Folklore escrita por Gorky


Capítulo 12
Canção da lua




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capítulo doze 

No domingo, Emília acordou com Jeremy a cutucando e gritando no seu ouvido que já estava quase na hora do almoço. Na verdade, ele não gritou de fato no seu ouvido, mas foi como se tivesse. 

Por consequência de não ter jantado e acordar tão tarde, Emília sentia-se praticamente de ressaca. Seus olhos ardiam, seu estômago dava nós, sua audição encontrava-se mais sensível do que o habitual, sua cabeça doía, e a temperatura de seu corpo parecia exageradamente quente. Assim que conseguiu se erguer do sofá (eu dormi no sofá?), ela subiu as escadas e atravessou a porta aberta de seu quarto. Não falou nada para Jeremy. Mal olhou para a cara dele. 

Jeremy não se ofendeu. Ele sabia que aquele era o humor de sua irmã quando ela despertava tardiamente. 

Emília tirou suas roupas e tomou um longo banho gelado. Lavou com shampoo e condicionador os cabelos ressecados, já começando a sentir nos dedos os efeitos da tinta. Sem dúvidas, ela retornaria para a sua cor natural no próximo ano. 

Lavou o restante de seu corpo com sabão e esfregou com dedicação a água do chuveiro no seu rosto, esperando afastar todas as sensações de desconforto e dor. Funcionou em parte. 

Por que os domingos tinham que ser tão deprimentes?

Quando saiu do banheiro, com a toalha cobrindo sua nudez, ela viu o seu celular vibrar em cima da sua penteadeira. 

TY 

quer ir pra festa do bobby harrison comigo hoje? vai ser no bosque, como sempre

Emília cerrou os olhos por um breve minuto, e em seguida respondeu:

talvez 

Então, Tyler mandou vários pontos de interrogação, mas Emília não respondeu. 



Na mesa da cozinha, Jenna, Jeremy e Emília inicialmente almoçaram em silêncio. Antes, enquanto Emília se servia, Jenna comentou alguma coisa sobre se sentir culpada por não forçar a sobrinha a jantar noite passada. Emília disse que estava tudo bem e mentiu que já havia comido bastante com Corinne num restaurante. Depois, Emília finalmente percebeu um fato inquietante: a ausência de Elena.

― Cadê a Elena?

― Dormiu na casa do Stefan. Ele ligou agorinha e disse que ela ia ficar pra almoçar lá. 

Emília relembrou a noite anterior. Ela havia saído com Corinne para uma sorveteria; e quando voltou, a sua irmã estava saindo com Stefan. Ela não especificou para onde ia, nem o que ia fazer. 

Apesar de ter consciência de que deveria, Emília não parou:

― E você acredita nele?

― Por que ele mentiria pra mim sobre isso? ― Jenna levantou a cabeça para a sobrinha, mastigando carne. 

― Ah, a Lena já fugiu antes.

Ela não entendia por que continuava falando. 

― Mas o Stefan não teve nada a ver com isso. Ela só… ― Jenna hesitou. ― Estava com raiva. 

Do quê?

Emília repentinamente se sentiu presa numa realidade paralela. 



Noite passada, ela queria tanto saber o que a irmã escondia, queria ser parte do mesmo mundo que Elena. Por que ela havia saído com Stefan? Quando eu voltar, eu te conto tudo, ela disse. As palavras ainda grudadas na mente de Emília. A opinião e julgamento de uma pessoa pode mudar muito em pequenos intervalos de tempo, sobretudo uma pessoa inconstante e indecisa como Emília. 

Agora, ela não desejava descobrir para onde a irmã havia seguido com o namorado vampiro. Ela não se importava mais. Naquela tarde ensolarada de domingo, a única preocupação real de Emília era o seu dever de casa. Foi bom perceber a sua própria indiferença com o sobrenatural, reproduzindo a indiferença do sobrenatural com ela. 

Mas não deixava de ser um pouco frustrante. 



― Ei, estranha ― Jeremy surgiu na batente de sua porta, quando Emília fazia o seu dever de matemática, debruçada sobre a escrivaninha. Ela ergueu os olhos para ele, com o lápis dentre os dedos. ― Quer ir pra festa do Duke comigo? 

Ela riu fracamente. 

― O nome dele é Robert Harrison.

― Você conhece ele? ― Jeremy franziu o cenho. 

― Mais ou menos. 

Bobby e Tyler eram amigos de longa data, apesar de Bobby ser três anos mais velho. Ele nunca foi nada além de um imbecil para Emília. 

― Então, quer ir?

― Se eu terminar todas as minhas tarefas a tempo ― ela brincou com o lápis em sua mão, girando-o freneticamente. 

― Você pode terminar amanhã na escola.

― Não, nossa. Eu odeio procrastinar! Chama algum amigo, sei lá. 

Jeremy pareceu pensativo por um instante. 

― Amigo? 

― Ah, por favor, não me vem com esse papo de “não tenho amigos”, porque eu sei que não é verdade.

― Não é isso ― ele respirou fundo e bateu, sem força, com a mão na parede. ― Eu vou convidar uma amiga, então.



Matemática, química, física e literatura. O cérebro de Emília quase explodiu. Assim que terminou o dever, ela se jogou com animação na cama e fechou os olhos, aguardando pelo sono, que não tardou a aparecer. 

Ela sonhou com tempos distantes, com o seu pai dirigindo o carro, com o carro capotando, com ela, e então Elena, berrando por socorro. Sonhou com árvores, presas, sangue, cadáveres amontoados queimando, um menino morto sendo carregado pelo irmão mais velho. Henrik. As peças do quebra-cabeça estavam se encaixando. Pouco a pouco. 

Quando acordou, com suor na testa, ela enviou uma mensagem para Tyler. 

vem me buscar. 



Carros, árvores, uma fogueira, garrafas de cerveja, adolescentes e universitários fora de si… essa foi a visão de Emília ao chegar à festa de Bobby, o que não a surpreendeu nem um pouco. Eu comprei pra você, Tyler lhe disse quando os dois estavam dentro do carro dele, entregando a ela uma lata pequena de Coca-Cola. Obrigada, ela respondeu sem ânimo. No céu estrelado acima deles, não havia mais nuvens. 

Jeremy não veio com eles. Emília nem o convidou, porque sabia que o irmão nunca entraria no mesmo veículo que Tyler Lockwood. Ele me disse que traria uma amiga. 

Tyler se encontrou com Bobby, alguns amigos universitários de Bobby, e os meninos do time de futebol. Emília mal os cumprimentou. Os que ela conhecia não gostavam dela; os que não a conheciam certamente não gostariam se a conhecessem. E ela não gostava de nenhum deles. 

Por que vocês ainda estão juntos?, Corinne lhe perguntou uma vez. 

Emília encostou-se em uma árvore e permaneceu ali por muito tempo, bebendo a sua Coca-Cola com calma. Ficou observando as pessoas ao seu redor, todas berrando, ou se beijando, ou rindo, ou quietas como ela. Mas havia uma unanimidade: todas se embebedavam. Todas com exceção de Emília. E todas não prestavam atenção nela. Nem mesmo Tyler. 

Aquilo não devia incomodá-la, mas incomodou. 

Ela avistou Caroline e Matt de mãos dadas, conversando um com o outro. Eles eram oficialmente um casal agora. Bem, é a vida dela. Ela pode fazer o que quiser, Emília tentou se convencer, com um gosto amargo na boca. E então, ela avistou o seu irmão com a tal amiga. Uma menina de baixa estatura, provavelmente da mesma idade que Jeremy ou até um pouco mais nova. Ela usava somente preto, os cabelos também escuros. Emília não a reconheceu e sentiu-se levemente brava com Jeremy por isso. Há quanto tempo eles se conhecem? 

Ao menos, a lua era um conforto. O único conforto naquele momento. Enquanto ela andava de volta para casa, após se cansar de lidar com um Tyler completamente bêbado (que por pouco não brigou com o seu irmão de novo), ela quase não tirou os olhos da lua; grande, redonda e radiante. Eu vou embora agora, Ty, ela avisou de antemão, mas ele não falou nada de volta. 

De repente, ela se pegou com saudades do pai e da mãe. Queria que estivessem ali, esperando por ela em casa. Ela tinha convicção de que as coisas estariam melhores se eles estivessem vivos. Talvez, se isso fosse uma realidade, ela nem saberia sobre a existência de vampiros e bruxas. 

E então, ela foi consumida pela raiva. Raiva de Corinne, por não aparecer no bosque. Raiva de Sara, por não ter a cumprimentado. Raiva de Jeremy, por estar acompanhado de uma garota que ela não conhecia. Raiva de Elena, por ter sumido. De Stefan, por absolutamente tudo que vinha ocorrendo na sua vida desde que ele retornou à Mystic Falls. E, principalmente, de Tyler. 

Por que vocês ainda estão juntos?

Emília tinha uma resposta para essa pergunta um ano atrás, mas ela não conseguia mais se justificar. 



Longe dali, na tumba escondida debaixo das ruínas da Igreja dos Fell, 25 vampiros sedentos por sangue e vingança rastejavam-se para fora. 


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