Dark Entries escrita por KendraKelnick


Capítulo 5
Capítulo 5 – Números




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Capítulo 5 – Números

Blake Manor, Crystal Cove,  7 de janeiro de 2023 – 8:30 am

Daphne acordou com o barulho de alguém batendo freneticamente na porta de seu quarto.  E em menos de um minuto após isso, Daisy abriu a porta de maneira brusca e entrou sem pedir permissão.

Daisy: Eu não acredito, Daphne! Que diabos! Que tipo de merda passa pela sua cabeça! Como você pôde de fazer isso?

Os gritos indignados de Daisy fizeram Daphne entrar em pânico. Por um momento, ela pensou que sua identidade secreta havia sido descoberta. Felizmente, Daisy continuou a lhe dar bronca em voz alta, e depois de alguns xingamentos indignados, Daphne entendeu que se tratava da foto que ela havia postado em seu Instagram, em que ela aparecia ao lado de Fred Jones.

Daisy: Seus fãs idiotas falaram para os sites de fofoca que você tem um affair com Fred Jones… e agora, adivinha? Todo mundo da faculdade está comentando que EU sou irmã do affair de Fred Jones… você tem noção do você fez? Eu sou amiga da Alice, sabia? Se você quer estragar a sua reputação com futilidades e baixarias desse tipo, tudo bem, MAS NÃO ESTRAGUE A MINHA! NEM ESTRAGUE A REPUTAÇÃO DAS OUTRAS PESSOAS!

Daphne: O quê? Affair? Do que você está falando, Daisy? Eu só tirei uma foto…

Daisy: Você tirou uma maldita foto ao lado de um homem comprometido e simplesmente publicou isso para as 36 milhões de pessoas idiotas que acompanham a sua vida!  Muito simples!

Antes que Daphne pudesse dizer qualquer coisa, Daisy praticamente esfregou a tela do celular dela na cara da irmã, e nela, Daphne viu que muitos sites de fofoca haviam publicado o boato. Daisy continuou a brigar com ela por alguns minutos, mas ao invés de responder, Daphne simplesmente pegou seu celular e apagou a foto de seu Instagram.

Daphne: Pronto, apaguei a foto, problema resolvido! Dá para parar de me destruir agora?

Daisy: Mas as notícias continuam nos sites de fofoca!

Daphne: Eu vou pedir para a Tessa resolver isso, ok?

Daisy: Ah, claro, você comete um erro e pede para a sua agente resolver para você, quanta maturidade!

Daphne: Que droga, Daisy! Eu já disse que foi sem querer! Sei lá, eu só quis ser legal com ele, eu nunca imaginei que isso aconteceria… eu nem queria estar naquele maldito jantar!

Daisy: SEJA LEGAL COM QUEM VOCÊ QUISER, SÓ NÃO AFETE A MINHA REPUTAÇÃO, OK?

Antes que Daphne pudesse responder, Daisy saiu e bateu a porta com força. Daphne suspirou de raiva, e logo em seguida, se levantou da cama. Antes de deixar seu quarto, ela acessou o True Crime Forum para ver as atualizações sobre o mistério do pingente da Lua. Infelizmente, o perfil Mistério S/A não conseguiu encontrar provas no local do crime, porém, Daphne notou que a mancha que havia dentro da piscina era muito parecida com a mancha que aparecia nas fotos da garagem da casa de James Arthur. Por fim, ela imprimiu fotos das manchas, para poder pesquisar sobre elas assim que seus pais saíssem de casa. Depois, ela selecionou alguns casos entre os inúmeros pedidos de ajuda que cherryred havia recebido em sua caixa de mensagens, imprimiu as informações necessárias e desceu para tomar o café da manhã.

Ao se aproximar da sala de jantar, ela notou que Daisy reclamava sobre ela em voz alta. Porém, quando Daphne chegou à mesa, a garota se calou e a encarou com raiva. Bart estava com um semblante sério, lendo algo no celular, e cumprimentou a filha friamente. Envenenada pelas palavras de Daisy, Nan olhou severamente para Daphne e a repreendeu.

Nan: Os Chiles nos convidaram para um jantar, e no dia seguinte, nós retribuímos com boatos sobre o filho deles! Que vergonha!

Daphne: Ah, que ótimo, a Daisy já te contou… por um acaso ela se lembrou de te contar que eu já apaguei a foto e resolvi tudo? Ou ela só quis me difamar mesmo?

Nan: Não foi a Daisy, foi a Dawn! E ela está em Nova York! Sabe como ela descobriu? Porque a notícia se espalhou pelo país inteiro!

Daphne: Bem, se a Dawn tem quase 30 anos e ainda lê sites de fofoca, o problema é dela… e se você prefere acreditar na versão mentirosa da Dawn e da Daisy, o problema é seu…

Nan: Daphne Ann Blake, olha como fala comigo!

Bart: Nan, já chega! Acalme-se, por favor!

Daphne se assustou com a interrupção ríspida do pai, mas notar a expressão de ódio no rosto da mãe, ela entendeu que a raiva que Nan estava descontando nela havia sido causada por outra razão. Nan o encarou severamente por alguns minutos, até Bart finalmente terminar de ler a tela de seu celular e dizer alguma coisa.

Bart: Bem… o que eu quis dizer é que não há razão para se alterar. Daphne cometeu um erro e está ciente disso. Hoje mesmo ela irá pedir desculpas a Alice e ao filho dos Chiles pelo que ela fez…

Daphne: Eu… o quê? Como assim “eu irei pedir desculpas”? Eu não tenho 6 anos de idade para você me tratar assim, papai! Você não pode me obrigar! E, além do mais, eu já consertei o que eu fiz!

Bart: Você irá! Não porque eu estou te obrigando, mas porque você deve consertar os danos que causou a eles, Daphne. Você é uma pessoa famosa agora, tem que ter mais responsabilidade sobre suas ações. E tem que tomar mais cuidado com as informações que espalha na internet…

Nan: A boa notícia, Daphne, é que você não é a única pessoa que tem que consertar os danos que causou e tomar cuidado com informações de internet…

Nan se alterou ao pronunciar cada uma das palavras, e ao terminar, continuou a olhar para o marido com raiva. Bart apenas suspirou, desviou o olhar e encerrou a discussão. Com tamanha tensão no ar, os quatro Blakes comeram em silêncio, até que o celular de Bart tocou e ele se retirou até a sala de estar para atendê-lo.  Nan deixou a mesa como uma leoa furiosa e o seguiu. Mesmo com a porta fechada, a voz de Nan pôde ser ouvida.

Nan: EXUMAÇÃO? O QUE VOCÊ PENSA QUE ESTÁ FAZENDO, BART? VOCÊ VAI PERDER O CARGO SE CONTINUAR SEGUINDO O QUE ESSES IDIOTAS DE INTERNET DIZEM!

Daphne e Daisy se olharam constrangidas, e Daisy logo desviou o olhar, porque ainda estava chateada com a irmã. Daphne sentiu seu coração acelerar de medo, por desconfiar que sua mãe estava se referindo à exumação do cadáver de Jane Doe.

Nan: QUE SE DANE A AUSTRÁLIA E A POLÍCIA AUSTRALIANA! COMO PÔDE COLOCAR O FBI NISSO?  VOCÊ NÃO PODE MOBILIZAR AGENTES E RECURSOS SÓ PORQUE UM PERFIL ANÔNIMO VAZOU INFORMAÇÕES CONFIDENCIAIS E UM BANDO DE LEIGOS OPINARAM SOBRE O CASO!

Quando as frases gritadas por Nan confirmaram suas suspeitas, Daphne ficou ainda mais nervosa. Os pais estavam brigando e correndo o risco de perder seus cargos por culpa dela. E, infelizmente, era tarde demais para apagar tudo e fingir que aquilo nunca aconteceu. Daisy apenas revirou os olhos impacientemente e abandonou sua refeição.

Daphne: Espera! Eu vou ao hospital com você… bem, você sabe… papai tem razão… você espera eu me arrumar?

Daisy fez uma expressão de desdém, mesmo assim, concordou. Após terminar sua xícara de chá, Daphne correu para o seu quarto. Ao passar pela sala em que seus pais discutiam, ela ouviu Bart dizer: “Eu não tenho outra escolha além de intervir, Nan. Alguém cavou um buraco no quintal da casa ontem à noite e retirou algo. Acreditamos que tenha sido o próprio assassino”.

Campus da Universidade de Darrow, Crystal Cove, 7 de janeiro de 2023.

10:00 am

 Depois de apenas 3 horas de sono, Fred estava exausto. O barulho do despertador parecia uma sirene distante em seu sono profundo, e seus olhos mal conseguiam ficar abertos. Mesmo assim, ele se levantou, pois sabia que tinha que cumprir os compromissos de sua vida normal.  Enquanto consumia café o suficiente para se manter acordado, ele viu as últimas notícias sobre o caso do pingente da Lua. A maioria delas noticiava que o FBI havia autorizado a exumação do cadáver para fazer o teste de DNA solicitado por Elandra Mahon. E algumas noticiavam algo muito mais grave: de que na noite anterior, alguém havia cavado um buraco no local do crime e retirado alguma coisa. O pânico que Fred sentiu ao ler tal notícia o despertou mais que as xícaras de café. Sua reação imediata foi ligar para Shaggy e Velma insistentemente, mas após várias tentativas, nenhum deles atendeu. Fred, então, enviou o link das notícias para Velma junto com a mensagem: “Você não acha que devemos entregar o livro anonimamente?”.

Em seguida, ele acessou o True Crime Forum para verificar as reações à postagem da Mistério S/A na noite anterior. Infelizmente, desta vez, as fotos do local do crime não geraram tantas reações nos usuários, e as respostas mais recentes eram direcionadas às mensagens que as próprias filhas de Joel Marlow haviam postado, alegando que o pai não era o assassino. Novamente, ele ligou várias vezes para seus amigos, e quando desistiu de ligar, deixou uma mensagem na caixa postal de Velma: “Que tal contarmos às filhas de Marlow sobre o livro? Elas podem saber de algo. Me liga.”.

Após tantas decepções, Fred resolveu acessar o Instagram para esquecer todos aqueles problemas. Porém, lá ele teve outra decepção – a foto que Daphne havia postado na noite anterior foi apagada por ela -, e logo ele percebeu que tinha mais um problema – as notícias falsas que o apontavam como affair de Daphne. Mais uma vez, Fred recorreu ao celular para resolver suas aflições, e ligou imediatamente para a sua noiva Alice.

Fred: Oi, amor… tudo bem?

O silêncio do outro lado da linha demonstrou que não estava tudo bem. Mesmo assim, Fred insistiu.

Fred: Você está zangada comigo?

Alice: O que você acha, Frederick?

Alice desligou sem se despedir, deixando claro que ela estava zangada. Fred suspirou e decidiu se arrumar para seu estágio no hospital. Afinal, se ele se atrasasse novamente, ele teria mais um problema.

Campus da Universidade de Darrow, Crystal Cove, 7 de janeiro de 2023.

11:00 am

 

Após receber inúmeras notificações de mensagens, Velma acordou de um sono profundo. O cansaço extremo fez doer todas as partes de seu corpo, e ao olhar pela janela, a imagem de Scooby-Doo dormindo tranquilamente no banco de trás do carro a irritou. Ao invés de voltar a dormir ao lado de seu namorado, ela preferiu se levantar e se preparar para ir a Riverdale. Após tomar uma quantidade de café suficiente para se manter alerta, ela ligou para Fred.

Velma: Oi Fred! Desculpe, eu não ouvi o telefone tocar. Aquele cachorro maldito e mimado latiu até às 9h, só porque ele queria entrar no carro e dormir no banco de trás, acredita? Pois é, quando Shaggy e eu finalmente deitamos, apagamos. Enfim… sobre o livro, eu acho que não devemos entregá-lo a ninguém. A não ser que consigamos relacioná-lo a Joel Marlow. Estaremos na biblioteca de São Francisco hoje à tarde, e enviaremos notícias assim que possível.

Ao terminar a ligação, Velma cutucou o namorado até ele reagir.

Velma: Vamos, Norville, precisamos ir!

Como resposta, ela recebeu uma sequência de palavrões e um travesseiro arremessado em sua direção. Então, ela decidiu mudar de estratégia para convencer o namorado a se levantar.

Velma: Vamos, Norville, o café da manhã está pronto!

Campus da Universidade de Darrow, Crystal Cove, 7 de janeiro de 2023.

11:30 am

 

Daisy estacionou em frente ao hospital e encarou a irmã mais nova com desdém. Daphne estava entretida conferindo a maquiagem no espelho quando percebeu que a irmã olhava fixamente para ela.

 

Daphne: Que foi? Ainda está com raiva de mim? Eu estou aqui para consertar o que eu fiz, sabia? Não precisa me olhar desse jeito…

 

Daisy riu, debochando da irmã, e continuou a olhá-la com desdém.

 

Daisy: Não estou com raiva, eu só estou te julgando. Eu acho que você está se arrumando demais para pedir desculpas.

           

Daphne olhou com raiva para a irmã, e Daisy riu novamente. Em seguida, ela entregou as chaves para Daphne e desceu do carro.

 

Daphne: Hey, aonde você pensa que vai? Você me trouxe até aqui e vai me deixar fazer tudo sozinha?

 

Daisy: Desculpe, eu adoraria ver você se humilhando, mas eu acho que fingir que eu não te conheço vai ser mais divertido!

 

Daphne revirou os olhos enquanto a irmã fez uma careta para ela e a deixou. Sem escolha, ela saiu do carro e foi sozinha ao hospital. Enquanto caminhava, ela olhava para o chão, para evitar os olhares de reprovação das pessoas ao redor. Mas mesmo sem olhar nos rostos, ela sentia que estavam comentando sobre ela. Daphne seguiu todas as instruções de Daisy, e ao chegar ao local indicado por ela, ela viu Fred de costas, sentado em uma cadeira, em frente a uma mesa cheia de papéis. Ela bateu na porta delicadamente na primeira vez, e como não foi ouvida, ela bateu com mais força – e não foi ouvida novamente. Sem alternativa, ela abriu a porta com cuidado e entrou.

 

Daphne: Fred? Fred Jones?

 

O chamado repentino assustou Fred, e o fez juntar os papéis rapidamente e escondê-los dentro de pastas de papel. Ao se virar, Fred ficou ainda mais surpreso por ver Daphne na porta de sua sala.

 

Daphne: Posso entrar? Estou atrapalhando algo?

 

Fred: Claro! Digo… claro que não!  Quer dizer, você pode entrar, e você não está atrapalhando, eu só estou analisando… umas… mortes que… aconteceram…  mês passado.

 

Daphne sorriu timidamente e entrou, enquanto Fred sorriu de maneira tensa, tentando esconder a etiqueta de uma das pastas que dizia “Óbitos 2016”- e tentando lidar com o nervosismo de ver Daphne mais uma vez.

 

Daphne: Bem, eu não vou demorar. Eu só queria lhe pedir desculpas por tudo o que eu causei a você e a Alice. Eu postei a foto sem pensar e sem pedir permissão a você, e não imaginei que iria acontecer tudo isso… de qualquer forma, a minha agente já está consertando os danos. Eu realmente sinto muito.

 

Fred: Sem problemas. Não se preocupe, nós entendemos que foi só um mal entendido.

 

Sem poder evitar, os dois se encararam por um tempo, e ao se darem conta de que não tinham mais o que dizer, desviaram o olhar e tentaram romper aquele silêncio desconfortável.

 

Daphne: Que bom. Fico feliz de não ter prejudicado vocês. Então… até mais, Fred!

 

Fred acenou e sorriu desconcertadamente enquanto observava Daphne sair de sua sala. Ao fechar a porta, Daphne notou que uma multidão de estudantes de medicina havia se acumulado no final do corredor, e todos olhavam para ela em silêncio. Ela, então, decidiu pegar o caminho oposto, para evitar passar por eles. Ao chegar ao elevador, ela viu Alice caminhar com raiva até a porta da sala de seu noivo, e batê-la com força logo após entrar.

 

Campus da Universidade de Darrow, Crystal Cove, 7 de janeiro de 2023.

12:30 pm

Shaggy buzinou pela segunda vez para apressar sua namorada, e isso irritou Velma.

 

Velma: Será que dá para você esperar? Eu não acho a minha bolsa! E sem a minha bolsa, não há motivos para irmos a São Francisco!

 

Ao invés de compreensão, Velma obteve um terceiro barulho de buzina como resposta, e ao ver seu namorado rindo por irritá-la, ela decidiu não demonstrar mais o quanto ela estava brava por ser apressada. Depois de procurar em todos os cantos de sua casa, Velma se lembrou que Scooby-Doo estava no banco traseiro, provavelmente sentado em cima de sua bolsa. As suspeitas de Velma foram conformadas quando ela se aproximou do carro de Shaggy e viu as alças de sua bolsa embaixo do cão. Porém, ao tentar puxar a bolsa, o cão lhe mostrou os dentes.

 

Velma: Você está me irritando com essa buzina e a minha bolsa estava o tempo todo embaixo do seu cachorro idiota!  E agora ele não deixa eu pegar!

 

Shaggy buzinou e debochou de Velma mais uma vez, mas ao tentar puxar a alça da bolsa dela, Scooby-Doo rosnou e lhe mordeu. Após uma sequência de palavrões, Shaggy tentou novamente, e em cada tentativa, o cão ficava mais feroz. Shaggy olhou desconcertadamente para a namorada, sem saber o que fazer. Velma apenas revirou os olhos e cruzou os braços.

 

Velma: A culpa é toda sua!  O cachorro pede hambúrguer, você dá. Ele pede para subir na cama, você deixa. Ele late duas horas seguidas porque quer dormir no banco do seu carro, você obedece. Você é o cachorro dele, Norville! Ele não te respeita como autoridade! Agora, se vira!

 

Shaggy: Tipo, a gente nem vai precisar dessa bolsa agora, né? Então deixa o Scooby deitar em cima dela… quando chegarmos em São Francisco ele deixa vc pegar, né, Scoob?

 

O cachorro se aconchegou em cima da bolsa e deitou a cabeça em cima das patas dianteiras, em uma atitude nada amistosa. Velma olhou com desprezo para o namorado, que ao invés de insistir na discussão, apenas ligou o carro e sorriu para ela.

 

***

 

            Shaggy: Vamos, Scoob! Tipo, tem uma loja que vende pipocas de diversos sabores pertinho do cemitério!

 

            Ao ouvir seu tutor lhe chamando do lado de fora do carro, Scooby-Doo sequer se mexeu. Ele resmungou alto por um momento, e terminou vocalizando um uivo curto. Shaggy ficou sem jeito e olhou para Velma, sem saber o que fazer.

 

            Velma: Eu não falo a língua dele, mas eu tenho certeza que ele te xingou.

 

            Shaggy: Tipo, eu não entendo, o Scooby nunca fez isso antes!

 

            Velma: Ah, eu entendo! Ele faz esse tipo de birra o tempo todo, e você o gratifica. Por isso ele não respeita ninguém.

 

            Shaggy decidiu respeitar a vontade do cão, e quando trancou o carro, deixou os vidros abertos. A caminhada pelo cemitério de Riverdale durou quase uma hora, e ao encontrar o túmulo de James Arthur, Velma confirmou suas suspeitas.

             

            Velma: Jinkies, ele morreu mesmo em 6 de outubro de 2016! Lembra do número 6102016 que achamos no chão da garagem?

 

            Shaggy: Tipo, mas como ele riscou o número se ele estava morto? Ou melhor, como ele ia saber que ele iria morrer justamente naquele dia? Tipo, a causa de morte não foi um ataque cardíaco?

 

            Velma olhou impressionada para o namorado, e pela expressão facial dela, ele entendeu que ele havia feito uma pergunta inteligente, e por isso sorriu.

 

            Velma: Acho que o mistério não para por aí… se ele era sozinho, não tinha herdeiros nem familiares, quem fez o funeral? Quem pagou pela lápide?

 

            Shaggy tentou dizer algo inteligente novamente para impressionar a namorada, mas não encontrou nada para dizer. Então, ele comentou a primeira coisa que lhe surgiu na mente.

 

            Shaggy: Tipo, um tal de Matheus, veja!

 

            Shaggy apontou para a base da lápide, onde havia escrito em letras minúsculas “Matheus 25:46”. Velma riu ao ver aquilo, e Shaggy entendeu que, daquela vez, ele não havia sido muito inteligente.

 

            Velma: Ora, até eu que sou ateia sei que isso é um versículo da Bíblia, Norville!

 

            Shaggy ficou sem jeito, e Velma tentou fazê-lo se sentir melhor.

           

            Velma: …mas pode ser uma pista. Geralmente, quando as lápides são pagas pela comunidade, eles escrevem algo como “homenagem de seus amigos de Riverdale”, coisas assim. Uma inscrição bíblica parece algo bem íntimo, não acha?

 

            Shaggy concordou balançando a cabeça, enquanto Velma fotografou a lápide em vários ângulos e enviou as fotos para Fred. No caminho de volta para o carro, Shaggy tentou dizer algo inteligente para convencer a namorada que seria importante investigar a loja de pipocas, mas ela não acreditou.

 

***

            Ao chegar a biblioteca comunitária de São Francisco, Shaggy estacionou estrategicamente em frente a uma loja de donuts, e isso fez com que Scooby-Doo finalmente saísse do carro. Com o livro e a bolsa em mãos, Velma caminhou até a jovem bibliotecária e se apresentou.

 

            Velma: Olá, eu me chamo Velma, e eu gostaria de devolver um livro que eu encontrei no porão da casa do meu avô.

 

            Lisa: Olá, Velma. Quanta gentileza a sua, muito obrigada!

 

            A moça usando um crachá de identificação com o nome Lisa Genau pegou o livro e procurou o código de barras para registrar a devolução. Como não encontrou, ela buscou o envelope na última página do livro, mas também não achou. Velma ficou constrangida e sorriu.

 

            Velma: Bem… eu imagino que esse livro está há muitos anos no porão do meu avô…e quando eu digo “muitos anos”, eu quero dizer “algumas décadas”…

 

            Lisa: Eu percebi! Mas não tem problema, vou colocá-lo na lista de cadastro para incorporá-lo ao acervo… muito obrigada pela sua atitude, é muito bonito ver pessoas zelando pelo patrimônio da nossa biblioteca!

            Velma: Bem… uh… na verdade… eu gostaria de saber se é possível descobrir quando exatamente o meu avô pegou esse livro. Você teria como descobrir? Teria uma cópia da ficha de empréstimo…?

 

            A bibliotecária fez uma expressão facial de estranhamento e olhou para a tela do computador. Após tentar procurar o livro duas ou três vezes no sistema da biblioteca, ela olhou surpresa para Velma.

 

            Lisa: Bem… infelizmente, não. Não há nada sobre esse título aqui, nem outras cópias desse livro, nem outros títulos do mesmo autor, nem registros de empréstimos anteriores… e para ser sincera, eu nunca ouvi falar desse livro, nem desse autor, nem dessa editora… e olha que eu cresci nessa biblioteca!

 

            Velma: Olha, eu sei que parece bem estranho, mas eu realmente preciso saber quando o meu avô retirou esse livro da biblioteca… na verdade, eu preciso saber se foi ele, ou se foi o meu tio-avô, ou outra pessoa… desculpe, é uma questão familiar muito complexa, envolvendo uma herança e mortes suspeitas de herdeiros, enfim… eu preciso muito saber essa data para informar para o meu advogado, teria como você me ajudar?

 

            A jovem bibliotecária ficou ainda mais surpresa, mesmo assim, tentou novamente fazer algo por Velma. Ela anotou a sequência de números e letras que estava na etiqueta do livro e caminhou até a prateleira em que o livro deveria estar, mas ao chegar lá, ela ficou incrédula.

 

            Lisa: Bem, eu adoraria te ajudar, Velma, mas…inexplicavelmente, a prateleira em que esse livro deveria estar sequer existe! Veja… ele deveria estar nesta estante, mas as prateleiras vão até a letra X… e aqui na etiqueta está escrito Z!

 

            Velma também ficou espantada ao perceber que a identificação que constava na etiqueta do livro não existia. Ao vê-la tão alterada, tirando fotos de tudo e vasculhando as prateleiras ao redor, a bibliotecária tentou ajudá-la.

 

            Lisa: Bem, você pode usar os computadores da sala de informática para acessar o histórico do acervo da biblioteca. Temos tudo digitalizado desde o ano de fundação. Se esse livro realmente era dessa biblioteca, você pode encontrar quando ele entrou no acervo e quando ele foi considerado perdido… talvez você possa achar alguma coisa. Fora isso, infelizmente, eu não sei como te ajudar. Como eu disse, eu cresci aqui e eu nunca ouvi falar desse livro antes. Minha avó era a antiga bibliotecária, ela trabalhou aqui por 60 anos, então, se esse título estivesse no acervo, eu saberia.

           

            Velma agradeceu a ajuda e caminhou até a sala de informática para pesquisar sobre o livro nos registros do acervo. Após algum tempo procurando nos registros, ela descobriu que aquele exemplar de “Numerologia Cabalística” permaneceu na biblioteca até setembro de 1981. Em outubro de 1981, o livro foi considerado “perdido”. Velma também descobriu que, desde o ano de sua fundação, em 1879, aquela biblioteca teve muitos outros exemplares do mesmo livro, e todos eles foram perdidos. Velma fotografou todas as evidências que encontrou e enviou para Fred. Em seguida, ela procurou registros de quando os exemplares de “Numerologia Cabalística” foram adicionados ao acervo, mas não obteve sucesso. Ela também não conseguiu encontrar exemplares do mesmo livro para comprar, nem achou resenhas sobre o título, tampouco informações sobre o autor e a editora. Depois de enviar tantas descobertas misteriosas para Fred, ele ligou para ela, e Velma deixou a biblioteca para atender a ligação.

           

            Velma: Oi Fred. Péssimas notícias: esse livro é como uma memória que nunca aconteceu. Não existem informações sobre ele em lugar nenhum, nem sobre o autor ou sobre a editora. Ele não possui informações sobre edição, mas, curiosamente, existem dezenas de registros de exemplares desse livro no acervo dessa biblioteca desde 1879. Nem mesmo a bibliotecária sabia sobre ele, e ela disse que a avó dela trabalhou aqui a vida toda e nunca o mencionou. E sabe o que é pior? Os registros são apenas de perda. Não há informações de como esses livros chegaram à biblioteca, mas há registros dizendo que todos eles foram perdidos. E tem mais: os livros sempre são perdidos em agosto ou em setembro…

 

            Fred: As suas descobertas bizarras terminaram? Porque eu preciso te falar sobre as minhas…

 

            Velma: Na verdade, tem muito mais. A prateleira em que esse livro deveria estar também não existe. Mesmo assim, ele tem uma etiqueta de identificação. E os outros livros desaparecidos também. De qualquer forma, eu acabei de devolvê-lo à bibliotecária, e creio que até amanhã ele deve receber uma etiqueta e entrar nos registros do acervo. E com isso, quem sabe eu possa achar quem o alugou em setembro de 1981.

 

Fred: Ótimo. Agora, se prepare para ouvir o que eu descobri. James Arthur não morreu de infarto. Quer dizer, não apenas de infarto.

 

Velma: Como assim? Qual foi a causa da morte dele, então?

 

Fred: Eu analisei os registros de autópsia, e entre os achados, havia tímpanos estourados, retinas queimadas, queimaduras de segundo grau pelo corpo todo, diversos vasos sanguíneos rompidos, hemorragia nas cordas vocais, infarto de miocárdio e, pasme, um choque hipovolêmico sem nenhuma gota de sangue ao redor do corpo… eu nunca vi nada parecido. Tantos sintomas bizarros juntos… é como se o corpo dele tivesse explodido e o sangue desaparecesse… e durante isso, ele tivesse gritado até suas cordas vocais colapsarem…

 

Velma: Jinkies! Eu não sei dizer sobre os demais achados, mas as queimaduras batem com as manchas que encontramos na garagem dele…

 

Fred: E sabe quem tinha exatamente essas lesões pelo corpo? A Jane Doe que usava um pingente de Lua… mas, no caso dela, as queimaduras foram ainda mais severas, e a hemorragia foi mais grave… pode parecer idiota o que vou dizer, mas o que quer que tenha causado isso, não foi um simples assassino. Quero dizer, eu nunca vi um assassino que causa hemorragias graves sem deixar vestígios de sangue…

Velma: Besteira. Só porque não entendemos como o maluco fez isso, não significa que seja algo paranormal. Podem ter sido vários assassinos, como uma seita religiosa, e eles podem ter drenado o sangue… ou queimado as vítimas, quem sabe? Enfim… Shaggy e eu achamos o túmulo do Sr. Arthur, e nele havia escrito “Matheus 25:46”. Eu pesquisei o que era e achei um versículo bíblico: “E irão estes para o tormento eterno, mas os justos para a vida eterna”. Parece meio psicopático, não?

Fred: Bastante. Mandar um eugenista que matou uma garotinha para o inferno e uma jovem inocente para o céu é algo que malucos de seitas religiosas fariam… bem, eu sinto muito, mas preciso ir agora. Até mais!

Velma se despediu de Fred, e logo em seguida, foi até a loja de donuts buscar Shaggy e Scooby. Enquanto eles terminavam de comer, ela analisava as fotos que tirou dos registros da biblioteca, para tentar descobrir algo.

Shaggy: Tipo, você conseguiu encontrar quem alugou esse livro?

Velma: Infelizmente, não. Na verdade, eu achei mais perguntas do que respostas. Não há nada sobre esse livro na internet, a bibliotecária nunca ouviu falar dele, a prateleira onde ele deveria estar não existe… mas, mesmo assim, existem registros desse livro no acervo da biblioteca desde 1879… ou melhor, apenas registros de perda, não há nenhuma informação de como eles chegaram lá… ah, e outra coisa, por algum motivo, eles sempre somem em agosto ou em setembro, o que torna tudo ainda mais misterioso…

Enquanto comia, Shaggy olhou as fotos com cuidado e refletiu sobre tudo o que ouviu. Após engolir o último pedaço de um donuts de creme, ele arriscou dar a sua opinião.

Shaggy: Tipo, nos registros de 1879 até 1899, os livros somem em agosto, talvez porque o mês de agosto é o mês 8, e os anos 1800 também têm 8. Você não disse que esse livro fala de umas maluquices de números invertidos? Tipo, palímetro, palítono, palíndeto…

Velma: Palíndromo! Jinkies, você é um gênio!

Velma ficou tão feliz e tão surpresa com a inteligência do namorado que beijou os lábios dele com força. Shaggy ficou sem jeito e corou, e Scooby-Doo bufou com desprezo ao ver a cena.

Velma: Esse deve ser o real motivo, veja! A partir de 1901, os livros somem em setembro, mês 9! É isso, os livros somem em uma data palíndromo! Que incrível!

Shaggy: Incrível? Tipo, isso é assustador pra caralho… quantos livros você conhece que somem sozinhos? Isso é coisa do demônio!

Velma: O demônio não existe, Norville… mas seitas existem, e podem roubar livros… e essa informação pode nos ajudar a saber quando esses malucos cometerão novos crimes!

Shaggy: Tipo, por favor, me diga que não vai ter nenhum palíndromo esse ano… porque se tiver, eu quero estar bem longe daqui e desse livro!

Novamente, Velma se impressionou com a inteligência do namorado, e ficou boquiaberta. Imediatamente, ela pesquisou na internet quando haveria uma nova data palíndromo, e ao encontrar, abraçou e beijou a bochecha de Shaggy com alegria.

Velma: Eu já disse que eu te amo hoje? Bom trabalho, querido. Agora sabemos exatamente quando essa seita vai agir!

Blake Manor, Crystal Cove,  7 de janeiro de 2023 – 5:00 pm

Após uma tarde inteira procurando nos arquivos pessoais de Nan e Bart Blake, Daphne havia encontrado poucas informações sobre os casos que as pessoas do True Crime Forum haviam lhe pedido. Mesmo assim, ela acreditava que essas poucas informações confidenciais poderiam mudar a vida daquelas pessoas, ou poderiam ser pequenas peças essenciais para que todos aqueles mistérios fossem desvendados, assim como ocorreu com Molly Becker. Porém, no momento em que ela ia postar seus achados, ela ouviu passos caminhando em direção à porta da biblioteca. Imediatamente, Daphne destrancou a porta, escondeu suas anotações e sentou-se na frente de seu Macbook para simular que estava estudando.

Bart: Olá, princesa! Eu preciso dar uma palavrinha com esses dois agentes. Se incomoda de ir para o seu quarto e nos deixar a sós?

Daphne concordou, juntou seus pertences e se retirou. Quando os três homens se sentaram, a porta se fechou e ela se aproximou para tentar ouvir o motivo da discussão. Ela não conseguiu ouvir perfeitamente a conversa, mas o pouco que ouviu falava sobre os resultados da investigação na casa de James Arthur. De acordo com os agentes, nenhum cadáver foi encontrado no local, nem outras pistas sobre grupos supremacistas.  Após várias palavras incompreensíveis, Daphne entendeu que a casa não estava mais sendo vigiada, e a demolição havia sido autorizada para evitar a visita de curiosos. E a última coisa que ela entendeu foi o pai dizendo “retirem o fractal do assoalho da garagem e enviem para a perícia. Ele pode ser a resposta para as outras manchas.”. Ao perceber que os homens de despediam, Daphne correu para o seu quarto e ali permaneceu até ver seu pai e os dois agentes deixarem Blake Manor.

Sozinha novamente, Daphne se trancou na biblioteca para pesquisar sobre a misteriosa mancha encontrada na casa de James Arthur e na cena do crime de Jane Doe. Ela passou uma hora vasculhando os arquivos dos pais à procura de cenas de crimes, mas não teve sucesso. Então, Daphne se lembrou da maneira como o pai se referiu à mancha — fractal – e ao pesquisar por essa palavra na internet, ela descobriu que as manchas se pareciam com as estruturas geométricas dos fractais. Pesquisando por “fractais em cenas de crimes”, ela se assustou. Ela encontrou dezenas de fotos de diferentes assoalhos, e todos eles mostravam manchas semelhantes às encontradas na casa de James Arthur. “Cena do local de desaparecimento do garoto Otto Reinier, 1962”, “local onde o corpo de Rachel Clay foi encontrado, setembro de 1970”, “último local onde Natan Cidic foi visto em 1941”, foram algumas das descrições que Daphne encontrou nas fotos, e ela foram suficientes para fazê-la compreender que havia algo muito maior envolvendo as mortes de James Arthur e a garota do pingente da lua.

Após anotar todos os nomes das vítimas que encontrou, Daphne buscou por elas nos arquivos de seus pais. Para o seu espanto, todas as vítimas apresentavam as mesmas lesões em seus corpos. Todos casos que ela encontrou ainda estavam abertos, sem solução e sem sequer uma pista sobre quem havia cometido o crime. E devido ao longo período de tempo entre um caso e outro, não havia como ser uma única pessoa. Daphne coletou as informações que precisava para uma publicação no True Crime Forum, e no momento em que fechou uma das pastas, um artigo de jornal se desprendeu e caiu no chão. Ao pegar o pedaço de papel amarelado, ela viu que era um artigo da primeira página do jornal local, Crystal Cove Gazette. Datada de 20 de fevereiro de 2002, a notícia falava sobre o misterioso desaparecimento de Hannah Renner, a esposa de Frederick Jones Sr., o atual prefeito. De acordo com o jornal, a mulher desapareceu sem pistas dentro da própria casa, deixando para trás panelas fervendo no fogão, uma televisão ligada e seu bebê de um ano no berço. Nem os vizinhos, nem a polícia encontraram algo suspeito, que pudesse indicar que ela fugiu ou foi levada. Ao final do texto, havia uma foto do assoalho da casa de Hannah, e nele havia uma mancha misteriosa idêntica à da casa de James Arthur. Ao lado da foto do fractal, havia a foto do bebê de Hannah, e Daphne logo o reconheceu.

Daphne: Freddie!

Hospital Darrow, Crystal Cove, 7 de janeiro de 2023.

06:30 pm

 

Ao sair do quarto de seu último paciente, Fred voltou rapidamente para a sua sala para aproveitar alguns minutos sem a companhia de ninguém. Após trancar a porta, ele encaminhou uma série de fotos para Velma, e a enxurrada de informações a fez ligar para ele.

 

Velma: Fred? Está em casa? Pode falar?

 

Fred: Infelizmente não. Eu saio apenas às 8:30. Mas estou sozinho agora e posso falar sobre o caso… veja a primeira foto que eu acabei de enviar… no túmulo de Jane Doe há uma pequena inscrição com o mesmo versículo bíblico que vocês acharam no túmulo do Sr. Arthur…

 

Velma: Jinkies, será que foi a mesma pessoa?

 

Fred: Pouco provável, visto que existem 35 anos entre as duas mortes… mas pode ter sido a mesma seita…

 

Velma: Seja quem for, essa pessoa deveria saber a real identidade de Jane Doe. Por que colocaria um versículo tão peculiar no túmulo de um cadáver desconhecido?

 

Fred: É uma boa hipótese. Mas falando em Jane Doe, creio que temos pistas suficientes para provar que ela é Allyra Mahon. Dê uma olhada nas outras fotos, o tecido que encontramos junto com o livro é muito parecido com o tecido dos vestidos que Allyra e Elandra estão usando nessas fotos antigas.

 

Velma ficou em silêncio enquanto analisava as fotos com cuidado.

 

Velma: Eu não diria parecido, eu diria idêntico. Esses desenhos são bastante excêntricos.

 

Fred: Então, podemos enviar o tecido ao FBI amanhã mesmo. Elandra Mahon está no país, ela certamente saberá informar se o tecido pertencia a Allyra.

 

Velma: Fred, não podemos fazer isso, nós cavamos a cena de um crime, droga! Eles vão nos pegar!

 

Fred: Vamos fingir que somos testemunhas e entregar anonimamente. Não precisaremos informar que cavamos o quintal.

 

Velma suspirou impacientemente e ficou em silêncio. Fred entendeu que ela estava contrariada, e por isso, tentou convencê-la.

Fred: Vel, eu estou dizendo isso porque tenho certeza que foi Joel. Tem mais uma coisa, eu achei uma reportagem local falando sobre ele. A matéria fala sobre o sucesso repentino da empresa de Joel, e nela há essa última foto que eu te mandei. Ela foi tirada na mansão de Joel em 1982. Repare no artesanato aborígene que decora a casa, esse desenho de Lua não lhe parece familiar?

 

Novamente, Velma se calou para analisar a foto, e desta vez, ela mesma interrompeu o silêncio.

 

Velma: Jinkies, é o mesmo desenho do pingente!

 

Fred: Agora, repare nos quadros que Joel colocou nas paredes… eles não são idênticos às paisagens das fotos antigas que Elandra postou? Observe a forma do lago, e as árvores ao redor…

 

Velma: Jinkies, Fred, genial! Isso sugere que Joel esteve na tribo de Allyra!

 

Fred: E prova que Joel deve ser investigado a fundo, então, entregaremos o tecido.

 

Velma suspirou mais uma vez, mas cedeu.

 

Velma: Ok, mas faremos isso amanhã, depois que eu voltar da biblioteca e analisar os registros do livro. Eu ainda quero saber quem alugou aquele livro, e por quê. Isso pode ser a resposta para a morte do Sr. Arthur também. E além disso, se o livro estava enrolado em um vestido de Allyra, ele deve ser uma pista importante para entender a morte dela.

 

Fred: Ok, entregaremos o livro amanhã de tarde, então. Se dermos sorte, entregaremos os registros de Joel Marlow junto com ele.

 

Fred foi interrompido com o barulho de Alice batendo na porta. Imediatamente, ele se despediu e encerrou a ligação.

 

Blake Manor, Crystal Cove,  7 de janeiro de 2023 – 6:45 pm

            Todos estavam em silêncio quando Daphne entrou na sala de jantar. Daisy olhou para ela e revirou os olhos, indicando que seus pais estavam brigados. Ao ver a filha mais nova, Bart sorriu e a cumprimentou brevemente, enquanto Nan apenas disse “você está atrasada”, de maneira mal-humorada e sem olhar para ela. Nenhuma palavra foi dita nos quinze minutos seguintes, e os Blakes só reagiram quando Daphne finalizou sua refeição e se levantou rapidamente.

            Bart: Espere, querida, Cosette ainda não terminou de servir todo o jantar.

            Daphne: Ah, desculpe, papai, eu tenho um compromisso hoje à noite e… eu não vou jantar em casa hoje…

            Bart: Eu não me lembro de você ter mencionado esse compromisso…

            Daphne: Ah, claro! Desculpe, eu não tive tempo! A Tessa me avisou sobre ele hoje à tarde, e eu me esqueci completamente de te avisar…

            Bart: Pelo jeito, você também se esqueceu de avisar seu motorista, porque eu acabei de ver o Walt indo embora…

            Daphne: Ah, não! Que cabeça a minha! Mas… não tem problema… eu… vou dirigindo o meu carro dessa vez…

            Bart: Não se preocupe, eu peço para o Jenkins te levar.

            Daphne: Não! Não precisa! Eu vou sozinha… desta vez, a Srta. Blake irá ao shopping ela mesma, como diz aquele livro famoso…

            Bart gargalhou ao ouvir a filha, mas insistiu.

            Bart: Ora, querida! Clarissa Dalloway era casada, tinha mais de 50 anos e certamente era bem menos bonita e ingênua do que você… por isso, eu insisto que Jenkins te leve.

            Daphne: Mas a Srta. Blake já tem 21 anos, então ela pode ir sozinha para onde ela quiser!

            Bart: A Srta. Blake é filha de uma promotora famosa e do chefe do FBI, e por isso, ela corre perigos que ela nem imagina. Assunto encerrado. Diga aonde quer ir que Jenkins te levará.

            Daphne suspirou e perdeu a paciência.

            Daphne: A Srta. Blake não faz ideia do que está havendo com a promotora famosa e com o chefe do FBI! Ela não fica sabendo de nada do que acontece nessa maldita casa! Ela só ouve gritos de raiva, presencia reuniões secretas com agentes e os pais se ignorando durante o jantar! E mesmo sem saber absolutamente nada sobre a vida secreta deles, ela tem que falar cada detalhe da vida dela e ser escoltada por um exército de seguranças! Isso não é justo!

            Daphne levantou a voz, mas Bart não se importou com o protesto da filha e permaneceu sério e irredutível em sua decisão. Após presenciar o ataque repentino de raiva da filha, Nan fez uma expressão de surpresa e sorriu maliciosamente para ela.

            Nan: Ok, acho que entendi… parece que a Srta. Blake tem um encontro e não quer ninguém por perto para vigiá-la.

            A revelação de Nan apenas piorou o humor de Bart, e ele continuou olhando de maneira séria para a filha. Daisy ficou indignada e protestou.

            Daisy: Ah, não, eu não acredito! O Fred Jones te chamou para sair?

            Daphne: O quê? Não! Claro que não! Você enlouqueceu? Não é um encontro!

            Daisy: Então, quem é? Me fala! Eu conheço? Fala, eu quero saber!

            Daphne: NÃO É UM ENCONTRO! Eu vou… ao shopping! Pelo amor de Deus, eu tenho 21 anos, eu não posso simplesmente querer ir ao shopping sozinha?

            Daphne corou e gaguejou ao dar suas explicações, e isso não convenceu Nan e Daisy, que se olharam, riram dela e se convenceram de que Daphne ia a um encontro. Bart demonstrou sua reprovação cruzando os braços, e mantendo sua expressão séria. Para provocar o marido, Nan incentivou a filha.

            Nan: Ok, sem mais perguntas. Bom encontro. Leve um casaco, a noite será congelante. Não beba nada. E não faça nada que eu não faria.

            Nan se levantou e beijou o rosto da filha, enquanto Bart olhou incrédulo para a esposa que desafiava a sua decisão.

            Daphne: Definitivamente, eu não farei nada do que você faria, mamãe!

            Nan riu e Bart permaneceu contrariado, de braços cruzados, enquanto a filha disse “tchau, papai” e beijou seu rosto.

            Daisy: Por favor, não poste nenhuma foto dessa vez. Você vai assustar ele.

            Nan e Daisy riram, enquanto Daphne revirou os olhos e saiu. Bart suspirou, pegou o celular e iniciou uma chamada. Imediatamente, Nan arrancou o celular da mão do marido, encerrou a ligação e o censurou.

            Nan: Bartholomew Blake, não se atreva a vigiá-la! Deixe a sua filha em paz!

            Riverdale, 7:30pm

            As mãos de Daphne tremiam quando ela estacionou a alguns metros da casa abandonada de James Arthur. Mesmo sabendo que a casa não estava mais sendo vigiada pela polícia, ela estava nervosa por estar ali – e por saber que o que ela iria fazer era errado. Ao deixar o carro, ela seguiu um caminho longe do alcance das câmeras, e entrou na garagem da casa rapidamente, por uma porta lateral. Daphne se arrependeu de sua decisão imediatamente. O cenário sujo e decadente daquele lugar lhe fez sentir desespero, e a possibilidade de encontrar aranhas, ratos e baratas causou um arrepio em suas costas.  Mesmo assim, ela reuniu coragem e avançou, usando a lanterna de seu celular como guia. Poucos passos adiante, ela encontrou a famosa mancha no assoalho, em forma de caracol e cheia de pequenas formas geométricas curiosas. Daphne se abaixou para ver de perto e tocou a madeira queimada, e percebeu que o local onde a mancha estava não havia sido consumido, apesar de ter um aspecto de queimado. Ela analisou minuciosamente cada pedaço da mancha, e tirou algumas fotos de tudo o que viu.

             No momento em que ela fotografava uma das partes da mancha, ela notou um objeto branco no vão entre duas tábuas de madeira. Ao se aproximar, ela percebeu que havia algo maciço, envolto em um tecido sujo, embaixo do assoalho manchado. Daphne procurou ao redor alguma ferramenta que pudesse ajudá-la a tirar a tábua de madeira. Ela tentou usar várias ferramentas que encontrou, mas nunca tinha força o suficiente para retirar o assoalho. Após várias tentativas, ela encontrou um pé de cabra pendurado na parede da garagem, e usando ele com muita força, ela conseguiu soltar os pregos que prendiam a madeira podre do assoalho. Daphne, então, usou o mesmo pé de cabra para mover a tábua cheia de pregos para o lado, de maneira devagar, temendo que algum inseto asqueroso saísse de lá de baixo. Com muito nojo, ela rapidamente enfiou a mão no vão e retirou o objeto usando a ponta dos dedos. Ao desembrulhar o objeto de um tecido bege, Daphne verificou que se tratava de um livro velho e amarelado, chamado “Numerologia Cabalística”, do autor Frank Melker.

            Curiosa, a garota ajeitou seu casaco em cima da mancha, sentou-se no chão e folheou o livro por alguns instantes. As primeiras páginas que viu eram de texto, mas no meio do livro, havia páginas somente com números. Inexplicavelmente, Daphne sentiu náuseas e um mal estar muito grande ao olhar para tantos números, e eles pareciam se mover diante de seus olhos. Após avançar várias páginas, ela encontrou desenhos de estruturas muito parecidas com as manchas em assoalhos que ela viu nas fotos. Nesse momento, ela viu uma gota vermelha cair no livro, e ao tocar o próprio nariz, ela percebeu que ele estava sangrando. Assustada, Daphne largou o livro e tentou estancar o sangramento com as mãos. Porém, ao olhar para a sua frente, ela viu um homem velho, de cabelos totalmente brancos, olhando fixamente para ela. Ele era bastante magro, tinha um aspecto assustador e pálido, usava uma roupa bastante antiga e tinha os olhos estranhamente brilhantes, como olhos de animais iluminados por uma fonte de luz. Daphne se assustou com o que viu e gritou de medo. Ao tentar se levantar de maneira rápida, ela apoiou um dos braços na madeira cheia de pregos e se cortou profundamente. A imensa dor a fez gritar mais uma vez, e no mesmo momento, ela se levantou e estancou o sangramento do corte com o tecido de sua blusa, pressionando braço contra o peito. Ao olhar ao redor, ela não viu mais o velho, mas ela sentiu tanto medo que desejou sair imediatamente daquele lugar. Em pânico, ela chutou a tábua de madeira até o seu lugar original e fechou o vão do assoalho. Em seguida, ela enrolou o livro e o tecido em seu casaco e correu de volta para o seu carro.

            Quando o braço e o nariz finalmente pararam de sangrar, Daphne ligou o carro e acelerou. Poucos quarteirões depois, ela sentiu o sangue escorrer novamente pelo braço e pelo rosto, e teve que parar o carro mais uma vez para estancar os sangramentos. Após três tentativas de voltar para casa, ela se convenceu de que havia algo de errado acontecendo com ela e desistiu. Além do sangramento, a dor de cabeça aumentou violentamente, então,  ela parou o carro e começou a chorar, por não saber o que fazer. Ela não podia chegar em casa sangrando, seus pais fariam tantas perguntas que ela não saberia como responder. E ao tentar responder, certamente ela acabaria dizendo algo comprometedor. Ela também não podia ir ao shopping naquele estado, para comprar roupas limpas. As pessoas certamente a reconheceriam e inventariam hipóteses e boatos sobre o que viram.  Após pensar em todas as consequências, Daphne decidiu que a melhor opção era ir ao hospital, cuidar dos ferimentos, e depois que parasse de sangrar, ela compraria roupas novas no shopping e voltaria para casa. Por sorte, seus pais sequer notariam que ela estava usando roupas diferentes.

            Com imensa dificuldade, ela dirigiu até o hospital Darrow em Crystal Cove, e ao estacionar o carro, ela notou que estava coberta de sangue. Em choque, ela rapidamente colocou o casaco com o livro dentro da bolsa e desceu do carro. Enquanto caminhava até a emergência, ela sentia suas forças diminuírem, e o sangramento parecia aumentar. Antes de perder totalmente os sentidos e desmaiar, ela ouviu uma voz familiar chamar o seu nome.

            Fred: Daphne!


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