Wicked Love. escrita por Beatriz


Capítulo 7
Capítulo 7: Maya.




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A manhã de Maya passou bem lentamente, ela não conseguiu encontrar Reiji para conversar com ele e também não conseguiu ter um sono tranquilo. Virando de um lado para o outro, ela só conseguiu tirar alguns cochilos de hora em hora. No fim, quando acordou para mais um dia de escola, estava mais cansada que quando deitara para dormir.

Ela tomou banho e se arrumou no modo automático. Se olhou no espelho e teve certeza de que odiava aquele uniforme com todo aquele pano e blazer e gravata borboleta. Ela se sentia sufocada com todos aqueles panos. Após embainhar sua espada, ela saiu do quarto, passando por outras vampiras no caminho para a saída do dormitório. Antes que ela chegasse a porta, sentiu olhares em cima de si e, ao olhar discretamente ao redor, percebeu que os olhares eram de Ruka Souen e Rima Toya, amigas de Kaname. Maya gostaria de ter o poder da telepatia para poder mandar as duas se foderem dentro de suas próprias mentes.

Ela saiu do dormitório, ignorando as outras vampiras, e adentrou o prédio da escola. Alguns vampiros estavam reunidos no refeitório, comendo alguma coisa (ou bebendo sangue) antes da aula, e outros estavam espalhados, uns no jardim, outros já em suas respectivas salas. Maya caminhou para o jardim, esperando ter um minuto de sossego, longe de todo mundo. As rosas brancas ali pareciam brilhar a luz da lua e Maya colheu uma, observando a flor mais de perto.    

As conversas dos outros vampiros que estavam por ali estavam em uma altura baixa, como se eles estivessem longe de Maya, e ao redor dela estaria tudo silencioso e calmo se não fosse ela perceber, como um sexto sentido, alguém se aproximando dela. Pelo canto do olho, ela percebeu uma mão se aproximando dela e Maya, sem perder tempo, segurou a mão, torcendo o braço de quem quer que fosse para trás e o encostando bruscamente ao tronco de uma árvore. Ela reconheceu imediatamente o visitante indesejado. Era Ayato. O vampiro virou tanto quanto podia o rosto, olhando por cima de seu ombro para Maya.

— Se você tentar colocar essas mãos nojentas em mim de novo, eu mato você — ela diz.

Ayato sorri, ignorando completamente a ameaça da menina. Isso apenas irrita Maya ainda mais.

— Hmm — ele diz. — Desde que éramos crianças, eu acho aquele ditado a sua cara: cão que ladra não morde.

— Tenta me tocar de novo — Maya disse, aproximando seu corpo do de Ayato. — que eu vou fazer muito mais que morder.

— O Laito tem razão — ele disse. — Você é mesmo uma vadia.

Ela o soltou bruscamente e, ainda com aquele sorriso malicioso nos lábios, Ayato virou de frente para Maya. Ele e Laito eram tão parecidos que poderiam ser confundidos se não fosse o corte de cabelo e as roupas. Os olhos, o cabelo, o olhar sádico nos olhos... Eram iguais. Além da extrema capacidade de irritar Maya e levá-la ao limite

— Eu estava curioso para saber porque você voltou para a nossa vida assim, tão de repente — ele colocou as mãos no bolso da calça e deu uma volta ao redor de Maya, sem tirar os olhos do rosto dela. — Talvez por saudades?

— Vai sonhando — Maya disse, quase rosnando e acompanhando os movimentos dele com o olhar. 

— Talvez por desejo? — ele parou em frente a ela e segurou seu queixo bruscamente, forçando Maya a encará-lo.

Ela soltou o rosto do toque ele batendo no braço do irmão, o que o forçou a soltá-la.

— Até onde eu sei, não fui eu quem fui atrás de você. Você veio atrás de mim, então, talvez, o desejo não seja meu, não é, Ayato?

Ele riu, se aproximando dela e ficando ao seu lado. Abaixando um pouco a cabeça, seus lábios se aproximaram do ouvido de Maya.

— Mal posso esperar para ouvir o meu nome saindo da sua boca em outras condições — ele virou o rosto para ela. Maya podia sentir agora o hálito dele em seu rosto. — Vê se não demora a me procurar, Maya. Eu não gosto de ficar esperando.

E então, assim como havia aparecido, ele foi embora, subitamente. Enfiou as mãos nos bolsos e se afastou como se Maya não passasse de uma ninguém com quem ele, por acaso, havia dado de contra na rua. Trincando o maxilar, ela observou as costas de Ayato se afastarem até ele sumir de vista.

— Idiota — murmurou no silêncio do jardim.

Após o encontro com o meio-irmão, Maya se forçou a caminhar de volta para o prédio da escola e a participar da aula prestando o mínimo de atenção. A primeira aula foi história dos vampiros e a professora, uma mulher de estatura mediana e olhos cor de mel, falou sobre os renegados e sobre o fato de que muitos deles foram transformados na época em que os vampiros e os humanos estavam em guerra e os vampiros precisavam de um exército. Os vampiros puro-sangue não quiseram dar seu sangue aos renegados depois que a guerra acabou e por isso eles acabaram perdendo a humanidade deles. Por serem muito difíceis de “domesticar”, os renegados acabaram sendo deixados a própria sorte. Ou seja, a existência desses vampiros, era culpa da sua própria espécie.

Durante a aula, Maya pensou que os vampiros odiavam tanto os humanos e falavam tão mal deles, expondo todos os defeitos deles, como se os vampiros fossem perfeitos. Mas eles eram tão egoístas, gananciosos e manipuladores quanto os humanos, talvez até mais, pois os humanos ainda tinham regras sociais que limitavam sua verdadeira natureza enquanto os vampiros faziam o que lhes dava na telha a qualquer momento. Eles não tinham moral nenhuma para falar dos humanos.

Depois que acabou as primeiras aulas e teve o intervalo, Maya pegou uma bolsa de sangue e se dirigiu para uma sala de descanso que havia no prédio de aulas. Os vampiros se reuniam ali com os amigos para conversar ou ficavam sozinhos ali quando queriam silencio. Quando entrou, Maya se surpreendeu ao ver quem já estava ali: Kanato e Shu. Shu estava largado no sofá, ouvindo música e de olhos fechados, e Kanato estava com um livro aberto em sua frente, olhando para as páginas e comendo doce. Teddy, seu urso de pelúcia, estava em seu colo e Maya duvidava muito que ele estivesse realmente lendo aquele livro.

Ela sugou pela última vez o canudinho que estava em sua bolsa de sangue, acabando o conteúdo, e jogou a mesma no lixo, se aproximando da mesa em que Kanato estava sem ser convidada. Ela puxou uma cadeira e sentou-se em frente ao menino. Atrás dela, Shu continuava a não dar qualquer sinal de vida. Ele e um cadáver não eram muito diferentes nesse momento. Se estivessem no século XVIII e XIX, poderiam enterrá-lo vivo com a desculpa de que ele de fato parecia morto.

— Oi — Maya disse, tentando chamar a atenção de Kanato. Ela sabia que ele havia escutado, mas não demonstrou qualquer emoção e não a cumprimentou de volta.

Maya revirou os olhos, erguendo as pernas e colocando em cima da mesa. Ela percebeu um movimento nos olhos lilás do irmão quando ele desviou a atenção uma fração de segundos das páginas do livro e observou a perna dela sobre a mesa. Mas foi muito rápido, logo ele colocava mais doce na boca e os olhos se moviam suavemente sobre as páginas.

— Não sabia que você gostava de ler — Maya comentou, ignorando o fato de que o irmão não parecia nem um pouco interessado em falar com ela. — Mas — ela deu de ombros. —, passei tanto tempo longe de vocês que talvez eu não conheça mais nenhum dos seis realmente.

Kanato enfiou mais um doce na boca e mastigou calmamente ainda sem falar qualquer palavra. Maya estalou a língua, achando irritante o silêncio de Kanato. Ela não se lembrava dele ser tão silencioso assim. Ela recostou-se a cadeira, cruzando os braços e fechando os olhos.

— É meio chato ficar falando e não receber uma resposta, sabia? — ela disse.

— Mamãe disse que não posso falar com você — ele disse, finalmente. — Então não vou falar.

Maya abriu um dos olhos e viu que Kanato havia tirado a atenção do livro e agora a encarava com uma expressão bem séria, mas com aquele olhar sofrido que ele geralmente tinha no rosto, como se ele fosse o maior pária do mundo. Abaixo dos olhos dele, ainda havia aquele círculos escuros, como se ele dormisse muito mal ou nem mesmo dormisse. Maya pensou que, se tivesse uma mãe como Cordelia, mexendo com a mente dela de cinco em cinco segundos, ela também teria dificuldade para viver uma vida meramente feliz.

— E a sua mãe manda em alguma coisa por acaso? — Maya perguntou, fechando os olhos novamente, sem se deixar intimidar pelo olhar do irmão. — Se você desse menos importância ao que ela fala, talvez fosse mais feliz.

Em um momento Kanato estava silencioso como a morte e no outro estava irrompendo em um ataque de fúria que era tão característico dele e acabava com toda aquela fachada calma. Ele se levantou bruscamente, fazendo a cadeira na qual estava sentado cair para trás. O barulho fez Maya abrir os olhos novamente e ela observou o irmão segurar Teddy com um braço e passar o outro pela mesa, jogando no chão o livro, os doces e o prato que se quebrou. Sem alterar sua expressão, Maya encarou o irmão.

— Não fale dela! — Kanato vociferou, seus olhos brilhavam de raiva. — Ela é minha mãe e eu proíbo você de falar qualquer coisa que seja dela!

Maya ficou calada por um tempo, observando a raiva transformar o rosto do irmão. As presas dele estavam visíveis e Maya tinha uma vaga sensação de que se ela falasse mais qualquer coisa que fosse de Cordelia, ele iria atacá-la ali mesmo. Não que ela tivesse medo de Kanato, mas estava tão cansada dessas mudanças de personalidade dos irmãos que a última coisa que queria era entrar em conflito com um deles. Por enquanto.

— É fascinante o jeito como ela manipula vocês — Maya disse, mas para si que para Kanato.

É claro que ele perdeu a cabeça com ela, já havia avisado uma vez e não era de falar duas. Ele ergueu uma mão, pronto para se apoiar na mesa e pular para o outro lado ou para bater em Maya. A expressão em seu rosto era de pura loucura e Maya sentiu pena dele e um ódio profundo de Cordelia por deixá-lo nesse estado. O que quer que ele fosse fazer, não conseguiu, pois Shu segurou seu braço no ar com tanta força que Kanato cambaleou para trás, quase dando de contra com o outro vampiro.

— Vocês estão atrapalhando meu sono — ele disse, segurando Kanato, mas olhando diretamente para Maya. Ela ergueu uma sobrancelha.

Kanato o empurrou para trás, se soltando bruscamente do loiro. O menino saiu correndo da sala, de cabeça baixa, Maya o acompanhou com o olhar até ele sair pela porta carregando seu urso. Ela suspirou e jogou a cabeça para trás, encarando o teto. Shu levantou a cadeira que Kanato havia deixado cair e sentou-se à frente de Maya.

Nem ela e nem Shu falaram qualquer coisa durante um tempo, mas ela sentia os olhos do vampiro sobre si, sabia que ele a estava encarando. Quando seu pescoço começou a doer, Maya levantou a cabeça e olhou para o irmão, encarando-o também. Os olhos azuis de Shu estavam relaxados, o que o fazia parecer meio chapado ou com muito sono. Ele sempre parecia estar morrendo de tédio.

— O que é? — Maya perguntou.

— Só estou me perguntando quando você ia falar comigo — ele respondeu, olhando bem séria para ela.

— Qual o problema de vocês achando que eu vou ficar correndo atrás de cada um como uma cachorra? — ela tirou as pernas da mesa, sentando-se ereta. — Vocês são irritantes.

— Vocês? — a voz de Shu estava bem calma como toda a sua linguagem corporal.

— Você, Ayato... Eu não vou correr atrás de ninguém! Onze anos passaram sem que vocês tivessem a consideração de mandar qualquer notícia, então que se fodam. Não é como se eu tivesse sentido saudades — ela cruzou os braços.

— Bem, isso é uma pena — ele disse. — Porque estávamos morrendo de saudades.

Ela percebeu a ironia no tom de voz dele e fechou ainda mais a cara. De todos os seus irmãos, Shu era o único que ela tinha que pensar duas vezes antes de pensar que havia entendido de fato tudo o que ele falava. Ela sempre tinha dúvidas se ele estava falando sério ou se estava brincando com a cara dela.

— Mentiroso — Maya murmurou, desviando o olhar.

Shu ficou de pé, arrastando a cadeira para trás. Andando pela sala, seu casaco balançava em seus ombros. Ele parou em uma estante de livros e ficou observando a lombada deles. Maya o observou por um momento.

— Quando viemos para cá, nós seis éramos muito próximos — ele disse, quebrando o silêncio. — Nos tratávamos como irmãos. Até mesmo Reiji cuidava muito dos trigêmeos e eu cuidava bastante de Subaru.

O olhar de Shu se desviou dos livros para a janela, onde a lua podia ser vista, brilhando pálida no céu. Para Maya, o rosto de Shu parecia perdido em lembranças, como se ele pudesse visualizar tudo o que estava falando no reflexo daquela janela.

— E quando isso mudou? — ela perguntou.

— Cordelia odiava o fato dos filhos dela gostarem dos irmãos e odiava ainda quando eles nos defendiam, principalmente Laito e Ayato que a desafiavam mais — ele tirou a atenção da janela e virou-se para Maya, mas ainda não olhava em sua direção. —       Ela tentou de todas as formas nos jogar um contra o outro, mas nossa ligação era mais forte. Então, ela jogou sujo — ele finalmente olhou para Maya, encarando seus olhos. — Ela se aproximou de Laito, sem intenção de transformá-lo em um futuro rei, apenas o atraindo para perto e oferecendo algo que nunca demonstrou aos filhos: afeto, carinho, amor. Toda essa demonstração de maternidade era muito distorcida, mas, como Laito acreditou que o que ela lhe dava era amor de verdade, ficou cego pela mãe. Nós tentamos alertá-lo, até mesmo Ayato tentou, mas não adiantou. Quando Karlheinz descobriu e prendeu Laito, foi quando tudo desandou. As brigas começaram e só foram ficando piores. Quando Laito voltou, tudo o que ele sentia era ódio e descontava isso em qualquer um. Isso fez todos nós nos afastarmos e sermos o que somos hoje.

Quando ele terminou de falar, Maya desviou o olhar do de Shu, virando o rosto para o lado e encarando o chão. Ela sentiu seu rosto queimar com uma vontade irritante de chorar, mas se forçou a se controlar. Ela odiava Cordelia e tudo o que ela representava para Laito. Odiava o fato dele não conseguir abrir os olhos, de se deixar ser manipulado tão facilmente por uma mulher tão perversa. Pela primeira vez, Maya ficou feliz por seu irmão mais novo não estudar com eles. O menino não merecia passar por nada disso, ver o quanto sua família era disfuncional. Ela fechou os punhos em cima da coxa.

— Odeio essa mulher — disse.

— Todos nós odiamos.

— Mas será que... — ela virou o rosto, olhando nos olhos de Shu. Uma centelha de esperança brilhava em seus olhos. — Talvez, da forma certa, será que...

— Não — Shu a interrompeu, sério.

— Você nem sabe o que eu ia dizer — ela fez bico, desviando o olhar novamente.

— Você quer nos unir novamente. Não vai dar certo, Maya — ele virou novamente de costas para ela, encarando a lua através da janela.

— Ah, Shu — Maya se levantou e foi até o irmão, ficando a centímetros dele. — Não é possível que o amor de irmãos que vocês sentiam uns pelos outros tenha se perdido para sempre. Não consigo acreditar nisso. O que você fez de tão ruim para Reiji o odiar tanto?

Shu virou de frente para ela, tendo que abaixar um pouco a cabeça para olhá-la nos olhos. Seus olhos azuis estavam bem sério, mas, lá no fundo, Maya conseguia ver tristeza. Dizem que os olhos são o espelho da alma. Os de Shu eram os mais solitários que ela já havia visto. Os de Laito não eram solitários, mas eram preenchidos por uma farsa, uma mentira inventada por Cordelia. Os olhos de Laito se alegravam com uma fraude.

— Eu parei de me importar — Shu disse. — Simplesmente não tinha o que fazer naquela época. Então, desisti de tudo, minhas notas caíram, repeti de ano 3 vezes, não ligava para brigas, provocações. Não me importava com nada que acontecia entre nós e por isso Reiji me chama de covarde até hoje.

— Você deveria se desculpar com ele, Shu — ela ergueu uma mão, tocando o peito do vampiro. Por baixo do uniforme de Shu, ela sentiu seu coração batendo tranquilo. — Por abandonar seu irmão quando ele mais precisava de alguém.

— Não consigo — foi a vez de Shu de desviar os olhos e olhar para o chão. — Reiji foi o único que tentou lutar por nós e eu o deixei fazer isso sozinho, mesmo sendo o mais velho.

— Você precisa parar de se culpar — Maya subiu a mão, tocando o rosto do irmão. Ele ergueu os olhos para olhá-la. — Para que Reiji o perdoe, você precisa se perdoar primeiro.

— É difícil, Maya. Kanato se fechou em seu próprio mundo com Teddy, e só fala através do urso ou quando é extremamente necessário; Reiji também se fechou, não troca mais que algumas palavras com a gente e apenas sobre as aulas. Ele tem muita raiva guardada dentro de si e toda aquela fachada de calma, eu sinto que não vai durar muito; Subaru se entregou a raiva, ficou extremamente agressivo e se isolou; Ayato seguiu um rumo parecido com o de Laito, ele vivia com os escravos de sangue e Laito, bem, Laito gosta de provocar, intimidar e causar dor nos outros ele fez isso com cada um de nós antes de partir para suas vítimas, a perversão dele só piora com o tempo — ele cerrou os punhos ao lado do corpo. — Se Cordelia o chuta, ele surta e faz alguma merda para chamar atenção. 

— Talvez, o que essa família precisa de verdade, é de uma terapia — Maya disse, afastando-se um pouco de Shu. Ele riu pela primeira vez.

— Eu não vou ajudar você a mudar as coisas, Maya, mas não vou impedir se você tentar — ele piscou para ela.

Maya sorriu, mas antes que ela pudesse falar algo, uma voz masculina soou pelos autos falantes de toda a escola, pegando os dois de surpresa. Eles se afastaram e prestaram atenção. Era a voz de Rido Kuran.

— Boa noite, alunos — ele disse. — Preciso dar um comunicado de última hora a vocês. Estamos detectando um número preocupante de renegados se aproximando da escola. Para a segurança de vocês, vamos cancelar as últimas aulas e vocês vão poder jantar e ir direto para o dormitório. Se tranquem em seus quartos e fiquem lá enquanto cuidamos da segurança de vocês. E, por favor, não saiam do dormitório até segundas ordens. Não tentem bancar os espertinhos, pois quem desobedecer será severamente punido. Obrigado pela atenção.

Maya e Shu trocaram um olhar. Renegados próximos da escola não seria nada preocupante, pois, até mesmo os alunos mais novos conseguiam lidar com alguns deles, então para estarem dando esses avisos, Maya pensou, só poderia significar que era um número relevante de renegados e que as coisas poderiam acabar se complicando caso eles tentassem invadir a escola. Maya sente um calafrio percorrer seu corpo. Quando um renegado morde um vampiro, é fatal. O vampiro acaba decaindo até o nível de um renegado em pouquíssimo tempo.

— Você ouviu o vice-diretor — Shu disse, o desprezo evidente em sua voz quando disse a última palavra. — Vamos comer alguma coisa e nos trancar nos dormitórios.

—x—

Maya e Shu saíram juntos da sala e seguiram na direção do refeitório. No caminho, perceberam a comoção que o anúncio de Rido havia causado. Muitos alunos andavam apressados para fora do prédio da escola, outros já estavam se armando, mas todos estavam indo em direção aos dormitórios, seguindo as instruções do vice-diretor. Maya pensou que seria a única, junto de Shu, a ir comer alguma coisa antes de se trancarem, mas estava enganada.

Quando os dois entraram lado a lado no refeitório, Maya viu que havia um número considerável de alunos ali e todos se calaram quando perceberam a presença dela e de Shu. Porém, apesar de todas as atenções estarem voltadas para ela, seus olhos se deslocaram direto para a penúltima mesa do refeitório. Seus outros irmãos estavam lá em silêncio e com cara de poucos amigos. Maya voltou a caminhar, seguindo até Laito que sorriu e piscou para ela em um claro sinal de provocação. Atrás dela, Shu foi se servir.

— Você parece preocupada, Maya — Laito disse, ficando de pé. — Está com medo dos renegados?

O refeitório ainda estaria em silêncio se não fossem os cochichos dos outros vampiros, que provavelmente já estavam fofocando sobre eles. Maya sentia vários olhares em suas costas, mas, diferente do que se pode esperar, ela não ficou intimidada.

— Se você se ajoelhar e lamber meus sapatos aí, talvez, eu pense em te proteger caso eles invadam a escola — Laito disse, um sorriso perverso estampava seu rosto.

Maya olhou nos olhos dele e não sentiu raiva, mas repensou em detalhes toda a conversa que teve com Shu. O que ela sentia agora não era vontade de reaproximar os seis, mas sim de humilhar Laito na frente de todo o refeitório. Humilhar de um jeito que nem ele e nem ninguém que estava ali dentro pudesse esquecer. E foi o que ela fez, sem hesitar.

Em um segundo, Laito estava sorrindo para ela, esperando que ela abaixasse a cabeça e saísse andando, e no outro Maya estava com a mão enfiada dentro do peito de Laito, segurando o coração do vampiro entre os dedos. Quando a primeira gota de sangue atingiu o chão, o único som que podia ser ouvido no refeito era o ofego de Laito, tentando não demonstrar que estava sentindo dor, ainda que seu rosto estivesse retorcido por causa disso.

O coração de Laito batia acelerado em sua mão e ela se curvou na direção do menino que já estava curvado para frente, quase encostando o queixo no ombro dela. Ela se aproximou o suficiente para que tanto ele quanto todo o refeitório ouvissem bem o que ela iria dizer.

— Talvez eu devesse arrancar o seu coração e jogar para eles se divertirem lá embaixo enquanto eu mesma me protejo — ela disse. — O que você acha, Laito?

— Sua... — ele disse com dificuldade, os olhos quase completamente fechados por causa da dor. — Vadia.

— Não me faça lembrá-lo que você, mesmo que finja que não, ainda tem um coração e não pense, nem por um segundo, que eu não o arranco do seu peito e o destruo com as minhas próprias mãos — Maya se afastou apenas o suficiente para encarar os olhos verdes de Laito. — Nunca mais tente me humilhar ou eu acabo com você.

Ela puxou a mão, retirando-a do peito dele, lambeu um dedo, deliciando-se com o sangue dele e o provocando, e depois limpou a mão na roupa de Ayato que havia se levantado também e estava em seu caminho. Calmamente, ela desviou dos dois irmãos, pegou uma bolsa de sangue e se sentou à mesa mais distante deles. Já haviam duas meninas à mesa em que ela sentou. Assim que ela se sentou, as duas vampiras se levantaram e foram embora, muito provavelmente com medo dela. Maya não se importou, ficou com feliz de não ter que interagir com elas. Porém, como a sorte não parecia estar ao seu lado, os assentos vazios ao seu lado logo foram ocupados por dois vampiros. Pelo cheiro, Maya não reconheceu nenhum dos dois.

— E aí, gatinha, quanto tempo — um dos meninos disse, bem próximo a ela, ao mesmo tempo em que passava um braço musculoso ao redor dos ombros dela.

Maya virou a cabeça, surpresa com aquela voz, e olhou para o menino ao seu lado que estava com um sorriso de lado nos lábios.

— Evan? — ela se afastou um pouco dele apenas para olhá-lo melhor. — Evan Sarutobi, é você mesmo?! Ah, meu deus! Quando você sumiu, eu achei que você tivesse sido morto! Nossa, nem acredito. É você mesmo?

— Em carne e osso — ele abriu os braços, fazendo a corrente de prata com o pingente de uma cruz balançar em seu peito. — Estou feliz em ver você também, garota. Mas, teoricamente, não estou vivo.

Ela riu e ele a acompanhou. Depois de todo aquele episódio com Laito, era bom rir com alguém que ela sabia que realmente gostava dela.

— Ainda não acredito que você se transformou em vampiro, mas ainda bem aconteceu. Aquele lugar não era para você, imaginava que um dia você acabaria morrendo lá — ela tocou a ponta dos cabelos pretos dele. — Você ficou mais bonito.

— Tsc — alguém estalou a língua atrás deles. — Evan, é falta de educação você conhecer a menina mais linda da escola, que por acaso está solteira, e não apresentar ao seu amigo.

Surpresa, Maya virou parcialmente o corpo na direção da voz. De pé atrás das cadeiras estava outro vampiro, tão lindo quanto Evan, com todo um ar de bad boy que Maya achou extremamente sexy. Ele tinha cabelos ruivos, seu olho esquerdo era azul como o céu e o olho direito era igual ao de um renegado, completamente preto apenas com a íris vermelha. Ele tinha um nariz fino e uma boca delicada da qual pendia um cigarro. Mas o que mais chamou atenção de Maya foi a cicatriz que dava a volta em seu pescoço.

— Maya Sakamaki — ela disse, apresentando-se. 

— A filha do rei — o desconhecido comentou, soltando a fumaça do cigarro bem na frente do rosto de Maya, e fez uma reverência para ela. — Yuri Hacke, prazer.

Ele levantou primeiro a cabeça antes de voltar a ficar ereto e olhou maliciosamente para Maya. Assim que Yuri deu a volta na mesa e sentou-se de frente para Maya e Evan, ele, mais uma vez, voltou a falar.

— Então, como uma menina como você conheceu esse idiota? — ele apontou com a cabeça na direção de Evan.

— Bom — Maya rolou os olhos, sugando seu canudinho. —, digamos que eu não sou uma menina tão boazinha assim — Yuri se recostou à cadeira, erguendo as sobrancelhas. — Evan era viciado em drogas e as vendia. Eu comprava as drogas dele e pagava com mordidas.

— Mas você é uma vampira puro sangue, drogas não fazem efeito em você — ele comentou.

— Nós dávamos um jeito — Evan piscou para o amigo. — Já ouviu falar em sangue batizado?

— Oh — Yuri fez um “o” com os lábios e sorriu. — Gostei de você, Maya. Você parece ser uma boa pessoa, diferente dos babacas dos seus irmãos. Podemos ser amigos.

— Se você é amigo do Evan, é meu também — Maya disse.

Enquanto comiam, eles começaram a colocar a conversa em dia e Yuri se entrosou bem com Maya, contando alguns momentos vergonhosos que Evan havia passado nesse tempo em que eles não se viram. Maya não se lembrava da última vez que havia rido tanto.

— Qual é a dessa cicatriz aí? — Maya apontou com a cabeça para o pescoço de Yuri. — Você é um vampiro, não devia ter curado?

— Ah, isso? — ele tocou a cicatriz com a ponta dos dedos. — Meu pai era um renegado e estuprou minha mãe, que era uma vampira. Ela acabou engravidando. Quando eu nasci, ela viu que eu tinha um olho igual ao de um renegado — ele apontou para o olho direito. — E, como lembrava os olhos do meu pai, ela tentou me matar e me largou em algum lugar para morrer. Mas, para minha sorte, uma senhora que trabalhava aqui me encontrou, me trouxe para cá e cuidou de mim até que eu ficasse bem, mas a cicatriz nunca sumiu. Essa senhora morreu há alguns anos, o que foi bem triste porque ela era minha única família.

Evan ficou com o olhar perdido por alguns minutos, provavelmente relembrando tudo o que havia passado, mas quando voltou a olhar para Maya e percebeu que ela estava um tanto quanto assustada e preocupada com a história e com ele, ele sorriu, dissipando a tensão entre eles.

— Ah, não se preocupe, Maya. Tirando esse olho, nada mais me liga ao meu passado e não há nada que me faça querer me tornar um renegado ou algo assim — ele disse, dando mais uma tragada no cigarro.

— Nossa... — Maya começou a falar, mas foi interrompida.

— Ah, meu deus! Você é Maya Sakamaki, filha do rei e da caçadora mais famosa da Transilvânia! — uma menina de cabelos loiros e olhos dourados, que Maya nem havia reparado na presença, disse, a encarando como se ela fosse alguém muito famoso. — Nem acredito que você está mesmo na minha frente.

— Leone! — outra menina, que deu a volta na mesa de Maya, disse. — Não assuste a menina. Esses dois idiotas já devem ter estragado o jantar dela o suficiente.

Sorrindo, ela tocou no ombro de Maya, mas o sorriso rapidamente sumiu quando ela tirou a mão do ombro da menina bruscamente.

— Mine, você está sem luvas! — Leone falou, assustada, jogando um par de luvas pretas para a amiga.

As duas sentaram ao lado de Yuri, Mina parecendo muito nervosa enquanto colocava as luvas nas mãos. Mas então ela começou a rir, tentando amenizar a situação.

— Me desculpe. Que falta de educação minha — ela sorri para Maya. — Meu nome é Mine Satsuki. É um prazer conhecê-la, Maya.

— Eu sou Leone Shibuya — a outra menina ergue uma mão como se estivesse em uma sala de aula.

A frente de Maya, Yuri leva uma mão ao rosto, balançando a cabeça.

— Maya, essas são nossas insuportáveis amigas — Evan disse, retribuindo a língua que Leone mostrou para ele.

— Por que você usa luvas? — Maya perguntou a Mine, curiosa.

Leone lançou um olhar nervoso para Mine que engoliu em seco.

— Por causa dos meus poderes — ela disse, parecendo triste. — Eu posso ter vislumbres do passado ou do futuro de alguém quando toco a pessoa sem luva. Posso também ter visões independe te tocar ou não em alguém.

— Quanto tempo eu tenho de vida? — Maya se levantou bruscamente da cadeira, se apoiando na mesa e encarando Mine.

Mine pareceu assustada por um momento até Maya sorrir, o que fez a menina sorrir também. Maya sentou-se novamente, terminando de tomar sua bolsa de sangue.

— Brincadeira, não quero saber. Não ia adiantar de nada mesmo — ela deu de ombros.

— Desculpe — Mine disse, parecendo tímida. — Não deveria ter invadido seu espaço assim. Mas não vi seu futuro, apenas um vislumbre do seu passado.

— Ah, tudo bem — Maya disse, balançando a mão na frente do rosto, dizendo para a menina deixar isso para lá.

O clima na mesa ficou mais leve e Maya começou a pensar que talvez começasse a se encaixar e gostar dessa escola. Do outro lado do refeitório, os meninos Sakamaki encaravam a mesa que Maya estava, observando a interação dela com os outros vampiros, principalmente com os meninos. Externamente, eles não demonstraram nada, mas internamente estavam sentindo algo estranho. Algo parecido com ciúmes.

Alheia aos sentimentos dos irmãos, Maya ficou conversando com os quatro até o momento em que um vampiro que trabalhava na segurança da escola mandou que todos fossem para seus dormitórios. Mesmo contrariada, Maya foi, acompanhada de Leone e Mine. Elas se despediram dos meninos, prometendo encontrar com eles quando desse, e seguiram em direção ao dormitório feminino, no qual ficaram conversando até tarde da noite. Maya nem mesmo se preocupou com os renegados que supostamente estavam próximos da escola. Ela estava se divertindo o suficiente com as meninas para esse parecer um medo distante para ela.


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