e os utensílios, estranhamente, tudo parecia uma realidade de quarenta anos atrás. Diante da passividade macabra de Hannah, Daphne se afastou e voltou para a mesma porta que entrou.
Para a sua surpresa, ao abri-la, ela não encontrou o mesmo corredor de antes. No lugar dele, havia uma sala de estar típica dos anos 80, e uma escada branca que conduzia ao andar superior. Daphne correu até a porta, e antes de abri-la, notou um calendário do ano de 1981 pendurado nela. Nele, o dia 5 de abril estava circulado em caneta vermelha, e os dias anteriores a ele estavam riscados. Próximo ao círculo, havia o número 7626 escrito, e ao lado dos dias riscados, havia os antecessores desse número, indicando a possível contagem de algo. Sem hesitar, Daphne girou a maçaneta, e imediatamente, Hannah afastou bruscamente a mão dela, impedindo-a de continuar. O som da máquina desconhecida ecoou novamente pelo local, e Hannah se desesperou. Ela conduziu Daphne até o andar de cima pelas escadas, mas, ao chegar lá, Daphne se viu em um lugar familiar. Inexplicavelmente, ela estava no penhasco de Crystal Cove, onde há um mirante que atrai muitos turistas. Sem entender o que aconteceu, ou como havia chegado ali, Daphne pegou Hannah pelo pulso e correu na direção oposta ao penhasco, rumo à estrada que leva de volta à cidade. Entretanto, Hannah permaneceu imóvel, próxima a uma pedra, observando a garota de afastar. Daphne decidiu voltar para buscá-la, mas quando estava a poucos metros de Hannah, ela ouviu um grito de pavor ecoar, e no mesmo momento, ela acordou na mesma cama imunda em que ela esteve minutos atrás.
Depois do grito inicial, Daphne ouviu a mesma voz gritar mais três ou quatro vezes. A intensidade e a frequência dos berros indicavam que a pessoa estava em apuros. Ao se levantar, Daphne notou que Hannah estava ao lado da cama e segurava um dos quadros da parede. Os gritos seguintes foram mais desesperados, e Daphne imediatamente deixou o quarto, temendo que a pessoa que implorava por ajuda fosse assassinada. No corredor, ela percebeu que o grito vinha de todos os lugares e todas as portas, e todas as direções pareciam ser corretas. Quando os gritos cessaram, ela ouviu vozes infantis repetirem “Herbert Stevins” diversas vezes, e logo em seguida, a mesma voz feminina gritar o nome “Herbert” desesperadamente. Daphne percebeu que o barulho vinha da mesma porta que o velho havia entrado anteriormente, e ao abri-la, ela viu uma cena aterrorizante. Uma mulher aparentando mais de 60 anos chorava em cima do cadáver ensanguentado de um homem idoso, com roupas típicas de um veterano de guerra, e o homem agonizava, pedindo por ajuda. Novamente, a mulher começou a gritar pelo nome “Herbert” e implorar por ajuda. Sem saber o que fazer, Daphne voltou ao quarto em que acordou para pedir a ajuda de Hannah.
Para o seu espanto, o ruído de rádio havia voltado a ecoar pelo quarto, e ela não conseguiu verbalizar o pedido de ajuda. Para piorar, os gritos de ajuda se tornaram mais intensos e horríveis, e Daphne também ouviu o homem gritar. Sem se incomodar com o barulho, Hannah calmamente se aproximou dela e lhe entregou o quadro que havia retirado da parede. Daphne notou que a foto antiga, em preto e branco, mostrava um rio, e na legenda havia escrito o nome Patapsco. Sem entender, Daphne olhou interrogativamente para Hannah, mas ao invés de explicar, a mulher simplesmente empurrou Daphne bruscamente. Ao cair no chão, Daphne sentiu um impacto tão grande em suas costas que lhe faltou o ar. A dor foi tão grande que Daphne se sentiu sufocada novamente, e por isso, ela inspirou da maneira mais forte que conseguiu.

Hospital Darrow, Crystal Cove, 7 de janeiro de 2023.
08:48 pm

Fred estava com o celular de Daphne em suas mãos quando ouviu um grito agonizante. Dois ou três gritos ecoaram pelos corredores logo em seguida, e após eles, ele ouviu uma voz familiar gritar pelo nome “Herbert Stevins”. Seu coração acelerou diante da possibilidade de ser Daphne, então, ele escondeu os pertences dela em um lugar seguro e correu para a sala de emergência. Ao olhar pelo vidro, ele viu a garota ofegante e muito agitada, gritando palavras desconexas enquanto se debatia descontroladamente na cama de hospital. Fred sorriu, e se juntou à multidão de enfermeiros que se aglomerou ao redor da garota. Em seguida, apareceram os mesmo médicos que a socorreram, e todos pareciam estupefatos com o que estavam vendo. Um médico mencionou a possibilidade de ser apenas uma reação momentânea causada pela adrenalina, e que ao fim dela, a garota morreria novamente. Porém, ele foi refutado pelos enfermeiros, que mostraram que todos os sinais vitais de Daphne estavam completamente normais. Novamente sem saber o que fazer, a equipe médica apenas conteve a garota e tentou acalmá-la. Quando ela finalmente parou de gritar e se debater, ela se deitou na cama e manteve os olhos abertos, olhando fixamente para o teto, em transe. Judy e os demais chamaram o nome dela diversas vezes e tentaram fazê-la voltar a consciência, sem sucesso. Fred segurou uma das mãos dela com força, e novamente os médicos começaram a falar com ela. Então, os olhos de Daphne se encheram de lágrimas, ela soluçou e começou a chorar. A reação dela alegrou toda a equipe, e eles insistiram em chamá-la, para fazê-la voltar à realidade. Após várias tentativas, Daphne finalmente moveu os olhos e se sentou na cama. Ao invés de soltar a mão de Fred, ela a apertou ainda mais e começou a chorar descontroladamente.

Daphne: Vocês precisam me ajudar! Eu vi um homem morrendo! Eu vi! O nome dele é Herbert Stevins, ele estava sangrando muito, vocês têm que ajudá-lo, aquele velho… aquele velho o matou! E ele vai matar as crianças e a Hannah e…

Judy: Querida, você precisa se acalmar, está tudo bem! Tudo isso não passou de um sonho, ok? Você está no hospital porque teve um mal súbito, e os medicamentos que lhe demos fizeram você sonhar com tudo isso…

Daphne: Não é um sonho! Eu vi! Eu estive lá! O velho me fez sangrar! E ele matou aquele homem! Ele levou a Hannah Renner, eu sei onde ela está, eu vi!
A menção ao nome Hannah Renner fez Fred estremecer, mesmo assim, ele manteve suas mãos segurando a mão trêmula e fria de Daphne. Após um breve silêncio, Judy insistiu em acalmar a garota, e depois de certo tempo, Daphne parou de repetir as mesmas frases e se calou. Com Daphne fora de perigo, parte da equipe deixou a sala de emergência para atender a multidão de agentes e policiais que havia se acumulado do lado de fora.

Judy: Não há o que explicar, xerife! Quando ela chegou, ela havia perdido mais de 40% do sangue dela e morreu no minuto seguinte. Dez minutos após morrer, ela acordou gritando, com como se nada tivesse acontecido, e todo o sangue havia voltado.

Brad: E todo o sangue foi perdido por sangramento nasal e por um pequeno corte. Não havia nenhuma outra lesão. Eu nunca vi isso em 30 anos de profissão!

As explicações continuaram e Daphne ouviu tudo com atenção. Então, ela se deu conta de onde estava e do que havia, de fato, acontecido, e olhou para Fred de maneira assustada. Fred sorriu e apertou a mão dela.

Fred: Bem-vinda de volta ao mundo, Daphne Blake. Fico feliz que a sua viagem para o outro mundo foi cancelada.

Fred se sentiu um idiota por fazer uma piada naquele momento, mas Daphne riu e ele ficou aliviado. Ao perceber que sua mão ainda estava nas mãos de Fred, Daphne corou e a retirou imediatamente. Fred ficou desconcertado com a atitude dela, por isso, desviou o olhar. De repente, a porta da sala foi aberta bruscamente, e Bart Blake surgiu às pressas, em prantos, e abraçou a filha com força. Nan e Daisy Blake surgiram logo em seguida e fizeram o mesmo. Fred se sentiu desnecessário ao ver os Blakes reunidos, e por esta razão, decidiu se retirar. Porém, ao alcançar a porta, ele notou que o xerife Bronson, alguns policiais e diversos agentes do FBI o esperavam do lado de fora da sala.

Bronson Stone: Sr. Jones, queira, por favor, nos acompanhar.

Hospital Darrow, Crystal Cove, 7 de janeiro de 2023.
10:30 pm

Fred: …quando eu deixei o hospital, eu a vi no estacionamento. Ela estava sangrando muito e, segundos depois, ela desmaiou. Então, eu a levei para a emergência e a equipe do hospital a atendeu.

Fred manteve o semblante sério enquanto falava, e ao terminar, encarou os dois agentes do FBI que olhavam fixamente para ele. Era a quarta vez que ele repetia a mesma história, com os mesmos detalhes. Os oficiais da equipe do xerife Stone terminaram suas anotações e olharam para o xerife, aguardando suas ordens. Bronson suspirou, agradeceu pelo tempo de Fred e disse “isso é tudo”, porém, a atitude dele não influenciou os dois federais, que se mantiveram irredutíveis.

Agente Ryan: Poderia descrever esses sangramentos? Onde exatamente estava sangrando?

Fred: Quando eu a vi, ela sangrava pelo nariz e tinha muito sangue na blusa.

Agente Ryan: E então, ela desmaiou? No estacionamento norte do hospital?

Fred suspirou impacientemente e olhou com raiva para os dois agentes.

Fred: Sim, ela desmaiou no estacionamento norte do hospital.

Agente Ryan: E poucos minutos depois, ela veio a óbito.

Fred: Sim, senhor.

Agente Ryan: Tudo isso devido a um sangramento nasal? Você, como um jovem médico, não acha isso estranho?

Fred: O que eu acho não influencia na maneira como aconteceram os fatos, senhor.

Agente Larson: Certamente que não, filho. Por isso, não há problema em nos dizer, certo? Você não acha estranho uma jovem saudável morrer por isso?

Fred: Dependendo do que a fez sangrar, não. Ela pode ter sofrido um golpe na cabeça, ou um soco no nariz… o corte no antebraço parece uma lesão de defesa.

Agente Ryan: E esse golpe com certeza aconteceu imediatamente antes dela desmaiar. Estou errado? Ou você, como médico, acredita que ela sofreu um golpe uma hora antes, quando o rastreador mostrou que o carro dela estava em Riverdale, e apenas às 8:30 o sangramento severo começou?

Fred: Eu vou repetir, senhor: O QUE EU ACHO NÃO INFLUENCIA EM NADA!

Fred sabia que não deveria demonstrar nenhuma emoção, mas ele não conseguiu se controlar. Infelizmente, a ira dele era exatamente o que os agentes procuravam.

Agente Ryan: Bem, Sr. Jones, considerando que o senhor atendeu seu último paciente às 6:30 e ninguém o viu nos corredores do hospital até o momento em que você apareceu com a Srta. Blake na sala de emergência…

Agente Larson: …e as câmeras de segurança mostram que você veio do estacionamento com a Srta. Blake nos braços…

Agente Ryan: …exatamente! Ou seja, considerando que o senhor não possui nenhum álibi para comprovar que o senhor ainda estava no hospital às 8:30, eu acho que a sua opinião sobre os fatos realmente importa. Caso contrário, a versão mais aceitável para esse caso é que você se encontrou secretamente com a Srta. Blake em Riverdale, a atacou de forma covarde e, depois de vê-la sangrando, se arrependeu do que fez e tentou salvá-la. Portanto, Frederick Jones Jr., nós te daremos mais uma chance para falar a verdade: o que aconteceu com a Srta. Blake?

O Fred verdadeiro, que já havia desvendado casos que os incompetentes do FBI nunca haviam desvendado, fechou os punhos de raiva e sentiu vontade de agredir fisicamente os dois agentes arrogantes que se recusavam a acreditar em sua versão. Porém, o Fred desinteressante apenas suspirou impacientemente e, em seguida, começou a repetir pela quinta vez tudo o que já havia dito.

Bart: Ryan, Larson, podem nos dar licença um minuto?

Imediatamente, os dois agentes se retiraram da sala, e os policiais os acompanharam. No momento em que o xerife Stone ia deixar a sala, o Sr. Blake pediu para ele permanecer. Bart não disse uma palavra enquanto ocupou o lugar dos agentes, e, lentamente, Fred sentiu toda a raiva se tornar medo.

Bart: Muito bem, Jones. Eu já ouvi minha filha, agora é a sua vez. Por favor, conte-me o que aconteceu desde às 6:30 pm, quando você terminou de atender a Sra. Hartley.

Mesmo temendo um processo, ou até uma condenação, Fred obedeceu e contou a sua versão pela sexta vez – obviamente, omitindo o período entre 6:30 e 8:30, em que esteve em sua sala pesquisando sobre Joel Marlow. Ao fim de seu depoimento, Bart agradeceu e o dispensou. No momento em que Fred deixava a sala – e os dois agentes voltavam para ela -, ele ouviu Bart dizer: “Ele está falando a verdade, ele não a atacou. Infelizmente, a minha filha está escondendo a identidade do agressor”. Fred sentiu alívio ao ouvir aquilo, porém a sensação durou pouco. Poucos minutos depois, Brad conduziu o filho de volta a sua sala. Seu semblante furioso fez o coração de Fred acelerar, mesmo assim, ele ousou enfrentar o pai.

Fred: O FBI me inocentou e o senhor continua desconfiando de mim? Eu não ataquei a garota, ok?

Brad: Neste caso, eu sei que você é inocente. Mas, no resto, você sabe que você tem culpa.

Fred suspirou impacientemente e tentou controlar a raiva da melhor maneira possível. Mesmo assim, ele acabou desacatando o pai.

Fred: Que merda, o que eu fiz de errado agora? Eu salvei uma moça? Eu deveria tê-la deixado no estacionamento, é isso?

Brad: Não, filho, você cumpriu seu dever. Mas você não salvou uma moça, você salvou a moça… a mesma moça com quem você estava sozinho no clube, a mesma moça com quem você estava na foto que viralizou, a mesma moça que foi vista em sua sala hoje de manhã… entende aonde eu quero chegar?

Fred sentiu tanta raiva que riu, desdenhando do que ouviu. Brad permaneceu sério, ignorando a reação arrogante do filho.

Fred: O senhor está mesmo insinuando que eu causei essa situação? Eu nem conheço essa mulher!

Brad: Não, eu estou me referindo ao fato de que você tem passado as noites fora de casa, tem perdido aulas e compromissos, tem mentido para a sua noiva… e tudo isso começou quando você conheceu essa moça. Eu não sei o que está realmente acontecendo, nem tenho interesse em saber, mas eu não posso permitir que você estrague a sua vida por causa disso, Frederick.
Fred suspirou, demonstrando impaciência, e tentou se acalmar antes de dizer qualquer coisa. Brad parecia desconfortável por manter aquela conversa.

Fred: Olha, não é nada do que você está pensando, ok? Não está acontecendo absolutamente nada entre eu e a Daphne… quanto às noites anteriores, eu apenas saí com Shags e Velma para comemorar meu aniversário, qual o problema disso?

Brad: O problema é que você está deixando a sua carreira de lado e decepcionando pessoas que sempre estiveram ao seu lado. Onde esteve hoje entre 6:30 e 8:30? O Dr. Hutton disse que você não estava no plantão, isso é inaceitável, Frederick! E nem vou mencionar o quão inapropriado é você sair à noite sem a sua noiva…

Fred ficou irritado com tudo o que ouviu, porém, ele sabia que seu pai estava certo. Ele realmente estava arruinando sua vida por causa de aventuras inconsequentes que, cedo ou tarde, não iriam acabar bem. Ele estava sendo irresponsável com suas obrigações, e estava decepcionando pessoas que ele amava. Para piorar, ele estava pensando em Daphne Blake bem mais do que ele gostaria, e ele sabia que isso era errado. Ao olhar nos olhos do pai, Fred viu o quanto ele estava decepcionado com todos os acontecimentos recentes, e ele sentiu a culpa doer em seu peito.

Fred: Olha, pai, eu realmente sinto muito por tudo. Eu nunca tive a intenção de prejudicar ninguém, eu só queria… sei lá… sair um pouco da rotina… esse internato tem sido uma merda… mas não irá acontecer novamente…

Brad sorriu e deu um tapinha nas costas do filho, orgulhoso por vê-lo admitir seu erro.

Brad: Agora, vá para casa, você precisa descansar.

Fred agradeceu e fingiu mexer no celular por um tempo, para que Brad saísse antes que ele. Sozinho, ele retirou a bolsa e o casaco de Daphne do esconderijo e deixou a sala, à procura dela. Infelizmente, quando Fred a viu, ela estava rodeada pela família, pelo xerife e por alguns médicos, entre eles, Judy. Ao ver seus pertences nas mãos de Fred, Daphne correu da direção dele e pegou imediatamente, temendo que seus pais, ou os policiais, se apossassem deles antes. Bart olhou interrogativamente para Fred, e depois encarou a filha, que parecia querer esconder o que tinha em mãos. Judy ficou constrangida e também olhou de maneira ameaçadora para o filho, em seguida, ela inventou alguma desculpa para justificar por que ele estava com a bolsa de Daphne. No mesmo momento, alguns médicos e agentes surgiram e comentaram os resultados de todos exames que Daphne fez. A divulgação pública e constrangedora enfureceu a garota, e ela chorou de raiva. Diante de tamanho absurdo, Nan tomou as dores da filha e protestou.

Nan: Já chega, Bart! Isso é ridículo! Como ousa expor a sua filha dessa forma? Ela é uma pessoa pública e acabou de ter um mal-súbito!

Nan abraçou a filha e a retirou do espetáculo investigativo criado por Bart. Judy e outras médicas acompanharam as duas, e logo em seguida, Daisy se juntou a elas, logo após olhar para o pai com raiva. Fred também decidiu se retirar, afinal, não queria se meter em mais problemas. Para evitar os olhares e comentários dos outros estudantes, ele escolheu sair por um caminho pouco frequentado. Ao chegar à saída do necrotério do hospital, ele viu uma mensagem de sua mãe dizendo: “Fique longe dessa garota, ou eu te devolvo para a adoção”. No momento em que ele saiu, ele viu uma ambulância estacionada em frente à porta, e um grupo de paramédicos retirava um cadáver de dentro dela. Quando os legistas se aproximaram, os paramédicos falaram sobre o cadáver: “Herbert Stevins, 76 anos, faleceu de intensa hemorragia de causas desconhecidas às 8:48pm”.

Blake Manor, Crystal Cove, 7 de janeiro de 2023 - 11:45 pm

O silêncio reinou durante o caminho de volta a Blake Manor. Ao chegar à mansão, Daphne abriu a porta do carro imediatamente e correu até a porta. Enquanto ela destrancava a fechadura usando a própria chave, Bart a alcançou e a segurou pelo pulso.

Bart: A nossa conversa ainda não terminou, mocinha. Você ainda me deve explicações sobre o que aconteceu.

Daphne: A nossa conversa terminou a partir do momento em que você me submeteu a um interrogatório de duas horas, e depois divulgou os resultados do meu exame de corpo delito para todo mundo! O que você pensa que está fazendo? Eu não sou uma garotinha, pai!

Bart: Eu estou tentando te proteger de quem quer te tenha feito isso com você!

Daphne: Me proteger? Eu sou a vítima, e você está me culpando!

Bart: Não estou te culpando, eu só quero saber a verdade!

Daphne: Não está me culpando? Você me obrigou a fazer um exame toxicológico! Você colocou um rastreador secreto no meu carro! Você nem sabe o que ocorreu, e ainda assim, disse aos agentes que eu estava mentindo! Você sequer confia em mim!

Bart: E eu deveria confiar? No jantar, você não quis dizer aonde estava indo. Depois, mentiu sobre a sua localização no interrogatório, e a sua irresponsabilidade fez todos suspeitarem de um rapaz inocente que só estava fazendo o trabalho dele!

Daphne: EU CONFIO EM VOCÊ, PAI! VOCÊ NUNCA ME DIZ AONDE VAI, NUNCA ME FALA O QUE ESTÁ ACONTECENDO NA SUA VIDA, E MESMO ASSIM, EU CONFIO EM VOCÊ! MAS, IRONICAMENTE, EU SEQUER POSSO VIVER A MINHA PRÓPRIA VIDA SEM PERDER A SUA CONFIANÇA!

Daphne terminou sua frase gritando. Sem esperar a reação e a resposta do pai, ela forçou a fechadura com raiva, e ao não conseguir abrir, ela cruzou os braços e chamou por Jenkins. As palavras da filha calaram Bart por um instante, e lhe fizeram refletir sobre suas atitudes. Nan e Daisy surgiram logo em seguida, e Nan o repreendeu.

Nan: Rastreador no carro, Bartholomew Blake? Onde você estava com a cabeça?

Bart: Você pode questionar meus métodos, Nan, mas nunca a eficácia deles. Sem o rastreador, não saberíamos que ela estava mentindo sobre o local onde estava, e a investigação teria…

Nan: Que investigação, Bart? Pelo amor de Deus, ela é a sua filha! Não ouviu o que os médicos disseram? Foi um mal súbito, um acidente! Você está obcecado pelo seu trabalho e acha que tudo tem que ser investigado!

Bart: Pois bem, eu quero saber as causas desse mal súbito, por isso iniciei uma investigação! Você não pode me repreender por me preocupar com a minha filha, eu só quero resolver o problema!

Nan: Invadir a privacidade dela e expô-la ao ridículo não irá resolver o problema, Bart! Deus, você não entende que não há crime e não há o que investigar? Ela só queria sair com um rapaz, sei lá, ir a uma festa, e acabou se sentindo mal por alguma coisa que ela tomou!

Bart: Quando um encontro termina sangramentos severos e morte, eu não entendo, Nan, e acho absurdo que você normalize isso. Nossa filha poderia estar morta. Mas, ao invés de você querer saber os motivos, você incentiva as mentiras dela…

Nan: Não é da nossa conta, Bart! Como se sentiria se eu colocasse um rastreador em seu carro e divulgasse para uma multidão que não houve abuso sexual, nem uso de drogas?

Bart: Eu não tenho nada a esconder, então, não seria um problema.

Nan: E quem disse que esconder um encontro é um problema? Você está tratando a sua filha como uma criminosa por causa de uma mentira inocente, enquanto trata os verdadeiros criminosos daquele maldito fórum como heróis!

As palavras de Nan desarmaram totalmente o marido, e ele se calou. Impaciente com a demora de Jenkins, ela pegou as próprias chaves e abriu a porta para as filhas entrarem, e não dirigiu mais a palavra a Bart. Enquanto Daphne lentamente subia as escadas, ela ouviu o pai conversando com o Dr. Brad Chiles e se desculpando por tudo o que fez. Antes de fechar a porta de seu quarto, ela ouviu Bart chamar seu nome, mas ela o ignorou.
***
Daphne ouviu alguém bater em sua porta. Bart pediu para entrar, novamente ela o ignorou, mas ele entrou mesmo assim.

Bart: Querida… eu… pensei que talvez você devesse ligar para Judy e Brad para agradecer a eles… e para se desculpar por…

Daphne: Deixe-me ver se eu entendi: eu tenho que ligar para Judy e Brad por que você acha que eu devo fazer isso. Eles não conseguiram me salvar, mas eu tenho que agradecê-los só porque você acha que eu devo manter a etiqueta social. Por fim, eu também tenho que me desculpar pelos problemas que você causou a eles. Puxa, como é ótimo ser um marionete de 21 anos!

Daphne terminou de proferir suas ironias e olhou com raiva para o pai. Bart suspirou e olhou nos olhos dela com arrependimento.

Bart: Bem, faça o que achar melhor, filha… mas eu não vim aqui apenas para te dar ordens… eu vim me desculpar pelas minhas atitudes… eu sei que eu me excedi, mas eu nunca tive a intenção de te prejudicar… eu só queria proteger você.

As palavras de Bart soaram verdadeiras, mas Daphne ainda estava com raiva, por isso, ela não conseguiu sorrir, nem aceitar as desculpas do pai. Bart percebeu que a filha estava realmente zangada e decidiu se retirar. Antes de sair, ele deixou um pedaço de papel com os telefones dos Chiles, caso Daphne mudasse de ideia. Quando Bart fechou a porta, Daphne suspirou de raiva e correu em direção ao papel como uma fera furiosa. Porém, antes de amassá-lo e jogá-lo no lixo, ela paralisou. Dos três telefones escritos no bilhete, um deles a fez hesitar: Fred Jones.


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