Snowboarding With You escrita por Gabe Kyan Parker


Capítulo 2
Capítulo Dois


Notas iniciais do capítulo

Aqui estou eu de novo! Este capítulo é ainda maior que o primeiro, para a alegria ou tristeza de vocês. Escrevi com muito carinho e dedicação, e espero de verdade que vocês gostem. Enfim, tenham uma boa leitura!



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Quando a manhã do sábado começou, a primeira coisa que veio à mente de Reki foi o skate. Ele não conseguiu processar nenhuma palavra do que suas irmãs lhe disseram quando invadiram seu quarto e o acordaram, apenas que tinha a ver com seu esporte favorito.

Foi um tanto difícil para o ruivo levantar. Ele se sentia um pouco cansado, depois de ter tido problemas para dormir, já que não conseguia parar de pensar em tudo o que aconteceu na noite anterior. Raios de sol que entravam pela janela iluminavam e aqueciam um pouco a casa, mas ainda havia um ar frio, que fazia ainda mais o ruivo querer continuar na cama. E ficou ainda mais difícil levantar quando ele sentiu suas mãos doerem, por causa dos ferimentos recentes.

Mas suas irmãs contavam com ele, então o vermelho não poderia decepcionar.

A paixão dele por skate começara há anos atrás, tudo graças a um garoto que ele conheceu e que logo acabou se tornando seu melhor amigo. O ruivo nunca conseguiu se esquecer do dia em que conheceu o skate, muito menos do dia em que deu seu primeiro ollie, e de como se sentiu tão feliz como nunca antes. É claro, a história não teve um final bom, e o vermelho tentava sempre esquecer disso, mas ainda gostava de se lembrar das partes boas.

Desde então, ele se apaixonou totalmente pelo skate. Mas ninguém jamais conseguiu entender essa paixão. Ele não tinha amigos e todos os seus colegas o achavam estranho. Sua família então achava o skate ainda pior. Reki nunca havia se importado, mas isso foi antes de encontrar pessoas que o entendiam e, assim, finalmente descobrir como é pertencer de verdade a algum lugar. Sempre fora apenas ele e o skate, mas agora, havia mais pessoas em sua vida e, mesmo as que já estavam nela, agora pareciam muito mais próximas.

Desde Langa, o torneio de Adam e tudo mais, as irmãs de Reki começaram a perceber como o skate era maneiro e a se interessar pelo esporte. Então, ele começou a ensiná-las a andar de skate. Em toda a sua vida, ele nunca imaginou que poderia um dia sequer conversar com algum familiar sobre skate. Mas lá estava ele, ensinando as garotas sobre suas adoradas pranchas.

Agora, ele se sentia mais próximo do que nunca delas. E, por mais que ele estivesse cansado, ele logo começou a se divertir de verdade com elas. Entre umas manobras e alguns tombos, os quatro se divertiam e riam muito.

A primeira vez que Reki ensinou alguém a andar de skate foi quando Langa apareceu. Ensinar o azulado foi a melhor experiência que o ruivo já teve em sua vida. Ele achava que era apenas porque gostava do canadense, mas agora, ensinando suas irmãs, ele começou a perceber que ele realmente gostava de ensinar. O skate era a coisa mais importante de sua vida e poder ensinar isso para outras pessoas, poder dar a elas a chance de conhecer a infinitude das pranchas, é algo ainda mais incrível do que praticar o próprio esporte.

O quintal de sua casa era pequeno se comparado à pista de skate da cidade, mas a mãe do ruivo insistiu que treinassem lá para que ela pudesse tomar conta das crianças. Não que ela não confiasse em Reki. Ela apenas… bem, não confiava. Pelo menos não quando se tratava de algo assim. Ainda mais depois de vê-lo machucado, de novo.

As mãos do garoto ainda estavam com curativos. Por sinal, ainda eram os mesmos que Langa havia colocado na noite anterior. Elas doíam um pouco, nada que ele não estivesse acostumado. Mas ele sorria e sentia seu coração acelerar toda vez que olhava para os curativos e se lembrava de todo o cuidado e delicadeza do canadense ao cuidar do ruivo.

Ele se lembrou daquele momento. De como eles estavam tão próximos. Ele quase podia sentir novamente a respiração do canadense, o seu calor e o seu toque. E ele não podia deixar de pensar em como ele desejava tê-lo beijado…

— Cuidado aí!

Mais uma vez, o garoto estava tão desatento pensando no azulado e olhando para suas mãos, que até esqueceu que estava em cima do skate e indo em direção ao muro da casa. Ele parou o skate bruscamente, só alguns centímetros antes de bater de cara no muro. Depois de se recuperar do susto, ele se espreguiçou, fingindo despreocupação.

— Ah, qual é, Koyomi?! Você achou mesmo que eu ia bater? — disse ele, sarcasticamente.

Ela revirou os olhos e deu risada. As gêmeas mais novas olharam para ele com brilho nos olhos, para logo depois se entreolharem, sorrirem e subirem de novo no skate que compartilhavam.

O ruivo se abaixou no chão, ficando na altura delas.

— Um dia, vocês também vão ficar boas como eu. É só continuar treinando, falou?

Ele ouviu um som diferente atrás dele e se virou. Lá estava Koyomi, andando em seu skate. De repente, ela deu um ollie. Reki ficou de queixo caído ao ver como a irmã tinha melhorado tanto. Ela executou a manobra com uma perfeição impecável. Ela exibia um sorriso inabalável, que parecia até brilhar com o reflexo da luz matinal que invadia o lugar.

— Eu vou é ficar muito melhor do que você, maninho!

O ruivo deu uma risada alta.

— Vai sonhando.

— Você vai ver! Eu vou ficar tão boa que algum dia eu vou entrar pra seleção!

Naquele momento, foi como se o mundo tivesse parado de girar. O vermelho sentiu uma pontada no coração ao ouvir aquilo. Na noite anterior, ele tentou ao máximo evitar pensar nesse assunto. Não conseguia tirar da sua cabeça a possibilidade de Langa deixá-lo para se tornar um profissional. Ele cerrou os punhos.

— Ah, qual é o problema de vocês, hein?! — ele gritou, expressando a mais pura raiva que havia em seu coração — Agora virou modinha todo mundo querer entrar pra seleção, é isso?!

A garota ficou confusa e um pouco assustada. Reki se deu conta de que tinha gritado.

— Foi mal aí, maninha — ele colocou a mão atrás da cabeça, como sempre faz quando está envergonhado — Eu não queria ter gritado.

Ele tentou disfarçar com um sorriso forçado. Ela o encarou como se estivesse tentando decifrar o que se passava na mente dele.

— Você tá bem?

Não, ele não estava bem. Ele sentia que sua vida estava virando de cabeça para baixo. Tudo finalmente parecia estar melhor do que nunca, mas, de repente, era como se tudo isso estivesse desmoronando.

Um de seus amigos mais próximos estava prestes a se mudar para entrar na seleção. E, agora, o seu melhor amigo, que a propósito era o garoto que ele gostava e a pessoa que mais amava no mundo, estava considerando ir também. Ele sabia que não poderia segurar Langa para sempre, mas também não tinha habilidade suficiente para seguí-lo. Além do mais, ele não aguentava mais guardar todos esses sentimentos para si mesmo, mas não poderia se confessar para o canadense, ou a amizade deles iria por água abaixo. E ele também não sabia que rumo ele mesmo seguiria no futuro.

Ele não fazia ideia do que fazer da própria vida naquele instante. Mas não havia ninguém com quem ele pudesse conversar sobre isso. Ele também não queria preocupar ninguém, e não queria que os outros percebessem que ele é tão inseguro assim sobre tudo.

— Claro que eu tô bem.

— Tem certeza?

— Pode crer, mano!

Koyomi estava prestes a questioná-lo mais uma vez, quando foi interrompida por um som de madeira se quebrando. Ambos olharam imediatamente para trás. Lá estavam as gêmeas, fazendo cara de paisagem e, do lado delas, o skate estava quebrado no meio.

O ruivo até pulou.

— Ai caramba! Como foi que vocês quebraram o skate?! — ele se abaixou no chão e pegou nas mãos as partes do que já foi uma prancha — Deu PT, velho! Eu vou ter que fazer outro!

Ele olhou para as irmãs, que agora pareciam realmente preocupadas e que, claramente, estavam se sentindo culpadas. Ele deu um sorriso e bagunçou o cabelo das duas com as mãos, tentando confortá-las.

— Ainda bem que eu sou um profissional quando o assunto é montar skates! Fica de boa, pessoal!

Ele sorriu sinceramente, e ficou aliviado ao ver que as crianças também ficaram mais relaxadas.

O ruivo pegou as partes do skate quebrado e se levantou. Ele deu uma última olhada para as crianças.

— Bom pessoal, acho que já deu de skate por hoje. Agora eu vou lá consertar essa parada aqui.

Antes de sair, ele deu uma última palavra:

— Vê se não esquece gente, o skate é o que mesmo?

— Infinito! — completaram as gêmeas em uníssono com a maior empolgação do mundo, que fez tanto Reki quanto Koyomi rirem.

 

O vermelho foi até a garagem, que servia de oficina. O local estava bem iluminado, o que era bom para trabalhar. Estava bem bagunçado, como sempre, com várias rodas e peças de skate, além de papéis com desenhos de projetos malucos dele, mas o ruivo gostava disso. Aquele era o cantinho dele, onde ele deixava suas ideias fluírem livremente e se esquecia de todos os problemas do mundo.

Não demorou muito para ele consertar o skate que as irmãs tinham quebrado. Ou pelo menos era isso que ele falaria para elas. O skate tinha sido perdido. Bem, na verdade, ele nem tentara consertar. Ele usou a oportunidade como desculpa para terminar um novo que ele já estava projetando especialmente para elas fazia algum tempinho.

Depois que acabou, ele pegou o lápis e seus papéis e começou a desenhar mais skates. A cada vez que o lápis tocava o papel, uma das incontáveis ideias brilhantes de Reki ganhava mais vida. Ele ficou tão concentrado, que nem percebeu o tempo passar. Mas não importava. Ele estava se divertindo, e era isso que…

— Reki?

Aquele chamado tirou o garoto de seus pensamentos e chamou sua atenção instantaneamente. Ele reconheceria essa voz em qualquer lugar do universo. Um sorriso se abriu imediatamente em seu rosto.

— Langa?! Fala aí mano! Eu achei que você ia chegar mais tarde.

— O sol já está quase se pondo, Reki.

— É o quê?! — ele largou tudo que estava fazendo e se virou para o canadense — Foi mal cara, eu meio que fiquei distraído… Cacete, Langa! Você tá legal, mano?!

Ele ficou preocupado ao vê-lo. O azulado estava com olheiras e dava para ver que ele não havia dormido direito. O vermelho mesmo estava reclamando que não tinha conseguido dormir, mas Langa estava visivelmente bem pior.

O canadense pareceu ficar constrangido por um momento.

— Não é nada demais, Reki. Eu estou bem.

O ruivo olhou desconfiadamente.

— Você não me engana não, besta.

O azulado riu. Aquela simples risada era suficiente para fazer Reki sorrir também. Porém, a expressão do canadense logo mudou para algo mais pensativo e distante. Mas ele rapidamente voltou seu olhar novamente para o ruivo e forçou um sorriso.

— A gente combinou de pegar o Miya na pista de skate antes de ir para o S. Acho que ele deve estar esperando.

Reki percebeu que havia alguma coisa de errado. Langa não costumava ficar assim. Mas o avermelhado se lembrou do que aconteceu na noite anterior, e pensou que talvez ele estivesse assim por causa daquilo. Normalmente, o ruivo perguntaria e tentaria conversar sobre isso, mas tocar nesse assunto era a última coisa que ele queria. Ele se sentia preocupado só de se lembrar.

Ele balançou a cabeça para afastar os pensamentos. Os dois estavam juntos agora e iam andar de skate, como sempre. Essa era a única coisa que importava.

Ele se espreguiçou.

— Bora lá, então!

 

Realmente, o sol já estava começando a se pôr. Langa amava esse horário do dia, e amava mais ainda andar de skate nele. Mas, dessa vez, ele não estava tão animado. Era como se as coisas apenas passassem diante de seus olhos, sem que ele realmente estivesse participando. Sua mente ainda estava bem distante, pensando na conversa que teve com sua mãe na noite anterior, sobre o Canadá…

Ele olhou para o lado e corou ao se dar conta de que Reki o estava olhando atentamente. O ruivo parecia analisá-lo, como se estivesse tentando entender o que se passava na mente do azulado. Langa não queria preocupá-lo, então se esforçava para não demonstrar o que estava sentindo, mas não conseguia esconder muito bem o desânimo.

O vermelho estava preocupado com ele, mas mesmo assim preferiu respeitar o espaço dele e não fazer nenhuma pergunta. O canadense se sentiu aliviado por isso. Mesmo não estando com o melhor dos ânimos, o simples fato de estar ao lado de Reki já era o bastante para o fazer se sentir mais leve e relaxado.

Eles seguiram o caminho até a pista de skate em silêncio. Mas é claro que Reki fazia uma manobra ou outra de vez em quando, tentando levantar o ânimo do azulado, que sorria em resposta e imitava os movimentos do ruivo.

Haviam apenas algumas pessoas na pista. A luz avermelhada do pôr do sol a deixava extremamente bonita, como da primeira vez que Langa deu um ollie. O vento frio que balançava os seus cabelos dava uma sensação agradável.

O azulado afastou uma mecha de cabelo que cobria seus olhos para poder observar melhor o local. Próximo a uma rampa, estava Miya e mais três garotos que pareciam ter a mesma idade que ele. Eles riam alto.

Langa e Reki se entreolharam. Eles nunca haviam visto o pequeno tão alegre assim.

— Quem são aqueles caras, Reki?

O ruivo fez uma careta e semicerrou os olhos, tentando ver melhor. Ele deu de ombros.

— Nunca nem vi, mano.

O grupo começou a andar. Dois dos garotos foram mais à frente, deixando Miya mais para trás com um garoto de cabelo castanho, alguns centímetros mais alto que ele. O pequeno skatista parecia muito mais à vontade com aquele menino em particular, e também parecia se divertir muito mais. Suas expressões ficaram mais alegres e sua risada mais alta, e o sentimento parecia ser correspondido.

Reki encarava a situação com uma concentração e curiosidade que Langa nunca tinha visto. Ele fez algumas caretas, como se estivesse pensando. Então, ele deu um salto, como se tivesse tido algum estalo no cérebro.

— É o quê?!

O ruivo segurou o canadense pelo braço e saiu correndo na direção de Miya, que estava na saída da pista de skate, se despedindo dos amigos.

Reki soltou o braço de Langa, e começou a se aproximar lentamente de Miya, que estava de costas para eles, observando os garotos irem embora. Então ele esticou os braços e levantou Miya no ar, que gritou e se debateu com o susto.

— Mas que merda é essa, cara?! Me larga seu slime idiota!

O vermelho o colocou no chão. Ele se aproximou do garoto e o encarou nos olhos. Ele deu um sorriso malicioso.

— Quem eram aquelas caras ali?

O pequeno ficou um pouco corado.

— São meus amigos. Sabe, vocês dois não são os únicos que eu tenho.

Reki fez uma careta ainda mais exagerada.

— E aquele menino ali, hein? — ele cruzou os braços atrás da cabeça, como sempre fazia quando zoava alguém — Vocês pareciam bem próximos…

— Vai cuidar da sua vida, slime intrometido! — Miya gritou, ficando mais vermelho que o cabelo de Reki, e desviando do assunto — A gente vai pro S agora?

— Aí, tampinha, muda de assunto não!

Miya desviou o olhar de Reki para Langa, que estava atrás do ruivo. Ele ficou com uma expressão preocupada.

— O que é que ele tem hoje?

Reki olhou para trás e viu que Langa ainda estava aéreo. Ele olhava para o horizonte, mas parecia que seus olhos estavam apenas parados, enquanto sua mente estava bem longe dali. Na verdade, ele ainda parecia com sono e parecia ter dificuldade em manter os olhos abertos. O ruivo e Miya se entreolharam. O pequeno fez uma expressão confusa.

Reki fez um sinal para Miya dizendo para irem embora. O pequeno não entendeu direito, mas assentiu. O ruivo se aproximou do azulado.

— Vamos lá, cara?

Ele segurou Langa pelos braços, o tirando do transe e o guiando delicadamente para fora da pista.

Mas antes de sair, seus olhos se depararam com algo que chamou sua atenção. Um grupo de crianças, mais ou menos da mesma idade que suas irmãzinhas, estava aprendendo a andar de skate. Elas riam e pareciam se divertir bastante. O ruivo sentiu uma alegria em seu interior que ele não soube explicar e não pôde deixar de sorrir.

 

A noite caía enquanto os três garotos iam para Crazy Rock. Como na noite anterior, a lua brilhava intensamente no céu. Como sempre, Reki ficou corado, observando como a luz prateada natural parecia ressaltar a pele clara e os olhos cristalinos de Langa.

Os três estavam em silêncio. O canadense realmente parecia estar com a mente distante. Miya não parava de encarar o ruivo na esperança de que ele contasse o que estava acontecendo com Langa, mas o pequeno desistiu depois de entender que nem mesmo Reki sabia.

Apesar de demorarem mais do que o habitual, eles finalmente chegaram. Os três mostraram seus broches do S e os portões se abriram para eles. Por mais que o dia não estivesse exatamente com o ânimo de sempre, Reki sempre amava a sensação de quando aqueles portões se abriam e eles adentravam na Crazy Rock.

O ambiente era iluminado por luzes cor de âmbar, que pareciam reforçar a ideia de estarem lá durante a noite. Langa sempre achou que essas luzes ressaltavam os olhos de Reki e, por um momento, se desprendeu um pouco de seus pensamentos para apreciar a beleza do vermelho. Reki percebeu e o olhou de volta, mas o canadense rapidamente desviou o olhar, envergonhado, e o ruivo fez o mesmo. Miya revirou os olhos, mas tentou disfarçar antes que os dois percebessem.

Como em todas as noites, o local estava cheio de pessoas, de várias idades, aparências e estilos totalmente diferentes. Mas todas tinham algo em comum: a paixão pelo skate. Reki sempre amou ver tantas pessoas juntas pela mesma paixão, mas ele suspeitava que nenhuma daquelas pessoas realmente amava o skate tanto quanto ele.

Os três pararam de andar assim que ouviram o som de alguém fazendo bastante escândalo em algum lugar perto deles.

— Shadow — os três confirmaram em uníssono.

O grandalhão se aproximava a toda velocidade em seu skate. Ele usava sua maquiagem de sempre, que assustaria qualquer um que não o conhecesse. Ele parou o skate bruscamente, quase atropelando os garotos. Fez um sinal de Rock n’ Roll com a mão, colocando a língua para fora, exibindo o seu piercing.

— Fala aí, molecada!

Os garotos o cumprimentaram, enquanto Shadow zoava com a cara deles, como sempre fazia. Mas não demorou muito para ele perceber que Langa não estava muito normal.

— O que é que ele tem?

Reki fez uma expressão sugerindo que não fazia ideia. Shadow revirou os olhos, demonstrando sua indignação. Afinal, se alguém deveria saber o que acontece com Langa, esse alguém é o Reki.

Antes que alguém pudesse falar mais alguma coisa, várias vozes femininas começaram a dar gritinhos e falar emocionadas pelo local:

— É o Cherry Blossom!

— Ai! É o Joe!

O grupo olhou na direção dos gritos. Joe e Cherry vinham à toda velocidade em seus skates, vestidos com seus trajes característicos. As pessoas tentavam apostar em qual dos dois seria o vencedor.

— Carla, calcule o ângulo.

O skate do rosado fez um som e brilhou em um tom roxo com a resposta da Inteligência Artificial.

— Vire a um ângulo de 67º, mestre.

Cherry então, realizou a última curva, com uma precisão extrema, ultrapassando Joe. Porém, o esverdeado usou sua técnica especial, se jogando contra as paredes de pedra e depois se impulsionando para a frente com os pés.

Logo, os dois adultos cruzaram a linha de chegada. Os dois exatamente ao mesmo tempo. As fãs apaixonadas cercaram os dois, e a multidão gritava.

— Independentemente do resultado — disse Cherry em um tom calmo, cruzando os braços e dando as costas para Joe —, todos sabem que fui eu que obtive o melhor desempenho aqui

— Ah, conta outra, seu merdinha!

Os dois ficaram cara a cara, ambos com ódio no olhar. Ou pelo menos eles queriam que parecesse ódio.

— Humanos têm mais habilidade, seu gorila!

— Ah, é?! Então como foi que você perdeu a nossa aposta?!

Cherry ficou extremamente furioso. Parecia que ele iria soltar fogo pelas narinas.

— Ora, seu energúmeno!

— Cala a boca, seu filho da…

— Papai! Mamãe! —  Miya interrompeu os dois com sua voz de bebê. Os dois se viraram para ele, que voltou à sua expressão normal de sarcasmo — Já pararam com a briguinha?

Os dois adultos se recompuseram e então se aproximaram. Eles cumprimentam Shadow e os garotos e começam a conversar. Não demorou muito para que os dois adultos também percebessem que Langa não estava no seu melhor humor, mas em vez de falarem alguma coisa, eles apenas se entreolharam e voltaram a conversar normalmente.

Após alguns minutos, Miya se espreguiçou.

— Chega de todo esse papinho. Eu vou andar de skate — ele lançou um olhar sugestivo para Reki e Langa — Algum dos slimes quer vir comigo?

Reki olhou para o azulado, que continuava perdido em seus pensamentos, olhando para o nada. Ele o cutucou com seu cotovelo.

— E aí, cara? Vamos andar de skate?

O canadense saiu de seus pensamentos apenas o suficiente para olhar para o ruivo e responder:

— Acho que hoje eu vou só assistir, Reki. Mas você pode ir com o Miya, se quiser.

Os adultos que estavam conversando ficaram em silêncio. Todos se entreolharam. Cherry limpou a garganta.

— Reki, será que pode vir aqui por um momento? Tem algo que queremos lhe mostrar.

— Tem? — Shadow perguntou, ingênuo. Cherry pisou em seu pé e o grandalhão tentou abafar um grito.

Reki assentiu e andou com eles, se distanciando alguns metros de Langa, que nem pareceu se importar.

— Tá bom — começou Miya — O que foi que deu no Langa, Reki?

O ruivo ficou sem graça.

— Eu não sei.

— Como assim você não sabe?! — Shadow praticamente gritou — Se alguém tem que saber o que acontece com o Langa é você cara!

— Não vai me dizer que vocês brigaram de novo?! — o pequeno fuzilou o ruivo com o olhar.

Reki ficou vermelho.

— O quê?! Não, é claro que não!

— Então o que aconteceu?

— Eu não sei.

— E por que você ainda não foi falar com ele?

O vermelho ficou envergonhado. Ele não queria conversar com Langa porque sabia muito bem o que tinha acontecido na noite anterior. A história de entrar na seleção japonesa de skate e ir embora para sempre, deixou o ruivo totalmente desamparado. Por mais que o azulado tivesse dito que não iria embora, Reki sabia que o assunto tinha deixado o canadense pensativo. Ele não queria perguntar sobre isso, porque morria de medo do que Langa poderia responder.

— É que eu… Bom, eu… Quer dizer, o Langa…

— Aí, Reki! — Joe interrompeu, colocando a mão sobre o ombro do mais jovem e o olhando com uma expressão quase paternal — Você não acha que deveria conversar com ele?

— Por mais difícil que seja dizer isto, creio que Kojiro tenha razão — disse Cherry.

— Ei, eu sempre tenho razão!

— Da última vez que isso aconteceu — ele continuou, ignorando o verde —, provou-se que evitar o assunto só deixava a situação ainda pior. Tente conversar com ele.

— Foi isso que eu acabei de dizer, seu merdinha!

— Fique quieto, seu brutamontes!

Reki assentiu. Ele sabia que era verdade. Se Langa estava mal, com certeza precisava de alguém para conversar, ou pelo menos de alguém para estar lá com ele. Ele sabia que o azulado faria a mesma coisa se fosse o ruivo quem estivesse mal. E os outros tinham razão, se tinha alguém que deveria estar lá pelo azulado, esse alguém era Reki.

Todos o incentivavam com gestos e olhares que transmitiam confiança. O vermelho respirou fundo e foi na direção do canadense, com o coração quase saindo pela boca.

 

Langa estava sentado no chão, segurando seu skate com ambas as mãos, observando o desenho de Reki e a palavra “fun”, com um olhar distante. Ele ainda estava com cara de sono, como se quisesse descansar mas não conseguisse relaxar. O ruivo sentou ao seu lado. Em outras circunstâncias, ficar sentado assim, lado a lado um com o outro, em silêncio, com o ar frio da noite contra seus corpos e sendo iluminados apenas pelas luzes de cor âmbar do S, poderia ser reconfortante, talvez até romântico.

Reki reuniu toda a coragem que nem sabia que tinha para falar com o azulado.

— Aí, cara… Você tá totalmente fora do ar hoje. O que… o que foi que aconteceu?

O canadense o olhou atentamente. Seus olhos azuis cristalinos mostravam que sua mente estava a mil, tentando processar a pergunta do vermelho e formular uma resposta.

Quando sua respiração mudou e sua boca se abriu para falar, o coração do ruivo parou. Ele estava completamente paralizado pelo medo do que poderia escutar naquele momento. Ele já imaginava a palavra “seleção” se encaixando na frase de milhões de maneiras possíveis. Não estava preparado para isso. Tudo tinha acontecido tão rápido… Ele sentia que seu coração estava prestes a se partir em vários estilhaços.

Porém, Langa apenas abaixou a cabeça, melancolicamente, e suspirou. A resposta veio em um tom baixo e suave.

— A minha mãe quer viajar para o Canadá.

O ruivo ficou surpreso, mas também confuso. Aliviado por não ser nada do que ele estava pensando, ele sentiu que finalmente conseguia respirar direito. Bom, ele sempre soube que algum dia Langa visitaria seu país natal novamente, mas não sabia ao certo como se sentia a respeito disso. Mas ele não entendia porque algo assim deixaria o azulado tão mal.

— E… você não quer viajar pra lá? Tipo, é o lugar onde você cresceu.

Langa continuava observando seu skate, cabisbaixo.

O Canadá era sua terra natal. Ele cresceu lá e construiu memórias incríveis com seu pai e com sua mãe. Mas, em pouco tempo, ele criou muitas mais no Japão. A princípio, o azulado achou que não queria voltar porque agora tudo o que ele mais amava estava bem ali com ele. Mas, depois de passar a noite acordado pensando, ele percebeu que não era só isso.

Foi difícil para ele admitir em voz alta, mas ele sabia a verdade:

— Eu tenho medo de encarar tudo de novo. Sabe, as coisas que eu deixei para trás…

O ruivo deu um sorriso acolhedor. Ele colocou a mão no ombro do azulado, como Joe costumava fazer para confortar os mais novos. Langa levantou a cabeça rapidamente ao sentir aquilo e fixou seu olhar atentamente em Reki.

— Aí, cara, você sabe que pode falar comigo, né?

A expressão do canadense mudou para algo mais relaxado e confortável. Como sempre, o simples fato de estar com Reki já deixava tudo melhor. Tudo parecia muito mais leve e fácil quando eles estavam juntos.

Langa ignorou tudo e todos. Naquele momento, parecia que as únicas coisas que existiam eram ele e Reki. E ele confiava no ruivo mais do que em qualquer outra pessoa no mundo. Ele não era muito de falar, mas ele deixou seu coração expressar tudo o que estava sentindo.

— Eu cresci no Canadá. E a minha vida sempre foi aquilo: praticar snowboard com o meu pai nas montanhas — um sorriso melancólico se formou em seu rosto enquanto inúmeras lembranças maravilhosas passavam por sua mente — Eu amava aquilo. Aquilo sempre fez o meu coração acelerar — ele colocou a mão em seu peito, sentindo as batidas de seu coração — A voz do meu pai rindo, o vento soprando o meu cabelo, o sorriso da minha mãe quando a gente finalmente voltava… Isso sempre me fez sentir como se eu estivesse exatamente onde eu deveria estar. Era como se aquela fosse a minha razão de viver. Eu não sei explicar, mas era… simplesmente mágico.

Era um sentimento distante, como uma memória de uma outra vida. Era um tesouro precioso, que ele queria proteger.

Reki o observava atentamente e Langa amava ver como ele demonstrava realmente se importar e querer entender. Eles perceberam que estavam se encarando e coraram. Ambos desviaram o olhar e Langa continuou a falar.

— Mas aí, quando… Quando o meu pai… — ele olhou para Reki, que balançou levemente a cabeça em um sinal de compreensão — Bom… quando aconteceu, parecia que tudo tinha virado de cabeça para baixo. Eu ainda lembro do dia que eu tentei praticar snowboard sozinho. Naquele dia, tudo parecia vazio e sem sentido. Era como se não houvesse mais nenhum sentimento. Eu não sentia a mesma coisa que antes, mas também não conseguia me sentir triste. Eu só não sentia nada.

Ele passou os dedos mais uma vez pela palavra “fun” em seu skate.

— É por isso que eu tenho medo de voltar. Eu quero poder me lembrar só das coisas boas, de como elas eram antes. Eu tenho medo de que, se eu voltar pra lá, tudo esteja vazio de novo, e o que sobrou daquela época acabe perdido para sempre…

Ele voltou seu olhar novamente para o ruivo. Sob as luzes âmbar do S, seus olhos curiosos pareciam brilhar. Langa nunca havia conversado sobre isso com ninguém, mas a cada palavra que dizia, mais sentia que podia conversar com Reki sobre qualquer coisa.

— Além disso, tudo que eu tenho de mais importante está aqui em Okinawa — ele sorriu e o ruivo ficou mais vermelho que o próprio cabelo.

Langa sentiu a proximidade dos dois aumentar e, pôde sentir sua respiração mudar e seu coração bater mais rápido ao dizer aquilo. Mas logo ele se recompôs e voltou a falar:

— Mesmo se não fosse por tudo isso, eu não sei se eu conseguiria ficar longe de você… — ele percebeu o que tinha falado e se corrigiu o mais rápido possível — é… de todos vocês.

Reki piscou algumas vezes enquanto seu cérebro tentava processar tudo o que tinha acabado de ouvir. Langa nunca falava muito sobre o Canadá. O ruivo sempre achou isso estranho, mas pensava que era só porque o azulado não era de falar muito. Ele não imaginava que tudo isso estava acontecendo, mas agora entendia o motivo de todo esse desânimo.

— Caralho… — foi tudo o que ele conseguiu responder.

— Eu não sabia que a minha mãe queria tanto voltar para lá. Mas eu não posso evitar isso para sempre. Uma hora ou outra eu vou ter que voltar.

De repente, a conversa dos dois foi interrompida por um som estranho. Reki se levantou para ver o que era e deu de cara com o resto do grupo, bisbilhotando a conversa. Assim que viram o ruivo, tentaram disfarçar, mas era tarde demais. Seu rosto ficou vermelho.

— Aí, vocês não têm respeito não? — ele falou do jeito explosivo, mas ao mesmo tempo brincalhão, dele — A gente tá conversando sério aqui! Não é pra ficar xeretando, ô!

— Eu não faço ideia do que você tá falando, slime —  Miya respondeu fazendo cara de paisagem e olhando para o nada.

Todo aquele clima melancólico se quebrou imediatamente. Mesmo com uma coisa tão simples, Reki e os outros sempre conseguiam animar Langa. Ele não pôde deixar de rir da situação.

Cherry Blossom limpou a garganta.

— Já que estamos aqui, me permite dar minha opinião, Langa?

— Lá vem o manezão se intrometer — Joe riu.

— Cale a boca!

— Claro, Cherry — Langa respondeu.

O rosado se aproximou.

— Bom, você tem medo de lidar com o seu passado. Isso não é algo de que precise se envergonhar. Você teve que lidar com muitas coisas em um tão tenra idade, então é perfeitamente normal sentir medo de trazer todos os seus sentimentos antigos à tona. Porém, isso faz parte de quem você é e, como você mesmo disse, você não pode fugir disso para sempre.

— Vai direto ao ponto — apressou Joe, que foi imediatamente fuzilado pelo olhar do rosado.

— Mas não pude deixar de notar que você comentou sobre não querer se afastar de Okinawa. Bem, neste caso, creio que possa haver uma possibilidade de te ajudar com seus conflitos.

Langa e Reki se entreolharam. Os dois jovens ficaram confusos.

— Como assim?

— A minha pergunta é a seguinte: seria mais fácil para você, Langa, se o Reki te acompanhasse nesta viagem?

Os dois garotos pularam.

— O quê?!

Reki ficou mais vermelho que seu próprio cabelo. Ele sempre soube que o Canadá era uma parte essencial de Langa e que, algum dia, ele poderia voltar para lá. Mas nem mesmo imaginando um milhão de cenários diferentes, ele teria se imaginando viajando junto com o azulado.

— Bom — continuou Cherry, rindo ao ver as expressões dos mais jovens —, parece que temos dois problemas em questão. Por um lado, Langa tem medo de voltar para o Canadá por causa das memórias que possui de eventos traumáticos. Por outro lado, se afeiçoou a Okinawa e não quer se afastar dos laços que criou aqui, principalmente com você, Reki. Então, acredito que, talvez, se você o acompanhasse, isso o ajudaria a enfrentar essa situação.

Os olhares dos dois garotos se encontraram. Ambos estavam confusos, mas ao mesmo tempo, era como se uma faísca tivesse sido acesa em seus corações.

Langa nunca havia pensado nisso. Ele sempre pensou na vida que teve no Canadá e na que criou em Okinawa como dois mundos totalmente separados. Mas, pela primeira vez, a barreira que existia entre esses dois mundos poderia se desfazer.

Reki era a coisa mais importante que ele já teve em sua vida. É claro que as coisas nunca seriam as mesmas, Langa sabia disso. Mas, se ele estivesse com o ruivo, ele sentia que tudo poderia ser melhor. De repente, toda a tensão e medo que ele sentia diminuíram. Seu coração acelerou, mas não de medo, e sim de felicidade. Ele se voltou para Reki e sorriu.

— Isso… seria incrível!

Reki ainda permanecia calado, tentando processar tudo aquilo. Mas sua atenção foi desviada instantaneamente ao ver o sorriso que se abriu no rosto do azulado. Ele pôde ver o brilho em seus olhos enquanto o observava. Dava pra ver claramente que toda a sua angústia havia desaparecido. Ele estava genuinamente alegre. E isso deixou o ruivo alegre também.

Uma onda de pânico tomou conta de si. Ele nunca havia feito nada do tipo. Nunca havia andado de avião, muito menos viajado para fora do país. E se as coisas dessem errado? Como ele iria se dar bem em um país onde ele nem sequer entende o idioma? E se ele não se adaptasse ao frio? E como ele iria pagar pela viagem? E se… e se ele decepcionasse Langa?

Eles estavam falando de acompanhar Langa em uma viagem à sua terra natal. Ele teria que passar por muita coisa. Isso era realmente importante para ele. E ali estava ele, contando com Reki para acompanhá-lo. O ruivo tinha medo de não corresponder às expectativas, de não ser bom o bastante. Ele queria concordar, por Langa, mas as palavras não conseguiram sair de sua boca.

Cherry pareceu notar.

— E, é claro, que se vocês concordarem, todos nós poderíamos acompanhá-los nesta viagem. Creio que isso poderia ser muito bom para todos nós. Esta experiência poderia nos agregar muitos conhecimentos culturais.

— Intercâmbio, é? — disse Miya — Eu gostei.

— Como meus negócios com caligrafia geraram um lucro exponencial acima do previsto neste ano, posso ajudar a financiar os custos da viagem para todos — sua expressão mudou rapidamente para um olhar de ódio, direcionado a Joe — Menos para você, é claro, seu brutamontes nojento!

Joe bufou de raiva.

— Ah, é?! Repete isso na minha cara, seu merdinha!

Cherry se recompôs.

— Mas, então, o que vocês dizem?

Todos olharam uns para os outros.

— Por mim pode ser — Joe concordou, cruzando os braços.

— Eu sempre quis fazer intercâmbio — Miya riu, dando de ombros.

Eles olharam para Reki. O ruivo conseguia ver a expectativa no olhar do azulado. Ele tinha seus medos, mas se seus amigos o acompanhariam, então seria mais fácil. Ele observou atentamente os olhos azuis de Langa e não pôde deixar de notar, mais uma vez, como eles eram lindos. Seus medos não importavam. Isso era por Langa. Então, não importava qual era a situação. Ele  estaria lá pelo azulado, sempre. Até o infinito.

Ele sorriu.

— Beleza. É óbvio que eu vou com você, Langa.

Mais rápido do que qualquer um poderia imaginar, o canadense o abraçou. O ruivo demorou um pouco para se dar conta do que estava acontecendo, mas logo o abraçou de volta. Ele fechou os olhos. Aquela era uma sensação única. Ver o quanto aquilo era importante para Langa, deixava Reki extremamente feliz de poder estar ao seu lado e fazê-lo sorrir.

Ele percebeu que todos estavam olhando e o abraço foi separado, antes que a situação ficasse constrangedora demais.

— Se for do agrado de todos, podemos passar o Natal lá — Cherry propôs — Acredito que comemorar esta data de acordo com as tradições norte-americanas possa ser uma experiência gratificante. Podemos convidar o Oka também se vocês quiserem. E, é claro, Reki e Miya precisam conversar com seus pais primeiro, para conseguir as autorizações. Eu posso ajudar vocês a cuidar de toda a documentação.

— Obrigado, mamãe — Miya agradeceu num tom levemente sarcástico.

— Então se todos concordam — o rosado concluiu —, acho que já podemos fazer os preparativos.

Todos sorriam. Porém, o clima foi quebrado instantaneamente por Shadow.

— Que negócio é esse de todos?! — como sempre, ele gritava — Eu é que não vou pro Canadá, mas nem a pau!

Miya lançou um olhar acusador.

— Não vai me dizer que você tem medo de avião?

— O quê?! — ele ficou histérico — Eu não tenho medo de nada!

— Então por que você não quer viajar com a gente?

— É que… bom, eu… — ele ficou envergonhado e deu alguns passos para trás.

Eles começaram a discutir, junto com Cherry e Joe que entraram na conversa, deixando Reki e Langa praticamente à sós, sentadinhos um ao lado do outro.

O ruivo cutucou o azulado com o cotovelo e riu.

— Aí, cara, não esquenta! A gente vai convencer ele a ir com a gente.

O canadense riu de volta. Sua expressão mudou para um sorriso calmo e tranquilo. Seu olhar expressava claramente suas emoções. Era como se Langa estivesse olhando diretamente para sua alma.

— Ei, Reki. Obrigado. De verdade. Isso é muito importante para mim.

O vermelho devolveu o sorriso.

— O prazer é todo meu, Langa.

O azulado se sentiu incapaz. Ele queria poder expressar o que realmente sentia. Mas não haviam palavras, em japonês, inglês, ou em qualquer idioma que fosse, que pudessem expressar o quão grato ele era por ter Reki ao seu lado. Não apenas naquele momento, mas em todos. Ele era, sem dúvidas, a melhor coisa que já acontecera em sua vida.

Ele se aproximou alguns centímetros.

Reki sentiu seu coração acelerar. Mais uma vez, ele podia sentir a proximidade dos dois. Ele acabou desviando o olhar. Por mais que aqueles olhos azuis fossem maravilhosos, ele não podia deixar de notar aquele sorriso lindo. Aquele era mesmo o garoto que ele amava.  O ruivo faria de tudo por ele. Mas naquele momento, tudo o que ele realmente queria era poder beijá-lo…

Todo clima tenso e angustiante de antes havia passado totalmente. Ambos estavam felizes com a presença um do outro. Tudo parecia calmo e certo agora. Eram apenas os dois. E nenhum deles poderia estar se sentindo melhor.

Então, antes que pudesse reagir, Reki sentiu Langa encostando sua cabeça em seu ombro e depositando todo o seu peso. O ruivo demorou um pouco para entender, mas então percebeu que Langa havia dormido. Em seu ombro.

Ele rapidamente ficou mais vermelho que seu próprio cabelo. Langa não havia dormido bem durante a noite, pensando em tudo. Reki ficou feliz por ver que o azulado finalmente tinha conseguido relaxar. Ele sorriu, contente.

— Ah, Langa — ele riu — Capotou mesmo, hein?

Ele pôde sentir a respiração calma do azulado. Aquela era uma sensação que o ruivo amava. Como sempre, tudo parecia certo e incrível quando estava com Langa. Ele queria poder ficar daquele jeito para sempre.

De repente, gargalhadas altas chamaram sua atenção, o lembrando que os outros ainda estavam lá. Ele olhou na direção do grupo e viu que todos ainda estavam conversando. Eles pareciam distraídos, até que Joe pareceu notar que estava sendo observado e olhou na direção dos garotos.

O vermelho entrou em pânico. Aquilo era constrangedor demais. Sua boca se abriu para falar alguma coisa, mas nada saída. Seu cérebro começou a pensar em milhões de coisas ao mesmo tempo, tentando encontrar algo que pudesse dizer ao verde. Mas, para a surpresa dele, o mais velho apenas deu uma piscadinha e conduziu os outros para longe, dando para Reki e Langa toda a privacidade de que precisavam.

O ruivo sorriu, aliviado. Agora sim, era só os dois. Ele hesitou um pouco, mas encostou a cabeça na de Langa, ficando confortável junto ao canadense. E ficaram daquele jeito, juntos, enquanto o tempo ainda permitia.

 

Depois de algumas horas, todos voltaram para casa. Langa percebeu que tinha dormido quando Reki o acordou, mas o ruivo não lhe deu muitos detalhes.

Após se despedirem de todos, os dois voltaram para casa. Normalmente, era sempre Langa quem acompanhava Reki até a casa dele primeiro. Mas, desta vez, foi o vermelho que quis levar o azulado até sua casa.

Agora, o silêncio da madrugada era relaxante, e não mais angustiante como quando estavam indo para o S. Naquela quietude, eram apenas Langa e Reki na rua. Eles não estavam fazendo nenhuma manobra elaborada, nem nada do tipo, mas apenas de estarem um com o outro, já era suficiente.

O canadense agora estava muito mais aliviado.

— Reki… Você acha que os seus pais vão te deixar viajar?

Por um breve momento, o ruivo ficou com uma expressão pensativa. Mas rapidamente voltou ao seu olhar energético de sempre.

— Ah, se for com você, acho que eles deixam. Eles gostam de você.

Langa ficou levemente envergonhado, mas sorriu.

— E a sua mãe? — Reki perguntou — Será que ela vai ficar de boa se a galera for junto?

— Sim. Ela também gosta de você.

Desta vez, foi o ruivo que ficou envergonhado.

Os dois sorriram um para o outro, e seguiram caminho.

 

Naquela noite, Langa conseguiu dormir tranquilamente. Ele estava um pouco ansioso com relação a conversar com a sua mãe sobre a viagem. Mas, só de saber que Reki estaria ao seu lado, tudo parecia muito mais fácil e leve.

Na manhã seguinte, o azulado juntou toda a coragem que tinha, respirou fundo e foi conversar com sua mãe.

— Mãe?

— Sim, querido? — ela respondeu, sem olhar para ele, enquanto preparava o café da manhã.

— A gente pode conversar?

Nanako parou imediatamente o que estava fazendo e olhou para o filho, com um ar preocupado. Ela deu um sorriso acolhedor e fez um gesto para ele se sentar com ela, na mesa da sala de jantar.

— O que foi, meu amor? — perguntou num tom extremamente calmo e suave, segurando a mão dele.

— Eu fiquei pensando naquilo que você disse anteontem. Sabe, sobre… voltar para o Canadá…

Ele desviou o olhar para um quadro ao lado, onde estava emoldurada uma foto com ele, seu pai e sua mãe, segurando pranchas de snowboard em uma montanha nevada.

— Eu… tenho medo de voltar para lá.

Nanako ficou surpresa. Langa sentia que estava tirando um peso enorme de seu coração ao dizer aquilo. Ele não queria desapontar sua mãe, mas sabia que ela precisava saber.

— Tudo ficou tão diferente depois que o papai morreu. Era como se tudo também tivesse morrido com ele. A nossa casa parecia vazia e os lugares que a gente ia não tinham a mesma alegria. E… o snowboard… era… era…

Ele parou, respirou fundo e tentou retomar o que estava dizendo.

— Eu sinto falta de tudo. Mas eu tenho medo de voltar porque, eu quero lembrar de como as coisas eram antes. E eu não quero que, se eu voltar, tudo esteja do mesmo jeito que estava quando a gente saiu.

Sua mãe enxugou uma lágrima.

— Ah, querido. Nós nunca chegamos a conversar direito sobre isso, não é? Obrigada por ter me contado isso.

Ela segurou as mãos de Langa nas suas e abriu outro sorriso acolhedor.

— Eu sei bem como é. Eu me senti do mesmo jeito. Foi por isso que eu quis vir para Okinawa. Eu pensei que seria mais fácil tentar recomeçar aqui do que continuar lá. E eu sei que deve ter sido ainda mais difícil pra você lidar com tudo isso.

Ela enxugou outra lágrima e respirou fundo.

— Eu queria voltar porque sinto falta do Oliver. Muita falta. E eu achei que, talvez, pudesse me sentir um pouco mais próxima dele se estivesse lá… Mas eu te entendo, querido. Se você não quer voltar, não tem problema. Se for para manter as memórias que nós ainda temos, então está tudo bem.

— Mas é justamente sobre isso que eu queria falar — ele começou, com o coração disparado —  Eu conversei com o Reki e os meus amigos sobre isso e…bom, eles me fizeram perceber que talvez valesse a pena voltar. Eu não quero que isso tudo sejam só memórias distantes. Eu quero poder sentir isso de novo. Eu quero…

— Poder construir novas memórias lá? — Nanako completou.

— Sim.

Langa abriu um sorriso agridoce, que sua mãe retribuiu.

— Então, você quer voltar? — ela perguntou — Tem certeza disso, filho?

— Eu quero. Mas… tem um pequeno detalhe…

De repente, ela ficou com uma expressão que Langa não soube identificar. Ela sorriu, mas um sorriso que quase chegava a ser uma risadinha.

— Você quer saber se o Reki pode ir junto, não é? — ela adivinhou.

O azulado ficou vermelho. Ele tentou dizer alguma coisa, mas as palavras não saiam de sua boca.

— Ah… como… como você sabe?

— Eu sei como ele é importante para você. Assim como o seu pai era.

— E você se importaria se ele viajasse com a gente?

O olhar no rosto dela expressava sua alegria.

— Eu adoraria, querido.

Não dava para medir o tamanho do sorriso que o garoto tinha em seu rosto.

— E, os meus outros amigos podem ir junto também?

— Mas é claro! — ela riu — Ah, eu nem acredito que finalmente vou poder conhecer os outros amigos do meu filho! — ela exclamou em seu tom exagerado de sempre.

Langa retribuiu a risada.

— A gente pode passar o Natal lá?

— Se os pais dos seus amigos concordarem, seria perfeito. Eu vou conversar com a mãe do Reki. Graças a vocês, agora somos melhores amigas!

Os dois começaram a gargalhar.

— Obrigado, mãe. De verdade.

— Eu que agradeço, Langa.

Ela segurou o rosto do filho afetivamente com uma das mãos.

— Ah — ela parecia ter tido uma ideia — Sabe… de repente… você poderia ensinar o Reki a andar de snowboard.

— O quê?

— Bom, ele te ensinou a andar de skate. Agora você pode ensinar ele a praticar snowboard.

Ele sorriu.

— Eu não tinha pensado nisso.

Sua mãe o abraçou forte e logo se recompôs.

— Bom, agora vamos tomar café da manhã. Temos um longo dia pela frente!

Ela levantou e voltou a preparar as coisas. Langa também se levantou, sorridente, e se aproximou do quadro com a foto da família. Ele o segurou e ficou observando a imagem de seu pai com o snowboard.

Ele ainda tentava processar tudo isso.

— Eu vou voltar para o Canadá…

Ele se virou para seu skate, no canto da parede.

Nós — corrigiu, pensando no ruivo — vamos para o Canadá.

 

Então se todos concordam”, a voz de Cherry era emitida pelos televisores, “acho que já podemos fazer os preparativos.

A imagem do grupo conversando era exibida em uma sala cheia de monitores, cada um mostrando a visão de uma câmera diferente do S.

A fumaça proveniente do cigarro se espalhava pela sala pequena.

— Ah... Então quer dizer que o pequeno Snow e seu grupinho vão viajar para o exterior? Isso não é… — o homem que assistia se levantou de sua cadeira e começou a sapatear — excitante?

Ele abriu um sorriso malicioso.

— Tadashi, faça os preparativos. Nós vamos viajar.

O outro, que estava parado mais ao lado, ficou surpreso.

— Mas senhor Ainosuke, tem certeza que é apropriado realizar uma viagem para fora do país agora?

— Ah, Tadashi. Não se preocupe com isso. O pequeno Langa vai viajar e eu não perderia isso por nada.

Adam deu uma última tragada em seu cigarro.

— Então, comece logo os preparativos — ele se virou para Tadashi, sorrindo — Nós também vamos para o Canadá.


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Notas finais do capítulo

Obrigado por lerem mais um capítulo! Eu realmente espero que vocês tenham gostado.
A minha vida ficou muito mais corrida agora, então não tenho nenhuma previsão de quando sairá o próximo capítulo e, provavelmente, vai demorar um pouco. Mas essa história é muito importante para mim. E, de qualquer forma, ela já foi toda planejada. Então sim, eu pretendo finalizá-la, mesmo que demore. E, falando nisso, eu planejei a história com todos os capítulos grandes, embora sejam poucos. Mas espero que, conforme minha rotina for se estabilizando, eu consiga me dedicar mais à escrita.
Ah, e só queria esclarecer que eu estou acostumado com a versão dublada do anime, que eu gosto muito aliás, por isso eu tento escrever as falas dos personagens de acordo com o jeito de cada um na dublagem.
Mas enfim, obrigado de verdade por lerem. Eu estou bem animado para continuar! Me contem o que vocês acharam desse capítulo e o que vocês esperam do próximo! Eu amo mesmo ler os comentários de vocês! Isso é muito importante para mim e me anima de verdade!
Bom, até o próximo capítulo! Se cuidem e se hidratem!



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