Um Reino de Monstros Vol. 4 escrita por Caliel Alves


Capítulo 5
Capítulo 1: Sobre paz e guerras - Parte 4




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Quando ela acordou, a velha copeira de Rachid a servia. Ela estava deitada num divã, coberta com a capa de Rachid. Quando se ergueu, percebeu que não estava mais trajada no seu uniforme aeroalquimista, mas sim numa roupa típica das oasianas, com tecidos finos, com estampas de arabescos e flores.

Aquele maldito, eu vou acabar com ele antes de sair daqui!

— O que aconteceu as minhas roupas?

— Estava toda ensopada com a chuva. O príncipe Rachid a trouxe até aqui desfalecida e pediu para que cuidássemos da senhorita e lhe desse novas roupas.

— E-eu agradeço, mas onde ele está agora? Quero bater nele!

— Hohohoho, o príncipe está na sala de julgamento antecedendo por uma prisioneira.

— Há... espere, prisioneira?

— Sim, ela tem um nome engraçado, Rose...

— Rosícler?

— Sim, esse nome mesmo, como sabe?

— Oh céus, leve-me até a sala de julgamento, minha senhora.

***

Seja lá qual fosse o motivo, Letícia sabia que algo havia dado errado na noite anterior, ela julgava que o incêndio foi uma espécie de distração, só não sabia para o quê.

Os primeiros a encontrá-la foram Tell e Index. Ela estava na galeria quando a dupla a vira, ambos correrem subindo pela escada. Letícia abraçou o garoto que derramava lágrimas. A alquimista pediu para que o mago-espadachim explicasse o que havia ocorrido.

— Vão matar a Rosícler.

— Porque? O que ela fez?

— Ela tentou matar o conjurador de Al Q’enba.

— Isso não faz sentido, Tell. O que ela ganharia com isso? Não foi um erro?

— Não, tanto eu quanto o Saragat vimos ela sendo pega pelos guardas reais as portas do quarto do conjurador desse castelo.

Soaram clarins, então entrou um melancólico cortejo. Rosícler estava sendo trazida por dois guardas. Um grilhão estava atado ao seu pescoço, sendo que um puxava com a corrente de um lado e o outro guarda a puxava do outro. Estava abatida, mas não derramara uma lágrima até agora, como aqueles que tem a plena convicção de vão morrer.

A sua frente estava o sultão, que exercia o governo e os julgamentos. Sendo ele juiz-mor de toda Oásis, no sultanato, ele era o órgão maior em termo de justiça. Letícia pensou:

Mas que coisa arcaica, em nenhum lugar do mundo vemos tal aparelhamento de poderes, como julgar sem ser influenciado pelo modo de governar?

— Não chore, Tell, ela pode ter sido induzida a fazer tal coisa. Onde está Saragat?

— Está junto com o conjurador, ele disse que Nalab tinha algo a dizer a Al-Q’enba.

Letícia enxugou as lágrimas de Tell e continuou a assistir aquele espetáculo imprevisível.

O sultão suspendeu as mãos e todos se silenciaram, tanto os que estavam de pé nas galerias da sala de julgamento, tanto os que estavam assentados assistindo o júri.

— Hoje, prezados patrícios, vou julgar sob a honra de nossos ancestrais e pelo testemunho de nosso deus Al Q’enba que a acusada Rosícler Cochrane atentou contra a vida de nosso amado conjurador Amir Ibin-Sawad, o que tem a dizer em sua defesa?

Mas nada pôde falar. Foi vaiada por todos, até que a guarda real e o sultão pedissem ordem no recinto. Os oasianos estavam furiosos.

— Vocês pegaram a pessoa errada, morou?

— Então, julga-te inocente?

— Sim, veio!

— Mas nunca vi tal coisa absurda, ALÉM DE LADRA É HIPÓCRITA!

Novas vaias foram direcionadas a ela, o conjurador era não apenas um homem respeitável e influente, mas também amado pelo povo e pela sua generosidade.

Letícia não sabia o que fazer, e para piorar, o seu companheiro mais sábio estava distante.

— Que droga, Tell! O Saragat sabe sair-se melhor em meio a essas situações. Se ela continuar assim, vai complicar tudo.

— Eu acho que ela vai morrer.

— Não vai acontecer isso, ela é escorregadia demais.

Rosícler ergueu os olhos para o sultão e disse:

— Eu posso ser tudo, mas eu odeio quando me culpam pelo que eu não fiz, sacou?

Um dos guardas reais atingiu sua coxa, ela caiu ajoelhada no chão.

— Não olhe diretamente para o nosso adail.

— Não enche, seu desgraçado!

— Silêncio, se não foi você, como justifica os guardas reais encontrá-la tarde da noite perto do quarto do conjurador com uma adaga ensanguentada? Nosso serviço de inteligência já nos deu a trajetória dos seus passos sangrentos: você pôs fogo no estábulo real e aproveitou o momento de altercação para assassinar o conjurador...

— E porque eu faria isso?

— Os motivos não são relevantes. Desde que tenhamos provas suficientes para enquadra-la em nossas sagradas leis.

— E como tem certeza de que foi eu e não outro que tentou matar seu tal conjurador?

— Silencia-te, pois sou eu que faço as perguntas a ti.

Rosícler cuspiu no chão em desafio ao soberano. Ela era arredia, mas toda a sua ousadia agora de nada servia, nem a ela nem aos seus companheiros, que poderiam ser acusados de traição.

Tell apertava o livro na mão, Letícia percebeu que o fluxo mágico entre o garoto e o Monstronomicom aumentava a cada dia. Ela só não sabia o porquê, talvez Saragat também tivesse notado.

— Tell, onde está Rachid?

— Com Saragat, ele salvou a vida da Rosicler ontem e ficou o tempo todo do nosso lado. Ele disse que ninguém que estivesse do seu lado ousaria desferir um golpe tão baixo contra Oásis, e que ele confiava em você, Letícia.

A alquimista afagou o cabelo crespo de Tell. O momento agora era de buscar se fortalecer, o resultado daquele julgamento tendia para uma execução.

O sultão cruzou a perna e juntou os dedos numa atitude meditativa e disse:

— Vou perguntar ao menos uma vez. Diga-me com sinceridade ao menos uma vez na vida, e morra com o mínimo de vergonha: você é uma espiã da Horda?

— Não.

— Você se infiltrou aqui para matar o nosso conjurador e enfraquecer a nossa nação?

— Não.

— Utilizou-se da Companhia de Libertadores para obter acesso mais fácil para Oásis?

— Não.

— Você atacou a noite passada o bom Amir Ibin-Sawad?

— Não.

Houve uma comoção generalizada. As pessoas xingavam-na e vociferavam a palavra de ordem: ENFORQUEM A ASSASSINA, MATEM A LADRA!

Index tentou voar até Rosicler, mas Tell o impediu, temia que seu amigo morresse também. O sultão levantou-se do seu trono e pediu para que a multidão se calasse.

Com muito esforço os guardas os fizera calar. O velho monarca finalmente deu o seu veredicto:

— Eu, Zaid al Názir, filho de Zabid al Názir, tendo o meu povo e o meu deus como testemunha, levando em consideração as incontestáveis provas e relatos de bom número de testemunhas, e tendo a ré se negado a responder as perguntas feitas pelo júri, não tendo nenhum respeito para com nossas leis ou a vida alheia. É como a mais indubitável demonstração de culpa que existe na face da terra, ela é uma vergonha para Aliança Internacional e para a Companhia de Libertadores, bem como um perigo a nossos cidadãos e cidadãs de bens, que suam e sangram todos os dias nestas terras áridas, buscando viver com honra e benevolência. Por esses motivos, eu a torno culpada pelos crimes de traição, atos profanos e tentativa de assassinato, por isso, sentencio Rosicler Cochrane a pena de...

— Sua percepção de justiça se alterou muito durante o tempo em que estive afastado.

Todos se viraram para a voz do homem que adentrava a sala de julgamento. Agora o destino da ré mudara drasticamente.


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