I - Herdeira da Noite: Êxodo escrita por Elizabeth Charpentier


Capítulo 18
Capítulo Dezessete




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Diferente de onde estava quando dormiu, Nyssa se encontrava em uma enorme clareira. O sol estava a pino e o barulho da água corrente denunciava que havia algum lago ou rio ali por perto. Além deste, o único barulho que havia era dos pássaros e os estalos da própria mata. A grama estava um pouco alta, com diversas flores colorindo o espaço como um enorme tapete verde. Era um lugar tranquilo, sereno. Além de tudo, havia uma pequena casa de madeira em um dos cantos.

Dali conseguia ver que todas as janelas estavam fechadas pelas cortinas. Caminhou lentamente até lá, subindo os três degraus da sacada que levava até a porta. Tentou abri-la, mas parecia estar trancada por dentro. Procurou por alguma fresta entre as cortinas da janela ao lado, mas tudo estava um breu. Não havia sinal de que alguém estava ali dentro.

Suspirou, sentando-se nos degraus. Não havia muito o que ser feito ali com a casa trancada, e a clareira não tinha nada além da própria vegetação. O vento estava fresco e bagunçava seu cabelo, o levando para todos os lados. Fechou seus olhos e aproveitou a brisa, sentindo a calmaria que aquele lugar trazia para ela.

Abriu seus olhos depois de um tempo, encarando as poucas nuvens acima dela. Uma mancha branca em meio às árvores chamou sua atenção, percebendo que se tratava de um pano branco pendurado entre as árvores, balançando junto com o vento. Teve a sensação forte de deja vu, fazendo-a lembrar do sonho apocalíptico que teve há algum tempo.

Andou até ele, deslizando levemente seus dedos pelo tecido liso e o pegou com uma de suas mãos, amassando um pouco entre seus dedos, sentindo-o esquentar rapidamente a ponto de queimar a sua mão.

Se sentou em sua cama em um salto, sentindo a pele de sua mão direita queimando. Levantou rapidamente da cama e correu para o banheiro, colocando a mão embaixo da água fria, sentindo a ardência aliviar um pouco. Por mais que tivesse tido apenas um sonho instantes antes, sua mão realmente havia queimado, a mesma em que tinha usado para tocar o tecido em seu sonho. Algumas bolhas apareceram em sua palma e a ardência continuava.

Pegou uma toalha limpa e enrolou em sua mão, voltando para seu quarto e chamando por Castiel.

— O que aconteceu? Como eu me queimei aqui, sendo que sonhei com isso? — perguntou a ele depois de ter explicado sobre o sonho.

— Você meditou? — perguntou simplesmente, se sentando ao lado da ruiva.

— E isso importa? — ele assentiu. — Sim, meditei ontem com Sam.

— Então você abriu uma fenda entre sua mente e seu corpo. Às vezes, o que acontece em seus sonhos passa para o seu físico, pois não são meros sonhos, são uma parte de sua mente que se liga a uma realidade diferente da que vivemos. Uma realidade que existe apenas em sua mente e ao que ela é ligada. — explicou. — Isso não acontecerá em todas as vezes, apenas em alguns em específico. Haverá um padrão para isso que você vai precisar descobrir.

— Vou ter que tomar cuidado nos meus sonhos, então. — falou enquanto desenrolava a mão da toalha, vendo que ainda não havia melhorado. — Eu já havia visto aquele tecido no sonho que eu tive no ritual de Banshee.

— Não foi apenas um sonho. — Castiel disse enquanto pegava gentilmente sua mão ferida, curando-a. — É exatamente o que eu te expliquei.

— Essa outra realidade faz parte da transição então? É para esses lugares que eu devo ir.

— Sim. Depois que você foi lá pela primeira vez, sua mente está tentando encontrar um caminho mais fácil para chegar até onde precisa. Cada vez que você meditar e chegar lá, mais fácil ficará para você "abrir a porta".

— Eu sempre acabo ficando com a parte mais complicada. — brincou. Percebeu que, mesmo depois de já ter curado sua mão, Castiel não quis soltá-la. Sorriu com isso. — Obrigada por me ajudar.

A ruiva se levantou e abriu a cortina junto com a janela. O quarto estava começando a ficar abafado com a falta de ventilação. Quando voltou seu olhar para trás, percebeu que Castiel estava encarando o piso de madeira a sua frente com a testa franzida.

— O que foi? — perguntou, voltando a sentar ao seu lado.

— Desde que comecei a conviver com os Winchesters depois que Dean voltou do inferno, tive um contato mais frequente com os humanos. Antes eu apenas os via do céu, mas raramente. Não entendia a forma como viviam, porque buscavam com tanto afinco o sucesso financeiro e a encontrar um parceiro para viver por toda a vida. E quando eu desci e fiquei mais tempo por aqui, comecei a entender, bem superficialmente. É difícil entender algo quando somos criados de uma forma que impedisse que sentíssemos.

— Os anjos não possuem nenhum sentimento? — Nyssa perguntou curiosa. — Sei que já comentou sobre algumas vezes, mas nunca explicou.

— Quando Deus nos criou, nos criou para protegermos a humanidade, ao menos esse era o plano inicial. Mas como somos eternos e os humanos não, Deus ficou com receio de que os sentimentos pudessem comprometer nosso trabalho, que pudéssemos sentir compaixão demais ou tristeza demais e acabassemos em uma eterna depressão. Então nossa criação foi voltada para suprimir qualquer sentimento e estamos assim há milênios.

— Entendi... Faz sentido, de uma forma cruel, mas faz. — sussurrou. — Isso mudou depois que começou a viver com os garotos?

— Sim, de forma lenta, mas sim. Viver tão perto dos três me fez entender mais claramente os sentimentos e ansiar por isso, ansiar por ter alegria, compaixão, tristeza, fraternidade, tudo o que eu nunca tive, até agora. E agora é como se as pequenas amarras que sempre tivemos nisto estivesse se afrouxando, permitindo que eu desenvolvesse esse lado.

— Então agora você sente?

— Como uma criança de três anos talvez, mas sim. — brincou, rindo de sua própria brincadeira. — É confuso, às vezes intenso, às vezes eu não faço a mínima ideia do que está acontecendo...

— Por que está me dizendo isso agora? — Nyssa perguntou quando o anjo ficou em silêncio.

— Sentimentos como fraternidade, amizade ou tristeza são bem mais fáceis de entender, porque são simples e estão ligados a um fato ou pessoa em específico. Mas há um que eu ainda não estou entendendo com tanta clareza.

— E qual é?

As palmas das mãos da ruiva começaram a soar em expectativa. Não poderia ter certeza de nada do que o anjo pudesse dizer, já que tudo é sempre tão imprevisível, mas a ponta de esperança que havia dentro de si — por mais que tenha inutilmente entendido que não poderia deixá-la ali — fazia imaginar ele dizendo que o anjo a correspondia minimamente.

O anjo abriu a boca algumas vezes, pensando antes de dizer alguma coisa. Por mais que não fosse de seu feitio pensar antes de dizer, naquele momento ele nem ao menos entendia o que se passava em sua cabeça para dizer algo com clareza. Ele precisava fazer um enorme esforço para que o que ele dissesse fizesse sentido, tanto para ela quanto para ele, e naquele momento estava ainda mais difícil.

— Talvez a paixão, ou amor, ainda não consegui identificar ao certo do que se trata. — disse por fim. — Eu tentei entender sozinho, mas livros de autoajuda dizem que o ideal é compartilhar isso com alguém para ajudar a entender.

— Você está lendo livros de autoajuda? — não pode deixar de rir com o fato, talvez mais por nervosismo.

— Estes livros falam sobre tanta coisa e os humanos os leem, achei que fosse uma boa ideia. Não é?

— Eu não sou a maior fã de livros de autoajuda, mas realmente muitos dizem que funciona. — deu de ombros. — Só precisa tomar cuidado para não ficar ainda mais confuso.

— Ah não, acredito que não. Pelo menos por enquanto isto não me rendeu nenhum problema, então vou continuar, talvez.

— E no que você quer que eu te ajude? — Nyssa perguntou calma, mas por dentro estava surtando.

— Li que uma das coisas que ajudam a entender e tornar o relacionamento mais propenso a dar certo é saber se o sentimento é recíproco.

Assim que o anjo terminou a frase, Nyssa se engasgou com alguma coisa, tossindo enquanto sentia seus olhos lacrimejarem. Por mais que Castiel não tivesse feito uma pergunta, e nem ao menos mencionasse seu nome diretamente, seu coração parou por um breve momento em expectativa.

— Desculpe, pode continuar. — disse com a voz entrecortada, pigarreando para melhorar e ajeitou a postura.

— Se eu for inconveniente, por favor, me avise, mas eu preciso saber se você sente algo semelhante.

Nyssa abriu e fechou a boca algumas vezes, pensando no que dizer. Precisaria reunir uma grande carga de coragem para dizer a verdade, mas também não conseguia mentir para ele. O anjo a olhava com um misto de expectativa e confusão. Por mais que não entendesse plenamente seus próprios sentimentos, sempre foi possibilitado a ela que sentisse, então não conseguia imaginar como seria viver sem estas emoções e depois "simplesmente" começar a sentir.

— Olha... — começou, mexendo nos dedos de suas próprias mãos nervosamente. — Eu não posso dizer que não sinto nada do gênero por você, Castiel, mas para mim também é confuso e eu não entendo completamente. Não é uma grandiosa piada alguém que foi criada para matar Deus se apaixonar por um de seus filhos?

— Deus não consegue controlar tudo e a todos, Nyssa, por mais que haja esse discurso. Não pense que, se isto realmente acontecer, é algo errado. Não é destino, não é Deus ou alguém interferindo, apenas natural.

— Para quem não entende nada sobre o assunto, você sabe algumas coisinhas. — riu.

Castiel se sentou um pouco mais para o lado, se aproximando um pouco mais da ruiva. Levantou sua mão esquerda e acariciou seu rosto, a olhando fixamente nos olhos enquanto fazia movimentos circulares com o polegar.

— Há algo dentro de mim que diz que preciso tentar isto, fazer isto funcionar. — sussurrou. — Mas eu preciso saber se você também está disposta a isto, aprender comigo. Ao menos é algo que não irá nos matar.

Nyssa ponderou, sua mente dando voltas e voltas e custando a acreditar que aquilo realmente estava acontecendo. Não podia negar que não pensava nessa possibilidade, imaginava como seria se todo este mundo sobrenatural não existisse ou interferisse tanto em suas vidas, como tudo poderia ser muito mais simples, mas nunca havia passado pela sua cabeça que Castiel pudesse sentir a mesma coisa que ela e quisesse aquilo.

— Eu tenho medo que você seja um alvo ainda maior daqueles brutamontes. — braguejou.

— Já sou e não é por sua culpa. Sou um alvo desde que me juntei aos Winchesters. Além de que sei me defender muito bem, não precisa ter medo disso. — sussurrou.

— Você tem certeza de que quer isso? — perguntou.

O anjo simplesmente assentiu, não tirando sua mão de seu rosto.

Nyssa respirou fundo, reunindo a coragem necessária, por mais que isso fosse inútil agora, dadas as circunstâncias.

— Por mais que eu tenha esse grande medo, eu também quero tentar e experimentar isto com você, Castiel. — disse por fim.

Castiel sorriu, aproximando-se do rosto da ruiva. Nyssa ficou sem reação, percebendo que o anjo estava se aproximando cada vez mais dela. Por mais que ambos tivessem se declarado nas entrelinhas, ela não imaginava que ele tentaria algo do tipo. O anjo tirou a sua mão de sua bochecha e a passou para sua nuca, puxando-a também em sua direção. Sem pensar muito, Nyssa encurtou ainda mais o caminho e encostou seus lábios. Todo o seu corpo entrou em um tipo de frenesi com o toque, principalmente quando Castiel aprofundou o beijo, segurando em sua cintura com a mão livre e puxando o seu corpo em sua direção, o máximo que a posição deixava.

A sensação de seus lábios nos dela era indescritível. Seu gosto adocicado, seus lábios macios e sua surpreendente postura possessiva em sua cintura causava arrepios em todo o seu corpo, um tipo de arrepio que nunca havia sentido até então. Seu coração se inflava a cada segundo em que o beijo acontecia. Ela sabia que seria complicado, ambos sabiam na verdade, mas naquele momento Nyssa tinha certeza de que estava se apaixonando pelo anjo. 

 


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