SoulsEyes escrita por Neko D Lully


Capítulo 2
Capítulo 2: Vida e Morte


Notas iniciais do capítulo

Hello~! Bom ver todos vocês de novo!
Em primeiro lugar, hum... Sorry pelos capítulos enormes? Meio que virou meu novo normal uma média de 10k de palavras por capítulo então... É, se acostumem com isso e se virem. Bem se metade dos leitores forem iguais aos que tem em Fusion então acho que não tem problema... De qualquer jeito isso significa que vocês não devem esperar atualizações frequentes. Eu ainda estou trabalhando no meu livro então isso é meio como um treino de escrita e uma forma de manter minha mente focada de alguma forma. Eu já tenho planejado alguns caps seguintes (pelo menos até o oitavo e o nono cap o que apenas dá até mais ou menos o final da parte das ruínas -.-''', que os deuses me ajudem na quantidade monumental de vezes que vou ter que rever a gameplay desse jogo)
Aqui é onde tudo realmente começa na história, novamente lembrando que Frisk pode ouvir seus comentários e interagir com vocês no decorrer da aventura dela então sempre lembre de conferir as notas finais para ter um pequeno olhar para o que possivelmente pode acontecer com ela nos próximos caps. As decisões dela podem ser influenciadas por vocês dependendo da situação, mas destino é destino então alguns eventos estão escritos em pedra e mesmo se você decidir permanecer em silêncio Frisk continuará com a aventura dela normalmente.
Agora, aproveitem o cap! Eu particularmente estou gostando dessa dinâmica kkk



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SoulsEyes - Vida e Morte 

Ao longe, o sol da manhã começava a raiar. Lenta, mas seguramente, os raios solares se erguiam no horizonte distante e começavam a espantar as sombras da noite que mergulhavam o pequeno vilarejo ao pé da montanha. Porém, ainda era cedo, os raios demorariam alguns minutos para alcançar o ponto necessário para iluminar a terra que apenas começa a despertar, a calmaria do começo de um novo dia.  

Penumbra ainda se mantinha plana sobre o lugar, ligeiramente clareada pela nova luz, não o suficiente para ver, mas o suficiente para enganar. Tema o começo da manhã, caro amigo, pois é ponto onde as sombras começam a se recolher e trazer consigo aquilo que nelas se esconde. E o que se esconde da luz se desespera por um último pedaço de suas vítimas antes de finalmente se recolher para os recantos profundos da floresta novamente, onde o sol e a luz não podem mais tocar.  

E, mergulhado na pouca faixa escura que ainda era tomada pelos resquícios da noite anterior, longe do vilarejo que começa a despertar para seus afazeres diários e suas vidas comuns, está uma pequena e singela casa, construída em madeira de carvalho envelhecida, mas ainda firme, teto vermelho que parece preto com a falta de luz, mas paredes brancas, desbotadas com o tempo, a tintura lentamente descascando para mostrar novamente a madeira por baixo, o casco escuro de troncos marrons que apesar dos anos e castigos do tempo, continua frondoso como se tivesse acabado de ser cortado. Janelas se encontravam abertas agora, deixando a brisa leve da manhã adentrar por suas passagens e arejar o interior também singelo da pequena morada. Não existia muito dentro, tal como o lado de fora também não era marcante. Quatro cômodos simples, nada mais do que o necessário, cozinha, quarto, sala e banheiro, poucas paredes a separá-los e muito poucos móveis para enfeitá-los. Todos eles rústicos, feitos a mão também de carvalho, pele e couro animal, já mostrando as consequências do uso constante e do tempo em seu tecido rasgado, molas soltando e pregos enferrujados, prontos para ceder. Eles ainda durariam mais alguns anos, se você me perguntar, móveis assim são feitos para durar, gerações e mais gerações de próximos moradores, relíquias esquecidas pela história, mas teimosamente presentes.  

Como nós.  

Bem vindo de volta. Faz um tempo que não o vemos por aqui.  

Não faz mal. Tempo, como viemos a aprender, é um conceito relativo, principalmente quando vida não está mais na equação. Vemos a passagem das horas, dias e anos de formas diferentes, talvez porque ele não nos afeta mais, não nos causa dor, não nos modifica como o fazia antes. Às vezes, apenas nos perdemos, ele passa e nos esquece e, quando finalmente percebemos, gerações deixaram de existir e estamos em uma nova era, desconhecida para nós. É opressor, eu imagino, mas acontece com todos nós uma vez ou outra, não podemos estar sempre presentes.  

Mas não se preocupe, você não perdeu muito.  

Oh! Vejo que você tem perguntas. Não se preocupe, quem você procura não está muito longe, seu dia começa cedo, muito antes dos primeiros raios de sol surgirem, antes das sombras da noite se dispersarem. É fácil entender o motivo, mas, creio, você ainda é muito novo para saber sobre esses detalhes. Novamente, não se preocupe, você vai aprender se ficar ao redor tempo o suficiente. Frisk não costuma esconder o que ela é ou do que é capaz.  

Vamos, ela está dentro da singela casa agora mesmo. Passe por sua porta de madeira vermelha e vire à direita para entrar na cozinha, você vai poder sentir o característico cheiro de café preenchendo o ar, a atmosfera calorosa apesar do leve frio da manhã, ainda não aquecida o suficiente pelo novo sol. Existe uma mesa ao centro, pequena, novamente de madeira, meio manca, apenas uma cadeira a acompanha agora, não precisa de mais. Um pequeno pano a cobre, apenas seu centro, não grande o suficiente para alcançar as bordas, branco e bordado com dourado e vermelho, tendo sobre ele uma bandeja repleta de pão relativamente fresco e o jarro de onde o cheiro de café se origina, uma pequena caneca já posta de frente a única cadeira presente, fumegando com o líquido recém filtrado.  

A garota que você procura não mais é a pequena serelepe que pulava sobre a cama ansiosa por uma história para fazê-la dormir. Não, os anos passaram e, diferente de nós, ela mudou. Ela cresceu para se tornar o começo de uma bela mulher que vive uma vida árdua, mas prazerosa em seus padrões tão pequenos. Cabelos ainda castanhos escuros, cheios, recobrindo seu rosto redondo, ainda extremamente jovem e rechonchudo. Os fios mal alcançam-lhe os ombros, apesar da parte frontal estender-se por alguns centímetros a mais, em um bico ondulado que lhe toca a clavícula com delicadeza. Sua pele parece mais morena, você irá notar, escura e marcada por leves sardas que lhe salpicam o rosto. Ebott não tem muito sol, você vai aprender, mas o suficiente para marcar a pele daqueles que passam tempo suficiente debaixo dele. Olhos dourados turvos, cegos para o mundo que a cerca, mas atentos para o nosso, existe um brilho neles, cheios de vida e alegria. Ela não cresceu muito em tamanho, seu corpo se tornou curvilíneo, mas ainda forte, braços grossos devido ao trabalho árduo na horta do lado de fora, com mãos calosas por remexer a terra uma e outra vez, cuidando das plantas que cultiva. Pernas grossas acostumadas a andar em terrenos difíceis, escorregadios e imprevisíveis, acostumados com os meandros da floresta.  

Ela dança ao redor com uma agilidade e destreza que você não espera encontrar em pessoas como ela, pessoas incapazes de ver. Mãos dançando sobre o balcão e os armários em movimentos coreografados, já reconhecendo cada recanto da singela casa de tal maneira que não precisa de seus olhos para ver. Ela pega a manteiga e a faca que procurava antes de chegarmos e as coloca junto ao resto das coisas na mesa, tomando seu lugar na cadeira presente e sentando-se em um movimento fluído, novamente decorado, já pronta para cortar o pão e passar-lhe a manteiga.  

Um café da manhã simples, mas tudo que ela precisa para começar seu dia. Algumas frutas estão presentes, aqui ou ali, que completam sua refeição da vez, derivadas das árvores que permeiam os redores de sua simples casa. Ela então sorri, tarefa ainda em mãos, mas atenção agora em nós.  

—Bom dia Chara e olá novamente! Tanto tempo sem ver, como tem estado? - ela lhe pergunta, sua voz ainda é suave, cantarolada, animada, mas ligeiramente mais grossa devido a idade, não muito, mas a diferença é fácil de perceber em seus ouvidos desacostumados. É definitivamente um bom dia, Frisk. Nosso velho amigo parece ter se perdido nos meandros do tempo, mas nada com que deva se preocupar. - Isso é ótimo ouvir! - não queremos interromper sua manhã, sei como tem muito a fazer, mas nosso amigo parece ter algumas perguntas para você. - Oh, não tem problema algum! Podemos conversar enquanto eu como, se não tiver problema.  

Suas mãos vagam pela mesa até encontrar a borda da bandeja com frutas, não se demorando muito para pegar uma e levar aos lábios para morder, para em seguida tomar o pequeno pote com o que se supõe ser açúcar e derramar duas pequenas colheres dentro de sua xícara de café, misturando ritmicamente enquanto escuta sua pergunta, cantarolando enquanto pensa como pode responder.   

—Hum... Como é poder ver vocês mesmo sendo cega? Eu não sei? Como é ser capaz de ver? Vocês sempre estiveram... aí, eu acho. Chara é a mais velha que posso ver, sempre presente, um pouco tagarela, mas é bom para ter uma ideia do que acontece com o mundo ao meu redor. Não sei o que faria sem ela. - tropeçar por sobre pedras enquanto explora a floresta próximo de casa, perdendo-se antes mesmo de ser capaz de decorar o caminho de volta para casa e sendo devorada pela vida selvagem que rodeia o lugar como muitos que se perderam por essas bandas. - Sim, obrigada Chara. O humor dela é um pouco sombrio, mas você se acostuma. Mas, voltando a nosso assunto, eu realmente não sei como te responder. A morte sempre foi muito mais clara para mim do que os vivos. Não posso dizer que sou capaz de... Hum... Como Chara gosta de dizer? Descrevê-lo perfeitamente. Todos os espectros e almas para mim são como vultos coloridos, silhuetas que representaram alguém um dia, em algum momento, cheio de cores e emoções, memórias e lembranças. Sempre foi assim e acho que sempre será, é algo que temos em nossa família por gerações de acordo com minha mãe. - Frisk beberica um pouco de seu café, expressão pensativa em seu rosto. - Não sabemos o que é, talvez seja magia, seria uma explicação simples para tudo isso agora que consigo pensar. Sempre gostei de acreditar que era, que nossa família não se esqueceu das antigas práticas mesmo nesses tempos modernos, mas ela disse que existiram aqueles entre nós que chegaram a chamar isso de maldição, outros de benção. Você em particular é um dos espectros mais brilhantes que já tive o prazer de encontrar, suas cores mudam, como um arco-íris, normalmente existe uma predominante que é o que eu vejo, mas você? Você parece um amalgama de várias pessoas em um, que interessante.  

Ela termina de mastigar o pão em sua mão e engole o resto de seu café com um virar simples da caneca em seus lábios, não mais quente o suficiente para queimar sua língua, mas ainda morno para ser apreciado com gosto. Suas mãos tateiam o lado direito da borda da mesa, dedos levemente tocando a ponta do bastão guia feito de plástico e metal que se mantem reclinado sobre ela, bem onde o deixou. Frisk o agarra, passando o pequeno laço por seu pulso e então erguendo-se da cadeira, deixando os talheres e copos dentro da pia e então se dirigindo para a porta, a mesma porta vermelha pela qual entramos.  

—Eu espero você fique, tenho certeza que com uma alma como a sua terá ótimos conselhos e poderá ajudar tanto quanto Chara. - ela sorri, gentil, convidativa, te faz realmente cogitar em permanecer, em ver onde alguém com tal sorriso pode guiá-lo, quais histórias ela pode mostrá-lo. O mundo é vasto e com uma habilidade como a dela é de se esperar que eventos no mínimo interessantes estarão fadados a acontecer.  

Frisk saí e deixa a porta aberta, um convite para que a sigamos, mas, primeiro, devo lembrá-lo caro amigo, por mais tentador que seja a história existem limites que um simples telespectador, um simples leitor é capaz de influenciar, de interagir. Não somos jogadores, não temos o controle das ações dos personagens, somos meras presenças que não pertencem a esse universo e espero que você, nesse meio tempo que não esteve presente, não tenha se esquecido das regras impostas a nós.  

Frisk pode ser capaz de ouvir e interagir com você, conosco, mas nem sempre ela o fará. Ela tem a própria vida, a própria realidade para viver enquanto nós perdemos nossa chance, ela não é atada em nos suprir, apesar de ser gentil o suficiente em fazê-lo. Mas nem todos são capazes do mesmo, não são capazes de nos ver ou nos ouvir, mas reconhecem que não somos parte de sua realidade e isso os assusta. Ver pessoas tão dispostas e abertas como Frisk a nós os assusta, então existirá momentos em que Frisk será incapaz de respondê-lo, mas saberá o que você sente, o que você pensa e o que você é capaz. Também não somos capazes de influenciar um mundo do qual não mais fazemos parte, as decisões de Frisk são apenas dela e nossos desejos e anseios, apesar de às vezes atados a ela, são incapazes de controlá-la. Somos nada mais do que espectros presos a alma dela, insistente em permanecer para ver, sentir e ouvir, fadados a ser incapazes de agir, de interferir, por mais que assim o desejemos.  

O mundo tem um curso próprio, uma realidade própria e somos apenas pequenos grãos em todo o esquema das coisas, então, caro amigo, é melhor fazer-se útil e não insistir em coisas que não somos capazes e apenas guiar Frisk em seu caminho. Afinal, você deve ter percebido, almas como a dela, capazes de sentir-nos, de nos abraçar, são almas destinadas a sofrer. Elas são diferentes e ser diferente, apesar de comum, nunca é uma boa coisa.  

Essa história apenas começou.  

Do lado de fora, agachada próximo a um pequeno canteiro repleto das mais diversas ervas as quais você é incapaz de reconhecer, Frisk se dedica avidamente a tarefa de colher, aguar e cuidar da terra, das plantas, da vida que toca seus dedos endurecidos pela contínua tarefa.  

Como, você se pergunta?  

Pelo cheiro, pelo som, pelo sentimento. Frisk pode não ser capaz de ver, mas ela está longe de ser incapaz de qualquer coisa. A perda de um sentido, em retrospecto, apenas faz com que os outros se agucem para garantir a sobrevivência. Tudo é uma questão de saber como usar, como diferenciar os leves sons que caracterizam uma determinada planta, um determinado movimento, um determinado amadurecimento. O cheiro também se torna mais proeminente junto a sua capacidade de distinguir o que pertence a o que, mesmo o mais doce do mais azedo, cítrico ao amadeirado. Então tem os sentidos, a capacidade do tato, a diferenciação de uma forma para a outra, tocar para criar a imagem, desvendar sua aparência, a visão na ponta dos dedos.  

Frisk aprendeu a viver sem ser capaz de ver. Entendeu suas limitações e as ultrapassou com seus próprios métodos, pois era isso que era necessário para viver sozinha em uma casa isolada, esquecida e solitária. Tempo e prática a fizeram mestre na arte de enxergar, de sentir e ouvir ao invés de ver.  

Ao lado de sua forma concentrada e meticulosa em seu trabalho uma pequena cesta de palha trançada se mantinha cada vez mais cheias das ervas que eram, uma após a outra, retiradas do canteiro e recolhidas para seu interior, separadas por tipo, organizadas da maneira que facilmente poderiam ser utilizadas posteriormente. Mãos hábeis, visivelmente acostumadas com o trabalho, facilmente retiravam a planta sem feri-la demasiado, pegando as partes que precisava e retirando o que não seria mais utilizável. O pequeno canteiro em si não era muito grande, talvez uma área de 2, talvez 3 metros, repleto de uma variedade invejável de flores que, a primeira vista, poderiam ser confundidas com ervas daninhas. Ao lado dele estava a horta, outro trabalho que deveria ser feito mais tarde, ainda esse dia se quisesse algo para almoçar ainda naquele dia.  

Frisk passará a maior parte de seu tempo na parte da manhã aqui, ajoelhada na terra com mãos avidamente trabalhando para tirar minuciosamente cada pequena planta ou fruto ou vegetal que achar estar pronto para colheita, plantar então outros que devam ser plantados nos espaços vazios que foram deixados, aqueles que se encaixam na época do ano, o inverno se aproximando, apropriados para as temperaturas, para as humidades. Então, quando terminar, o que provavelmente apenas será daqui há várias horas, ela seguirá para o cercado onde um galinheiro improvisado, obviamente feito de pedaços improvisados de madeira e metal, velho, talvez tão velho quanto a casa, remendado aqui ou ali, mas ainda servindo a seu propósito. Lá ela recolherá os ovos postos, provavelmente não muitos, verá se é o tempo para uma nova ninhada de pintinhos, se as frangas já cresceram o suficiente para pôr seus próprios ovos e se as mais velhas já chegaram a seu tempo para serem parte do jantar. Ela as alimentará, provavelmente depois de sua breve parada para o almoço, o sol já tendo se levantado no ponto mais alto do céu, mas a brisa fria do outono tornando impossível para sentir tanto calor quanto deveria.  

Você deve perceber a reclusão do lugar, para ter tantos artifícios de autossuficiência a disposição, ainda que alguns exemplos básicos ainda estão em falta. Um poço de água ao lado da casa, límpido e intocado pela ação humana, vendo como a única cidade próxima é o vilarejo há dois quilômetros de onde Frisk mora, sua nascente derivada da montanha que se ergue logo ao lado de sua casa, recheado por árvores frondosas, velhas e intocadas. Existem algumas evidências aqui ou ali de terem havido outras casas, talvez outro pequeno vilarejo, mas o tempo e os desastres os levaram e os soterraram, agora sendo usados como base de apoio para a nova vida na floresta poder crescer e florescer. Provavelmente mais ninguém mora ao redor por décadas, séculos mesmo, não tem como saber. 

—Minha família mora aqui por gerações. Nossos registros foram perdidos em alguns incidentes aqui ou ali como minha mãe costumava me contar, mas desde que conseguimos nos lembrar vivemos aqui, na base do monte Ebott. Mãe costumava dizer que existe um certo... Peso de responsabilidade e nunca conseguimos sair. - Frisk cantarola, agora dirigindo-se para os vegetais, pesando em sua mão, amassando-os e tateando-os, para ver se estão bons para serem colhidos. - Aparentemente existiam mais de nós, como um pequeno clã. Fomos diminuindo com o tempo e agora apenas eu moro aqui. Existem algumas fotos e diários de alguns membros da família, mas a maior parte da nossa história é e sempre foi passada em contos e histórias de pai para filho. 

Os recursos que faltam, aqueles mais difíceis de obter como carne e medicamentos, são facilmente recolhidos no vilarejo próximo, mas mesmo eles têm dificuldades, às vezes, de conseguir determinadas necessidades. Ebott é isolada, você vai perceber, e carregada com uma atmosfera pesada que afasta aqueles que procuram encontrar refúgio em seus arredores. Os moradores sussurram que é a floresta, sussurram que a montanha é amaldiçoada, a boca do diabo. Não existe qualquer comprovação de seus dizeres, obviamente, mas não impede as pessoas de falar, principalmente quando nenhuma outra cidade conseguiu se estabelecer ao redor mesmo com o transcorrer dos anos e o florescer da tecnologia moderna.  

Alguma coisa apenas parece... Errada com as terras próximas a montanha.  

—O povoado esteve aqui depois de nossa família. Existiram outros, mas a maioria se dispersou por um motivo ou outro e agora existe apenas um único vilarejo. A cidade mais próxima está ao norte, quase há duzentos quilômetros de distância. Boa parte das rotas não levam para essas bandas, acaba tornando difícil para as pessoas que moram aqui. Mas conseguimos sobreviver com o que temos. - com um balanço firme de seu corpo, Frisk ergueu ambas as cestas que guardou separadamente as ervas e os vegetais. Depois de todas as vezes fazendo o mesmo, ainda que ambas estivessem abarrotadas, não pareciam pesar nada em seus braços. Suor escorre de sua testa com o esforço do dia, sol já alcançando o pico indicando tanto o horário do almoço como o momento de uma boa e merecida pausa. - Venham. Vou apenas tomar um banho e preparar o meu almoço antes de mostrar a verdadeira mágica.  

Com a mesma destreza com que saiu de sua casa, Frisk retorna para dentro, deixando ambas as cestas sobre a mesa da cozinha antes de se dirigir para o único banheiro da casa. É uma questão de delicadeza que não a acompanhemos. Mesmo sendo apenas espectros que não podem influenciar a realidade, presos a ela para acompanhar sua história, não significa que não possamos dar-lhe um pouco de merecida privacidade quando necessário. Existem aqueles, obviamente, que insistem em transpassar essas barreiras claras e desrespeitar aqueles a quem se apegam, mas nós não temos tais indelicadezas, certo?  

Além do mais, não demora mais do que alguns poucos minutos para Frisk já estar de volta a cozinha, navegando de um lado para o outro em busca dos utensílios necessários para começar a preparar seu almoço e, minutos mais tarde, sentar-se a mesa para uma refeição quente e merecida antes de voltar ao trabalho. A casa não se manuseará sozinha, muito menos suas terras, e Frisk precisa de todos os recursos disponíveis para manter o conforto que lhe é disponível. Nada vem sem um preço, como você já deve saber.  

—Sabe, você não estava muito longe ao comparar o fato de ver vocês com magia. - Frisk começa depois da última mordida da comida em seu prato, levantando-se da mesa e caminhando até a pia onde começa a enxaguar os utensílios. - Como eu falei, muito sobre minha família se perdeu com o passar do tempo. De acordo com minha mãe ocorreram tentativas de escrever sobre nossa história, o que fazemos, como fazemos, tínhamos até uma biblioteca! Eu tropecei nas ruínas dela quando era criança, aparentemente queimou até o chão uma noite, ninguém sabe o motivo, ou esqueceram o motivo, mas foi o suficiente para levar todos os nossos registros junto. É uma tradição da família contar o que sabemos para as próximas gerações e ensinar o que sabemos. Antes deveria existir muito mais do que eu sei agora, vendo como existiam mais pessoas para compartilhar, mas com o tempo nosso clã foi morrendo até apenas uma única família ficar. Não tenho tios ou avós, sem primos ou irmãos, no final de uma geração que dura mais de séculos resta apenas eu. Então todo o conhecimento que minha família carrega agora apenas existe comigo. Alguns de nós acreditam que foi uma espécie de maldição, não poder repassar quem somos, fadados ao esquecimento. Outros... Bem, outros pensam que o mundo apenas não deve saber o que sabemos e qualquer coisa que deixemos para trás não será usado para o bem. Guardiões, foi o que minha mãe nos chamou.  

Ela caminha para a cesta de ervas não muito longe, logo após terminar de lavar os talheres e guardar o que lhe sobrou de comida para o dia seguinte. Novamente sem dificuldades, seus passos espertos e conhecedores de cada centímetro da casa, ela pega a cesta nos braços e a leva para a parte de trás da casa, uma singela porta na cozinha a deixa ir para o exterior novamente precisando apenas de mais alguns paços para ver uma pequena e simples área de serviço onde o telhado se estende um pouco mais além das paredes, cobrindo uma pequena varanda onde um fogão a lenha foi construído contra os muros da casa. Ele não é grande e ocupa nada mais do que metade da parede na qual foi construída, sua chaminé subindo além do telhado na extremidade direita, as bocas seguindo para a extremidade a esquerda.  

Frisk deixa a cesta em uma pequena bancada não muito longe, caminha para pegar a lenha guardada em uma espécie de armário que já parece estar começando a ficar vazio, logo era terá que buscar mais madeira. Lutando um pouco para encaixar a madeira dentro do forno, Frisk não demora em tomar um pacote de fósforo e acender a lenha que agora começa a trepidar com o lento, mas definitivo acender de chamas. Ela ainda deve esperar um pouco, não está quente o suficiente para começar o processo do que está para começar. 

As atividades da segunda parte de seu dia.  

Enquanto as chamas crescem dentro do forno, Frisk separa cuidadosamente as ervas em sua cesta em pequenas pilhas. Algumas ela retira as folhas, outras as sementes, algumas ela apenas as quebra em pequenos pedaços e outras ela as deixa inteiras. É um processo lento e delicado, mas que facilmente se agiliza com a familiaridade e o costume de uma prática repetida.  

—Vou mostrar um pouco do conhecimento que foi passado a mim. Mortos não contam histórias, é o que dizem, então tenho certeza que você não vai sair tagarelando para todos o que eu estou fazendo aqui. - ela riu de sua própria brincadeira, suas mãos nunca parando a atividade que se mantinha a fazer, pegando uma pequena tigela de cerâmica que já se encontrava próximo a mesa onde trabalha com as ervas, não se demorando a pegar algumas pétalas e sementes e colocá-las dentro da pequena tigela, amassando-as e misturando-as com uma pequena ferramenta de madeira. - Acho que ver vocês é uma capacidade exclusivamente nossa, é pelo que minha família ficou conhecida na região, mas existem outras coisas que podemos fazer que podem ser ensinadas porque, bem, não dependem de nenhuma capacidade especial realmente. E eu digo acho porque não conheço ninguém fora de nossa família que saiba o que sabemos. Pode ser que nunca alguém tenha tentado ensinar para outra pessoa que não seja da família. Ainda assim, se você imaginar isso como magia é um conceito na verdade bastante simples! 

Creio que você ainda se lembra de nossa pequena história e como foi descrita a existência de magia. Uma energia que vem da alma, uma força que monstros são capazes de usar livremente. Almas são, nada mais nada menos, do que a essência base da vida. É por isso que espectros como nós, que já não mais estamos atados a vida, não seguimos o curso natural da existência dessa realidade, pois, ainda que permanecemos presentes e carregamos a essência que define a própria vida, não estamos, de fato, vivos. Somos relíquias de um passado esquecido, o oposto do que a alma deveria representar, somos a morte.  

—O fato de vocês serem criados apesar da extrema oposição da energia que compõe cada um de vocês, a mesma energia única que sou capaz de ver apesar da minha incapacidade de enxergar qualquer outra coisa, mostra o quão poderosa essa energia é. O quão poderosa essa suposta magia é. E, o mais impressionante de tudo, está presente em todos os lugares. - mesmo nas plantas que Frisk esmaga e banha na água fervente dentro dos caldeirões sobre as bocas do forno. - Isso significa que, assim como a magia que se conta na história que os monstros usam, eu posso usar energias de outras fontes vendo como é tão abundante, a questão é apenas saber como. É esse ensinamento que é passado por minha família de geração para geração. Como manipular a energia nas outras criaturas vivas para criar determinados efeitos, determinados resultados. E como não depende da energia de minha própria alma, a qual, por mais incrível que isso pareça, eu não sou capaz de usar, não sei como usar, melhor dizendo, então é uma capacidade que não depende exclusivamente de mim e é, portanto, ensinável.  

As cores da água dentro do caldeirão começam lentamente a mudar, tingindo-se de uma energia que você é capaz de sentir vibrando o ar. Você sabe que é real, tenho certeza, você acredita nas palavras ditas pela simples garota cega que continuar a trabalhar em poção após poção como a feiticeira de um mundo de fantasia. Ela sabe o que está fazendo, misturando as plantas certas, os ingredientes adequados, manipulando a energia que cada um deles carregue para que não se tornem apenas uma sopa estranha de elementos aleatórios.  

Não é simples. Exige concentração e precisão, o momento certo para colocar cada ingrediente, o ponto certo para mexê-los e remexê-los. Cada diferença pode criar um resultado diferente, um que talvez não seja necessário. Em tempos antigos tais práticas eram chamadas de alquimia e, mais antigo ainda, foram conhecidas como bruxaria.  

Agora elas são vistas como falsas. Crenças de vidas antigas que não conheciam a realidade do mundo, a ciência das coisas. Mas aqui está você, vendo essas práticas criticadas como contos de fadas infundados funcionando uma após a outra e ainda talvez seja apenas seu estado atual que o permita sentir a crepitação no ar, a energia que carregam. É lindo e ao mesmo tempo perigoso. O faz perguntar se realmente os antepassados de Frisk estavam certos ao imaginar que a queima de tal conhecimento não veio como um alerta divino dizendo que o mundo, a humanidade não estava pronta para ele ainda.  

Todo o processo pode durar horas ou não mais do que alguns poucos minutos. Depende do que se pretende fazer. Quando terminado, Frisk coleta pequenos frascos personalizados feitos propriamente para guardar cada uma das diferentes poções que fabricou, lentamente preenchendo cada um deles e os separando em ordem em uma caixa de madeira de cadeado de metal e bronze, ornamentado com números dourados reluzentes e de aparência pesada. Quando trancada com todos os pequenos fracos de poções dentro é preciso uma senha especial para ser destrancado e então a confirmação da linhagem da pessoa que o abre.  

Para um objeto de caráter tão antigo, tendo visto várias gerações e datado mesmo antes do começo do iluminismo na Europa, é impressionante que seja tão bem fabricado em seus mecanismos, quase como uma tranca criada na era moderna. Mas, mesmo você eu posso dizer, consegue ver que existe algo místico na tranca, mesmo na caixa, assim como existe algo místico no conteúdo guardado nela. É fácil entender, com apenas um olhar, que aquele não é um objeto comum e te faz acreditar em lendas perdidas de muitas décadas atrás. 

—Agora vem a última parte. - Frisk suspira, segurando a alça da caixa mística e então tateando a mesa na qual trabalhou em busca da bengala de metal que usa para ajudar a guiar seu caminho. Depois de encontrada começou a guiar seus passos para a direção leste de sua casa onde um pequeno e rústico caminho se forma entre as árvores da floresta que rodeia suas terras. Não parece muito usado, as árvores quase o cobrem com suas copas largas e raízes elevadas, mas a grama ainda não cresceu por sobre a terra pisoteada e sua forma ainda permanece relativamente clara. Não como se Frisk precise realmente ver para saber de sua existência, mas definitivamente facilita seu caminho sendo desprovida de pedras e raízes, evitando que tropece ou precise ir muito mais lentamente do que o necessário, sua guia batendo sobre o solo enquanto caminha, tateando cada obstáculo antes que possa chegar até ele. -  O resumo é basicamente que posso criar coisas tipo poções que fazem, talvez, um pouco de tudo. Existem algumas palavras e encantamentos rúnicos que também posso fazer usando da energia das árvores e da terra, é como normalmente garanto que não existam pragas em meus canteiros e tudo isso, ou que minhas galinhas continuem a produzir. Existe um motivo para as pessoas acreditarem que palavras tem poder, você tem apenas que saber o que está fazendo e como canalizar o ponto de energia correto. Acho que era o que os antigos druidas e xamãs costumavam fazer. E eu sei que é um pouco estranho que eu esteja fazendo tudo isso em uma época que basicamente existe uma solução científica para tudo, mas, novamente, não muito chega por essas bandas, então esses pequenos truques acabam vindo bem a calhar. 

Técnicas milenares diminuídas a simples truques. Parece um sacrilégio apenas em pensar algo assim.  

—Não seja dramática Chara. No final não é nada próxima ao que você imagina que magia significa quando se fala sobre ela. Sem fogo ou show de luzes, apenas um bom e velho trabalho manual. Mas acho que tem seu charme, não me entenda errado. Se algum dia esse tipo de magia espalhafatosa realmente existiu e minha família soube como usar, então se perdeu com o tempo junto com ela. - aos poucos com que vai andando pelo caminho aos poucos ele vai se tornando mais visível, mais largo, mais definido, as árvores vão se afastando e o sol da tarde começa a iluminar o lugar sem o impedimento das folhas das árvores. Não demorará muito para chegar no vilarejo agora. - Oh sim! Quando chegarmos ao vilarejo de Ebott não vou poder conversar com vocês, sinto muito. Chara vai ser capaz de responder qualquer dúvida que tiver então não hesite em perguntar a ela. As pessoas no vilarejo não gostam muito do dom que minha família carrega, mas eu preciso reabastecer minha geladeira e algumas das minhas ferramentas precisam ser substituídas, então não tenho escolha a não ser ir até lá mesmo que os deixe desconfortáveis.  

Você deve entender já agora, existem muitos mistérios que rodeiam essas terras. Mistérios que mesmo a ciência moderna tem dificuldade de explicar e com o isolamento imposto as pessoas que aqui vivem é fácil acreditar que elas se perderam no tempo, paradas em épocas antes da criação da eletricidade, dos computadores e celulares. Pouca informação chega até aqui, mesmo com os mais novos trazendo lentamente a nova tecnologia para modernizar o vilarejo. Poucos saem, menos ainda voltam. Um povo recluso que se prendeu a tradições e superstições. Antiquado pode ser uma boa palavra para descrevê-los.  

Não ajuda que a própria terra pareça rejeitar novos convidados e aqueles que tem coragem ela devora sem pensar duas vezes. Isso deixou os habitantes paranoicos, presos em conceitos que se perderam, assustados com a terra que os alimenta e os abriga. Não são apenas as cidades que não conseguiram permanecer, mas os desaparecimentos e mortes que permeiam suas entranhas em números alarmantes a cada ano.  

Ebott é conhecida não apenas por sua vegetação deslumbrante, intocada pela raça humana, mas também pela quantidade de pessoas que vem e nunca mais volta. A montanha que devora homens, eles dizem, marcadas pelo sangue daqueles que não retornam e, os que retornam, tem suas covas cavadas na própria terra que os tirou a vida. A terra é antiga e carrega uma atmosfera de morte que poucos lugares no mundo parecem conseguir igualar. Atrevo-me até a dizer que apenas as terras enfestadas pela guerra e pela peste conseguem equivaler a aura sombria que Ebott emite diariamente. Se mesmo os leigos conseguem sentir o peso da memória deixada pelos espectros que partiram, então acredite quando digo que esse é o ponto de descanso de muitas almas que partiram sofrendo.  

Sangue derramado normalmente não é esquecido facilmente. Ele marca o solo e impregna o ar de tal maneira que ecos do passado ainda retumbam entre as árvores da floresta. Existe um motivo pelo qual alguns edifícios são deixados abandonados ou áreas inteiras são esquecidas como memoriais para os mortos.  

Existe um motivo para nossa presença ser tão desprezada por aqueles que ainda vivem.  

A frente, surgindo por entre os troncos das árvores que cercam o caminho no qual Frisk caminha, pequenas casas simples de espaçosos quintais começam a surgir uma após a outra. Logo a terra que caracteriza o caminho se transforma em concreto ou blocos de pedra. As casas não eram tão antigas como a que você viu com Frisk, concreto e tijolos são facilmente identificados na arquitetura de todos os tamanhos e formatos. Não existe muita vegetação, porém. Quanto mais Frisk adentra nos arredores da pequena vila mais as casas se agrupam umas as outras e menos grama consegue se identificar pelo chão, ou mesmo árvores. O som agitado de carros e pessoas passando permeiam o lugar como uma cacofonia desafinada e alta, constante. Não é tanto como você esperaria em uma cidade mais populosa, mas o suficiente de uma diferente do que você tinha ouvido na pequena área isolada para ser notado.  

A vila em si não deve ter mais do que algumas centenas de habitantes, talvez mesmo um pouco mais de mil. Não é grande para se destacar e ainda permanecesse rodeada pela floresta e cheia de casas antigas que datam mesmo antes da segunda ou primeira grande guerra, talvez mesmo antes da revolução industrial. Ainda assim, é o suficientemente moderna para se dizer que mesmo com o isolamento da área, ela ainda cresce para abrigar seus habitantes. Muito mais animada do que você esperaria inicialmente com todos os contos relatados da floresta ao redor.  

É fácil pensar que toda a ideia de uma vila assustada seja um exagero ao ver toda a movimentação animada do meio de tarde. Mas não se deixe enganar, essas pessoas tem costumes próprios para lidar com as particularidades impostas pela terra.  

O primeiro é o fato que facilmente são percebidas poucas variações de comércio. Não existem farmácias e os supermercados são nada mais do que sacolões os quais guardam o que é produzido pela própria terra nas pequenas fazendas nos limites da cidade, próxima as estradas de saída e entrada. Os produtos são limitados e não existem muitas variações do que uma pequena venda familiar aqui ou ali. Depois tem o fato que mesmo o hospital local não pode ser realmente chamado de hospital, vendo como não possuí mais do que dois ou três médicos e raramente estão cheios além dos pequenos casos de gripe ou acidentes que são fadados a acontecer uma hora ou outra. Então tem o fato do próprio cemitério da cidade e a igreja construída logo ao lado. Tão velhos quanto a própria cidade, sempre cheios por um motivo ou outro.  

O cemitério carrega o ar sombrio que se espera de um lugar onde o número de mortes ultrapassa em muito o número de habitantes locais. Curiosos e turistas que vagueiam por essas bandas também acabam encontrando seu lugar entre as tumbas dos moradores locais, algumas até mesmo não marcadas ou reclamadas, vendo como não são encontradas identidades ou números para ligar para suas famílias e avisar sobre a tragédia. Pessoas que vem para ver sobre os boatos ou apenas aparecem em uma viagem ao redor do país. Aqui você tem sorte de até mesmo ter seu corpo encontrado pelos grupos de buscas quando perdido na floresta por mais de um dia, é apenas mais um fato da vida nos arredores. Por tal, a igreja permanece cheia.  

Humanos correm para onde acreditam estar a segurança, mas contra o que se acredita ser o sobrenatural suas crenças são a única segurança que dispõem para se proteger do que apenas suas imaginações são capazes de ver. Então eles rezam. Rezam pela proteção de seus entes queridos, que eles nunca ponham o pé nas florestas que devoram homens, que eles nunca se percam nas matas que encobrem o sombrio, que eles encontrem o caminho de volta para casa mesmo quando sol se pôr e a lua for a única testemunha de seu sofrimento. Eles rezam, pois mais nada podem fazer.  

As pessoas sussurram e contam histórias, lendas e fábulas sobre pessoas que adentraram nas florestas, que subiram a montanha e encontraram seu fim nas mãos da vida selvagem ou dos fantasmas que culpam por tomar a vida de seus vivos, ou desaparecem para nunca mais serem vistos novamente, abrindo espaço para teorias da conspiração ou contos de terror na calada da noite. Eles sussurram porque temem que a montanha possa ouvi-los e arrastá-los para suas entranhas sem piedade. Eles sussurram porque acreditam que o mal encarnado se esconde entre suas terras, que monstros vivem ao redor, escondidos nas sombras da noite e as próprias garras da morte estão soltas para pegá-los quando menos esperam.  

São essas crenças que os levam a se esconder no conforto de suas casas de portas e janelas trancadas quando o sol começa a cair. É o que os fazem espantar viajantes e evitar como a peste adentrar na floresta, avisando suas crianças dos perigos que os esperam se assim desejam explorar os arredores de onde nasceram. Cresceram acreditando que a terra está viva e se alimenta de seu sangue, sacrifícios arrancados de suas casas, atraídos para dentro da montanha para satisfazer seus anseios.  

Eles temem tudo que é diferente, tudo que não pode ser explicado, tudo que não entendem. Pois o desconhecido tirou mais do que eles podem realmente contar e é tão real para eles quanto o ar que respiram e a água que bebem.  

É por isso que você pode escutar os sussurros amedrontados enquanto passamos e sentir os olhares de desconfiança e cautela dirigidos em nossa direção mesmo que eles não possam nos ver.  

Bruxa” 

Feiticeira” 

Demônio” 

Abominação”  

  Você consegue ouvi-los sussurrar? Resmungando uns para os outros com olhares pontudos de medo e raiva, como se Frisk fosse a causa de todos seus problemas.  

Não pareça tão surpreso, humanos raramente pensam da forma racional como tanto se orgulham de fazer. Seus medos são normalmente infundados e suas ações normalmente impensadas. Eles temem o que não entendem e, por tal, repudiam e atacam tudo que vá contra o que acreditam, pois é diferente. Eu cheguei a avisar sobre isso, Frisk também tentou te dar um aviso antes de chegarmos, mas ela não é a mais querida nesse pequeno vilarejo, motivo pelo qual sua família vive isolada quase do outro lado da montanha.  

Talvez eles a teriam a matado a muito tempo, terminado com sua linhagem antes de até mesmo chegasse a nascer, acreditando que ela era a causa de todo o sofrimento que vem passando nos últimos anos. Que, como uma bruxa, é sua culpa que atraia almas desavisadas para dentro da floresta e matá-los para criar seus feitiços. E, mesmo que isso seja possível, vendo como vidas humanas também são capazes de criar a energia necessária para o que Frisk é capaz de fazer, talvez até mais, todos nós sabemos que não apenas vai contra a natureza da doce garota, mas também se tornaria mais trabalho para ela como resultado.  

Não como se essas pessoas também saibam alguma coisa sobre isso.  

Eles têm suas próprias crenças e virtudes, recusando-se a ver nada além de sua própria ignorância, preferindo repelir e odiar uma criança que nada mais faz do que ajudá-los ao invés de realmente entender a magnitude de seu conhecimento.  

Hipócritas, se você me perguntar. Apenas veja como eles se aproximam para trocar seus preciosos recursos em favor de ter as poções miraculosas que Frisk carrega em sua pequena caixa. Apenas veja como eles a deixam entrar em suas casas, com olhares desconfiados e rostos contorcidos em desgosto, resmungando e praguejando como se ela não fosse capaz de ouvi-los, para que ela seja capaz de curar seus doentes ou aquecer suas casas, resolver problemas que eles são incapazes de solucionar porque assustam estranhos no pretexto de protegê-los das assombrações na floresta, isolam-se nessa terra esquecida por deus e se recusam a sair pois são antiquados e insistem que essa é sua terra e tem o direito de permanecer.  

Você já deve ter compreendido porque eles nunca mataram Frisk ou sua família até o momento, por mais que seu desprezo corra profundamente em suas veias. Pois querendo ou não, eles precisam dela, precisam do que ela é capaz de fazer. É o único que tem para sobreviver e, sem as curas e soluções milagrosas de Frisk, muitos mais provavelmente morreriam durante o inverno, em caçadas por comida e pele, ou mesmo devido a escassez derivada da própria produção natural. Frisk é uma solução fácil a falta, mas ainda indesejada de qualquer maneira.  

Como eu disse: hipócrita não? Humanos normalmente são.  

Todo o teatro não dura muito, uma hora, talvez duas se estender demais. Existem aqueles que fazem pedidos para a próxima vinda, acordos de trocas como uma poção de sorte ou selo de captura para a próxima caçada em troca de um pouco de carne, talvez pele, talvez algo diferente. É sempre possível vê-los se contorcendo sempre que o acordo e feito e um contrato é assinado, se ficássemos mais tempo tenho certeza que veríamos cada um deles correndo para a igreja não muito depois, prontos para rezar por perdão devido a seus pecados, fazendo acordos com uma bruxa, uma mulher do diabo, talvez seja até mesmo heresia.  

Frisk atua sobre todo o calvário com elegância, ignorando sussurros e comentários pejorativos em sua direção com graça, mantendo seu ritmo de cliente para cliente, voz calma e tranquila assim como sempre calculadamente neutro para evitar que emoções sejam retiradas de sua pessoa. Sua mãe a ensinou os negócios árduos que sua família tem com o vilarejo por gerações, infelizmente ser temido nesse caso é melhor do que ser amado. Pois se eles a temem, se eles a evitam então menos probabilidades existem de ser explorada mesmo com sua deficiência, menos eles podem usar para machucá-la, menos chances ela tem de lutar por sua vida e mais tempo ela pode sobreviver.  

No final de toda a troca ela normalmente dirige-se imediatamente de volta para casa, mas hoje é um dia especial, aparentemente.  

Um dos homens da vila se aproxima, seu rosto é sério com o cenho profundamente franzido, contorcendo suas feições apesar de ligeiramente mascaradas pela quantidade excessiva de pelos faciais em seu rosto. Ele é alto, erguendo-se sobre a cabeça de Frisk por vários centímetros, braços grandes e musculosos e peito largo, definitivamente não a figura mais amigável e pelo retorcer das mãos de Frisk sobre a alça de sua pequena caixa ornamentada, ela sabe muito bem disso. As chances de escapar caso algo dê errado seriam ínfimas, mesmo se for na direção da floresta que todos temem. Isso porque, meu caro amigo, esse não é um homem trabalhador qualquer, esse é um lenhador e também um caçador.  

As pessoas desse vilarejo facilmente acreditam que a floresta é um ser vivo, um que se enfurece caso seja ferido, como qualquer outro animal, mas é poderoso o suficiente para verdadeiramente feri-los de volta. É o motivo da floresta ter se mantido quase intacta por tantos anos apesar da presença clara de ação humana. Eles temem que se tiram mais do que o necessário, se enfurecem a montanha com sua ganância e anseios, ela tomará mais do que apenas aqueles que se perdem em suas matas fechadas. Acrescentado as lendas que permeiam toda a terra fazem trabalhos envolvendo qualquer interação com a montanha ou a vida que a cerca ser tão arriscado quanto marchar em direção aos portões da guerra. Esse, no entanto, é o serviço imposto aos caçadores e lenhadores.  

Lenha é apenas um dos elementos básicos para o funcionamento da cidade, não apenas para a construção de casas, o criar do fogo, mas também para abrir espaço em prol da expansão e acomodação dos moradores. Mesmo que o vilarejo propriamente dito não tenha crescido muito em questão de habitantes, novas necessidades ainda aparecem de tempos em tempos com o crescer dos tempos modernos e é preciso criar espaço para a construção de locais que são capazes de suprir essas necessidades. Os lenhadores são os responsáveis por ferir a terra em prol da sobrevivência. Eles, assim como os caçadores, são os que melhor conhecem os caminhos e perigos que a montanha carrega em suas entranhas.  

Caçadores, por sua vez, tem sua própria função. Sem a chegada constante de suprimentos e alimentos, vendo como rotas comerciais não muitas vezes atravessam essas regiões e a comunicação funciona de forma estranha, por qualquer que seja o motivo, é preciso encontrar outras formas de suprir as necessidades mais básicas e, nesse caso, é mantendo algumas práticas antiquadas e arcaicas. A caça é provável a atividade mais antiga praticada pelo homem desde seu surgimento, procurando não apenas a comida, mas o couro para se cobrir. Caçadores são incumbidos de arriscar suas vidas entrando o mais fundo possível na floresta para “colher” os animais que nelas habitam e trazê-los de volta onde sua pele e carne será usada para a confecção das roupas e alimentos para o resto da cidade. Mais do que os lenhadores, eles são admirados e agraciados como heróis. São eles que normalmente encontram os corpos dos desaparecidos e procuram por aqueles que por um motivo ou outro desafiam a montanha.  

Mesmo que Frisk corra para as matas fechadas, ela muito provavelmente será encontrada, pois o homem a sua frente conhece a região tão bem quanto ela, talvez até mais.  

— O chefe da vila deseja vê-la. - o homem anuncia, a voz grossa e profunda retumbando junto aos batimentos acelerados do coração de Frisk, não se demorando a abrir espaço para que Frisk comece a andar. Não existe muita escolha nesse momento, Frisk não pode recusar um chamado de um dos chefes do vilarejo, exatamente por ser com eles que seu contrato de um relacionamento pacífico com a vila se firma.  

Quem são os chefes, você pergunta? Bem, como eu disse, esse vilarejo se prende a tradições que na maior parte dos outros lugares do planeta foram perdidas há muito tempo. Aqui, não existem prefeitos ou funcionários públicos, ainda que a democracia de escolher um governante permaneça. De fato, boa parte das leis que são mantidas aqui podem ser bem diferentes das que são atualmente executadas em outras cidades, mas eu não saberia dizer exatamente. De qualquer forma, nesse vilarejo a linha de comando é dada aos mais velhos, mais experientes e normalmente mais amados pelo resto da população. Um grupo de pelo menos cinco pessoas tomam as decisões e criam as leis e regras que os outros membros da cidade são obrigados a obedecer. É apenas graças a eles e seu acordo com a família de Frisk que os habitantes mais hostis têm se mantido longe dela, limitando-se em apenas encaradas feias e sussurros praguejados pelas costas.  

Esse contrato dura anos, muito antes de Frisk nascer, ou da mãe dela nascer, talvez mesmo de seus avós. Existe um motivo também pelo qual hoje apenas existe Frisk sendo que sua família basicamente fundou todo o lugar. Humanos podem ser cruéis mesmo com sua própria espécie. Demorou um tempo para perceberem que precisariam dos produtos criados pelo povo que desprezavam para os chefes da época orquestrarem o contrário, a única coisa que mantem a linhagem de Frisk ainda viva e longe das fogueiras. Não foi difícil entender que para viver e ter o mínimo de segurança se quisesse continuar vivendo nessas terras, os antepassados de Frisk apenas teriam que intercambiar produtos que já eram feitos normalmente por suas famílias.  

O contrato é renovado a cada mudança de geração, tão simples quanto isso possa parecer. 

O lenhador lenta e silenciosamente guiou Frisk até os arredores da cidade, um dos muitos que guia para uma das entradas da floresta. Essa parece mais isolada, pouco usada, mas próximo a uma particular área residencial, mais antiga que as demais. Suas casas ainda feitas de madeira e pedra polida, de arquitetura clássica e definitivamente arcaica. Próxima a entrada da floresta estão mais dois homens de aspecto tão intimidador quanto aquele que guia Frisk até eles e, entre esses dois homens, está um velho. Um senhor de setenta, talvez setenta e cinco anos, com cabelos grisalhos e rosto manso, feições que você esperaria encontrar em seu avô, calorosas e convidativas, mas sempre carregando o peso de suas experiências e vivências em seus ombros, olhos assombrados como se tivesse visto demais. Mas ainda que seja visivelmente velho seu corpo ainda permanece forte, com músculos enchendo suas roupas e mãos calosas, grandes e firmes, apoiadas calmamente sobre uma bengala que o sustenta devido a seu joelho estourado que o mantem a mancar durante seu caminhar calmo. Ele não é tão alto quanto os homens que o acompanham, mas é fácil dizer que um dia foi.  

Quando diante dele, Frisk respeitosamente abaixa sua cabeça em um cumprimento, sua voz tão neutra quanto seu rosto carregam a passividade que precisa para não alertar os guardas que mantem um olhar atento e pontudo em sua pequena pessoa.  

—Chefe Callan. - ela o cumprimente. - O senhor pediu que me chamassem?  

—Dispense as formalidades, querida. Venha, como tem estado? - nada na voz do velho homem indica hostilidade, de fato, você pode perceber um carinho profundo em cada uma delas, o que é uma surpresa depois de toda a hostilidade mostrada pelos habitantes da cidade. - Os moradores não tem lhe dado muito trabalho?  

—Tenho estado muito bem, obrigada por perguntar, Chefe Callan. - Frisk responde, sua voz é controlada, mas é difícil de perceber vendo o quão boa é em disfarçar o nervosismo de sua voz, ainda sentido os olhares pontudos dos outros três homens presentes, atentos a toda a interação. - Os moradores tem sido hospitaleiros como sempre, gentis o suficiente para me deixar entrar e oferecer-me os frutos de seu trabalho tão suado.  

Os olhos do homem se tornam se escurecem, as sobrancelhas se contorcem e curvaram enrugando ainda mais suas feições. É fácil agora ver como alguém de aspecto tão bondoso foi escolhido como chefe de um vilarejo marcado pela morte. E durante anos nada menos. O mais velho entre os chefes e provavelmente o mais respeitado até então. Afinal, ele não foi apenas um caçador em seus tempos de jovem, mas também conhecido por sobreviver por mais tempo dentro das entranhas da montanha e voltar para contar a história. Uma lenda dentro do pequeno vilarejo que não conhece nada mais assustador do que suas próprias terras e, também, avô paterno de Frisk.  

Com um sinal firme de uma de suas mãos ele dispensa os três homens que o acompanham. Eles hesitam por um só momento, encarando-se em dúvida, antes de finalmente se afastar para dentro da cidade novamente, passos lentos e arrastados, obedecendo as ordens a contragosto, mas ainda assim partindo de uma forma ou de outra.  

Quando finalmente sozinhos e Frisk não podia mais sentir a hostilidade ou ouvir os passos pesados dos homens sobre o cascalho, o velho se aproximou, pousou uma mão firme e pesada sobre seu ombro, ainda cautelosa para não ferir e a atraiu para perto. Frisk parece uma criança a seu lado, mesmo que já tivesse alcançado seus dezoito anos.  

—Agora, conte a seu velho como realmente tem estado. As pessoas daqui não tem te dado muita dificuldade, tem? Como está se saindo vivendo sozinha naquela sua pequena casa? Sabe que sempre que precisar existe espaço para você na minha casa, não é? - dessa vez Frisk realmente sorri para o homem, deixando que ele a traga para perto enquanto caminham tranquilamente para mais próximo da entrada da floresta.  

—Estou realmente bem, vovô. As pessoas aqui realmente não têm sido tão ruins, nada além do normal olhar ruim e sussurros pelas costas. Nada com o que não tenha me acostumado até agora. E eu gosto de viver na velha casa da família, é tranquilo, confortável e tem tudo que eu preciso. Além do mais, duvido que Rosa realmente se sinta confortável comigo morando junto com ela, ou... Bem... Qualquer outra pessoa da cidade. - Rosa Callan é, em outras palavras, a avó paterna de Frisk, mas, diferente do Chefe Callan que com seus anos de viver em constante contato com a floresta que todos temem e a família que todos repudiam passou a entender e aceitar os mistérios que rodeiam a região e aqueles que vivem nela, ela ainda culpa a mãe a família de Frisk por todos os males que aconteceram a ela e a todos os outros na cidade, ao ponto de nem ao menos considerar Frisk como sua neta, mesmo tendo nascido de seu único filho. E o Chefe Callan sabe disso, tanto que suspirou em derrota. - Mas, afinal, por que me chamou até aqui? Se fosse apenas para conversar teríamos ido até seu escritório ou sua oficina e o senhor teria ido me buscar e não um dos lenhadores.  

—Atenta como sempre. - com um suspiro pesado o homem retirou a mão de sobre o ombro da neta, seu olhar triste voltando-se para a floresta apenas alguns passos a sua frente, com árvores frondosas de troncos escuros, mesmo nessa distância ele quase não poderia ouvir os sons dos animais que habitavam as redondezas ou enxergar muito além do que alguns passos a dentro, a região densa o suficiente para os raios do sol terem dificuldades em penetrar por entre as copas das árvores e iluminar o caminho. - Faz alguns dias temos dado o sumiço de duas crianças nessas redondezas. Pensamos inicialmente que elas tenham entrado na floresta por curiosidade, acontece por mais que tentemos impedir. Crianças serão crianças e a curiosidade muitas vezes vai superar o medo. Mas então os pais começaram a nos contar que suas crianças tem relatado o avistamento de um garoto por entre as árvores, chamando-os para dentro, dizendo que conhece o caminho para um tesouro. Pensamos que pode ser um dos seus casos.  

Um espectro.  

Veja, caro amigo, existe um motivo para Ebott ser uma região que a superstição não é tratada como loucura ou contos de fadas, assim como existe um motivo para lugares muito antigos ou marcados pela história por um motivo ou outro serem muitas vezes tratados como assombrados ou macabros, deixados de lado até alguém ser corajoso o suficiente para derrubá-los. Existe um outro elemento na alma humana que a torna muito especial, algo que muitas vezes carece em outros seres vivos:  

Memória.  

Almas humanas são feitas de memórias e memórias são atadas a sentimentos. É o motivo pelo qual momentos demasiadamente marcantes ficam por mais tempo na memória do que aqueles que não fazem muito diferente em nossas vidas. E não existe nada mais marcante, normalmente, do que a morte. Principalmente quando foi particularmente difícil.  

É esse apego pelo passado, pela memória do que um dia foi, que não deixa a alma partir mesmo quando seu corpo já não mais funciona e seu tempo se esgotou. Ela permanece até sua energia se esgotar e ela desaparecer para saberá onde a alma dos mortos vai depois de encontrar a paz. Mas, lembre-se, você e eu não somos uma alma, fizemos parte de uma há muito tempo, uma que talvez já partiu e trazemos traços que representaram a essência dessa alma, sua personalidade, seus desejos e anseios, medos e paranoias, mas não somos elas. Almas não são nada mais do que um acumulo de energia, energia e sentimentos que formam um ser, ela não tem forma e não pode falar.  

Então o que somos?  

Espectros.  

Espectros são memórias, traços deixados para trás por uma alma humana depois que ela se desprende das várias camadas de seu corpo físico. Energia pura que toma a forma do último que marcou uma alma em determinado momento, em determinada ocasião. Às vezes podemos recordar que não mais existimos, que não mais estamos vivos, como você e eu, mas outras estão presas no tempo em que seus espectros foram criados, fazendo o que quer que estivessem fazendo na hora. Mas assim como a alma nossa energia se esvai com o tempo, muitas vezes no mesmo momento que nossas almas, nossa única fonte de energia. Se não nos prendermos em alguma coisa que nos forneça a energia para permanecer ou por um motivo ou outro nossa alma não consegue se desprender da memória que carrega, então partiremos, esquecidos pelo tempo. É simplesmente o ciclo natural.  

Mas se uma alma é forçada a permanecer e, por consequência, manter seu espectro, então lentamente sua energia se desgasta e se corrompe, pois passou de seu tempo natural e agora ela está muito além do que é capaz de suportar. Memórias são tudo aquilo que as prende aqui, o apego sobre o passado, e, no começo, esse apego pode ser tanto positivo quanto negativo, momentos felizes e momentos tristes que se acompanham durante os eventos de seu momento quando ainda vivos. Mas assim como a própria memória humana, as memórias que prendem uma alma se desgastam com o tempo até tudo o que sobram são as mais recentes e qual é a memória mais recente de uma alma? Claro, sua morte.  

Sua energia se torna negativa e não mais um equilíbrio balanceado de positivo e negativo. Sua essência começa a mudar, uma alma carregada de justiça lentamente caminhará na direção da vingança e então terminará como uma alma injusta, que não se importa em trapacear ou trair. Ela é marcada por sua visão negativa do mundo, a dor e o sofrimento de permanecer quando deveria ter partido até o ponto que deixa de ser a si mesma. Os espectros que deixam refletem exatamente essas mudanças e, com o crescer da negatividade, começam a quebrar as regras que devemos obedecer afetando o mundo dos vivos, influenciando-os e muitas vezes atraindo-os para uma morte prematura.  

Lugares que normalmente carregam muitas memórias negativas normalmente trazem como bagagem almas e espectros incapazes de partir, presos em seus próprios sofrimentos, passados que não podem mais ser alcançados ou até mesmo esquecidos pelos vivos. É por isso que Ebott não mais se assusta com suas aparições ou casos estranhos que são relatados de tempos em tempos, avistamentos daqueles que já partiram.  

—Se já está começando a ser visto significa que é alguém que já partiu há muito tempo. Crianças normalmente são mais apegadas a vida, com óbvios motivos. Eles ainda não a viveram completamente para se sentirem confortáveis em deixar. Sem falar que poucas vezes percebem que até mesmo partiram, vendo como desconhecem o conceito de morte. - Frisk suspirou, sua voz em uma entonação pesada, triste e solene. Ela já se acostumou com a morte, se não somos prova o suficiente, mas sempre lhe trará pesar ver o sofrimento daqueles que pouco podem ser ajudados. O máximo que se pode dar a essas histórias esquecidas é a paz da inexistência. - Então precisam de mim para ajudar a alma a partir? Alguém tem alguma ideia de onde pode estar dentro da floresta?  

—As duas crianças desaparecidas não foram encontradas, infelizmente. Então não temos certeza de onde pode estar a origem desse... Ser. O máximo que podemos supor é que guia as crianças para algum lugar no lado oeste da montanha.  

—Oeste... É na mesma direção que... 

—A Área Proibida.  

Ninguém nunca chegou ao topo de Ebott, mesmo não sendo uma montanha tão alta. Ou, pelo menos, isso é o que dizem. Não se tem registros ou histórias de alguém que chegou até lá e, se chegou, nunca retornou para contar a história. Mas se toda a área da montanha é uma armadilha mortal, então a floresta na região oeste é um portão direto para o reino dos mortos. Quando os habitantes do vilarejo descrevem a atração para a montanha como, em sua maioria, um sentido figurativo, esse termo é particularmente literal para a região oeste. Chegou ao ponto que toda a área foi posta como proibida e nem mesmo os mais corajosos ousam chegar até lá. Qualquer rastro que leve para essa parte da floresta é prontamente colocado como um decreto da morte do desaparecido, sem a possibilidade de recuperação do corpo. E não importa que as pessoas saibam sobre isso e que existam avisos por toda a floresta quando você começa a se aproximar da área exata de perigo, de alguma forma, elas ainda conseguem se perder e caminhar até lá. 

Como mágica.  

—Frisk, eu sinceramente não quero que você vá atrás dessa alma se ela estiver dentro das áreas proibidas. - o homem, Chefe Callan, atestou, mas sua voz era pesada, já sabendo que não teria como convencer sua teimosa neta. - De fato, eu não quero que você entre na floresta por um tempo. O clima dentro tem estado... Estranho. Mais pessoas tem desaparecido nos últimos meses do que nos últimos anos.  

—Mas esse é meu trabalho e o senhor sabe que deixar essa alma continuar da maneira que está vai apenas piorar a situação e não existe mais ninguém que possa fazer isso. - Frisk contestou e não existia muitos argumentos que pudessem contradizer o seu. Era apenas como era. Com Frisk sendo a última de sua linhagem e a única a conseguir não apenas interagir com as almas dos que partiram, mas também entendê-los, qualquer situação semelhante apenas poderia caber a ela lidar. - Não se preocupe, vovô. Vou ficar bem, prometo.  

E assim, determinação queimando em seus ossos, olhos cegos brilhando tão dourados quanto o próprio sol, ela se dirige para a entrada da floresta, sua guia lentamente rastreando o chão para qualquer raiz ou pedra perdida que possa indicar algum problema em seu caminho. Não será a primeira e nem a última vez que entrará na floresta, tendo crescido explorando os recantos mais obscuros do lugar que a maioria teme, Frisk aprendeu que morte é apenas parte da vida e mais uma parte de seu cotidiano, talvez até mais do que qualquer um no planeta. Ela não teme a floresta, mesmo quando as ameaças de ser devorada por ela continuam acontecendo.  

Talvez seja o senso de responsabilidade de sua família, aquele mesmo que permeia seu sangue e os obriga a permanecer geração após geração. O sentimento que temer a floresta os fará fugir, mas eles devem ficar. Por que? Nenhum deles sabe.  

—Eu não gosto que você ande pela floresta sozinha, Frisk. - e nem mesmo você acha que isso é uma boa ideia. Mas está tudo bem.  

—Eu nunca estou sozinha.  

Pois estamos com ela, não é?  

Caminhar pela floresta é um desafio por si mesmo, você vai notar. As árvores são velhas, portanto, são grandes e grossas, suas raízes se estendem pelo solo argiloso e muitas vezes escapam para fora. O terreno é perigoso, acidentado, cheio de solavancos e pedras espalhadas ao redor, dos diversos tamanhos e formatos, algumas pontudas o suficiente para cortar. A própria inclinação chega a ser um problema e existe pouca visibilidade por entre os arbustos, troncos e plantas que se espalham, não como se isso fosse um problema para Frisk, vendo como sua visibilidade depende totalmente do que pode ouvir e sentir.  

Os sons, no entanto, não tornam a atmosfera melhor. Eles pioram. Ver troncos retorcidos e galhos que parecem serpentes prontos para estrangulá-lo não são ajudados quando os barulhos de animais ecoam ao redor sem que você possa vê-los, quando as árvores chacoalham com o vento, assobiam entre os troncos e estalam debaixo de seus pés é quase como se fosse uma cacofonia de tensão crescente, apenas esperando o momento certo para alguma coisa saltar em você. Além disso, existe o frio natural da umidade ao redor somada com o fato de que a luz do sol não consegue ultrapassar as várias camadas até chegar ao chão.  

Quanto mais se adentra na montanha, mais longe se chega da civilização, mais se pode sentir os calafrios subindo por seu corpo e a sensação incomoda que todo o lugar está te observando, te seguindo, como se esperasse sua hora para se juntar a eles, para ser mais um entre os vários outros nomes.  

No começo, realmente não existe mais do que uma caminhada ao redor, Frisk conhece quase toda a região próxima a base do monte e talvez um pouco na metade, não contando a área a oeste. Animais selvagens perambulam ao redor, como se não afetados pela atmosfera, talvez sendo uma especialidade apenas humana ou talvez sejamos apenas paranoicos, transformando vento em sussurros e as sombras em formas. Temos uma imaginação muito fértil afinal. Mas você tem quase certeza que algo se esconde por trás dos arbustos, mesmo os que você acabou de passar e, em poucos momentos, é difícil diferenciar para onde está indo ou para que lado fica a cidade.  

Por qual caminho acabamos de passar mesmo?  

É um desnortear estranho, fácil de perceber, afinal, mesmo os sentidos de esquerda e direita, para frente e para trás, parecem meio perdidos em meio a mata densa. Pode ser o próprio efeito do espectro próximo, mas espectros normalmente não são fortes o suficiente para afetar os sentidos humanos nessa magnitude. Apenas um muito antigo talvez chegue a esses níveis de influência.  

Os passos de Frisk ecoam pelas árvores, altos demais para seu gosto posso imaginar, ela está procurando a sensação correta, o fio que a guiará até o inquilino que assombra essas bandas. Não é tão complicado, apenas tem que saber para onde olhar.  

Mais alguns metros a frente – ou foram para a esquerda? Talvez tenham sido para a direita. Não estamos voltando? - é possível ver a forma espectral do que parece um caminho, quase como uma chama na escuridão. Sua cor é laranja que se desvanece lentamente enquanto Frisk segue a direção que continua a indicar, mais adentro nas entranhas da floresta, passando por debaixo dos galhos e se esquivando daqueles que tentam se agarrar as suas roupas, quase como se estivessem tentando impedi-la de continuar.    

Cada passo parece mais pesado que o anterior, talvez estivemos subindo a montanha todo esse tempo e por isso é tão complicado seguir, um viajante normal já teria se cansado, mas Frisk é demasiadamente acostumada com o caminho para realmente começar a sentir a queima em seus músculos, não ainda. O fato de não poder ver pode ajudar também, por mais que os sons sejam sinistros em sua própria maneira.  

—Se vive o suficiente por aqui vai aprender a se acostumar com eles. Por enquanto, ainda existe luz do dia o suficiente para que a maior parte do que seria preocupante não seja um problema. - humanos se agarram as crenças populares, então, mesmo quando morrem e suas almas permanecem, elas acabam reproduzindo aquilo que por tanto tempo acreditaram ser o que acontece quando está morto. Isso significa que as sombras e o escuro facilmente fortalecem espectros e almas que começam a se corromper. Elas afetam o ambiente e as sensações do ambiente, confundem os sentidos e atiçam o instinto primitivo mais profundo de cada um de nós.  

O medo.  

Você pode notar enquanto nos aprofundamos do que seria o território do novo espectro que atormenta essas bandas. Começa a ficar mais frio, calafrios sobem por sua nuca acompanhado pelo suor frio do nervosismo, quase incapaz de ouvir qualquer outra coisa devido ao retumbar constante das batidas de seu próprio coração em seus ouvidos. Não precisa se preocupar, no entanto. O que sente não passa de uma memória de quando ainda tinha um coração, sangue pulsando em suas veias e os sentimentos comuns de quando ainda estava vivo. O pavor natural de ser ferido, de ser atacado, de sofrer. Não tem mais que se preocupar com isso agora.  

Mas Frisk... 

—Eu estou bem Chara. - está demasiadamente acostumada com a atmosfera ao redor para realmente se preocupar, ainda que seja possível que seu coração esteja batendo mais rápido do que o normal e seus ouvidos estejam mais atentos do que normalmente são.  

Mais alguns metros adentro da floresta.  

Não é tão estranho quando os risos e gargalhadas se juntam a cacofonia natural da floresta. Passos de criança correndo em todas as direções, mas apenas uma voz está aí.  

Um pouco mais adentro e agora o vulto começa a se contorcer entre os troncos grossos das árvores, rápidos e ligeiros. Os calafrios pioram e o frio é muito mais incomodo do que apenas uma brisa gélida em seu corpo. Parece cavar através dos seus ossos, machucando suas juntas e deixando suas extremidades com pontadas dolorosas. É instintivo se encolher, procurar calor no próprio corpo.  

Estamos quase lá.  

A frente, depois de um amontoado particular de árvores, está o que parece ter sido um dia uma pequena clareira, ou talvez seja o resultado de uma erosão particularmente ruim. Existe um barranco de terra mais a frente, quase como se o próprio solo tivesse caído e se separado, uma parte para cima e outra para baixo, pedaços de raízes agora expostas se esticam e apontam para todos os lados, algumas seguindo para o chão mais abaixo e formando arcos retorcidos e estranhos de madeira. O próprio lugar é desprovido de árvores em uma circunferência suspeitosamente perfeita, mas apenas um pouco de claridade chega ao lugar, mostrando que o dia ainda está alto sobre o céu, mas as árvores ao redor cresceram o suficiente para suas copas começarem a tentar bloquear o caminho. Ainda assim, apesar da falta de presença de árvores e arbustos, a grama não está sozinha a ocupar o centro da estranha circunferência, também existem estranhas pedras, pontudas e grandes, como espinhos grossos e doloridos a sair da terra, procurando alcançar os céus, sem sucesso. Elas estão tombadas para todos os lados, em posições precárias, mas firmes, repletas de musgo de um verde vibrante.  

É, de fato, uma paisagem muito bonita, intocado pelo tempo e pela ação humana. Você pode sentir que é velho. Existe apenas esse estalo de poder no ar que engolfa sua essência e o faz se curvar em respeito, permanecer calado. 

Também carrega o fedor da morte.  

Alguma coisa aconteceu aqui. Algo grande.  

Os risos infantis novamente ecoam pelo lugar e detrás de uma pedra um vulto se esconde antes que possa observá-lo, apenas para reaparecer em outra pedra do outro lado da circunferência.  

Frisk anda até o centro, sem temer que seja o que for que se esconde possa lhe fazer mal.  

—Olá? - a voz de Frisk ecoa através da clareira, quebrando a monotonia que havia se instalado no lugar. Os ecos dos risos de criança se aproximam, junto com os sons de seus passos apressados, correndo sobre a grama. - Olá!  

A presença se aproxima, assim como o vulto corre ao redor de pedras mais próximas, seus passos se tornando mais altos. É impressionante como Frisk parece não se importar em girar em busca da origem do som cada vez que ele ecoa em direções diferentes, da esquerda para a direita e da direita para a esquerda em questão de segundos. Ela apenas sabe. 

Tem alguém aqui.  

Olá! - virando-se rapidamente, alguns passos de onde estamos, está agora, no lugar onde antes não estava nada, uma pequena criança pálida de grandes olhos escuros profundos como breu. Ela usa uma máscara, não é seu rosto, você pode notar, ainda que os buracos nos olhos deixam claro que sim, o buraco escuro são realmente seus olhos, ou seriam a falta deles? Negros como um poço sem fim, enervantes no mínimo. A própria máscara não ajuda sua imagem, tão pálida quanto sua pele, parece de porcelana, lisa e fina, com traços delicados e simples moldados sobre ela. São genéricos e ao mesmo tempo característicos, talvez tenham sido a expressão da criança um dia, mas agora imutáveis permanentemente em um sorriso maroto de bochechas salientes. Talvez não mais de oito, talvez sete anos, seu tamanho definitivamente reforçando o pensamento.  

Veste roupas antigas, shorts que apenas lhe chegam os joelhos ralados em pernas finas, presos por suspensolhos da mesma cor. Tem uma blusa social branca, os botões bem fechados e mangas bem arrumadas, cobrindo todos os seus braços magros, empurrada para dentro das calças. Nos pés estão sapatos de couro, definitivamente um modelo que não se vê mais, parecem os de seu avô, ou algo que seu avô definitivamente usaria em algum momento de sua vida, com meias compridas até o meio das canelas magras. Seu cabelo está bagunçado, curto e bem aparado.  

Eu te assustei, não assustei?! - a criança, o espectro pergunta animado, orgulhoso de si mesmo. Sua voz é estranha, como se ecoasse sinistramente, não como a de Frisk, que retumba naturalmente pela paisagem, a dele não parece ressoar ao redor, mas sim sobrepor-se várias vezes, como se repetisse o que acabou de falar uma e outra vez, de uma só vez. É estranho também vê-lo falar pela máscara, sendo tão real como é. É quase como se falasse sem realmente abrir a boca. - Você está aqui pelo tesouro também? Eu o encontrei, é meu!  

—Eu vim aqui procurando por alguma coisa, sim. Mas não é um tesouro. - Frisk responde, pequeno sorriso em seu rosto. Não é a primeira vez que ela encontra um espectro e não será a última. Também não é a primeira vez que encontra um que é uma criança tão jovem. - Eu não sabia que existia um tesouro aqui.  

Você não sabia? Todos sabem sobre o tesouro nas montanhas! Dizem que é mágico, mas você não pode ficar com ele, eu o encontrei. Eu o encontrei e vou levar para casa e todos vão ter que acreditar em mim! 

—Eu acredito em você. Tem que ser muito corajoso para vir até aqui em busca de um tesouro, não acho que mentiria sobre isso. - a criança, o pequeno espectro, estufou o peito em orgulho.  

Sim! Eu sou muito corajoso! - então o pequeno espectro parece se dar conta de alguma coisa, sua forma se tornando mais insegura, rosto virando de um lado para o outro, obviamente confuso. - Hum... Mas por que a senhorita está aqui? Não é perigoso?  

—Um garotinho se perdeu na floresta. - Frisk respondeu honestamente. Foi provavelmente o que aconteceu com a criança, tendo encontrado esse lugar, mas nunca conseguiu voltar para contar sobre o que descobriu. Talvez foi um tesouro, mas o que é realmente um tesouro para uma criança? - Eu vim tentar guiá-lo de volta. Ele foi muito corajoso também, em subir até aqui, mas agora as pessoas estão preocupadas que ele não possa mais voltar. Acha que pode me ajudar?  

Oh! Hum... Eu... - ainda inseguro, o garotinho se remexeu incerto em seu próprio lugar, mãos apertando fortemente o short. Não se pode evitar pensar em o quão estranha a cena não se parece quando a expressão em seu rosto permanece sempre a mesma. - Eu... Eu não sei como voltar... Eu acho... 

—Tudo bem, é meu trabalho guiar pessoas perdidas de volta para onde seus entes queridos estão. Isso quer dizer que eu posso te ajudar também, se você quiser. Tenho certeza que sua mamãe e papai sentem sua falta. Você pode contar a eles sobre o tesouro que encontrou.  

Você... Você realmente pode me ajudar?  

—Claro! Tudo que preciso é uma pequena mágica e você vai saber exatamente para onde ir. Você gosta de mágica? - um pouco mais animado, o espectro assentiu, alguns passos mais próximo. Frisk sorriu convidativa, abaixando-se para fazer-se da mesma altura do garotinho. - Tudo bem, tudo o que tem que fazer é segura minha mão, bem de leve. Não vai doer, tudo bem? Você pode sentir um pouco de... Calor em seu peito, mas não machuca, eu prometo. Agora, feche os olhos e pense em seus pais, pense em sua casa, pense na presença deles e como você quer voltar, como você quer... Encontrar seu caminho de volta. Pode fazer isso pra mim?  

Guiar um espectro ou mesmo uma alma para encontrar a paz é tão simples quanto guiar a energia de cada ingrediente de suas poções para mesclar-se como deve ser feito para criar um resultado. Mas ao invés de se juntar alguma coisa, é quase como desemaranhar um nó, desprender o que está segurando a alma além do necessário e então deixá-lo seguir seu curso. Precisa de um pouco mais de concentração, vendo como almas humanas são muito mais complicadas do que almas de qualquer outro ser vivo nessa terra, principalmente devido a sua insistência em se apegar ao passado.  

Lentamente o pequeno espectro começa a se desfazer, pequenos flocos de sua essência desmantelando-se desde seus pés até a cabeça, desaparecendo como fragmentos de luz ao vento até o ponto que nada lhe sobra a não ser a leve brisa gelada e a sensação fantasmas de que esteve ali em algum momento.    

Frisk suspira, ombros caindo ligeiramente cansada pelo dia longo.  

—Definitivamente um dia agitado. Tivemos sorte, no entanto. A alma apenas tinha começado a se corromper, por isso aceitou tão facilmente minha presença aqui e ouviu o que pedi. Se tivesse ficado mais tempo talvez não tivesse sido tão fácil. - o que é, de fato, verdade. Quanto mais antigas e corruptas uma alma é, mais poderosa ela pode ficar, usando da energia das outras coisas vivas ao redor para distorcer os sentidos e criar armadilhas que podem acabar no fim de outra vida. Dependendo de qual a característica primária da alma ela pode se tornar violenta, agressiva e complicada de se comunicar, presa em algum ponto do tempo, às vezes um de completa carnificina dependendo de como era sua vida antes de partir. - Mas a energia nesse lugar se sente diferente. Não acho que apenas esse espectro causaria isso. Parece... Muito mais antigo.  

A morte permeia esse lugar como o recanto de descanso de muitas almas. É uma energia eletrizante, você também deve poder sentir, quase como se tivesse sido carregada e descarregada como uma bomba e então consumida lentamente pela vida local. Não é algo que possa ser dito como ter sentido antes, é muito característico, quase como... 

—Minhas poções. É como se alguém tivesse manipulado a energia da vegetação ao redor, da própria terra, e multiplicado ela com alguma coisa... Mas definitivamente foi feito para machucar. A intensão está marcada em todo lugar e, como você disse Chara, morte marca profundamente essa parte da floresta. Eu definitivamente não lembro de nada assim ou, bem, não lembro desse lugar. Acho que nunca estivemos aqui. - com cuidado e pontas dos dedos delicados, Frisk teteia as rochas que crescem para fora do solo, lentamente se dirigindo para a parede de terra que se forma não muitos passos a frente. - Talvez porque estamos mais próximos da Área Proibida. O quão próximos é a melhor pergunta. Chara? Você poderia procurar qualquer aviso que esteja por perto? Ou qualquer coisa que possa nos trazer alguma resposta na verdade. Nada disso se sente... Natural de alguma forma.  

A área não é muito grande, mas a parede de pedra realmente não parece natural, demasiadamente linear, apesar da ação do tempo e da própria natureza terem criado dentes e arestas em sua forma, talvez em algum momento a terra do barranco possa ter deslizado e o monte se espalhou ao redor, existe um buraco maior ao centro, formando quase um pequeno telhado. Ele também é maior do que se parece a primeira vista, mais alto do que Frisk com toda certeza e continua mesmo de volta entre as árvores.  

Seria um problema se estivéssemos dentro da Área Proibida, no entanto. Afinal, não para nada ela é chamada como é, nossas chances de encontrar nosso caminho de volta para casa seriam menores do que gostaríamos de pensar. Por isso estou procurando uma pequena placa, feita de madeira e entalhada com letras douradas, provavelmente em uma tinta que reflita a luz ou chame a atenção apesar da escuridão da floresta. Não é muito pequena, mas também não é grande. Elas foram postas ao redor dessa área para avisar viajantes perdidos que estão chegando perto de uma área perigosa, não como se funcionasse muitas vezes, mas são úteis para se localizar. Ter certeza que não foi muito mais longe do que deveria e...  

Oh! Lá está ela! Não muito longe do barranco caída sobre a grama por sorte com suas letras viradas para cima, tornando possível ler “Cuidado. Área Proibida há 10m”. Isso é um bom sinal, significa que ainda estamos seguros e não é muito arriscado explorar um pouco mais a clareira, mesmo que devemos tomar cuidado para não nos aprofundarmos na floresta.  

Agora para a outra tarefa, não parece existir muito que possamos encontrar. Tudo é muito antigo e coberto pela vegetação local, qualquer traço que pudesse ser deixado de uma possível batalha ou evento importante provavelmente foi desgastado pela própria ação das mudanças de estação. A Área Proibida é conhecida mesmo antes dos períodos sombrios das duas primeiras guerras se a história da própria cidade é para ser acreditada. E não existem relatos de quaisquer conflitos por alguns bons cem anos por essa área. Seja o que for que aconteceu é muito mais antigo do que costumamos ver ao redor das terras de Ebott que já é particularmente velha.  

—Talvez esteja relacionado ao tesouro que o espectro comentou. Ele diz que o encontrou. - pode ser relacionado a qualquer coisa e ao mesmo tempo a nada. A própria ação natural da erosão ao redor da montanha pode ter causado todo o problema e por algum motivo ou outro deixou o que parece um rastro de energia exótica ligado a terra. Algo que se parece muito com a morte. Ainda que pouco provável, não deixa de ser uma possibilidade. - Chara... Chara eu posso ver alguma coisa.  

Em situações normais isso não seria uma surpresa, talvez trouxesse um pouco de curiosidade, mas no nosso caso? A frase é estranha, muito mais do que surpreendente, pois Frisk não é capaz de ver. Seus olhos nasceram sem a capacidade de apreciar o mundo como é e, por tal, ela se apoia em minhas palavras, não para ver propriamente dito, ela não precisa de mim para se guiar, para funcionar, mas para tentar ver o mundo como outras pessoas também o veem. Com mais do que formas estranhas nas pontas dos dedos ou sons particulares. Ouvir que ela “viu” alguma coisa traz mais do que curiosidade, traz também preocupação.  

Pois se ela é capaz de ver e o único que ela pode ver são coisas relacionadas ao nosso mundo, então o que ela tem em mãos?  

—Não é como... Como se eu pudesse ver. Não em detalhes pelo menos. Não como você consegue ver. É mais como... Como um contorno brilhante marcando uma silhueta? Como... Como se emitisse energia igual a vocês, mas eu posso senti-lo em minhas mãos, então não pode estar relacionado a um espectro, certo? Tem como você ver o que é?  

Esse, afinal, é meu trabalho.  

Frisk está basicamente ao lado da parede de terra, agachada sobre a grama macia com um objeto de aspecto pétreo em suas mãos. É visivelmente branco, talvez ligeiramente acinzentado e manchado pelo tempo, talvez um dia tenha tido uma forma específica, mas agora parece apenas um pedaço muito quebrado de alguma coisa, talvez um piso, ou uma escultura, não se pode ter certeza mais, mas tem marcas sobre ele, esculpidas detalhadamente e agora repletas de areia e ligeiramente apagadas. Tenho certeza que Frisk ainda vai poder sentir as saliências e sulcos se passar a ponta dos dedos sobre eles, mas ainda vai ser difícil de distinguir o que exatamente formam, vendo como estão demasiadamente desgastados para realmente se destacarem no resto do material. Definitivamente quebrou de algum lugar, observando suas marcações, faltam pedaços, partidos no que se pode descrever como o meio de uma frase. Pode ter sido uma placa ou parte de algo maior que um dia esteve aqui, muito antes do vilarejo.  

—Existem lendas de que Ebott um dia foi um reino, ou, pelo menos, parte de um. Não sei nada sobre um tesouro, mas talvez antes as pessoas acreditassem que ainda existissem tesouros perdidos aqui, relíquias do velho reino. Mas nada foi comprovado. Alguns arqueólogos chegaram a vir aqui, mas... Bem, você sabe como essa história costuma terminar. Talvez tenha sido isso que o espectro encontrou quando vivo. Talvez exista mais alguma coisa aqui. - mas, no momento, devemos partir. O sol está começando a se por e as sombras começam a se tornar mais espeças com o passar dos minutos. Talvez seja uma exploração a ser deixada para quando temos mais horas em nossa disposição. - Sim, sim, você tem razão como sempre Chara.  

Com a decisão tomada, Frisk se levanta para partir, seu achado ainda nas mãos com toda a pretensão de levá-lo para melhor estudo em sua casa, mas algo na atmosfera parece mudar assim que o assoprar da brisa de outono assobia por entre as árvores, balançando as folhas das árvores de tal maneira que as próprias sombras parecem se agitar por um momento. E, junto as sombras, o mundo parece girar e a floresta não mais parece a mesma, o cenário mudando.  

—Isso é...! 

Um eco.  

Se espectros são manifestações físicas de como uma alma se parecia em determinado ponto antes de morrer então ecos são literais projeções de momentos de sua vida, deixados para trás em pontos específicos onde sentiram uma emoção muito forte que os marcou por um motivo ou outro. Diferente de espectros também, os quais apenas existirá um de cada alma, ecos podem existir aos montes dependendo de quantos momentos marcaram essa alma antes de partir. Eles se dissiparão com o tempo, assim como a alma e o espectro, mas são muito mais simples de desaparecer e não necessariamente podem causar danos vendo como apenas os mais sensitivos são capazes de realmente interagir com eles, enquanto espectros podem ser capazes de influenciar o mundo dos vivos se der tempo e vontade o suficiente. Ecos são muito mais informativos do que qualquer um dos outros, as páginas do livro de uma alma.  

O primeiro fato que deixa claro que estamos dentro de um eco é facilmente visível pela falta das pontudas pedras que saiam do solo dentro da área sem árvores que nos encontramos, muito menos a proeminente parede de terra que caracterizava o lugar como se o próprio chão tivesse desabado. Outro, no entanto, é o fato que as copas grandes das árvores que cobriam a limitada área circular agora não existem mais e sim toda área foi ocupada por árvores como o resto da montanha. Existe também um caminho que não antes existia, feito de pequenos blocos de pedra que seguem para o topo da montanha, com pequenos sinais também feitos da mesma pedra branca reluzente seguindo-os logo ao lado, alguns, apesar de um pouco complicado na distância em que estamos, possuem o que parecem ser letras gravadas sobre eles. Pontos de informações muito provavelmente.  

E, apesar da imagem relativamente pacifica e bonita de um dia claro, o cheio de queimado permeia o ar assim como o trepidar do fogo selvagem não muito distante, definitivamente muito maior e mais perigoso do que uma simples fogueira. Gritos também ecoam através da floresta, assim como o tilintar de metal se chocando e o tremor do solo do que poderia muito bem ser um exército se movendo. Não é muito complicado supor que uma batalha acontece nos arredores e não precisaremos esperar muito tempo para descobrir o que está acontecendo. Pelo menos, em partes.  

Ecos nunca duram muito tempo, eles são fragmentos de memórias que marcaram uma alma, não filmes de uma vida inteira. Eles são quebrados e fragmentados em partes desconexas, sem começo nem fim, apenas lapsos do que um dia se passou.  

São o suficiente, no entanto, para marcar uma nova alma que é capaz de vê-los.  

Como previsto precisa de apenas alguns segundos para um grupo passar correndo, apressados, provavelmente fugitivos da guerra que continua em outras áreas da montanha. Mas as pessoas que vemos definitivamente não são o que esperamos, pois, ao invés de humanos com suas características simples de duas pernas, uma cabeça, dois braços e um rosto com dois olhos, uma boca e nariz o que aparece por detrás das árvores em expressões de puro medo e desespero são criaturas que nunca antes vimos. Criaturas que, no sentido comum, são facilmente descritas como monstros com seus chifres e tentáculos e peles e formas variadas e que parecem ter saído dos mais loucos sonhos ou pesadelos de alguém.  

Eles correm na direção do topo da montanha, sempre conferindo por sobre os ombros, rostos assustados e machucados, desesperados. Não muito atrás, o que é definitivamente um humano, cabelos castanhos e olhos dourados, carregando o que parece ser um cajado, também ferido e tropeçando na retaguarda, parece sempre olhar para trás, gritando a todos que continuem correndo, continuem indo, não falta muito. Muito para que não podemos saber, o contexto nos perde.  

Pouco depois mais grupos de humanos aparecem, esses vestindo armaduras ou roupas de couro, capacetes e espadas, alguns até mesmo arcos, marcados com poeira e sangue. Diferente do humano que acabou de aparecer esses não parecem amigáveis aos monstros que fogem. De fato, vendo pelos rostos daqueles que ainda estão não muitos metros de onde esses novos humanos apareceram, é fácil supor que são inimigos, humanos caçadores e monstros as presas. Não parece, no entanto, como nas histórias em que cavaleiros corajosos caçam o grande mal. Não, de fato, os humanos parecem os monstros e os monstros parecem os humanos das histórias. Famílias inteiras que são aterrorizadas e devoradas pelo grande mal, sem poderem se defender.  

Tomando a frente, o humano com cajado, de alguma forma, faz com que as plantas da floresta ergam suas raízes e ataquem, mas não parece forte o suficiente para deter a todos os cavaleiros que cortam as raízes com suas espadas afiadas e continuam a marchar na direção dos retardatários que não são rápidos o suficiente para fugir.  

Assim que avançam o suficiente para estarem a poucos passos do que se supõe ser um mago, a terra começa a brilhar. Do chão enormes placas de pedra se erguem e empurram ou destroem os cavaleiros que estão em sua área de alcance, dilacerando-os por completo sempre que conseguem um golpe direto, sangue vermelho agora marcando a terra quando o chão simplesmente parece desabar e se separar perfeitamente daquele onde os fugitivos ainda estão, estupefatos com a intervenção, assistindo em uma mistura de horrorizados e aliviados cada um dos humanos cair perante tão demonstração de poder sobre a natureza.  

Uma sombra então se ergue entre os corpos, no meio do campo de batalha, energia pura brilhando ao seu redor.  

Irmão! — o primeiro mago grita para a sombra que aparece, um humano de características devera semelhantes ao que agora protege os monstros, mas seus olhos são vermelhos ao invés de dourados e queimam com uma fúria implacável que brilha junto a energia que emite.  

Leve todos para o refúgio! Eu vou atrasá-los! - o novo mago grita de volta, seus olhos nunca deixando o inimigo, ainda mais energia se concentrando em suas mãos enquanto continua a fazer com que enormes pedaços de pedra se ergam do solo.  

Alguns soldados correm, outros se levantam em meio a seus companheiros caídos e avançam corajosamente contra a nova ameaça, ainda que pareça que não terem chance.  

E então o lapso parece falhar, toda a imagem simplesmente se duplica e distorce, vários cenários diferentes se sobrepondo em um, o mesmo evento, mas de formas diferentes, partidos e estilhaçados uns aos outros em imagens entrelaçadas. Até que, assustadoramente, se não o ponto mais assustador do dia, o eco do mago que luta contra os humanos se vira para nos encarar. Para encarar Frisk.  

Ecos são, como já mencionado, partes do passado. Eles não podem interagir com o presente, assim como o presente não pode interagir com eles. O que aconteceu, aconteceu e não existe nada que se possa fazer para mudar. E, ainda assim, um dos fragmentos de imagem do mago parece se desprender do resto, ir contra toda a cena e caminhar em nossa direção, seus olhos vazios lentamente perdendo se banhando em um negro profundo, gelatinoso, quase como um rio de podridão que agora derrete em lágrimas.  

Você não deveria estar aqui. - sua voz ecoa e distorce como um áudio quebrado, gravado várias vezes e então começando a falhar, o arquivo demasiadamente corrompido, mas de alguma forma ainda funcional. Frisk tenta se afastar, seus olhos arregalados em pavor pelos novos acontecimentos que nunca antes, em toda sua vida, ela já tinha presenciado. O eco a segura antes que possa ir muito longe, deixando seu rosto tão próximo quanto fisicamente possível, um sorriso agora contorcido em seus lábios, jorrando a mesma substância negra que seus olhos. - Volte para seu mundo pequeno viajante. Não existe lugar para você aqui.  

E com isso o eco a empurra e Frisk, quase literalmente, caí para fora do eco, atingindo o chão gramado com um impacto abrupto, mas não o suficiente para realmente ferir. Sua respiração é errática e seu coração bombeia tão rápido quanto baterias em uma marcha de carnaval. Ela vasculha ao redor, mas já não mais pode ver o eco, toda a floresta parece ter voltado ao presente com a parede de terra e as pedras pontudas, sem árvores e definitivamente muito mais tarde do que antes, sem claridade.  

Mas ainda assim, de alguma forma, apesar de não mais presente, ainda é possível sentir a presença do que quer que fosse espreitando por entre a mata. Todo o lugar se silenciou, não mais animais ou vento, sem mais assobios ou silvos, uma floresta extremamente vazia e silenciosa. Nunca um bom sinal.  

Então, ainda com a adrenalina correndo por suas veias e a confusão de toda a situação, medo se arrastando por debaixo de sua pele e os pelos de sua nuca arrepiando pela constante sensação de ser observada, Frisk toma a única decisão coerente no momento:  

Dando a volta para o caminho de onde veio, ela começa a correr.  


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Notas finais do capítulo

Prévia do próximo cap "Passado e Presente":
Frisk tem uma decisão difícil em suas mãos. Por um lado lidar com espectros problemáticos que começam a causar problema para os vivos é seu trabalho e todos os eventos sinistros do MT. Ebott parecem ter a mesma fonte que se encontra na parte mais obscura e evitada da floresta, por outro lado esse é o lado mais obscuro e evitado da floresta e algumas centenas de pessoas desapareceram se aventurando lá dentro e ela pode ser a próxima se seguir com seu dever de identificar o espectro e fazê-lo encontrar a paz. Sua curiosidade, no entanto, foi atiçada com os ecos do que parece ser a lendária guerra entre Monstros e Humanos que tem sido passada por sua família em histórias e fábulas por gerações. Seria esse o motivo, que essas terras foram palco da guerra unilateral entre duas espécies, que levou sua família a se manter presa no mesmo lugar durante várias gerações? O quão fundo ela vai ter que ir para descobrir? Passado e presente se encontram no mesmo lugar, prontos para contar uma história que pode ser muito mais profunda do que qualquer um poderia imaginar. E parece que, junto de tudo a isso, ela tem mais alguém para acompanhá-la em sua jornada.

Eu sinto como se minha alma tivesse se perdido em algum ponto no meio do caminho. Se foi pq vendi para terminar isso ou porque ela simplesmente desistiu fica a dúvida. Por mais que seja divertido escrever tudo isso é um pouco cansativo que meus caps sempre acabam ficando tão grandes, mas oh bem. Eu pretendo ir bem devagar com os acontecimentos dessa fanfic então pode demorar um pouco para que chegue nos "finalmentes". Espero que estejam aproveitando tanto quanto eu.
Até a próxima!



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