Margaery Tyrell: A Rosa Dourada de Highgarden 🌹 escrita por Pedroofthrones


CapĂ­tulo 24
A Nova Rainha




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A mãe de Elinor, Lia Serry, a ajudava a amarrar seu vestido. O tecido era de samito verde, com renda dourada. Era uma vestimenta mais madura — afinal, Elinor era agora uma mulher crescida —, com um longo corte em forma de “V” que descia até o umbigo. Um painel triangular de renda dourada de Myr escondia o corte profundo. A saia do vestido tinha um corte em “A”, revelando a anágua de seda dourada e perfumada, que fazia um farfalhar conforme Elinor andava. Os ombros do vestido eram almofadados e as mangas tinham boca de sino, tão largas, que quase tocavam o chão; a parte de dentro era forrada com feltro dourado.

Não sentia que usar aquele vestido era certo. Preferia estar envergando um vestido preto, em sinal de luto pelas vidas amadas que ela perdeu: Megga, Alyn, Mace, Garlan, Loras… Ah, tantas vidas, ceifadas pelo Estranho, levadas para longe, muito antes de seu tempo.

— Eu preferia não ir — protestou Elinor para a mãe, que terminava de amarrar as costas do vestido, embora já soubesse a resposta.

— Você sabe que não pode faltar, querida. — Disse sua mãe, dando um último laço no vestido e afagando os ombros da filha. — O casamento real é um evento de grande importância, e a Casa Tyrell não anda bem vista pela Coroa… Pelo menos não como antes, é claro.

Elinor suspirou.

— Mace lutou por Aerys II — lembrou Elinor.

— E foi contra o atual rei, Aegon VI, e morreu por isso — Rebateu Lia Serry, embora de forma gentil — Não podemos dar nenhum passo em falso depois disso.

Derrotada, Elinor assentiu, apesar de detestar estar presente em uma cerimônia tão cruel e depravada; ora, onde já se viu? Aquela dornesa asquerosa iria se casar com aquele que matou vários dos familiares dela, e ela teria de olhar e sorrir? Aquilo era um ultraje! Sentia-se suja só de pensar que teria de participar de tal pantomima.

Ficava feliz de que pelo menos não seguiram a moda da Campina, onde era comum dar presentes a ambos os noivos antes da cerimônia — a ideia de ter lordes disputando quem dava os melhores presentes para Aegon ou para Arianne lhe dava nojo.

Lembrava-se de como Margaery estava feliz enquanto recebia os presentes do dia de seu casamento… Elinor nunca imaginara que ela e a avó estavam prestes a matar o noivo na frente de todos.

Aquilo deixava Elinor em conflito: Joffrey era um rei lindo, mas também era um monstro e merecia morrer por isso; entretanto, violar o direito dos hóspedes era talvez o maior dos pecados, apenas pessoas cruéis como Walder Frey, Tywin Lannister, ou mesmo o próprio Joffrey, seriam capazes de tal coisa… Apenas monstros faziam isso, certo?

Lembrava-se de como fora ver Joffrey morrendo; a expressão de horror em seu rosto, o estalo que sua garganta fazia, lutando para respirar, enquanto suas unhas rasgavam a própria carne…

NĂŁo importava. Olenna estava nas mĂŁos dos deuses agora. Assim como sua neta.

Após se vestir, Elinor pediu para a mãe a ajudar a fazer uma trança no cabelo.

— Não quer deixá-lo solto, filha? — indagou sua mãe, claramente confusa com o pedido da filha. — Tem um cabelo tão bonito…

— Não — insistiu Elinor, incisivamente. Sua mãe assentiu aos pedidos da filha.

Seus belos cachos castanhos foram presos por uma fita dourada com pequenas e douradas pérolas de água doce.

— Você está linda, minha filha! — Disse sua mãe, enquanto levava-a para um espelho de prata martelada e polida.

Ao ver sua imagem prateada, Elinor deu um sorriso fraco. Sabia que sua mãe queria apenas lhe motivar um pouco, mas não sentia-se feliz. Sua garganta tinha um nó, assim como seu pescoço. Só desejava poder sair logo daquele pesadelo.

Vai acabar logo, pensou, depois, poderei ir para casa e ficar lá para sempre. Precisava só ser a donzela obediente por um pouco mais de tempo, após isso, poderia voltar a tentar ajeitar os cacos em sua vida. Ainda era jovem, com muitos anos de vida pela frente, ela podia lidar com uma simples cerimônia. Sim, só mais uma simples cerimônia não lhe faria mal algum.

— Será que depois disso poderemos ir para a casa? — Perguntou, virando-se para encarar a mãe. O cabelo dela estava trançado para cima. Apesar de ainda ter trinta e cinco dias de seu nome, Lia já tinha algumas mechas grisalhas em seu cabelo castanho.

A mĂŁe lhe dirigiu um olhar de pena e ficou quieta por um tempo, como se estivesse a pensar em uma resposta que nĂŁo magoasse a filha.

— Bem, isto dependerá da boa vontade do rei, minha querida.

Aquilo era um não, Elinor bem sabia. Entretanto, já se acostumara, há muito, que tais palavras de aspecto negativo eram raramente faladas em voz alta na corte. Assentiu calmamente.

Seu pai Theodore entregou nos aposentos, junto do irmĂŁo mais novo de Elinor, Luthor. Ambos usavam um belo gibĂŁo verde samito, com renda dourada. Uma rosa dourada estava cozida no ombro direito deles. O pai de Elinor tinha um manto verde preso por uma rosa de ouro.

— Já estão prontas, senhoras? — Perguntou Theodore, dirigindo-se à esposa, visivelmente nervoso. A mãe de Elinor assentiu.

— Sim, marido — Ela o respondeu.

Ele anuiu, indo até a mesa do quarto e pegando uma jarra de vinho.

—Seria prudente beber, meu marido? — indagou Lia, enquanto Theodore vertia o conteúdo da jarra em uma taça de vidro lyseno. — Já irão nos servir no banquete.

Seu marido pousou a jarra na mesa e ergueu a taça.

— Não vou beber muito, fique tranquila — prometeu Theodore, bebericando um pouco da bebida.

Luthor fixou o olhar em Elinor.

— Não vai de cabelos soltos, irmã?

Ela negou com a cabeça.

— Prefiro-os presos. — respondeu.

— Mas, filha — disse sua mãe, voltando a tentar convencê-la a soltar os cachos castanhos —, seus cabelos são tão bonitos e…

— Por acaso o Rei vai se importar tanto assim com como me pareço? — ela indagou, a cólera em sua voz era palpável, mesmo que não aumentasse o tom da fala — que eu saiba, ele vai casar com a princesa dornesa, não comigo; então não acho que mude muita coisa.

— Elinor! — Censurou seu pai.

Sua mãe pareceu chocada com a resposta tão bruta vindo de sua tão educada filha. Depois, seu rosto deu lugar para uma expressão de irritação.

— Pelos deuses, Elinor — censurou Lia —, apenas fiz uma observação! Não existe motivo para ficar tão irritada assim!

Elinor abaixou a cabeça, sentindo-se culpada pela explosão de palavras.

— Desculpe, minha mãe. — Disse, olhando para o chão. — Não quis ser tão rude.

Lia suspirou.

— Entendo que anda passando por momentos difíceis, filha. — Sua mãe lhe disse, afagando sua bochecha. — Mas logo poderemos voltar para a Campina e tentar nos acostumar com essas terríveis mudanças em nossas vidas.

Elinor sorriu. Era um sorriso cansado.

— Infelizmente — disse o pai de Elinor, em tom severo —, nós devemos estar presente para o julgamento de Lady Olenna.

Lia Serry bufou, irritada ao ser lembrada daquilo.

— Sim, lembro-me disso — respondeu. — É um absurdo uma nobre ser julgada por… — Parou, e Elinor a viu respirar fundo. Sua mãe sabia que as palavras eram perigosas. — Bem, que seja julgada com justiça, e que os deuses lhe mostrem piedade. — Terminou.

O pai de Elinor suspirou pesadamente e sentou-se em um pequeno banco sem encosto.

— Quem iria imaginar que chegamos à isto — Ele bebeu mais um gole do vinho. — Os sete reinos nunca estiveram tão caóticos… Creio que nem na Dança dos Dragões ou na primeira rebelião Blackfyre tivemos os reinos tão divididos e devastados.

A mãe de Elinor acenou com a cabeça, concordando com as tristes palavras do marido.

— Tudo irá acabar logo — garantiu o irmão de Elinor, embora ele só devesse estar tentando convencer a si mesmo daquilo. Ela, entretanto, não compartilhava das certezas dele.

— Não vai — respondeu Elinor, convicta de suas preocupações. Ela conhecia, mesmo que só um pouco, a mulher a qual Aegon estava rejeitando para poder casar-se com Arianne. — Daenerys voltará atrás de vingança. Acreditem, ela mesma abalou todas as terras de Essos pelas quais passara, e isso após perder um filho e seu marido. Nada a impedirá de ter o que ela acredita ser dela.

Os pais de Elinor abanaram as cabeças, como se para negar as palavras da filha.

— Daenerys e os rebeldes do Norte irão matar-se uns aos outros antes disso, filha — seu pai assegurou-lhe, fazendo um gesto despreocupado com o braço. — Não mostram ameaça alguma.

Elinor, todavia, não compartilhava de tal confiança.

— Mas, senhor meu pai, o que impede a usurpadora de fazer uma aliança com os nortenhos? — indagou, querendo que eles compreendessem seu ponto de vista. — Afinal, agora eles teriam o mesmo inimigo em comum. — Fe-los lembrar-se — E o Rei do Norte não está casado…

A mĂŁe de Elinor deu uma aguda gargalhada.

— Oh, Elinor! — Ela disse, despreocupada e ainda rindo. — A guerra lhe deixou paranóica demais, criança! O pai do usurpador no Norte ajudou a matar o pai de Daenerys; assim como o pai desta matou o avô dele, junto de seu tio. — Continuou: — E não nos esqueçamos que a tia dele foi sequestrada pelo irmão mais velho de Daenerys.  Eles têm muito sangue derramado entre suas famílias. 

As palavras de sua mĂŁe faziam sentido, mas ela ainda nĂŁo se sentia segura de tudo aquilo.

— Mas… — começou a dizer, antes de ser interrompida pelo irmão.

— Mamãe tem razão, Elinor — Ele endossou as palavras de seus pais — Sansa e Jon, assim como seus aliados, devem detestar os Targaryen tanto quanto eles os odeiam.

— Ainda assim — Ela insistiu — Daenerys tem um exército enorme, mais um dragão; assim que ela terminar com o Norte…

— Terá de lidar com o Vale e o Tridente — interrompeu seu pai, levantando do banco e botando a taça vazia na mesa. — Estes reinos também ajudaram na luta contra o seu pai e irmão; duvido que irão se aliar à filha do rei do louco.

— E se o fizerem? — questionou ela, não entendendo o motivo de seu pai não compartilhar das dúvidas dela. — Com Jon e sua irmã derrubados…

— Ela ainda terá que lidar com os tios de Sansa — Ele a lembrou, um tanto irritado com a insistência da filha — E talvez o marido desta, caso ele ainda esteja vivo até lá. De qualquer forma, Daenerys é claramente insana; de modo que duvido tenha inteligência o bastante para saber que deve se aliar aos seus inimigos, afinal, como um verdadeiro dragão, ela só sabe causar caos. — balançou a cabeça — Não. Nenhum lorde em sã consciência ousaria apoiar Daenerys.

Em outros tempos, talvez Elinor tivesse apenas assentindo ante as palavras de seu pai, mas, ao invés de fazê-lo, o que disse foi:

— Mas, pai, e caso Daenerys venha nos atacar? — Ela indagou de forma insistente. — Que faremos quando isso acontecer? Ela tem um exército enorme, além de um dragão ainda maior que o de Aegon… Pelos Deuses, até onde sabemos, o Dragão Branco voou até ela.

Seu pai balançou a cabeça, fazendo pouco caso de suas palavras.

— Daenerys ainda é apenas uma mulher — Ele disse, como se isso explicasse tudo. — Ela tem as fraquezas de uma mulher; é incapaz de controlar suas emoções e forjar estratégias de guerra. Como ela só tem bárbaros com ela, duvido que algum deles possa auxiliá-la. 

De alguma forma, Elinor sentiu-se enojada com as palavras de seu pai; como se fossem uma ofensa para ela. Sem conseguir controlar-se, disse: 

— Foi assim que ela derrubou as grandes cidades de Essos, reuniu um enorme exército e derrotou o exército no qual você também lutou, papai?

Seu pai  a olhou, surpreso com as palavras dela, depois dirigiu um olhar para a esposa, em busca de ajuda.

— Já chega, Elinor — ordenou Lia — Não é digno para uma dama ficar falando de assuntos de guerra. Este é um assunto para homens, não mulheres. Nós não sabemos lidar com esse tipo de coisa, querida.

Elinor inicialmente irritou, mas logo tentou se acalmar. Sua mĂŁe e o seu pai deviam ter razĂŁo; ela devia estar sĂł amargurada e paranĂłica com os Ăşltimos eventos, sĂł isso. Logo, poderia voltar para Highgarden e tudo aquilo acabaria. Sim, ela logo estaria em paz novamente. SĂł queria voltar a ser feliz.

Sim, voltaria a ser uma jovem feliz e obediente. Despreocupada com a vida.

— Desculpe-me, família — Ela disse — Creio que os últimos tempos me deixaram… perdida.

Seu pai fez um aceno com a cabeça, mostrando que compreendia sua filha.

— Não se preocupe, minha filha — Disse ele, em um tom acolhedor — Logo voltará a ter a sua feliz vida de volta, acredite em mim.

Elinor sorriu:

— Sim, eu gostaria disso. — E gostaria mesmo. Nada lhe agradaria mais do que voltar a brincar nos jardins de Highgarden, colher rosas douradas, perder-se no labirinto, e ficar em barcas do amor no Vago, enquanto ouvia músicas de cavaleiros que resgatavam donzelas indefesas e casavam-se com elas. Lembrar de todas aquelas coisas, faziam o calor voltar ao seu corpo, sentindo júbilo.

— Tenho certeza que sim — seu pai sorriu — Logo você poderá voltar aos campos dourados da Campina e casar-se-á com um belo cavaleiro!

Ouvir aquilo foi como jogar água fria nos sonhos de Elinor.

— Casar? — Ela perguntou, atordoada. — Pai, não, não quero casar-me.

Seu pai franziu o cenho, nĂŁo gostando daquilo.

— Como assim “não”, Elinor? — Ele indagou, desgostoso.

— Filha — disse a mãe dela —, uma mulher precisa casar-se. Você ainda é muito nova, eu sei, mas já está na idade perfeita para um casamento.

Ela balançou a cabeça, como se negasse a realidade dolorosa imposta pelas palavras de seus pais.

— Mamãe, por favor… — Ela implorou — Não quero me casar; ainda estou de luto por Alyn.

Sua mĂŁe deu um olhar compassivo.

— Eu sei, minha querida — Ela disse, tocando no ombro acolchoado da filha —, todavia, o período de luto passará, e você deverá deixar Alyn para trás. É uma moça já bem crescida, Elinor, devia saber que seria assim.

Elinor começou a sentir os olhos arderem, quase como se doessem. Não, não podia chorar. Não poderia parecer uma garotinha fraca.

Ela inspirou, pesadamente, e depois liberou o ar dos pulmões. Era uma dama crescida, não se deixaria levar pelo desespero; sabia que deveria cumprir seu papel como uma futura Lady de Westeros. Forçou um sorriso e aquiesceu as palavras da mãe.

— Tem razão, minha mãe — Disse Elinor, torcendo as pontas de seus lábios para cima, para um amável sorriso. 

 Seus pais assentiram e deram um sorriso. Sua mãe deu o braço para o seu pai, e Elinor fez o mesmo com o seu irmão. Estava na hora de enfrentar mais uma batalha.

Vai acabar logo, disse a si mesma.



As primas de Arianne a ajudavam a se vestir para o seu casamento.

Sua prima Tyene tinha feito um belo vestido branco como marfim, com renda dourada em formato de sóis. Era de cetim, ao invés de seda, pois o inverno estava muito rigoroso. O cabelo preto de Arianne fora lavado com água de rosas do inverno, deixando os cachos tão brilhantes quanto a crina de um cavalo. Um anél com o sol de Dorne foi colocado em seu dedo, enquanto usava um simples anel de ouro vermelho no dedão. O centro de sua testa foi encimado por uma jóia de rubi com topázios.

Em breve, ela sabia, seria uma coroa.

— Esta linda princesa — Disse Tyene, dando uma pulseira de ouro com o formato de uma serpente.

— Obrigada — Disse Arianne, enquanto uma serva ajudava a colocar a manga do vestido.

— Aegon é um homem de sorte — Disse Nym, observando a prima.

Arianne aquiesceu, mas nĂŁo compartilhava do bom humor de nenhuma de suas primas.

A princesa sabia que ser rainha era a maior posição de uma mulher em Westeros — pois os ândalos tinham o estranho costume de não deixarem mulheres como herdeiras —, mas não sentia que era exatamente isso que ela queria. Não queria aquela enorme cadeira de metal retorcida, queria o simples trono de ébano de dorne; não queria um continente vasto e fértil, queria um principado de terras áridas. Ela queria Dorne, queria ser a princesa que iria governar aquele local.

Quando o vestido ficou pronto e as jĂłias foram colocadas, Arianne recostou-se na coluna de madeira de sua cama. Sentia-se sufocada. Cansada.

— Arianne — indagou Tyene—, está tudo bem?

A princesa deu de ombros.

— Quer que lhe afrouxe o vestido? Está muito apertado?

— Eu não sei… Talvez.

Ela lutara tanto pelo direito de governar o principado, agora estava apenas deixando aquilo de lado como se nĂŁo fosse nada? E por que?

Foi para o bem do reino, disse a si mesma.

Mas que mal havia feito Daenerys? Ela estava libertando escravos muito antes de Arianne sequer começar a jogar o jogo dos tronos…

Era por que o ego de Aegon fora ferido por ela ter tido uma amante? Que mal havia nisso? Arianne também já teve amantes, era o direito de uma mulher, qualquer que fosse. Afinal, sabia que Aegon também teria seus gostos íntimos e ela pouca questão fazia de impedi-lo de buscar formas de se satisfazer.

Entretanto, ela não poderia fazer o mesmo; sabia que não poderia ter mais a mesma liberdade de antes. Ser rainha, era a maior posição que uma mulher poderia almejar para si, mas também era a quebra da liberdade. Para Arianne, ser rainha era como desistir de tudo pelo qual lutara.

Daenerys matou seu irmão, uma voz a lembrou. Por que era tão difícil para ela se lembrar disso? Quentyn era o seu irmão, e ela o amava… Ela…

A verdade Ă© que Arianne quase nĂŁo conhecia seu irmĂŁo. Ele era um estranho para ela; se Daenerys realmente o matou ou nĂŁo, era um fato quase inexistente para ela. Indiferente.

Aquilo pareceu tão triste e mesquinho que ela achou que Daemon estava certo sobre ela; talvez ela fosse só uma pessoa ruim…

De repente, ela sentiu um toque em seu ombro, tirando-a de seu transe.

— Está na hora, princesa. — Disse Tyene.

Arianne respirou fundo e assentiu.

— Sim, está na hora. — concordou.

 

Havia uma fileira de liteiras no pátio da Capital; Arianne foi levada para uma enorme liteira dourada, com o símbolo da Casa Martell. Era a liteira que seu pai usava para se locomover nas areias de Dorne.

A liteira que Aegon usaria era feita de ébano, drapeada com panos pretos de renda vermelha. Um enorme dragão feito de ouro vermelho, estava empinado no alto da carruagem, de asas abertas e três cabeças gritando para os céus.

Antes de entrar em sua carruagem, o rei Aegon viu sua futura esposa e deu um sorriso encantador em direção a ela. Arianne retribuiu o gesto com um sorriso parecido. Não poderia dizer que o futuro marido era feio, mas também não era de seu gosto; preferia olhos mais azuis mais claros e cabelo menos claro.

Areo Hotah a ajudou a subir na enorme enorme liteira dourada, onde seu pai também estava. Ele cobria suas deformadas pernas pela gota com belas rendas de Myr. Tyene e Elia também estavam lá.

— Está linda minha filha. — Disse Doran quando Arianne se sentou no assento em frente ao dele.

— Obrigada, meu pai. — Ela disse, dando um sorriso triste.

— Eu mesma fiz o vestido, tio. — Disse Tyene, com orgulho palpável na voz. A prima estava usando um belo vestido branco marfim. Simples e pura.

Doran sorriu e acenou para a prima.

— Lindo, como sempre, minha amada sobrinha. Você sempre teve talento em suas mãos.

Arianne deu um riso abafado, um tanto amargurado.

— De fato, prima, tenho certeza que os deuses devem estar muito satisfeitos com os vossos trabalhos. Assim como aquele seu chefe.

Tyene olhou-a com dĂşvida, analisando as palavras de Arianne. Por fim, ela respondeu, um tanto seca:

— Bem, princesa, creio que você também gosta de como trabalho — olhou para o sol de renda vermelha no peitilho do vestido que Arianne envergava —, afinal, usa-o com orgulho.

Arianne abaixou os olhos e assentiu. A prima tinha razĂŁo; Arianne nĂŁo era uma vĂ­tima dos planos da prima.

Ela ouviu Sor Pato gritar uma ordem e, de repente, a liteira começou a se mover, fazendo todos dentro dela tremerem um pouco com o leve solavanco.

— Arianne, onde está o seu escudo pessoal? — Perguntou Doran — Não o vi desde que cheguei; achei que estaria aqui. Ele não deveria fazer-lhe companhia.

— Ele… — Pensou no que responder. Não poderia apenas falar que ele agora a odiava.

Indo em auxĂ­lio da prima, Tyene tomou a dianteira.

— Daemon estará com seu pai na cerimônia, tio — disse Tyene, de forma simples, como se não fosse nada importante. — Afinal, o bastardo de Graçadivina não poderia fazer companhia a Futura Rainha dos Sete Reinos.

Arianne sorriu para a prima. O laço de amizade entre elas era mais forte que o ódio.

Doran anuiu.

— Sim, eu imaginei — respondeu o pai de Arianne. Deu um sorriso para filha, mas sua expressão era de dor. — Como são estranhos esses ândalos, se sentem ofendidos por um mero bastardo!

Arianne deu um sorriso triste. Sabia que seu pai compreendia a verdade: Daemon outrora fora amante dela, nunca, sob qualquer hipĂłtese, eles poderiam ser vistos juntos novamente.

NĂŁo que fosse acontecer novamente. Daemon agora sentia asco dela e deixara isso bem claro. Agora ela nĂŁo era nada para ele.

Mas a princesa estava acostumada a magoar aqueles em volta dela; afastou Daemon, traiu Daenerys, e seu estĂşpido plano contra o pai serviu apenas para matar Sor Arys e machucar Myrcella.

Ah, pobre Myrcella, sentia falta dela. A doce menina que conheceu em Dorne merecia mais do que morrer por uma doença como aquela que Daenerys e seus malditos soldados trouxeram. A morte daquela garota era culpa dela.

— Daemon sempre foi bom para você — Disse Doran, enquanto atravessavam o portão da fortaleza. Os gritos da multidão aumentavam conforme seguiam em frente. — Sim, ele a amava mais do que tudo.

Arianne abaixou a cabeça e olhou para as mãos juntas no colo, como se fosse uma criança, fingindo não ouvir o que seu pai dizia.

— Uma pena que ele não era nobre — continuou Doran —, eu teria ficado feliz em casar vocês dois, mas ele estava muito abaixo de você…

Será que ele tomou muito leite de papoula? Estava tagarelando muito…

O povo gritava conforme a liteira deles passavam, surpreendentemente, embora alguns olhassem para a caminhada real com desconfiança, muitos outros gritavam com alegria e salva de palmas. 

— Deveria abrir mais as cortinas e saudá-los, Arianne — Disse Doran —, afinal, este é o seu povo agora.

Arianne hesitou, ouvindo os aplausos das pessoas. Como ela poderia saber se iriam reagir bem a ela? Afinal, Dorne nunca se deu bem com o resto dos sete reinos. Além do mais, não tinha certeza nem se Aegon era amado.

Tomando coragem, a futura rainha empurrou as cortinas e observou o mundo lá fora. As pessoas estavam vestindo lã, bem aquecidas contra o frio. Isto, Arianne sabia, era obra do Alto Septão; apesar de fanático, o mendigo supremo se mostrara bem protetor do povo.

Talvez todos tenham luz e trevas dentro de si, pensou.

O povo nas ruas brava “REI AEGON!” e outros “RAINHA ARIANNE!”, para o total espanto da moça. Aquilo era coisa de Lorde Willas e seus parentes da Campina; eles haviam distribuído comida desde que chegaram, os Tyrell trataram de defender a boa imagem “do legítimo rei e sua adorável princesa, que trataram de expulsar os perversos comparsas da Rainha Louca” — Bem, era o que Varys teria informado, prestativamente.

Arianne acreditava que o desaparecimento de Margaery seria um problema, afinal, bem podiam acabar por culpar Aegon por aquilo, assim como a morte de Tommen, ou mesmo de Myrcella…

Entretanto, de acordo com Varys — para variar —, um interessante rumor teria surgido nas ruas e vielas de Porto Real; rumor este, que dizia que a “Cruel filha do Rei Louco” teria matado de forma cruel a antiga e amada rainha, assim como as “pobres crianças inocentes” que ela via como seu obstáculo para obter o trono — E, em algumas versões, Daenerys teria banhado-se no sangue de suas vítimas.

Este, contudo, não era o único múrmurio que se espalhava entre o povo: Daenerys era culpada pela doença, trazendo seu exército de invasores pagãos, e que a ira dos deuses trouxeram o fluxo sangre. Para salvar seu povo, Aegon VI se livrou da Rainha, e baniu seus “malfeitores”. Arianne ainda lembrava-se de, no dia seguinte após o sumiço dos sacerdotes vermelhos, ter visto os soldados dourados da companhia dourada e os coloridos cavaleiros da Fé expulsando as pessoas de Essos da cidade. O povo de Porto Real jogou merda e frutas pobres enquanto eles fugiam, e saudavam os soldados que eles julgavam como seus salvadores.

Os estrangeiros de diversas partes de Essos estavam esparsos, alguns talvez ainda estivessem acampados na Mata do Rei, outros talvez estivessem a caminho do tridente, em busca de sua salvadora. Alguns haviam tentado acampar nas muralhas de Porto Real, mas os arqueiros os expulsaram com flechas em chamas.

Aegon cada vez mais caía nas graças do povo: Ele provara ser o filho de seu pai ao montar um dragão com o nome deste, expulsara os Greyjoy da Campina com relativa facilidade — Ele dissera para Arianne que Euron parecia ter fugido, pois apenas poucos invasores ainda estavam na Campina. Curiosamente, Malora Hightower, a Donzela Louca, que deveria estar em Torralta, sumiu sem deixar pistas —, desbancou a má rainha Lannister, e era apoiado pela fé dos sete.

A bem verdade, enquanto Aegon crescia nas graças do reino, Daenerys andava bem mal falada: diziam que ela usava de antigas artes negras, banhando-se em sangue para parecer tão nova e bela.

— Curiosamente — Disse Varys, certa vez, enquanto informava o Pequeno Conselho sobre como andava o povo pequeno —, um boato que se espalhou é de que Daenerys é infértil, ou, mais precisamente, uma parideira de monstros, e que teria dado a luz a um demônio, meio-homem meio-dragão.

Arianne o olhara com desconfiança ao ouvir aquilo.

— Nem imagino de onde isso tenha surgido. — Ela disse.

Varys deu um risinho abafado.

— Ora, princesa, as pessoas inventam cada coisa!

Enquanto a liteira virava em uma viela, Arianne viu mais pessoas se aglomerarem para saudarem a sua passagem real. Sorrindo e sentindo-se um pouco mais segura, Arianne botou a cabeça um pouco para fora da liteira e esticou o braço, jogando algumas moedas para o povo; alguns pegaram elas no ar e agradeceram, enquanto outros se jogaram no chão, lutando para pegar as moedas de prata e ouro que haviam caído.

Este é meu povo agora, disse a si mesma, devo acostumar-me com eles.

 

— Feche as cortinas — Disse Elinor, irritada com a visão dos plebeus que aplaudiam o usurpador.

— Por qual motivo, filha? — indagou Lia. — Está com frio?

Elinor fixou o olhar nas pessoas que batiam palmas e sorriam nas ruas. Algumas mulheres batiam seus lenços no ar e alguns homens se curvavam e retiravam seus chapéus em um gesto de respeito.

— Não quero ver essa pantomima ridícula — respondeu, afundando-se nas almofadas da liteira e cruzando os braços.

— Filha — seu pai disse —, não gostava de cavalgar com Margaery por estas mesmas ruas?

— Com margaery. — Ela disse — E ela não está aqui agora, então não tenho o que apreciar.

Suspirando, seu pai anuiu e mandou a esposa fechar as belas cortinas rendadas com um aceno da cabeça.

Luthor colocou uma mĂŁo em cima da mĂŁo da irmĂŁ.

— Calma, calma, irmã… — Ele disse, dando tapinhas nas costas de sua mão. — Logo vai poder comer alguns bolos e se acalmar.

Elinor fez um som de desdém com a boca e deu um sorriso torto, mostrando pouco apreço pelas palavras do irmão mais novo. Luthor era só um garoto, não sabia dos perigos verdadeiros da guerra; Elinor passara dias comendo pouco, perdeu amigos e um noivo, e quase perdera a vida, sendo atormentada por terríveis sonhos febris, enquanto enquanto estava esvaindo-se nas próprias fezes. Ele era uma criança.

Para Elinor, o caminho até o grande septo de Baelor pareceu uma eternidade. Aquilo a fez se questionar como a antiga rainha Cersei realmente devia ter os pés sangrando quando chegou na Fortaleza Vermelha.

Era uma pena o povo da cidade nĂŁo ter mais a fĂşria que demonstraram ter naquele dia.

A visĂŁo do enorme e belo Septo de Baelor fez a jovem estremecer. Ali ela fora despida de suas roupas, acusada falsamente de ser uma fornicadora lasciva, e presa em uma cela minĂşscula, onde nĂŁo podia comer quase nada e muito menos dormir.

— Tudo bem, filha? — indagou sua mãe, botando uma mão no ombro almofadado de seu vestido. — Está pálida.

Ela balançou a cabeça, tentando limpar a mente. Forçou um sorriso.

— Estou bem, minha mãe. — Mentiu, sentindo um nó na garganta. Sua cabeça pareceu começar a girar.

 

Quando a liteira parou em frente ao Grande Septo, Arianne respirou fundo, sentindo o nĂł no estĂ´mago voltar a se enroscar. Sentia que logo o seu desjejum iria sair pela boca.

O Rei saiu de sua liteira drapeada primeiro, subindo os degraus para falar com o Alto Septão e entrar. Arianne bisbilhotou e o observou, percebeu que Sor Pato estava com ele, como sempre. O Anão Lannister também, vestindo um belo gibão dourado e de renda de ouro.

A princesa não sabia se gostava da proximidade daqueles dois; Tyrion era um Lannister, indigno de confiança. Claro, ele se voltara contra a própria Casa, mas isso só não o mostraria mais indigno?

E ela não tinha esquecido-se das palavras dele após a morte de Tommen, de que ele buscaria vingança. Havia ódio naquelas palavras, ódio verdadeiro, não fingido.

Quando comentou de seus receios com Obara, porém, esta se mostrou pouco preocupada.

— Ele concordou em matar o garoto — Ela a lembrou — Não creio que se importasse muito com ele.

Talvez a prima estivesse certa e Arianne estivesse apenas sendo boba e paranĂłica. Afinal, eles fizeram tudo que Tyrion pediu: ele agora era mĂŁo do Rei, e Connington, seu maior inimigo na corte, estava agora como regente na Campina. E logo o anĂŁo poderia fazer o que bem quisesse com a irmĂŁ.

Entretanto, Arianne não podia deixar de se lembrar de como ele traira Daenerys e contara sobre o feto monstruoso para Aegon. Ele não era confiável, caso o lado de Aegon pendesse a cair, o anão não pensaria duas vezes antes de o trair.

— Arianne — Tyene disse, quando o rei subiu mais os degraus e entrou no Septo — Podemos entrar agora.

— Certo — Arianne assentiu. Seria levada para um pequeno aposento, onde vestiria o seu manto de donzela (uma grande piada de mal gosto, no seu caso), após isso, iria casar-se com Aegon. Depois disso, seu destino estaria selado.

Doran olhou para os enormes degraus.

— Não gosto da ideia de que me vejam sendo carregado. — Disse o príncipe.

— Areo pode levá-lo numa cadeira, meu príncipe — Arianne sugeriu. — Temos uma para você, eu garanto.

Apesar de parecer desagradado com a ideia, Doran assentiu.

Arianne subiu os degraus, com a pequena Elia atrás dela. Gostaria que Myrcella estivesse ali, a garota era boa para com ela. Tyene também estava lhe fazendo companhia. Os convidados iriam entrar apenas após a noiva.

Ao chegar perto e ficar de frente ao Alto Septão, Arianne se curvou ante a sua imagem. Era estranho para ela, curvar-se para alguém que mais lhe parecia um mendigo.

O Septão não usava qualquer símbolo de poder e riqueza; sua cabeça não era coroada com qualquer espécie de diadema, tendo seu cabelo escuro amarrado para trás. Ao invés das ricas vestes que alguém na posição dele teria o direito de trajar, o Alto Septão envergava uma simples manta de lã branca.

Entretanto, o que mais lhe era feio, eram seus pés: escuros e duros como raízes de árvore. A princesa ouvira, certo dia na corte, que aquele homem, antes de ser o líder da fé dos sete, era apenas um simples septão que vagava pelos sete reinos ajudando o povo — bem, pelo estado de seus pés, era bem fácil de acreditar naquilo, pois claramente já haviam passado por todo o tipo de terreno.

— Princesa — Ele disse, após Arianne se ajoelhar em frente a ele. —, é bom vê-la tão resplandecente no dia de hoje. — Atrás dele, estavam dois filhos do guerreiro, envergando armaduras brilhantes, que mais pareciam prata polida, adornadas com cristais que brilhavam na luz, criando um arco-íris (ou assim seria, caso o sol não estivesse tampado por nuvens cinzas de inverno). O capacete deles eram encimados lindas penas coloridas, como as asas de um pássaro das ilhas do Verão.

— Obrigada, vossa santidade — Ela disse, erguendo-se e alisando as saias do vestido. Por sorte, a neve havia sido retirada antes que eles chegassem. — Tenho certeza de que este será um dia que ficará para a história de Westeros.

O ancião da fé assentiu de forma lenta.

— Deveras, princesa. — Ele aquiesceu as suas palavras. — Hoje é o dia em que finalmente, após tanto tempo, o povo voltará a se sentir seguro, sabendo que os monarcas do trono se importam com as vidas dele.

Arianne anuiu. Pelo menos aquilo era verdade.

— Eu devo dizer — ele continuou a falar — que vossa prima tem falado muito bem de você. — Ele acenou com a cabeça em direção a sua prima Tyene, que fez uma vénia ao ser mencionada.

Arianne sorriu, em agradecimento aos elogios.

— Fico feliz por saber disso, Santidade. Eu e minha prima somos como irmãs.

Ele sorriu.

— Sem dúvida, vossa irmã escapa da marca bastarda de sua natureza — Ele disse — E da lascívia dornesa. Tenho certeza que ela pode guiá-la para o bom caminho dos sete.

Foi difĂ­cil manter o sorriso.

— Bom saber disso, Vossa Santidade. — Disse Arianne, não suportando a presença daquele velho deprimente e sujo. O que a mãe de Myrcella estava a pensar ao armar aquele homem? Aquilo nunca daria certo. — Agora, com vossa permissão, gostaria de entrar para assim prepararmos a cerimônia.

O velho assentiu e deixou Arianne e suas primas passarem por ele.

 

Quando a dornesa entrou, Elinor e outros convidados puderam entrar. Enquanto subia os degraus de mármore, a jovem não podia deixar de olhar para as sete torres do septo. Quando Cersei tramou contra Margaery e suas primas, Elinor acabou por ser presa em uma daquelas torres, onde fora obrigada a comer pão seco e duro e era impedida de ter uma boa noite de sono. Antes daquilo, Elinor amava a bela estrutura de mármore e cristal feita por Baelor; entretanto, após ser injustamente presa e odiada, ela odiava aquele lugar com todas as suas forças.

Apesar do tremor que passou por seu corpo, principalmente nos pés, Elinor manteve a cabeça firme e conseguiu subir os largos degraus de mármore, atravessando os enormes portões duplos do local.

Dentro do septo, Filhos do Guerreiro faziam guardas nos portões, com suas belas armaduras. Olhar para eles também lhe deixava nervosa, pois se lembrava de como eles a agarraram e a levaram para fora do septo da Fortaleza Vermelha, após jurar que elas iriam para a casa. Será que o medo tomaria conta de sua mente e de seu corpo para sempre?

No salão das lâmpadas, lâmpadas chumbadas e coloridas eram erguidas por correntes, parecendo um céu com estrelas coloridas. Septãs acendiam diversas velas e incensos, enquanto alguns septões balançavam seus respectivos turíbulos, espalhando mais fumaça e deixando o lugar mais abafado, tanto quanto estava luminoso, enquanto os convidados adentraram no local. Os Mais Devotos, o Conclave da Fé dos Sete, que elegem o Alto Septão, entraram no salão, usando trapos sujos, ao invés das belas mantas de prata de outrora.. Era estranho, mas todos os septões no septo pareciam mendigos sujos.

Elinor já havia estado naquele salão em diversas vezes: o casamento de Margaery; o funeral de sete dias de Tywin Lannister; o dia em que fora presa pela fé, junto de suas primas; o último dia em que esteve ali, fora no seu julgamento e o de suas primas. Agora, estava ali para ver o casamento de seus inimigos.

Ao pensar em todos aqueles eventos catastróficos, lembrou-se que Eddard Stark fora decapitado pelo falecido Rei Joffrey, nos degraus do Septo, começando assim a Guerra dos Cinco Reis e toda a devastação de Westeros, jogando os Sete Reinos em puro caos. Para um lugar tão belo e sagrado, o Septo de Baelor atraia bastante negatividade.

Enquanto Elinor e sua família andava no imenso local, ela viu como a corte fora tomada por diversos dorneses: dorneses pedregosos, pessoas de pele e cabelos claros, vindos das marcas dornesas, sendo mais parecidos com o resto de Westeros, e usando as mesmas roupas também; arenosos, que tinham a pele oliva e usavam várias roupas de seda e jóias na testa típicas de dorne; e os salgados, que tinham a pele mais escura, parecida com ébano, alguns usavam mais tecido para cobrir o corpo.

Curiosamente, ela notou a falta de um dos principais apoiadores da Casa Martell: a Casa Dayne. A antiga linhagem tinha guerreiros, como o famoso Arthur Dayne. Todos eram conhecidos como “A Espada da Manhã”.

A jovem não conhecia nenhuma daquelas pessoas, apenas pelos símbolos da casa ou pelo rosto, já que viu alguns no casamento da prima — embora a cerimônia não tenha tido nem metade do número de dorneses vindos do principado que a atual.

Ao ver seu primo Willas, junto de  sua avó, a jovem Elinor foi até eles, junto de seus pais. O lorde Tyrell acenou ao vê-la, um tanto tenso. Perto dele, ela viu a prima Alla, com um rosto de pedra e um rico vestido de veludo marrom.

Os votos de casamento iriam ser feitos entre o altar da Mãe e do Pai. Elinor já estivera nessa situação antes, no dia em que Margaery e Joffrey estavam fazendo os votos de amor e juramentos aos deuses. A prima, entretanto, o mataria no mesmo dia, poucas horas depois.

Apesar de ter sido enganada, Elinor sentia saudades da prima e a queria de volta. Entretanto, Margaery estava muito longe de onde ela estava, e poderiam nunca mais se reencontrar.

Sansa. Ela era a culpada por aquilo. Margaery e Elinor, assim como a falecida Megga e a pobre Alla, tinham-na tratado muito bem, dado atenção a ela. A nortenha, por outro lado, se mostrou uma verdadeira ingrata e sequestrou Margaery, levando-a como uma refém, e entregando-a para a morte certa. Nunca perdoaria aquela maldita loba por isso; rezava para que o pai e a mãe estivessem certos e Daenerys a queimasse, juntos dos idiotas dos irmãos dela e todo o seu castelo.

Tyene passou uma corrente pelo pescoço de Arianne e foi fechada, prendendo o manto laranja com um sol vermelho atravessado por uma lança feita de fios de ouro. O símbolo da lança dourada era o brasão original dos Martell, enquanto o sol vermelho fora trazido pela princesa guerreira, Nymeria. Ela mudara para sempre a ordem do reino dornes, transformando-o em um principado, e dando a mulheres como Arianne, o direito de herdar terras por direito próprio. Em Dorne, homem ou mulher, bastardo ou legítimo, todos eram amados. Foi por uma mulher como ela, que Arianne sabia que, mesmo sendo uma mulher, ela era tão capaz quanto um homem. Ela era uma guerreira, ao seu próprio modo.

Ellaria, a amante de seu falecido tio, sorriu enquanto ajeitava o manto.

— Está linda, minha prin… — ela parou, corrigindo-se: — Minha rainha. — Fez uma vénia profunda.

— Obrigada. — Arianne agradeceu, dando um sorriso.

— Aquele Alto Septão parece mais um mendigo — Disse Elia Sand, com a petulância de sempre.

— Quieta, Elia — ordenou Ellaria. — Pelos deuses, tenha mais respeito!

Arianne deu um risinho e se virou para o pai, que estava sentado em uma cadeira. — Estou pronta.

Seu pai acenou. 

— Estou orgulhoso de você, filha — Ele disse, dando um sorriso, enquanto parecia que lágrimas se acumulavam em seus olhos. — Você é o maior motivo de meu orgulho.

Arianne sabia que era aquilo que ela sempre quis ouvir… Mas as palavras apenas a entristeceram, fazendo-a abaixar a cabeça.

Para a surpresa de sua filha, ele colocou as mãos nos braços da mesa e fez força para se virar. Uma veia saltou de seu rosto,por causa do esforço físico.

Obara e Ellaria deram um passo em direção a ele, mas ele as impediu. Areo também iria em seu auxílio, mas o príncipe o parou também.

— Não! — Doran disse, com dificuldade, por causa do esforço que fazia.

— Pai… — Arianne disse, chocada com a atitude do pai.

Quando ele ficou em pé, seu rosto estava vermelho e suado. Ele pegou a mão da filha, com a própria mão repleta de protuberâncias inchadas, causadas pela doença.

— Eu vou acompanhar você, minha rainha — Ele disse, fazendo força para que seus lábios formarem um sorriso e mantê-lo. — Eu estou com você, Arianne. Vou acompanhá-la nesta jornada.

Desta vez, Arianne não conseguiu segurar as lágrimas, que vieram como uma torrente. Foi difícil achar forças para falar.

— Obrigada, meu príncipe. — Foi tudo o que ela conseguiu dizer. — Estou feliz em lhe dar orgulho.

— Ah, filha, você sempre me deu orgulho. Rainha ou não. — Ele piscou, fazendo lágrimas caírem, embora ela não soubesse se era pela dor ou emoção. — Sua mãe estaria orgulhosa se estivesse aqui, assim como seu tio e irmãos. Ah, e até a doce Elia… Me alegra que você esteja casando-se com a última memória que tenho de minha amada irmã.

Não queria ouvir falar dos mortos, tinha que pensar no agora e seguir em frente. Além do mais, seu pai não aguentaria para sempre.

— Vamos, meu pai — Ela disse — Vamos trilhar esta última jornada juntos.

Doran assentiu, segurando o sorriso trêmulo, tentando disfarçar a dor. Sua cabeça balançava um pouco, e suas pesadas e grotescas pernas, gordas pela gota, tremiam.

No caminho até o altar, todos os olhos a observavam, enquanto seu pai a levava até o rei, com extrema dificuldade de andar, respirando pesadamente.

Arianne andou por cima de rosas de inverno — eram quase as únicas que tinham naquele clima frio — que eram jogadas pela sua pequena prima Elia, observando os rosto que a observavam. Reconhecia os amigos de Dorne, como Sylva Santagar, Garin e Andrey Dalt. As pequenas filhas de Ellaria estavam lá, assim como a mãe delas, que saiu pouco antes dela. Procurou por Daemon, e demorou até achá-lo, quase acreditando que ele não teria vindo.

Ele estava bem no fundo da multidĂŁo, parecendo se esconder. Seu rosto era carrancudo, mas seus olhos pareciam magoados. Sem suportar vĂŞ-lo, ela desviou o olhar.

Willas também estava lá, junto de sua avó e primas — a mãe não estava, provavelmente se recusando a participar da cerimônia, embora ela tivesse sido informada de que a pobre viúva estava doente. Duas vezes eles quase se casaram; quando mais nova, ela tentou fugir para Highgarden, na tentativa de casar com ele; e, anos depois, quase se casou com ele e tomou toda a Campina.

Agora, porém, ela estava indo conquistar algo mais importante que o trono Tyrell; o Trono de Ferro, e junto dele, todos os Sete Reinos.

O Rei Aegon estava em pé, entre o altar de adoração da Mãe e do Pai. Ele trajava um lindo gibão preto com renda vermelha, em forma de dragões, e cravejado de rubis. Havia cortes no gibão, revelando o tecido prateado de dentro. O cabelo de prata estava solto, a cabeça era coroada com um diadema de aço valiriano, cravejado com rubis — um presente de Dorne, embora muitos não soubessem que eles tivessem guardado a coroa de Aegon; uma memória do jovem rei Daeron II. Contudo, o que Arianne realmente achava bonito e digno de nota, eram os olhos azuis escuros dele, parecendo quase violeta.

Quando Doran soltou a mĂŁo de Arianne, ele pareceu quase desabar; por sorte, Obara o ajudou a se sentar na cadeira de rodas. Algumas pessoas suspiraram, surpresas e preocupadas, mas, apesar disso, nada de ruim aconteceu.

Fingindo que nada aconteceu, Aegon sorriu e soltou o manto de donzela de Arianne ele mesmo, visto que o pai dela não tinha forças, entregando-o para Obara. Como Trystane permaneceu em Dorne, coube a Tyene passar o manto de noiva para o rei. Devia ser estranho para alguns da Corte ver uma bastarda fazer tal tarefa.

Aegon desdobrou, de forma delicada, o manto preto, revelando o imenso e vermelho dragão com três cabeças cozido nele. O símbolo da Casa Targaryen.

NĂŁo importava o que os inimigos dissessem, Aegon era Targaryen. Ele era do sangue de ValĂ­ria e tudo que sobrara do sangue de Elia.

Arianne e Aegon deram as mĂŁos, se olhando. Era o momento dos votos.

— Com este beijo empenho o meu amor, e o tomo como meu senhor e esposo. — Arianne jurou.

— Com este beijo empenho o meu amor, e a tomo como minha senhora e esposa.

Seus lábios se tocaram, sem amor algum.

O Mendigo Supremo ergueu um cristal, fazendo um arco-Ă­ris pairar sobre eles.

— Aqui, à vista dos deuses e dos homens — disse —, proclamo solenemente que Aegon IV da Casa Targaryen e Arianne da Casa Nymeros Martell são marido e mulher, uma carne, um coração, uma alma, agora e sempre, e maldito seja quem se interpuser entre eles.

O Rei e sua agora entĂŁo Rainha foram banhados pela luz colorida dos sete, unidos em sagrado matrimĂ´nio. Elinor odiava aquela visĂŁo.

O restante da cerimônia passou como um borrão para Arianne, mas foi como um século para Elinor. Votos foram feitos, velas acesas e cânticos foram cantados pela nova rainha. Finalmente, era a rainha de Westeros. Estava feito.

 

Aegon e sua rainha montaram cavalos e cavalgaram um do lado a lado. O povo rugiu de alegria ao ver os dois, e Arianne nĂŁo pode deixar de sorrir.

— Eles a adoram, minha rainha — Disse Aegon, parecendo apreciar a felicidade da esposa.

Arianne sorria, observando todos os rostos alegres que gritavam “ARIANNE! ARIANNE!”, “QUE OS DEUSES SALVEM A NOVA RAINHA!”.

Por um momento, ela sentiu que aquele era o seu povo.



De volta a Fortaleza Vermelha, Arianne retirou o vestido branco e colocou um brocado laranja com renda dourada, que também havia sido feito por sua amada prima Tyene. Não era como as roupas de Dorne, com as quais a princesa estava tão acostumada, pois o clima não era favorável a uma vestimenta leve.

O adorno especial, porém, não era um novo vestido, e sim sua coroa, que foi trazida por um pajem, levada em uma almofada de veludo púrpura com franjas douradas. Tyene tomou o diadema em suas pálidas mãos e colocou com cuidado na cabeça de Arianne.

Um espelho prateado de Myr foi trazido e a Rainha observou o próprio reflexo: seu espesso e lustroso cabelo preto estava encimado por uma coroa de ouro incrustada de pérolas douradas, topázios amarelos, rubis e opalas de fogo. Conforme Arianne movia sua cabeça, o círculo dourado brilhava, refletindo a luz.

— Os ourives que trabalharam nisso fizeram um ótimo trabalho! — Disse Arianne, maravilhada com o metal bem trabalhado. Deveria lembrar de agradecer o Rei por tal presente, era simplesmente esplêndido. — Nunca vi pérolas como esta… E as jóias foram belamente cortadas. 

— Está linda, Majestade — Disse Tyene, fazendo uma reverência. — Aegon é um homem de sorte.

Ao ouvir aquilo, o sorriso de Arianne quase morreu.

— Sim — concordou —, muita sorte…

 

Na sala do trono, foram montados estrados para o grande banquete que estava sendo feito. Elinor preferia ir para o seu quarto — talvez dormir ou chorar, tanto fazia para ela —, mas teria de fazer parte daquela porcaria de banquete dos tolos.

De forma insultante, os dorneses tinham um estrado mais elevado do que os lordes da Campina. Aquilo era um ultraje! Onde já se viu aqueles seres promíscuos terem mais direito do que os Tyrell e os seus vassalos?

Enquanto se dirigia até seu lugar, Elinor congelou ao ouvir uma voz que lhe dava arrepios.

— Uma bela cerimônia, não acha? — Disse Cersei, indo de encontro a Elinor.

A jovem se virou para encará-la, um tanto assustada por reencontrar aquela mulher terrível e que tanto a atormentou. Cersei ainda tinha sua beleza, mas estava um tanto esgotada; os olhos estavam com sombras fundas e pareciam cansados, o cabelo encaracolado e dourado agora era um tanto curto e um tanto prateado, preso por faixas carmesim, em duas tranças grossas. Apesar de tudo, ainda existia força em seu rosto.

Elinor tentou se recompor, nĂŁo querendo demonstrar medo.

— Foi bonita o bastante, creio. — respondeu.

Cersei deu um meio sorriso assustador. Apesar de todas as perdas familiares e ser despojada de poder, aquela mulher ainda era capaz de encher o coração de Elinor de medo.

— De fato, a de meu filho foi muito melhor — Disse Cersei, olhando para o estrado. — Uma pena a sua amada Margaery e aquela velha avó dela terem matado-o.

Se tem algo que elas fizeram de certo, foi acabar com a vida dele, quase disse, mas nĂŁo teve coragem.

Cersei observava as pessoas subindo no estrado.

— Interessante quantas pessoas morreram, não? — comentou Cersei, com os olhos verdes se movendo sutilmente, observando algumas pessoas se sentando em seus respectivos lugares. — Meus filhos, meu pai, Jaime… Ah, é claro, o pai e os irmãos de Margaery… Sim, muitos morreram.

Elinor queria logo sair dali, sentindo-se desconfortável.

— Queiram os deuses que ninguém mais morra.

Cersei sorriu, tremendo um poucos os lábios, como se segurasse uma gargalhada.

— Ah, claro, queiram os deuses que não. — endossou Cersei com um sorriso venenoso, mas o sorriso morreu após ela acompanhar o irmão anão subindo o estrado. — Bem, meus problemas logo estarão acabados, de um jeito, ou de outro.

Elinor franziu o cenho.

— Desculpe? Não entendi.

Cersei a olhou como se tivesse falado alguma bobagem infantil.

— Ah, logo irá entender — Disse Cersei, tocando uma das tranças de Elinor, observando o cabelo escuro dela e a fita clara que o prendia. — Meus problemas acabaram, mas sei que os seus estão só começando, pequena rosa…

Elinor não gostou de como aquilo soou. Irritada, puxou a trança das mãos pálidas da Lannister. A antiga rainha pareceu achar aquilo divertido.

— Vá para com a sua família, filha — Disse Cersei —, apreciem o tempo que ainda tem juntos.

Dando ouvidos Ă s palavras da mulher, Elinor rapidamente deu um giro e saiu de perto daquela mulher asquerosa.

Ao chegar perto do estrado, enquanto seu pai puxava uma cadeira para a mĂŁe dela se sentar, Elinor foi parada mais uma vez.

— É bom vê-la em boa saúde, milady — Disse Lorde Matthis Rowan, sorrindo.

Elinor franziu o cenho.

— Infelizmente, o mesmo não pode ser dito de minha prima, Megga.

O sorriso do homem morreu, ele retirou o papel e o levou para o peito.

— Meus pêsames — Ele disse.

— Tudo bem, ela está com o pai e os deuses agora.

Ele acenou.

— Sim, de fato… — Ele aquiesceu. — De qualquer forma, como eu bem disse, Willas não teve de casar com a princesa dornesa.

Elinor acenou com a cabeça.

— De fato. — Disse secamente.

Enquanto os servos e lordes andavam para todos os cantos, os dois ficaram se olhando, em um silêncio desconfortável.

— Elinor! — Chamou sua mãe.

A filha se virou na direção do grito e acenou com a cabeça. Voltou-se para Sor Matthis.

— Eu devo ir.

Ele anuiu, mas antes mesmo dele o fazer, ela se afastou dele com pressa.

Sentou-se perto dos pais, com o irmão de um lado e a prima Alla do outro. A jovem prima usava um vestido marrom, com um corte revelador nos ombros. O cabelo dela, ao contrário do de Elinor, estava solto. Era possível ver o ódio nos olhos escuros da jovem.

Ao lado da prima, estavam Willas e Olenna.

— Vossa mãe está bem, Milorde?

Willas balançou a cabeça.

— Ainda está mal, prima. — Ele revelou — Mas depois falaremos disso. — Ele sorriu — pode me chamar de Willas ou primo, Elinor.

A jovem assentiu, com um sorriso tĂ­mido.

 

A Rainha e o Rei entraram a cavalo na sala do trono, montando belos cavalos brancos, enquanto pajens corriam e jogavam pétalas no chão onde eles suas montarias iriam passar. Os lordes e Ladies se levantaram dos assentos e começaram a aplaudir, enquanto Aegon descia de sua montaria e ajudava sua nova Rainha risonha a descer da montaria dela.

Apenas Olenna, Elinor, Alla e Daemon Sand não aplaudiram  ou sequer sorriram .

Os pratos eram variados, muitos foram trazidos de Essos e outros de Dorne, visto que a Campina estava totalmente devastada e muito da comida trazida de lá fora dada aos plebeus. Sendo assim, muitos lordes tiveram que comer especiarias picantes e exóticas e vinho azedo. Elinor quase não teve o que comer, preferindo os simples figos e o fraco vinho de caqui. Conforme vários pratos diversificados foram sendo trazidos à mesa, teve de recusar a maioria deles: cobra apimentada, quando lhe serviram alguns pimentões com molho de cobra, cogumelos com cebola e pimentas de dragão picantes.

O odor dos molhos picantes e da fumaça das velas e tochas fez Elinor sentir seus olhos arderem, ela expulsou as lágrimas passando as costas das mãos pelos olhos enquanto fechava as pálpebras.

— Tudo bem, irmã? — Perguntou Luthor.

— É só a fumaça. — respondeu.

— Tente comer algo, querida — Pediu sua mãe.

Elinor aceitou alguns ovos de gaivotas picados, mas teve de tomar muitos copos de água, pois estavam muito picantes. Por fim, ela aceitou uma simples laranja sanguínea.

— A comida de pão e água não parece mais tão ruim assim — comentou Alla, empurrando um prato de bacon com molho de cobra.

— A comida da Capital parece ter decaído bastante pelo que vejo. — Comentou Olenna, torcendo o nariz com o cheiro dos molhos.

Arianne saboreava os belos pratos, feliz por finalmente voltar a comer os pratos que sempre comia em seu principado. Aquilo a lembrava das areias de Dorne, das cavalgadas que faziam pelas dunas, do sol quente batendo contra seu turbante; lembrava-a dos amigos que tinha no principado, das noites ardentes em que Daemon derramava a sua semente nela quando eram mais novos. Arianne sempre iria sentir falta daqueles momentos.

Atrás da mesa onde ela e seu marido estavam, encontrava-se o trono de ferro. Alto e retorcido, com mil lâminas retorcidas formando uma imensa grotesca e monstruosa. Era incrível pensar que muitos morreram para conseguir se sentar naquele trono pontudo e desconfortável.

Daenerys também era uma que tinha sacrificado tudo o que tinha para tomar aquele trono, e acabou sendo traída pelos seus próprios aliados.

Sabia que assim Daenerys soubesse de tudo aquilo, sua fúria seria avassaladora; Arianne só podia rezar para que os deuses fossem bons e protegessem-na da fúria da Mãe dos Dragões.

— Esta linda, minha rainha — Disee Aegon, oferecendo um pouco de vinho dornês para ela do próprio cálice em que bebia. A Princesa — Não, a Rainha, aceitou de forma subserviente e sorridente.

Arianne tentou não ver Sor Daemon durante todo o banquete, mas era um desafio, pois ela queria saber onde ele estava. Queria saber se ele estava bravo ou triste… Ah, como ela queria estar com ele naquele momento. Queria estar em seus braços fortes e se perder no corpo dele. Queria sentir ele dentro dela e sentir seu sentir o calor de sua semente entre as suas pernas de novo.

Por que ela deveria continuar pensando naquele bastardo idiota? Ele a rejeitou, falou coisas cruéis para ela. Não devia nada a ele.

Entretanto, não importa o quanto tentasse, não conseguia parar de pensar nele. Pensar na dor em seus olhos quando percebeu o que ela e suas primas tinham feito… Havia tanta dor naquele olhar, mas até do que ódio. E, o pior de tudo, é que ela sabia que ele tinha motivos para odiá-la.

Com o passar do banquete, músicos vieram, tocando seus alaúdes; flautistas tocavam na galeria, enquanto um cuspidor de fogo lançava chamas pela boca, como se fosse um dragão renascido; encantadores de serpentes assustaram e encantaram diversos lordes e ladies. O rei os ouvia com alegria e os aplaudia, sem mostrar tédio ou cansaço. Arianne se esforçava para fazer o mesmo, embora devesse agradecer ao vinho por deixá-la mais relaxada.

Conforme o dia foi terminando, o sol foi baixando, as nuvens no céu ficaram mais escuras. Mais velas e tochas foram acesas. Espelhos de prata martelada ficavam postos atrás das alabardas de ferro, aumentando o brilho das chamas que tremeluziam.

Quando a hora chegou, o Rei Aegon se levantou de sua cadeira, alto e régio.

— Milordes e Miladies — Anunciou Aegon, fazendo todos ficarem quietos —, chegou a hora de eu e minha amada rainha consumarmos o nosso casamento, unindo, novamente, a Casa Targaryen ao poder, graças a Casa Nymeros Martell.

Um brado foi ouvido, com pessoas batendo os copos contra a mesa, gritando, enquanto flautistas tocavam com notas de pura alegria, e outros homens e mulheres se levantavam de seus assentos para aplaudir.

Elinor ficou sentada, observando todos os familiares, que tanto haviam sofrido nas mĂŁos daquele usurpador e a sua serpente maldita, aplaudindo a ocasiĂŁo.

“PRA CAMA!”, os lordes gritavam, “PRA CAMA!”.

A rainha levantou-se, um tanto tonta. Quando deu por si, os homens foram e ergueram Arianne, que ria, sentindo a cabeça leve pelo vinho, sentindo se flutuar, enquanto eles arrancavam suas vestes, mostrando seu corpo escuro.

— Não rasguem o meu vestido! — Gritou Tyene, enquanto se unia a outras mulheres para levar Aegon até a cama.

Arianne logo se viu com a roupa íntima, uma simples mantilha e algumas anáguas.

— Arianne, Aegon é um homem de sorte! — seu amigo Garin disse, quando um de seus seios ficou exposto.

— Ah, isso eu sei! — Brincou Arianne, sentindo-se leve e alegre, sentindo que não aguentava a gargalhada.

Andrey retirou uma de suas anáguas perfumadas, deixando as pernas expostas.

Conforme as mãos foram largando-a, ela se viu nos braços de um homem forte, que a erguia no ar, como se ela fosse uma mera boneca.

— Está bela, Minha Rainha — Disse Daemon, secamente, enquanto a levava nua pelas escadas.

Ao ouvir a voz dele, seu riso sumiu. A alegria de seu corpo se dissipou e ela cobriu os seios fartos com um braço e a vagina com uma mão, retraindo nos braços do bastrado que outrora fora seu amante, se encolhendo como um gato assustado.

Os homens bradavam atrás deles, correndo para acompanhar.

 — Não tem motivos para esconder nada, minha rainha — Ela percebeu que Daemon também estava um pouco bêbado, pois seu corpo balançava e sua voz estava embargada. —, eu já vi tudo o que tinha de ver.

Ela se irritou com aquilo. Sabia que ele estava fazendo aquilo propositadamente; todos logo iriam comentar o encontro entre a rainha e seu ex-amante.

Quando as escadas terminaram, dirigiram Daemon até uma antecâmara. Do outro lado, estaria Aegon, esperando-a.

Ela empurrou o peito de Daemon e tentou levar as pernas ao chão; entretanto, se desequilibrou e quase caiu, mas ele a segurou por um braço.

— Como ousa? — Ela afastou a mão dele com um tapa. — Nunca mais toque em mim!

Ele deu um olhar magoado para ela, como se ela tivesse batido na mãe dele. Antes que os homens chegassem, ele se dirigiu até a porta aberta. Era possível ouvir os gritos ecoando, ficando cada vez maiores.

— Tenha uma boa noite, minha princesa — Ele disse, chamando-a pelo antigo título, e atravessou a soleira da porta, enquanto os outros homens passavam por ele e a empurravam até a porta que levava para o quarto.

Arianne teve vontade de empurrar aqueles homens e correr até ele, mas deixou a multidão a levar para a cama.

 

— Sua prima bem disse que tem as mãos letais, Tyene — Disse o rei para a bastarda loira que retirava-lhe os calções dele com agilidade.

A jovem riu.

— Eu e a minha prima sempre fomos bem íntimas — ela respondeu, abaixando os calções dele — E sempre compartilhamos tudo.

O Rei deu um largo sorriso ao ouvir aquilo.

— Sempre, é?

Elinor fez uma careta ao ouvir aquilo. Ela retirou a meia capa vermelha dos ombros dele. Nem queria estar ali, desnudando o homem que tanto odiava, mas as ladies da corte simplesmente a empurraram até aquele local.

O rei cada vez mais perdia partes do vestuário, respondendo cada piada lasciva com outro comentário tão baixo quanto. Ele logo estava com o corpo como veio ao mundo, nu. O cabelo prateado ficava caia até os ombros, e o falo estava vigorosamente empinado. Elinor virou a cara com nojo.

— E pensar que Jon queria evitar esta velha tradição — Disse o rei de porcelana, com as bochechas coradas, embora Elinor não soubesse se era pelo vinho, excitação ou os dois.

Logo, as damas empurraram o rei pelado até a cama, aos risos. Os homens ergueram Arianne novamente e a pousaram na cama, ao lado de seu novo marido.

Elinor olhou para a visão dos dois amantes com nojo, antes de fecharem a porta da antecâmara.

Arianne, de repente, sentiu-se um pouco envergonhada, mas tentou nĂŁo transparecer isso. Aegon sorriu, nu, ao seu lado, afastando uma mecha negra de seu cabelo.

— Você é tão linda, Arianne — Ele disse, com um sorriso alegre —, não sabe como fico feliz de ter uma esposa tão esperta e bela ao meu lado. Uma que me ame, me apoie, e em que possa confiar.

Ela sorriu, sem jeito.

— Fico muito feliz em saber disso, vossa graça — Ela disse, um tanto tonta.

Aegon a beijou nos lábios, lambendo a sua boca inteira por dentro, e Arianne sentiu o bafo quente e azedo de hipocraz e vinho dornês em sua boca.

Ele se colocou por cima do corpo de Arianne mantendo os lábios colados no dela, e com a língua lambendo a dela. Arianne o guiou para dentro dela, fechando os olhos e imaginando ser Daemon, e que eles estavam novamente em Dorne, quando eram jovens.

Quando tudo acabou, algum tempo depois, embora a Rainha nĂŁo pudesse ter certeza de quanto tempo, o rei dormia, com um leve roncar, e Arianne sentia sua semente morna entre as perna, junto de uma leve dor nos rins.

— Arianne? — Chamou a pequena Elia, saindo da antecâmara, abrindo a porta com silêncio e segurando um pequeno castiçal com uma vela acesa — Por que está chorando?

Arianne deu uma fungada.

— Não estou chorando. — Ela respondeu. — por que estaria? Sou a rainha agora, tenho tudo o que quero. Rainhas não choram.

O rosto escuro de Elia estava dourado pelo brilho do sol. A chama dançava em seus dois olhos escuros. Ela assentiu e começou a se virar.

— Espere. — Disse Arianne. — Faça-me companhia, prima.

A jovem assentiu e deixou o castiçal em um aparador. Deitou-se numa esteira ao lado da cama real, e ela e Arianne entrelaçaram os braços.

 

Cersei estava sozinha em seus aposentos, com apenas vinho e uma simples vela dando luz ao seu quarto. Era sempre assim agora, desde que perdera todos aqueles a quem amava. Não tinha mais os filhos, o amado irmão, ou mesmo o seu pai para lhe fazer companhia. Estava sem poder também. Estava sozinha.

Um som foi ouvido na escuridão, vindo de seu armário e as portas dele se abriram. Uma figura pequena saiu por ele, bamboleando nas sombras. Quando chegou perto da luz, Cersei pode reconhecer o rosto horrendo do irmão; sem nariz, com uma enorme cicatriz no rosto, olhos desiguais, cabelos loiros, quase brancos, e barba negra e retorcida.

— Olá, doce irmã. — Ele disse, numa carranca que ela suspeitava que deveria ser um sorriso.

Cersei já sabia que isso iria acontecer. O irmão finalmente a tinha despojado de poder e amor, e ela havia tido sua humilhação final naquele dia, vendo a Rainha mais nova tomar seu lugar.

Já havia estado naquele lugar antes, quando a tia daquela fedorenta havia roubado seu lugar ao lado de Rhaegar. Agora, o filho de Elia tinha vingado a morte da mãe e a sobrinha dela tinha tomado seu lugar. Era uma pena que o pai não tivesse feito Elia sofrer mais antes de morrer.

Mas Cersei, apesar de ainda odiar a nova rainha, não poderia dizer que tinha inveja dela. Já esteve em seu lugar antes; quando era bela, jovem, e amada por todos. Arianne iria aproveitar isso, sentindo-se vitoriosa e amada, que a sua linhagem iria perdurar por Eras. Que ela teria lindos príncipes e princesas, e tudo seria motivo para torneios e festejos…

Aquilo era tão tolo que Cersei bem poderia rir dela, ou chorar por ela. Arianne poderia ter o júbilo de usar uma coroa por agora, mas logo o biles iria alcançar a sua vida.

— Chegou tarde, irmão. — Disse Cersei, tomando um gole de vinho. Tentou saborear o gosto o máximo que pudesse, pois sabia que seria o último. — Obrigada por ainda me permitir tomar vinho dourado de Arbor.

Tyrion assentiu e pegou a jarra.

— Ora, nem eu sou tão mal. — Ele disse, enchendo a própria taça. — Brindemos! A minha grande vitória!

Cersei ergueu a taça.

— A sua saúde — Ela virou a taça uma última vez, saboreando o doce gosto da bebida.

Ele bebeu um gole e depois perguntou:

— Acha que Jaime está vivo?

Cersei balançou a cabeça, respondendo que não.

— Não. — Disse, enfaticamente. —Eu já não o sinto. Fora que ele teria vindo me salvar.

O feio anĂŁo a olhou por um tempo, estudando-a com olhos desiguais, antes de assentir suspirando.

— Uma pena — Ele disse —, queria fazê-lo sofrer também.

Cersei fez uma expressĂŁo amarga.

— Bem, eu acho que todos nós temos as nossas decepções na vida. — Ela disse — Você foi uma, por exemplo.

Tyrion torceu a boca, irritado.

— O sentimento é mútuo e verdadeiro, irmã. — Depois ele deu um sorriso asqueroso. — Bem, pelo menos eu ganhei no final; Rochedo Casterly é meu agora, assim como o cargo de Mão do Rei. — Ele tocou as mãos de ouro, orgulhosamente.

Cersei deu um risinho.

— Oh, aproveite, Tyrion — Ela disse, de uma forma doce, mas venenosa. — Não vai durar.

Ele nĂŁo tirou o sorriso do rosto.

— Inveja não lhe cai bem, irmã — Ele disse, inabalável.

Cersei riu.

— Ah, você sabe que essa sua farsa de pantomineiro logo vai acabar — Ela disse. — E você está errado, querido irmão, fui eu quem ganhei. Eu vi isso hoje, no olhar amedrontado de uma das estúpidas primas de Margaery. Eu sempre estarei na vida daquela medrosa, atormentando-a, assim como na vida de suas primas, assim com Sansa, e com você, querido irmão. — Continuou: — Eu sempre estarei lá, afetando vocês. Nunca vão conseguir se livrar de mim.

Furioso, Tyrion saltou da cadeira e agarrou o rosto de Cersei, apertando-o e xingando-a. Ela bateu nele, tentando afastá-lo, mas ele puxava seu cabelo trançado, fazendo-a gritar.

A cadeira de Cersei caiu, levando ela junto. Tyrion nĂŁo largava seu rosto. Ela sentiu o chĂŁo bater contra o lado de seu rosto.

Tyrion chutou a barriga dela, fazendo-a perder o fôlego. A jarra de vinho havia caído no chão e se espatifado em vários cacos, o líquido dourado se espalhava pelo chão. Tyrion ergueu-se, observando Cersei tossir e tentar recuperar o ar. Estava tonta, mas ainda tentava se afastar, esticando o braço nos chão e se puxando para longe do irmão, mas sabia que era inútil. A trança havia sido desfeita pelos puxões do irmão, cobrindo o rosto dela e tapando a sua visão.

Ela ouviu seu irmão caminhar atrás dela, mas antes que pudesse fazer algo, sentiu algo duro e frio apertando o seu pescoço. Ela tentou recuperar o fôlego, mas não conseguia engolir o ar e mandá-los para os pulmões. Tentou quebrar o que quer fosse que estivesse lhe sufocando, mas não conseguia puxar, por mais que tentasse. Foi então que o tato de seus dedos energéticos e desesperados a fizeram perceber que ele estava usando a corrente de mãos de ouro, cortando a carne pálida de sua garganta, conforme seu irmão a apertava.

E quando suas lágrimas te afogarem, o valonqar deve envolver as mãos sobre sua garganta pálida e sufoca-la até a morte.

Cersei esticou os braços, tentando bater e afastar o irmão, mas era inútil. Enquanto tudo ficava escuro, lágrimas brotavam de seus olhos. Tyrion apertava a corrente, fazendo a garganta dela apertar mais e sangrar. Ele apertou mais uma vez…

 


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