Up all night I won't quit escrita por Arin Derano


Capítulo 2
[MIYEST] - Capítulo 2




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Quando voltei para casa, apenas meu pai me esperava. Ele estava desapontado comigo, e com razão. Me explicou o porquê de ter aceitado a proposta do meu futuro esposo, e que estava disposto a fazer de tudo para me ver bem, mesmo que eu tivesse que morar longe dele.

Sou um Sardjoe, e mesmo que me machuque, estou disposto a fazer quem eu amo ser feliz e seguir em frente, e você também é um Es.”

Me doeu vê-lo dizer isso, mas sabia que ele estava fazendo o que achava ser melhor para mim, e eu não tinha muita escolha. Eu também só queria ver meu pai feliz, e todas as coisas que imaginávamos do nosso futuro junto como família foi antes do papa falecer, Soerin ir embora e nossas cabras começarem a morrer.

Eu tinha me decidido. Iria com o sr. Frenn para o norte no pôr do sol de amanhã. Deixaria toda minha vida para trás para começar uma nova e ser uma Sardjoe.

Ou melhor, uma Frenn, dali em diante.

No dia seguinte, improvisei uma bolsa para levar alguns dos meus pertences, para ter pelo menos algumas coisas que lembravam meus pais e irmão antes de ir. A bolsa que papa usava para levar ervas e chás em suas aventuras, um anel de citrino que pai me dera quando completei quinze anos, e uma pelúcia de coelho surrada que eu e Soerin dividíamos – brigávamos – para dormir com ela quando éramos crianças.

Parecia um tempo tão distante, e ainda sim conseguia sentir o cheiro de chá preto com mel que papa preparava para todos nós antes de sair e de quando bagunçava nossos cabelos e a trança que pai tinha acabado de fazer em mim. Eles fingiam brigar, se beijavam e papa saía para ajudar as pessoas e os animais.

Sinto tanta sua falta. Ele poderia nos ajudar agora.

Enxuguei as poucas lágrimas que caíram do rosto. Não iria chorar hoje, tinha prometido para mim mesma. Era um novo começo.

Lembrei da caixinha que guardava embaixo da cama. Continha alguns trocados, que eu juntava para comprar um potro, um sonho antigo meu e de Soerin. Quando se casou, usou o dinheiro que tinha guardado para comprar uma joia para a esposa. Eu poderia usar o meu para comprar algo para meu pai antes de ir.

Ordenhei as cabras e avisei meu pai que iria para o centro da vila. Levei os dois recipientes com os leites para vender ou trocar e procurar um presente. Analisei com cuidado artesanatos, pinturas, comidas, vestimentas que meu pai poderia gostar. Passei por uma das barracas de tecidos, e recordei de quando meu pai e eu passamos por ali semanas atrás e ele gostou de um dos lenços de caxemira.

Me aproximei da barraca, e o senhor que vendia aceitou trocar os dois leites e minhas moedas pelo lenço. Tive de dar todas elas, e o pensamento de que eu podia usar elas para comprar comida se passou pela minha mente. Pode ser que lhe dar um lenço não seria tão importante quanto comida para a situação que a gente estava.

Porém eu nunca tinha dado nenhum presente para meu pai, além de flores que eu encontrava na floresta e restos de pão doce. Eu podia dar algo a ele que fosse realmente especial.

Cheguei em casa e encontrei meu pai em meu quarto, em silêncio. Ele estava... nostálgico.

Conversamos, lhe dei o lenço e ele logo vestiu, e relembramos das piadas que fazíamos quando eu era menor, das histórias fantásticas que contava para mim e Soerin antes de dormirmos, da história de quando conheceu o papa e como essa é a história mais linda e pura de amor que já vi, de como eu queria poder viver um romance assim. Nos abraçamos, e ele sussurrou:

— Sei que seja qual for a escolha que tomar, será a que te fará mais feliz.

Deixei que as lágrimas caíssem, e ele as enxugou com o polegar. Ele me olhava com um olhar peculiar, com orgulho e... saudade, como se tivesse certeza que a partir do momento que eu partisse, eu não voltaria.

— Vou sentir sua falta, pai.

— Eu também, Es — ele me segurou nos ombros e me olhou nos olhos, também marejados — Cuida da garotinha que sempre gostou de folhas e cavalos para mim, está bem?

— Claro. Eu prometo.

Nos abraçamos mais uma vez, e imaginamos que fosse apenas mais um dia normal. Cuidamos das cabras e da casa e esperamos o fim do dia chegar.

Sr. Frenn chegou com uma carruagem majestosa, com dois alazões e as rodas custando mais do que todo o dinheiro que eu poderia ganhar trabalhando na vila. Ele desceu da carruagem e conversou com meu pai enquanto eu me instalava no veículo. Aquela seria minha vida dali em diante. O cocheiro me auxiliou a subir e conversamos rapidamente sobre os cavalos, tempo suficiente até meu futuro marido subir na carruagem e se sentar ao meu lado. Meu pai me olhava da pequena janela que tinha, com um sorriso de despedida. Eu acenei de volta para ele, e ouvi o cocheiro batendo com os chicotes nos cavalos, o som das ferraduras começando a bater no chão e meu pai sumindo de vista.

Olhei o mais para trás que consegui, e apenas vi uma parte de seu lenço adentrando minha antiga casa.

A partir dali aquela não seria mais minha casa.

— Ansiosa, meu bem? — ele passou o braço por trás de mim e me puxou para mais perto — Um banquete te espera em meu castelo. Você nunca mais passará fome ou necessidade. Terá tudo que quiser comigo, o que acha?

Não tínhamos conversado muito, mas cada palavra que ele me dizia me deixava mais desconfortável e com náuseas.

Eu não queria isso. Eu nunca quis isso.

Deixei que ele falasse enquanto eu fingia que escutava por boa parte do caminho, com os cascos dos cavalos ecoando ao fundo. Observei a floresta que conheci por tanto tempo passando pela janela, e por um breve momento pude ver uma parte do castelo que visitei no dia anterior.

Eu não sei explicar como ter visto um castelo de uma garota que mal conheci me deixaria tão esperançosa. Era minha última e única chance.

— Podemos parar? Não me sinto muito bem. — Eu disse com cuidado, como se estivesse prestes a vomitar.

— Tem certeza, querida?

— Agora! — mandei, e o cocheiro imediatamente parou. O som dos cascos dos cavalos ainda ecoando na minha cabeça. Ele abriu a porta da carruagem, e eu corri para detrás de uma árvore. Me agachei e fingi estar regurgitando a bile do estômago. Eu cuspia e até fingia chorar, como se fosse terrível, o fim do meu mundo ele estar me vendo nessa situação.

— Está bem, querida? Quando chegarmos posso te levar para a enfermaria!

— Está sim, só preciso de um tempo — gritei de volta.

Pude escutar mais cavalos se aproximando, deviam ser os bardos que tocavam na vila toda semana. Aproveitei o barulho e corri floresta adentro, sem nem olhar para trás.

Corri até que minhas pernas amortecessem, até que a força do vento contra meu rosto me deixasse sem ar, até que a trança que meu pai tinha feito no meu cabelo se desmanchasse.

Quando a visão do castelo se abriu por completo, me apoiei nos joelhos para descansar por um momento. Observei meu anelar esquerdo vazio, sem nenhum sinal de aliança.

E ri. Era tão bom ter me livrado disso. Meu pai ficaria decepcionado, mas poderíamos encontrar outra pessoa com mais calma, a gente conseguiria.

E presumo que Kimura pudesse ajudar.

Bati com as alças na porta de madeira novamente antes de abrir a porta. Me perguntei como ela conseguia deixar as portas destrancadas em um castelo tão grande e vivendo sozinha...

— Kimura! — chamei. Sem resposta.

Segui o caminho até a biblioteca, e a encontrei escrevendo algo em um livro em uma das poltronas dali.

— Não achei que voltaria tão rápido — comentou, os olhos ainda presos no que quer que estivesse escrevendo.

— Olá. Eu preciso da sua ajuda — pedi, e os olhos violeta se voltaram para mim. — Tem um homem que vai procurar por mim, e pelo meu pai, e achei que você pudesse nos ajudar.

Ela olhou fundo nos meus olhos, como se procurasse por algo neles. Fechou seu livro e deixou ele e o pincel em uma das mesas de apoio e se aproximou.

— E o que te fez pensar que eu iria ajudar?

— Bem, você tem um castelo sinistro só para você no meio da floresta. Sem ofensas, mas... Você não é uma bruxa? — perguntei, tensa.

Ela piscou, e em seguida riu.

— Uma bruxa... — ela repetiu e recuperou o fôlego. Eu a olhava atônita. — Ah, Sardjoe. Você é ingênua, gosto disso em você.

— Mas... mas vai me ajudar, não é?

— Não posso. E mesmo que eu fosse uma bruxa, também não poderia.

— Por favor. Você deve conhecer alguém, alguma coisa que me ajudaria a manter ele longe de mim e do meu pai — implorei.

— O que eu ganharia com isso? — ela mantinha os braços cruzados, com uma expressão indecifrável.

— Eu... poderia limpar seu castelo! Do lustre ao chão. Poderia te trazer as melhores coisas da vila, comidas... Ser a sua serva! Qualquer coisa.

Suas sobrancelhas arquearam. Ela parecia considerar minha proposta.

— Está bem, mas com uma condição: terá que morar aqui.

Minha respiração falhou por um segundo. Algo me dizia para não aceitar... mas com certeza era uma proposta melhor que a que eu tinha mais cedo.

— Eu poderia visitar meu pai?

— Bom, você não estava indo com esse homem? Se seu pai descobrir que não está com ele, vai se chatear. Depois de alguns meses, você pode ir visitá-lo.

Ela tinha razão. Não poderia voltar imediatamente para ver meu pai. Eu teria que manter a mentira por um tempo.

— Tudo bem. Fechado.

Ela abriu um sorriso e pude notar dois de seus dentes levemente mais afiados que o normal.

Percebi que não tinha contado a ela sobre estar indo com o sr. Frenn e minha situação com ele. Como ela sabia dessas coisas?


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