Um Reino de Monstros Vol. 4 escrita por Caliel Alves


Capítulo 24
Capítulo 5: A Invocação - parte 2




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O sultão assistia a batalha. A proximidade com que a luneta trazia a batalha aos olhos do adail o deixavam angustiado. Quando enormes bolas de fogo atingiram o grupo, ele deixou a luneta cair e deu um grande grito de desespero que foi ouvida em toda Oásis.

Suas pernas tremeram. Se apoiou na mureta de proteção e alguns soldados se aproximaram. Ele os repeliu.

— Meu filho! Meu único filho! Onde estava com a cabeça quando permiti que ele fizesse essa sandice?

E com muita fúria, passou a rasgar suas vestes reais. Os soldados o observaram, todos sentiam a sua perda. O alfaraz que comandava as defesas no muro cedeu a luneta a ele.

— Que quer de mim, tripudiar da minha dor?

— Olhe o senhor mesmo, meu adail.

O velho com arrogância tomou o objeto e mirou no campo de batalha. Estupefato, rosnou algo e depois de repousar as mãos na muralha, disse em alta voz:

— Já não é mais uma batalha entre homens e monstros...

***

O lobisomem chutou um pedregulho e saltou. Torceu o pescoço peludo e o resto dos ossos. Sua ossatura fazia um som de prac-pric, aos poucos, tudo foi voltando ao lugar.

Farejou o ar. Amaldiçoou o seu rei. Sua proteção ao monarca estava no puro nível instintivo, o odiava por ser um humano, ser teimoso e acima de tudo um arrogante. Mas também não deixava de perceber a perícia com que usava a energia divina de Enug e sua própria energia mágica, poderosa demais para um humano.

A imprudência de Sua Majestade quase o matara. E talvez fosse esse o seu real desejo. A rocha amorteceu sua queda. Estava vivo. Tentaria não mais irritar o seu rei.

Se Zarastu morresse enquanto Enug ainda estivesse preso, provocaria a morte instantânea de todos os monstros, fossem eles originais ou transformados pela energia da relíquia que o chefe da Horda ostentava no pescoço. Manter o rei de amarelo vivo era uma questão de sobrevivência também.

— Meu deus Enug, não sei porque o senhor permite que um humano tão tolo se utilize do seu poder dessa forma. Mas eu...

Espere, o que é aquilo? É Tell de Lisliboux! Ele está evocando uma magia... não, ele está... Mas que coluna de luz é aquela? Está saindo do Monstronomicom, está tingindo o céu com uma estranha luz branca.

***

Os cinco corpos caíram no chão. Estavam com queimaduras graves. Tell era um dos mais feridos.

Zarastu deu as costas, sendo ovacionado pelos monstros. Havia derrotado, não sem custo algum, cinco bravos guerreiros. Com prepotência, cantou vitória e conclamou a Horda a iniciar o ataque aos muros. Oásis seria dele. Que os monstros se divertissem com os corpos dos derrotados. Ele incendiaria a cidade murada depois de tornar escravo cada um dos seus habitantes.

Mas para seu azar, ao contrário do que ele pensava, o Monstronomicom não havia sido destruído no ataque. Index protegeu o livro com o seu corpo, e o garoto protegeu o guardião do livro, tomando a criatura em suas mãos.

Index acordou. As lágrimas, tentou acordar o jovem que parecia desmaiado. De repente, os olhos de Index começaram a brilhar com uma luz embranquecida. Foi até os ouvidos de Tell e disse algumas palavras. Para surpresa de seus companheiros que o julgavam morto, ele passou a se mover.

— Tell? Fuja... Garoto, não seja tolo, suma daqui! Não ouse enfrentá-lo sozinho!

Estava surdo para as palavras de Saragat. O flandino ficou de pé, olhando para o tomo em sua mão. Os cabelos crespos lhe encobrindo o rosto. Index voou e pousou em sua cabeça.

Letícia percebeu pela primeira vez que as marcas em Index tinham uma função mágica. Os caracteres indefinidos se assemelhavam muito a xenografia que tanto seu irmão mais novo estudava.

O mago-espadachim abriu o livro e uma enorme coluna de luz subiu aos céus, iluminando às escuras nuvens.

Zarastu virou-se, não admitia que aquele garoto ainda estivesse vivo e andando. Mas, mesmo ele sabia que havia algo errado. A emissão de energia era grande demais para uma única pessoa.

— Mas que tipo de mago é você?

A coluna de luz sumiu, ao mesmo tempo em que um portal de energia surgiu na frente do conjurador de Enug. O portal tinha três metros de altura por dois de largura. Lá dentro, uma densa energia mágica provocava descarga elétricas.

De súbito, um braço saiu de lá de dentro, depois o ombro, após, dois chifres negros. A criatura se revelou aos poucos, e quando mostrou-se por completa, Zarastu teve certeza de quem se tratava. Seria necromancia? Ele não podia dizer com cem por cento de certeza, mas aquele portal havia trazido um dos seus subordinados de volta à vida.

— Capitão Ox?

Assim como o rei, todos da Horda ficaram assombrados quando o portal se desfez e o minotauro se colocou à frente do monarca.

— Ox, é você?

Fisicamente, o monstro em nada devia ao capitão Ox, que foi derrotado em uma das batalhas ao Norte de Lashra. Mas sua face, nada tinha daquele semblante carregado e expressão violenta. Ao contrário. Nem sequer a monstruosidade podia ser percebida naquele ser. Mesmo assim, a certeza de que aquele ser era Ox o impediu de tomar qualquer inciativa.

O minotauro pousou o machado gigante nos ombros. Um sorriso brando marcava seu rosto anguloso. Em seu focinho, uma argola de prata balançava com o vento.

A criatura trajava um saiote pregueado. Caneleiras de prata e sandálias com correias trançadas. Um peitoral com padrões floreados revestia o seu abdome, as ombreiras tinham a mesma forma de uma cabeça bovina. As orelhas grandes e pontudas tinham argolões de prata, que faziam um som trinado quando o vento batia.

— Capitão Ox, se for você, eu ordeno que acabe com esse garoto imediatamente!

Tell ergueu a cabeça. Os olhos estavam embranquecidos, como se estivesse em transe. As veias saltavam no rosto. Um fluxo de energia mágica ia de Tell ao livro e do livro ao monstro.

Zarastu ficou sem entender a situação.

O jovem ergueu a mão direita em direção ao monstro a sua frente e disse:

— Ataque!

— Seu monstro idiota! Você não ousaria...

Mas o minotauro se moveu, rápido e com força, atacou com o machado. Restou ao rei se esquivar, se abaixar o máximo que pôde. Não foi o suficiente. O monstro o atingiu com um chute no estômago. A dor o fez cuspir sangue. O impacto o arremessou ao longe.

Mas o que é isso? Ox não morreu! Foi apenas aprisionado no livro.

O velho mago ergueu-se. Limpou o filete de sangue que escorria da boca.

O monstro avançou. Deu uma machadada, mas o adversário foi mais rápido. Com uma esquiva, saltou sobre o braço do minotauro e com um Projétil de Luz enorme, atingiu a face do ser bovino.

Zarastu aproveitou o impulso, agarrou os chifres da criatura e o lançou ao chão. Pousando, o monarca se vangloriou. Sabia da resistência dos minotauro, mas perdiam muito em agilidade e tinham o ponto fraco dos chifres, embora fossem mortais se atingissem o oponente.

Quando a fumaça se dissipou da cabeça da criatura, o chefe da Horda se decepcionou. O minotauro levantou-se do chão, era como se não estivesse ferido. O governante ficou ainda mais irritado com o sorriso que o ser lançava.

— Do que você está rindo, seu monstro estúpido? Vou tirar esse riso da sua cara.

E juntando energia mágica em suas mãos e as ergueu aos céus. Era tanta energia que a terra tremia. Os olhos de Zarastu brilharam ensandecido. Sua voz emitia fúria. Atrás de si, a sua energia se amplificava e se materializava numa forma humana. Um ser translúcido com vestes resplandecentes. No ombro, o enorme ser segurava um jarro.

— Ox ou não, morra! Aquarídio.

Quando o ser de pele cristalina virou o jarro, uma chuva de meteoros caiu sobre as areias do deserto. Ela atingiu o minotauro em cheio. Uma grande cortina de areia ascendeu aos céus. O som triturante ecoou por longas distâncias. Zarastu se divertia com a violência da situação. Não admitia que entre os monstros houvesse traidores.

Se virou para Tell. Ele continuava lá, em transe. Os olhos esbranquiçados. As veias se contorcendo por debaixo da pele. Sua energia mágica vazava pelos poros de modo descontrolado.

Ele está inconsciente todo esse tempo?

Tomp, a folha do machado o atingiu nas costas. O rei caiu há alguns metros.

— Estou cheio de você, seu monstro idiota.

No chão, acuado, Zarastu via o monstro erguer o seu grande machado prestes a desferir um golpe que poderia o dividir ao meio.

O minotauro estava completamente ferido, com queimaduras profundas na pele. A amadura estava derretida. Um dos chifres havia se partido.

— Balázio Metralhador.

Centenas de projéteis de energia mágica disparados por segundo atingiram o peito do monstro. Uma sucessão de rajadas tão grande que em pouco tempo era possível ver o sol através do peito do minotauro. O monstro ainda continuou de pé por alguns segundos, até que a vitalidade abandonou seu rosto e caiu de costas com barulho.

O governante levantou-se do chão e limpou a areia do seu traje. Caminhou devagar em direção a Tell de Lisliboux. O mago-espadachim fechou os olhos e desmaiou sobre o Monstronomicom.

Era a oportunidade perfeita para matar o garoto e destruir o livro. Index rosnava para Zarastu. Mas ele não se importou com a criatura e a chutou para longe. Os companheiros do jovem flandino gritavam para ele se levantar, continuar a luta... fugir. Mas ele continuava lá, como se estivesse morto, sem se mexer.

O rei dos monstros, sob aplausos e congratulações da Horda, apontou a palma da mão na direção do jovem. Iria desintegrá-lo para que não sobrasse nem mesmo o pó do seu cadáver. Nas suas mãos, formou uma esfera de energia, zummmm, o som da esfera girando provocava um som cortante, aquecendo o ar em volta. A energia comprimida tinha força suficiente para provocar uma grande explosão.

— Morra, Tell de Lisliboux, encontre o seu... hã!

— Oh, deus meu! Não há um digno, não há nenhum dentre vós.

— Mas essa voz é de...

Perfuração Solar.

***

Os alfarazes na muralha estavam estupefatos com a reviravolta na batalha. Ao que tudo indicava, um monstro havia surgido entre Tell e Zarastu e travava luta contra o rei. O monstro foi derrotado pelo chefe da Horda, e se dirigiu ao flandino.

O jovem desmaiou, o que não impediu que o seu oponente usasse de sua covardia e preparasse uma magia no intuito de matá-lo.

Mas, um novo personagem mudou os rumos do conflito drasticamente: um ser alto e desengonçado. Sua cabeça era uma enorme abóbora. Trajava uma casaca preta com listras vermelhas. A cartola pendia meio torta da cabeça. Suas mãos eram galhos de árvores retorcidos. Usava uma rapieira. A lâmina estava rubra como um ferro em brasa.

— Mas... quem é aquela estranha figura?

— Meu adail, perdoe minha ousadia, mas temo mais pela vida do príncipe Rachid.

— Eu temo pela vida de toda a minha nação! Meu filho se colocou em risco por livre e espontânea vontade. Me desobedeceu como pai e como o seu governante. Ele sabe que Oásis não precisa da Aliança Internacional. Oásis nasceu para a grandeza. E não será abalada pela marcha de insetos no deserto.

O comandante geral do exército de Oásis apertou o cabo de sua espada com força.

— O príncipe Rachid não só o desobedeceu com intenção de frustrá-lo ou duvidando das capacidades defensivas de Oásis. Ele seguiu a Companhia de Libertadores porque queria que não só Oásis, mas toda à Lashra tivesse esperança nessa guerra.

O sultão arreganhou os dentes furioso para o subordinado, nunca haviam falado assim com ele.


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