No outro dia, ambos foram a toca de Poça de Folhas para receberem as instruções, Voo de Esquilo estava lá, ambas falavam sobre algo em voz baixa, a curandeira estava com a cauda bem enrolada a barriga e sua irmã cochichava algo em seu ouvido.

       Depois que Poça de Folhas deu as ervas para Pelo Gris e Fênix levarem aos anciões, ela se sentou de costas para a boca de sua toca, parecia estar apenas mexendo em algumas de suas folhas, mas estava em uma posição estranha, como se algo a impedisse de se abaixar corretamente.

       Na toca dos anciões, Pelo Gris começou a falar:

—Fênix, eu sinto muito por ter feito aquilo.

—Fênix: Tudo bem, Cauda de Nuvem me encontrou. (Respondeu sem dar muita importância).

—Pelo Gris: Não é sobre isso que estou falando. É sobre antes, na toca de Poça de Folhas.

—Fênix: Ah, isso? Tudo bem, se eu denunciasse, ninguém acreditaria mesmo.

—Pelo Gris: Então, somos amigos de novo?

—Fênix: Não sei se estou pronta pra isso, mas não precisa se preocupar, não estou brava com você.

—Pelo Gris: Isso é bom.

       Ambos continuaram a trabalhar em silencio, estava até que confortável para a aprendiz negra e poderia muito bem continuar assim, porém uma gata branca entrou na toca dos anciões, Fênix logo reconheceu que era Asa Branca, a filha de Cauda de Nuvem e Coração Brilhante:

—Asa Branca: Olá, Pelo Gris. Fênix. (A cumprimentou com um aceno de cabeça).

—Pelo Gris: Asa Branca? O que faz aqui?

—Asa Branca: Poça de Folhas me disse para mandar Fênix para a toca dela.

—Fênix: Tudo bem, eu já vou.

        Pelo Gris se levantou e foi ao encontro da gata branca, ficou de pé frente a ela, inclinou um pouco a cabeça e tocou seu nariz ao dela, Fênix não sabia o que estava acontecendo, os dois gatos se afastaram e a guerreira branca saiu da toca.

—Fênix: É bom ver que vocês se aproximaram. (Falou se sentando).

—Pelo Gris: Eu e Asa Branca nos aproximamos um pouco nesses últimos dias. (Falou sem dar muita importância).

       Fênix ficou meio sem jeito, não sabia como reagir, por um momento seu pelo se arrepiou, não soube o motivo, mas ficou feliz por Pelo Gris estar finalmente esquecendo de Voo de Esquilo, isso com certeza acalmaria algumas coisas.

—Fênix: Bom, é melhor eu ir encontrar Poça de Folhas. Te vejo depois.

      A aprendiz negra caminhou até a toca da curandeira, ainda pensando sobre o que acabara de acontecer na toca dos anciões, na hora ela sentiu algo estranho, mas que não sabia explicar. Pensava nisso até que entrou na toca e viu as duas filhas de Estrela de Fogo esperando por ela:

—Voo de Esquilo: Fênix, venha cá, rápido. (Falou meio grossa).

—Poça de Folhas: Calma, irmã, não assuste ela.

—Fênix: O que houve? Eu fiz algo errado?

—Voo de Esquilo: Não se preocupe, não é sobre você, mas precisamos de sua ajuda.

     A gata negra se aproximou das irmãs, Poça de Folhas guiou com sua cauda uma das patas da aprendiz até sua barriga, então a jovem sentiu algo batendo contra a sua pata:

—Fênix: Poça de Folhas, você quer dizer que... (Interrompida).

—Poça de Folhas: Sim, Fênix, eu estou esperando filhotes.

—Fênix: Meus parabéns, eu... (Pausou por um momento, pois se lembrou que a gata era uma curandeira, por tanto era proibida de ter um relacionamento amoroso com qualquer um). Poça de Folhas, o que você fez? Quem é o pai? (Mudou seu tom para um mais preocupado).

—Poça de Folhas: Um gato do Clã do Vento. Eu sei que isso vai ser pedir demais, mas, Fênix, você pode nos ajudar a esconder isso dos outros?

—Fênix: Mas por que eu?

—Voo de Esquilo: Você é aprendiz de Poça de Folhas, uma hora ou outra iria descobrir. E precisávamos ter certeza de que você não contaria a ninguém. (Falou com os olhos totalmente fixos na aprendiz, como se a dissesse só com o olhar de que ela deveria manter segredo).                           

—Fênix: Certo, o que vamos fazer quando eles nascerem?

—Poça de Folhas: Estamos pensando nisso, provavelmente nascerão ainda nessa estação, então, o risco é cada vez maior.

[...]

       As semanas se passaram, Fênix agia normalmente perto dos outros gatos, como se não soubesse de nada, ainda mais porque também pensava no fato de que precisava se aproximar mais dos outros gatos, não poderia limitar tanto assim as suas amizades, não podia se prender apenas a Pata de Cinzas, Poça de Folhas e Estrela de Fogo.

       Então sua primeira atitude foi levar algumas ervas para os anciões, assim como a curandeira havia solicitado que ela fizesse, mas dessa vez a aprendiz teria um brilho diferente nos olhos, estaria indo para talvez começar uma conversa ou ouvir alguma de suas histórias, o que a ajudaria a entender melhor o Clã do Trovão.

       Estava caminhando para a toca dos anciões quando esbarrou em Pelo Gris, de novo, já estavam ficando chatos esses encontrões aleatórios, Fênix murmurou um “desculpe” e tentou contorná-lo, mas o guerreiro barrou seu caminho com a cauda, fazendo-a voltar o olhar para ele com uma expressão surpresa, enquanto ele estava inexpressivo.

—Fênix: O que foi agora, Pelo Gris? (Perguntou entediada). Já nos acertamos, lembra?

—Pelo Gris: É claro que eu me lembro. Só quero ter certeza de que você não vai se esquecer disso. (Falou frio e seco).

       A mais nova abriu a boca para responder umas duas vezes, mas nada saiu, seus olhos estavam totalmente vidrados nos dele, e só então ela parou para reparar: ele tinha olhos azuis. Claro que já havia percebido antes, mas nunca tinha notado que eram tão azuis assim, eram como o céu no sol a pino, era um azul anil claro e forte, e suas pupilas em fenda davam mais destaque neles, as vezes estas alternavam entre os olhos da gata negra, dando a entender que ele também a analisava.

    De repente, Fênix sentiu os olhares do outros gatos queimando sobre eles, que ambos deviam estar em uma posição muito estranha para quem olhasse e não soubesse do contexto da situação. Se afastaram, a mais nova pegou as ervas, que deixara cair no chão em algum momento que não se recordava, e retomou seu caminho, mas não resistiu a virar a cabeça para trás e dar uma última olhada no guerreiro azul cinzento, para então perceber que ele fazia o mesmo, sentiu-se constrangida e virou para frente o mais rápido que pôde.

    Aquela seria uma das cenas mais marcantes em sua vida, com certeza, nunca mais se esqueceria daqueles olhos azuis brilhantes, da sensação que sentira quando estavam mais próximos do que deveriam, mas, como sempre, Pelo Gris estava sendo misterioso e estranho, simplesmente a parou no meio do caminho, a encarou e se afastou sem dizer nada. Seja lá o que estivesse de errado com ele, devia ser algo sério.

    Assim que chegou no seu destino, visualizou uma anciã com alguns filhotes ao seu lado, ela parecia contar uma história ou algo assim, sua voz idosa, porém doce, proferia palavras sabias e marcantes, Fênix até quis parar para ouvir, estava se concentrando no que a mais velha contava, mas a história foi interrompida quando a anciã reclamou que seu ninho estava desconfortável, causando uma crise de risos nos filhotes, a mais velha fingiu irritação e os pequeno saíram correndo.

    Fênix voltou ao trabalho seguindo aos protestos da anciã, que aparentemente estava de mau humor de verdade agora, pelo jeito, fazer amizade com os anciões não seria algo fácil, mas nada na vida se consegue fácil, então só precisava continuar tentando, além disso, ainda haviam os guerreiros e outros aprendizes para ela se aproximar, por tanto, não era momento de perder as esperanças.