Folklore escrita por Gorky


Capítulo 6
Salvador


Notas iniciais do capítulo

oi!
espero que todo mundo tenha tido um bom carnaval. vou repostar porque o nyah parece estar meio bugado. aproveitem!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/805534/chapter/6

 

capítulo seis

Victoria Donovan estava desaparecida há quase uma semana.

Só se falava disso nos jornais e noticiários. Entre os moradores, porém, o nome da irmã de Matt era pouco pronunciado. Emília entendia por que. Vicki era uma típica garota-problema, com um longo histórico de envolvimento com drogas, filha de um lar desfeito. O seu sumiço não foi o bastante para obrigar a sua mãe a voltar para Mystic Falls. Emília nem se lembrava do nome dela (era Carol? Mary? Kelly?). Vicki nem chegou a concluir o ensino médio. Ela largou os seus estudos no penúltimo ano e começou a trabalhar como garçonete no Grill. Também não era uma pessoa popular e amigável; o que acontecia ou deixava de acontecer com ela não importava para a maioria das pessoas da cidade. O próprio Matt alegou estar ficando cansado de limpar a bagunça da irmã. Emília desconfiava que Jeremy estava mais preocupado do que Matt.

Ela não culpava o irmão. Nem Matt. Por mais que não gostasse de Vicki, ela às vezes se pegava pensando nela naquele dia, a angústia estampada no seu rosto, em cada movimento que ela fazia. Emília não falou para ninguém, mas ela não ficaria surpresa se encontrassem o corpo de Vicki em algum lago ou rio.

Talvez ela tenha pulado da mesma ponte que matou os pais de Emília. Wickery. Um nome um tanto apropriado.

 

Emília abriu a geladeira quando Jeremy passou pelas escadas como um fantasma, batendo a porta de entrada com força. Dois minutos depois, Elena desceu os degraus e se dirigiu à cozinha, onde a irmã ainda encarava a porta com espanto.

― O que deu nele? ― Emília indagou, apanhando uma caixa de leite.

― Vicki ― Elena respondeu com rispidez. Emília não se zangou; estava claro de quem Elena sentia raiva.

― Bom dia ― Jenna disse, mas Emília mal escutou.

A Gilbert mais velha tentou não pensar na conversa que escutou entre Elena e Stefan dias antes, quando Vicki ainda não tinha desaparecido. Contudo, foi inevitável. Nada daquela breve conversa fazia sentido para Emília. Nada. Ela só tem algumas horas. Humana. Transição. A escolha que você fez. O que eles poderiam saber que Emília não soubesse? Por que não falaram nada? Emília sentia como se tivesse apenas metade das peças de um quebra-cabeça.

Na escola, depois da sua segunda aula do dia, Emília encontrou com Tyler no corredor, alunos caminhando para lá e para cá. Ele coxeava, a mão tocando a cintura e as costas. Praticamente nem a enxergou ali; Emília que precisou pará-lo para chamar a sua atenção.

― Oi, você. O que foi? Não devia estar em campo?

― Devia, mas fui dispensado. Tô com uma dor muito estranha desde ontem à noite.

― Você caiu?

― Não sei, não sei de onde essa dor veio ― ele deu de ombros. ― Ficou sabendo que estão organizando uma equipe de buscas pela Vicki?

O sangue dela ferveu.

― Por que tá falando sobre ela?

― Ela desapareceu, Emmy. Acho que a minha promessa não conta numa situação dessas.

― Conta, sim. Para de falar nela! ― ela não compreendeu a própria mudança brusca de humor. Vicki não era de fato uma ameaça, mas ainda irritava Emília profundamente. Por que Tyler não podia ser mais como a mãe de Vicki e Matt? ― Ela tá bem, eu tenho certeza. Deve estar se drogando em algum beco escuro.

Ele abaixou a cabeça e mordeu o lábio inferior. Obviamente não queria discutir com a namorada.

― Tá bom.

Ela quase se desculpou.

No intervalo, ela foi parada por Caroline na entrada da biblioteca. A Forbes segurava duas grandes sacolas pretas, que continham acessórios e roupas para a festa do Dia das Bruxas promovida pela escola naquela noite. Emília lembrou que Caroline fazia parte do Comitê de Organização. É claro que sim.

― Oi, Mila. Você vem na festa hoje?

― Claro que sim ― Emília deu um sorriso tímido.

Caroline retribuiu com um sorriso mais largo.

― Ótimo, porque eu vou te procurar.

Depois, ela questionou Corinne, Sara e Angie sobre a festa. As três confirmaram presença.

Ela não viu a irmã em lugar nenhum.

 

Emília pensou na sua fantasia por horas; dias, na verdade. Desde que começaram a espalhar cartazes pela escola convidando os alunos para a festa, na segunda-feira. Porém, ela só conseguiu se decidir na sexta, justamente no dia da festa. Ela não tinha uma boa segunda opção, então esperava que a primeira desse certo. E isso dependia de Elena.

Quando chegou em casa, a irmã já estava lá, sentada em um dos sofás, encarando fixamente a lareira. Jenna, pelo visto, não estava em casa. Emília falou "oi" e Elena falou de volta, com pouca animação.

― Eu não te vi na escola hoje. O que aconteceu? Tava procurando a Vicki com o Jeremy?

― Eu não tava me sentindo bem.

Ela estava mentindo, Emília percebeu. Mas preferiu não comentar. Seja lá o que tenha acontecido, foi algo sério. Mais um segredo dela com o Stefan?

― Então, você ainda tem sua roupa de torcida?

― Tenho, por quê?

― Eu posso usar hoje na festa?

― Que festa?

― A festa de Dia das Bruxas. A gente falou disso ontem.

― Ah, é mesmo. Desculpa, minha cabeça tá fraca hoje. Pode, pode usar. Pode até ficar com a roupa pra você, eu não vou voltar pra torcida mesmo. Tá na última gaveta da minha cômoda.

Elena não se importou em olhar para ela enquanto falava. Emília tentou não se irritar.

Ela achou o uniforme com facilidade. Na única gaveta de sua penteadeira, dentre outros objetivos, havia um frasco com sangue falso, comprado para o Dia das Bruxas do ano anterior. Restava bastante.

Emília entrou no banho às seis e trinta e oito da noite. Ela se maquiou de toalha, no espelho do seu banheiro. Usou secador, deixou o cabelo solto, vestiu o uniforme (muito curto e desconfortável, mas ela não achava que as pessoas iriam reparar nisso), tênis e espalhou sangue falso pela sua roupa e corpo. Um pouco no rosto também. Tyler a buscou no seu carro e os dois chegaram na festa ― que ocorria tanto no estacionamento do colégio quanto no seu interior ― lado a lado.

Quando avistou Caroline, fantasiada de bruxa, uma imagem desagradável se intrometeu na sua mente: a da loira adentrando aquela mansão bizarra, ignorando os gritos de Emília. Mil teorias já haviam sido formuladas desde aquele dia, mas nenhuma fazia sentido. Apesar de que a situação toda já não fazia sentido, para começar. Por que todos pareciam estar escondendo segredos de Emília?

Ela não gostou de fazer essa associação, mas não pôde deixar de notar que tudo isso teve início com Stefan Salvatore.

― Pega alguma bebida pra mim, Ty ― ela pediu com delicadeza, torcendo para ele não ter percebido os olhares que ela lançou à Caroline.

― Alcoólica? ― ele estranhou. Emília o examinou de cima a baixo. Ainda não sabia qual era a fantasia do namorado (ele usava calça e uma capa vermelha; o peitoral todo à mostra para qualquer um que quisesse ver).

― Pode ser, sei lá.

― Tem certeza?

― Sim, tenho! Beber só uma vez não vai me afetar ― ela revirou os olhos quando ele se afastou. Às vezes, ela sentia que o seu relacionamento com Tyler encontrava-se sempre em uma corda-bamba interminável, mas nenhum dos dois nunca queria cair.

Caroline abriu um largo sorriso quando a Gilbert andou até ela. Bonnie, por outro lado, só sorriu por educação, claramente. As duas não eram próximas e nunca foram, mesmo Bonnie sendo a amiga mais antiga de Elena.

― Oi, meninas ― Emília as cumprimentou.

Caroline e Bonnie falaram "oi" em tons diferentes.

― O que é isso? ― Emília apontou para o copo em uma das mãos de Caroline.

― Cidra. Das fortes ― ela se inclinou mais para Emília ouvi-la. Tinha muita gente no estacionamento.

Emília fez uma careta.

― Você gosta de cidra?

― Mais ou menos, mas o meu objetivo principal aqui é ficar bêbada até achar alguém gostoso o bastante pra dar uns amassos.

― Nossa, agora eu fiquei um pouco ofendida.

Bonnie soltou um "uh" baixinho.

― Eu preciso ir ao banheiro ― ela disse. Caroline e Emília assentiram. As três entendiam o que estava acontecendo.

Quando Bonnie se distanciou o suficiente, Emília falou:

― Eu acho que também preciso ir ao banheiro. Me mostra o caminho?

Caroline prontamente aceitou.

Caroline saiu do cubículo primeiro. Emília saiu quase dez minutos depois. No estacionamento, ela se deparou com um Tyler perdido e levemente enfurecido.

― Onde você tava? Eu fiquei te procurando feito louco ― ele segurava dois copos cheios.

― A Bonnie não disse que eu precisei ir ao banheiro?

― Por que eu perguntaria pra Bonnie? ― ele franziu as sobrancelhas.

Emília deu de ombros e pegou um dos copos. Tinha cerveja dentro.

― Obrigada.

Tyler esqueceu a sua raiva quando Emília o beijou. Ela alternou entre beber e beijar. Ficou assim por muito tempo. Eventualmente, os dois se cansaram, se despediram e seguiram caminhos diferentes pelo colégio: ele permaneceu no estacionamento, ela entrou para dentro.

A escola estava sendo iluminada de uma maneira fantástica; uma coloração azulada, e então vermelha, e então verde. Neon. Não foi diferente no ano passado, mas não deixou de encantar Emília. As últimas semanas lhe pareceram mais cansativas do que o normal, mas aquela noite trouxe um certo conforto para Emília, que ela não sentia há um tempo já. Talvez tenha sido apenas o "efeito Caroline", como Angie chamou uma vez.

Por falar em Angie, Emília a procurou pela escola, mas não a encontrou em lugar algum. Ela então procurou por Corinne; as duas se esbarraram nas escadas. Conversaram por poucos minutos. Eu tô falando com um menino tão gatinho, Corinne confessou, bêbada. Sério? É, amiga. Ele tá me esperando, eu preciso ir. Mais tarde, após jogar fora o seu segundo copo vazio, ela conversou com Sara. Ou melhor, Emília falou "oi" e Sara respondeu com mais um de seus monólogos.

Em determinado momento da noite, com Emília vagando sozinha pelos corredores, ela avistou Vicki Donovan com Jeremy. Ou, pelo menos, foi o que pareceu de longe. Emília viu rápido demais os dois rostos. Eles se viraram e andaram juntos para outro caminho. Era, sem dúvida, um casal. Vicki Vicki Vicki o que você quer?

Assim como ela inexplicavelmente seguiu Caroline no lava a jato, ela fez o mesmo com aquelas duas figuras incertas. Eles estavam seguindo para o lado de fora, na parte de trás da escola, onde ficavam os ônibus escolares amarelos. Não devia ter quase ninguém lá; um local perfeito para ficar a sós com outra pessoa.

Um local perfeito para matar uma pessoa.

Tudo ocorreu numa velocidade difícil de acompanhar, sobretudo se você está embriagada. Primeiro, Emília seguia o casal apaixonado que aparentemente só queria dar uns amassos em paz, e, depois, ela ouvia o rapaz ― que tinha a mesma voz de seu irmão era de fato o seu irmão ― gritar por socorro. Vicki! Vicki! Vicki, para!

Emília os achou encostados em um dos ônibus parados. Vicki mordia Jeremy. Ou tentava morder.

― Vicki! ― ela berrou de desespero e confusão. Vicki largou Jeremy com brutalidade e se virou para ela. Nada na irmã mais velha de Matt assemelhava-se ao que ela era antes. Ela não parecia mais humana. Emília não sabia como, mas Vicki se moveu com tamanha agilidade que a Gilbert não conseguiu nem mesmo dar um único passo para trás. Vicki já estava lá, prendendo-a no lugar, mordendo o seu pescoço. Emília sentiu uma dor insuportável e única.

Alguns segundos se passaram, talvez minutos; uma eternidade para Emília. Os dentes de Vicki se desprenderam de sua garganta e a sua força diminuiu de uma vez; Emília desabou no chão áspero como uma boneca. Seus olhos ficaram pesados demais e ela teve que fechá-los. Quando os abriu novamente, Vicki também estava no chão, sem nenhum movimento, os olhos arregalados. Jeremy não estava sozinho. Emília notou a presença de outras figuras com eles. Todas de pé.

Alguém se agachou ao lado dela e colocou delicadamente as mãos ao redor de seu pescoço, examinando-a. Stefan.

Emília puxava ar de seus pulmões com dificuldade. Ela tentou se apoiar nos cotovelos, mas caiu logo em seguida. Um pouco mais à frente, perto de um dos ônibus, Elena conversava com um Jeremy totalmente horrorizado.

Stefan mordeu o próprio pulso e então o aproximou, ensanguentado, aos lábios de Emília.

― Vamos, pode beber.

Se ela estivesse menos machucada e perdida, ela diria que não. Não fazia sentido, era nojento, repulsivo... mas ela já tinha ouvido e visto tantas coisas malucas nos últimos dias e sentia-se tão exausta e dolorida, que acabou nem discutindo. Ela simplesmente obedeceu Stefan, um cara que ela mal conhecia e que podia ou não ser a razão pelas coisas ruins que vinham ocorrendo.

Quase instantaneamente, ela melhorou. A ferida aberta no seu pescoço curou-se por conta própria. Sua fraqueza passou (não completamente, mas o bastante para ela se levantar). Sua visão ficou mais nítida. Ela enxergou Stefan, Elena, Jeremy, Vicki e aquele homem estranho, o ex-namorado de Caroline e irmão de Stefan. Damon?!

Nome difícil de esquecer.

― Leva ela e o Jeremy embora ― Elena falou para Stefan. Nem olhou direito para a irmã. Mas Emília não rebateu. Nem Jeremy. Os três saíram mudos. Ela e Jeremy pareciam em transe. O carro do irmão de Stefan não ficara longe dali, o que foi um alívio para Emília. A última coisa que ela queria era encontrar Tyler ou Caroline.

Stefan dirigiu até a residência dos Gilbert. Merda e a Jenna? Por favor que ela esteja com o Logan por favor que ela esteja com o Logan por favor que ela esteja com o Logan por favor...

Jeremy saiu do veículo primeiro. Ele entrou para dentro imediatamente. Emília respirou fundo, a cabeça encostada no vidro do banco da frente. Ela pensava em muitas coisas e em nada ao mesmo tempo. Do que exatamente Stefan e Elena falavam naquele dia? Por que Caroline agiu daquele jeito no lava a jato? De quem era aquela mansão? O que Stefan escondia? O que aconteceu com Vicki? Como ela a mordeu com tanta força? Por que ela atacou Jeremy? Ela ao menos ainda estava viva?

― Como você tá? ― Stefan esticou um pouco a mão, mas logo desistiu. Emília não conseguiu encará-lo. Seu coração acelerava a todo instante. Ela temia ser a próxima vítima. Talvez ela soubesse demais. Um tremor excruciante percorreu todo o seu corpo até chegar ao seu rosto.

Emília, Emília, Emília.

Stefan a chamava, mas a sua voz soava cada vez mais distante. Ela queria respondê-lo, dizer que tinha algo de errado, mas, apesar de ser capaz de separá-los, nenhuma palavra escapava de seus lábios. Nem um mísero sussurro. Não é seguro aqui. A sua visão ficara turva, embaçada. Emília sentia que estava caindo, mas não conseguia se segurar em nada. Eu não me lembro disso. Pela segunda vez em menos de uma hora, por razões diferentes, manter os seus olhos abertos tornou-se uma tarefa árdua e ela obrigou-se a fechá-los. A mesma escolha que você fez?

Ela não viu quando o Salvatore mais novo a carregou para dentro. 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

já estamos nos aproximando do fim da primeira fase da história!
deixem um comentário, por favor.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Folklore" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.