Um Reino de Monstros Vol. 4 escrita por Caliel Alves


Capítulo 6
Capítulo 1: Sobre paz e guerras - Parte 5




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O silêncio só foi cortado pelo cínico sorriso da gatuna.

— Hihihihihi, deu ruim, pai.

O trio recém-chegado continuou o seu avanço, encabeçando a marcha, um velho com ataduras no ombro esquerdo. Estava seminu da cintura para cima e caminhava amparado pelo príncipe Rachid al Názir.

O sultão mudou de cor, ele não esperava que a situação ganhasse aquele rumo.

Mas como, por Al Q’enba, como pode ser isso? O que vejo a minha frente, um fantasma?

— Acha que o meu deus me deixaria morrer assim nas mãos do inimigo?

— Não compreendo, como sobreviveu, meu caro Amir?

— Esse nobre conjurador realizou uma Cura Divina em mim, caso contrário, teria deitado ao pó ontem mesmo... agora, vamos ao que é de interesse público, essa jovem é inocente.

E como o conjurador havia falado, todos prestaram uma reverência quando ele começou a falar sobre a sua tentativa de assassinato.

***

Era tarde da noite, os corredores estavam escuros e mal iluminados devido ao fim da queima do azeite. Só alguns guardas circulavam pelo palácio.

Rosicler andava de modo tão devagar que ninguém a ouviria. Com as suas habilidades, ela conseguia se esconder nos lugares mais impossíveis, despistando os guardas.

Até que algo chamou a sua atenção. Era um vulto preto, disforme. Ele caminhava rapidamente pelos corredores de pedra. Era suspeito, suspeito demais para uma ladra. Ela saíra com o objetivo de entender o mapa do castelo, uma simples saída de observação, voltaria antes de alguém perceber.

Mas, aquele estranho, parecia conhecido, e o estranho amorfo, passou a ser reconhecido como um döppelganger.

— Pare aí mesmo!

Ela ordenou, mas ao invés de obedecer, ele empreendeu uma fuga. Rosicler tentou acompanhá-lo, mas ele parecia ser mais rápido. O coração dela ficou sobressaltado, ele portava uma lâmina na mão, provavelmente mataria alguém e a culparia por isso.

Virando uma esquina no corredor, ele sumira. Ledo engano, a facada não a acertou, mas foi suficiente para desnorteá-la, tempo suficiente para que ele sumisse de suas vistas mais uma vez.

— Argh, desgraçado, você não vai escapar da mamãe aqui...

Ergueu-se num salto, tomou o seu punhal na mão e continuou a perseguição. Atravessou o longo corredor e deu num quarto com a porta aberta. E da porta, sem tempo para raciocinar, ela agiu. Lançou o seu punhal e desviou da faca do inimigo.

A faca atingiu o ombro de Amir Ibin-Sawad que ainda dormia. E após um breve despertar com um grito estertorante, desfaleceu de dor. A faca se cravara profundo em seu ombro. Sangue escorria como uma cascata.

— O que vai fazer agora, Rosicler?

— O que eu deveria ter feito a muito tempo, capitão Fethc! Eu vou acabar com você...

— O seu irmão Reinaldo Cochrane ficaria decepcionado em você ter caído tão facilmente em minha armadilha.

— Onde ele está agora?

— No mesmo lugar de sempre: na Fortaleza do Crepúsculo, esperando o dia em que você vai retornar. Não se preocupe, mandarei lembranças suas.

— Ora, seu desgraçado, Chuva de Facas.

O döppelganger saltou pela janela. Algumas das facas acertou as suas costas, derramando um sangue de cor purpúreo pelo quarto.

Rosicler tomou o seu punhal na mão, e quando se dirigiu para a janela, Fethc havia sumido. A gatuna sentiu o vento frio da noite oasiana e percebeu que algo ainda pior acontecia, um incêndio devastava o estábulo real.

Não teve tempo de entender melhor a situação, alguém puxara os seus cabelos violentamente. Caiu no chão, o punhal foi chutado. Cerca de três homens vestidos de preto dos pés à cabeça a encaravam.

O que parecia ser o mais jovem dentre eles, abaixou-se, ficando o mais próximo do rosto dela, e disse com um tom severo:

— Você achou que poderia entrar aqui no castelo do nosso adail e profanar as terras oasianas com o sangue de nosso conjurador? Que Al Q’enba tenha piedade de você.

Ela tentou evadir, mas ele segurou tão forte em sua garanta que ela não teve mais forças, desmaiou. Rosicler era inteligente demais para saber que o seu fim estava contado.

***

Todos estavam admirados com o relato do conjurador oasiano. O sultão nem sabia como articular as palavras.

— Essa história não faz sentido algum. Então o culpado da sua tentativa de assassinato não é a ladra, mas sim um döppelganger! Perdoe-me, meu venerável Amir, temos um relatório do nosso serviço de inteligência. Ela foi pega no ato, temos testemunhas e tudo o mais.

— Então a julgue pelo sangue, meu adail.

— Não é possível, lembre-se que em termos de justiça eu sou a instância máxima e...

— Quanta insolência, criatura humana...

Os olhos do conjurador brilharam por debaixo das bandagens em seus olhos. A cicatriz no ombro desapareceu completamente. Todos se prostraram no chão. A voz que ecoava na sala de julgamento não era mais a de Amir, e sim a do deus da Justiça e Educação.

— ... essa é a segunda vez que Zaid al Názir me desafia, e que seja a última. É por causa da sua teimosia que impedi que sua descendência fosse numerosa como as areias que rodeiam Oásis, tirei-lhe a fertilidade na primeira vez. Nessa, retirarei a sua legitimidade para governar: oh, aqueles que crede, escutem-me, este vergonhoso adail toma a palavra de justiça a boca, e tem os sonhos atormentados todas as noites graças a sua vaidade e sua ganância.

O monarca rasgou as vestes reais e caiu prostrado no chão, com o rosto encoberto por mãos trêmulas.

— Poupe-me a vergonha, perdoe-me Meu Deus.

— Já lhe dei chances em demasia, adail. Oh povo que habita no deserto, sabeis que vosso sultão incorreu em grave pecado na campanha de unificação dos emirados do antigo Deserto Sem Fim, e que como punição, terá direito a apenas um único sucessor varão. Caso o seu amado filho morra, não terá a casa al Názir sucessor algum, pois Zared foi exilado pelo vosso ardiloso adail em sua busca desenfreada por poder. Manchaste a honra de seus ancestrais quando se serviu do expediente de fazer dos clãs de assassinos sua guarda real...

Todo os presentes ficaram impressionados. Rosicler era só sorrisos, aquelas revelações eram inesperadas para todos, menos para ela. Em meio as fornalhas na Cordilheira de Bashvaia, o velho Z relatara o triste fim do relacionamento com o seu irmão primogênito.

Saragat encarou o príncipe. O mesmo não ousou devolver o olhar, não saberia o que dizer, era uma situação constrangedora para ele também.

— ... agora, a vista de todo o povo, se nega a realizar minha conjuração! Pois bem, agora eu farei uso do Julgamento Divino.

Uma forte luz emanou do corpo de Amir. Sua forma se tornou translúcida, quase vaporosa, era Al Q’enba manifestado no mundo terreno. Sob uma voz trovejante, o ente divino deu a sentença:

— Rosicler Cochrane, inocente... Fethc, capitão do Batalhão Espectral da Horda, sob comando do general atroz Anhangá, culpado de tentativa de assassinato e atos profanos.

Quando terminou de falar, a luz desvaneceu e Amir reapareceu. Os guardas libertaram a prisioneira, que alisou o pescoço, tentando livrar-se dos hematomas e dos traumas.

Letícia não acreditar na reviravolta. Tell e Index desceram a galeria para abraçar a amiga.

O sultão, ficou em estado de choque, o seu corpo convulsionava. Rachid pediu para que a multidão fosse mandada embora, e correu em direção ao pai, tentando confortá-lo. O adail de Oásis, nunca mais seria o mesmo depois daquele dia, nem o príncipe também.


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