Wicked Love. escrita por Beatriz


Capítulo 4
Capítulo 4: Kaname.




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/801680/chapter/4

O que Kaname estava pensando quando deu seu sangue a uma caçadora nem ele saberia explicar. Tudo aconteceu muito rápido naquele início de manhã. Não estava em seus planos encontrar com Kaori e muito menos que ela encontrasse o renegado que ele estava seguindo.

Kaname não havia visto a morte do vampiro de sua escola (fora uma menina), mas, quando viu o corpo, não pensou duas vezes antes de seguir o rastro deixado pelo renegado. Eles eram vampiros sem qualquer tipo de humanidade, sem nenhum pensamento meramente racional em sua mente, e por isso costumavam deixar uma bagunça por onde passavam. Não fora difícil para Kaname achar o rastro dele e continuar o seguindo, o vampiro puro-sangue só não contava que o renegado chegaria até a escola dos caçadores e mataria um deles também. Algum desafortunado que estava fazendo patrulha nos limites da escola. E não contava também que Kaori chegaria lá antes dele.

Ele não viu o início do embate, mas ficou observando quando ela se machucou fatalmente e quando separou a cabeça do renegado de seu corpo. Escondido entre as árvores, Kaname observava a caçadora quase como se estivesse hipnotizado. Ele sempre respeitou os caçadores, mas sempre os achou fracos fisicamente, eram humanos afinal. A única vantagem que tinham sobre os vampiros eram suas armas que eram feitas com um material específico "anti-vampiro". Se essas armas atingissem um vampiro, elas impediam a regeneração e, dependendo do machucado, em algum momento levariam um vampiro a morte. Mas, deixando as armas de lado, os caçadores não tinham mais nenhuma habilidade muito interessante: não tinham super força, ou a rapidez que os vampiros tinham, não tinham poder algum. Então, era relativamente fácil matar um caçador.

Porém, vendo Kaori lutar, ele se perguntou se esse pensamento não estaria completamente errado. O jeito como ela saiu daquela árvore, ignorando completamente o ferimento em seu abdômen e continuou a atacar até matar o renegado surpreendeu Kaname de um jeito que ele nem se lembrava mais ser possível.

Quando tudo acabou e ela caiu no chão, Kaname a viu se encolher e observou uma lágrima rolar por seu rosto. Ele não sabia porque os humanos insistiam tanto em se apegar a vida, talvez porque ele era imortal e já não se apegava a mais nada, pois ele sabia que tudo era passageiro. Absolutamente nada durava para sempre.

Foi nesse momento que ele se aproximou de Kaori, saindo de trás das árvores e se revelando para ela. Kaname sabia que ela não aguentaria mais muito tempo, não com um ferimento como aquele, então não se importou se ela conseguisse enxerga-lo. Contudo, antes de chegar até o corpo da caçadora, ele percebeu que mais alguém estava se aproximando. Olhou entre as árvores e viu um caçador. Vampiros podiam enxergar distâncias que um humano nunca conseguiria, o caçador ainda estava um pouco distante, mas chagaria rápido e, se encontrasse Kaname próximo ao corpo sem vida de Kaori, as coisas ficariam muito, muito feias. Um puro-sangue sendo acusado de matar um caçador poderia provocar muitas coisas entre as comunidades, principalmente guerra. Kaname não queria isso.

Então ele tomou a decisão que mudaria sua vida para sempre. Era estupidez, ele sabia disso tanto quanto sabia que o céu é azul, mas que outra opção ele tinha? Kaname se agachou próximo de Kaori, ela ainda estava viva e seus olhos o observaram por um instante. A vida estava deixando o corpo dela mais rápido do que o vampiro previra, ele teria que agir rápido. Mordeu o próprio pulso, enfiando suas presas na pele clara e sentiu o gosto de sangue em sua boca. Kaori não resistiu de nenhuma forma quando ele colocou o pulso na boca dela, apenas deixou que o líquido viscoso e escuro descesse por sua garganta.

O sangue de Kaname agiu rápido no corpo dela, mais rápido do que ele imaginava até. Em poucos segundos, ela estava desmaiada, mas não havia mais ferimento nenhum em seu abdômen e já não corria nenhum risco de vida. Ele a carregou no colo e se colocou propositalmente na direção da Academia dos Caçadores no exato momento em que o outro caçador apareceu.

O garoto de cabelos brancos, assim que viu Kaname, levou a mão até o cabo de sua espada, mas não chegou a tirá-la. Não foi preciso, pois Kaname nunca entraria em uma briga daquelas.

— Ela ainda está viva — ele disse ao caçador. — Só está desmaiada.

Não houve conversa entre os dois, o caçador apenas pegou Kaori dos braços de Kaname e sumiu floresta adentro, de volta para a escola deles. E Kaname ficou sozinho no meio da floresta, sentindo os primeiros raios de sol tocarem sua pele. Antes que ele fosse embora, sentiu o coração de Kaori batendo como se estivesse em seu próprio peito. Kaname suspirou, seguindo seu caminho de volta para a escola dos vampiros. O que Kaori diria se soubesse que agora estava ligada, através do sangue, com um vampiro puro-sangue?

Kaori Ozu era um nome diferente então não foi difícil para Kaname achar toda a informação que pudesse sobre ela. Ele conhecia sua história, de onde ela veio, quem foram seus pais, o que havia acontecido no passado dela. Tudo isso pertencia a ele agora assim como pertencia a ela. Os pais de Kaori haviam sido mortos por Shizuka Hio, uma vampira puro-sangue que há muito não era vista, mas que Kaname sabia muito bem que estava viva. Então não foi atoa que Kaori se tornou caçadora, ele entendia seus possíveis motivos.

Dois dias se passaram desde o momento em que deu seu sangue a ela e Kaname pensou que a vida da caçadora fosse um pouco mais agitada, com muitos sentimentos à flor da pele, mas ele se surpreendeu ao perceber o quão tranquilo pareciam ser os diasdela. Kaori não era dada a rompantes de raiva ou a emoções muito intensas. Talvez ela acabasse sentindo mais sentimentos dele que ele dela, como no dia em que ele tomou o sangue de Ruka. A ligação entre ele e Kaori não foi quebrada, pois Ruka não tomou o sangue dele, mas ele sabia que Kaori sentira a excitação que ele sentiu no momento. Mesmo não sentindo nada por Ruka, o ato da mordida sempre era ligado ao ato sexual, então era impossível não se sentir excitado. Ele conseguiu sentir o incomodo que Kaori sentia enquanto ele bebia o sangue de outra e, por um momento, ele pensou como seria se Kaori estivesse no lugar de Ruka. Enquanto tomava o sangue da vampira, quando fechou os olhos, Kaname pôde ver vislumbres do rosto de Kaori, como as suas bochechas coraram quando ela percebeu que estava excitada como ele.

Naquele momento, Kaname segurou Ruka contra si com força e escutou a vampira dizendo para ele ir mais devagar, mas ele não escutou. Fazia muito tempo que ele não tomava sangue humano e só o pensamento de tomar o descontrolou um pouco. Ele acabou tomando o sangue de Ruka até ela desmaiar em seus braços. Ele a deixou no sofá, deitada confortavelmente, com um bilhete ao seu lado pedindo desculpas pelo o que ele fizera e saiu da sala. Kaname não esperaria Ruka acordar, pois sentiu uma necessidade estranha de ver Kaori.

Entrar na Academia de Caçadores se tornava relativamente fácil se você fosse um vampiro puro-sangue. Kaname não demorou muito a encontrar o dormitório feminino e ficou observando, lá em baixo, a janela do quarto de Kaori. Ele sabia exatamente qual era o quarto dela, pois podia senti-la lá dentro. Seu corpo se movendo na cama, o pijama deslizando por sua pele quando ela se mexia no colchão, a respiração lenta. Kaname sabia que não era sensato manter uma ligação com um humano e tinha a plena consciência de que poderia acabar com isso rapidamente. Mas algo dentro dele não queria acabar com aquela ligação.

Ele observou a janela dela até que ela levantasse para beber água no meio da madrugada. Kaori passou pela janela e Kaname observou como a alça do vestido/pijama dela deslizava de seus ombros e os cabelos castanhos tacavam as costas nuas. Ele apenas saiu dali quando o cabelo dela revelou o pescoço e, subitamente, Kaname sentiu uma vontade quase assustadora de tomar o sangue da caçadora. Ele se forçou a ir embora ou faria algo que se arrependeria.

Quando os dois se encontraram na Academia de Caçadores na noite seguinte, Kaname quase desejava que ela lesse seus pensamentos. Vá atrás de mim, era o que ele queria dizer a ela. Em sua mente, ele estava praticamente implorando para que ela o procurasse. Não porque ele queria que ela soubesse a verdade sobre a ligação entre eles, mas porque ele queria senti-la.

A ligação que eles tinham agora praticamente exigia algum contato físico entre os dois. Kaori talvez não se sentisse como ele, pois não entendia o que estava acontecendo com ela, mas ele sentia como se ela fosse um ímã e o controle que ele tinha que ter para não ser atraído para ela era monstruoso.

Na Academia de Caçadores nada aconteceu, em muitos momentos apenas Cordelia falou e a única coisa que impediu Kaname de mandar a vampira calar a boca foi a sua boa educação. O único momento em que Kaname fora obrigado a concordar com Cordlia foi quando  ela disse que Kaori era muito bonita. Kaname pôde observá-la melhor agora e, de fato, ela era extremamente bonita. Não tinha nada da beleza sobrenatural das vampiras que Kaname estava acostumado. Era uma beleza mundana, discreta. Os cabelos de Kaori estavam presos em um rabo de cavalo exatamente como no dia em que ele deu seu sangue a ela, uma franja penteada para o lado cobria a testa da menina e uma mecha solta de cada lado emoldurava seu rosto; ela tinha os olhos castanhos escuros e a pela dela era menos clara que a dele. Tinha uma cor normal para qualquer humano: rosada, mais bronzeada. Em algum momento Kaname pensou no quão atraente ela ficava com aquela expressão séria no rosto.

Antes de ir embora, ele não pôde falar mais que um “cuide-se” para Kaori, ainda não era o momento e Kaname sabia ser paciente. Dentro de si, ele sentia que, mais cedo ou mais tarde, ela iria procurá-lo. Seria inevitável, considerando o quão curioso um humano poderia ser. Ele a esperaria até lá.

Depois de passados todos esses momentos com Kaori, ele teve que deixá-la um pouco de lado em sua mente para se concentrar em outras coisas, como por exemplo: a escola. Kaname tinha que lidar com muitas coisas ali, uma delas era a sala em que os escravos de sangue ficavam. Aquilo era uma provação para o grupo de Kaname que não se alimentava de sangue humano. Além disso, a chegada de Maya Sakamaki havia deixado todos alvoroçados, Kaname odiava essa sensação que Maya deixava em qualquer um, fosse vampiro ou humano.

Maya Sakamaki era uma dos muitos vampiros que Kaname preferia ignorar a existência, pois não concordava de forma alguma com seus modos de viver. Ela era uma vampira inconsequente e irresponsável. Era o tipo de vampira que pensava “e daí se as suas ações levassem a uma guerra?”. Kaname não suportava vampiros assim, talvez por vim de uma família que pregava a paz entre vampiros e humanos acima de tudo. E, após a briga que os dois tiveram na aula de Reiji Sakamaki, Kaname estava tentando manter todo o controle possível para não colocar a vampira em seu devido lugar.

Alguns dias se passaram desde a discursão na aula e Kaname e Maya faziam o possível para manterem distância dentro do internato, eles nem mesmo olhavam na direção um do outro se fosse possível. Os ânimos de todos pareceram se acalmar após esses dias e depois que todos se acostumaram com a presença de mais uma Sakamaki na escola, porém Kaname sabia que algo estava errado entre os irmãos Sakamaki, podia sentir isso, mas não sabia dizer o que. Era pra evitar esse tipo de atrito familiar que ele mantinha distância de sua própria família.

— Kaname? — Kaname ergueu os olhos, vendo Ichijou Takuma ali na porta de seu escritório com a cabeça loira aparecendo por uma fresta aberta.

— Pode entrar — Kaname disse, voltando a prestar atenção no que estava fazendo antes de Ichijou aparecer.

Assim o loiro fez, entrou no escritório e fechou a porta suavemente atrás de si. Kaname não podia imaginar o porquê de Ichijou estar ali, mas imaginou que não fosse nada sério, pois, se fosse, todo o grupo teria vindo até ele, procurando soluções para o que quer que tivesse acontecido como se Kaname fosse algum tipo de santo milagroso que pudesse resolver tudo.

— Desculpe interrompe-lo — Ichijou disse, quebrando o silêncio e se aproximando um pouco da mesa.

— Aconteceu alguma coisa? — Kaname perguntou, não muito interessado em saber, mas querendo ser educado de qualquer maneira.

— Na verdade, eu queria conversar com você sobre algo — Ichijou sentou no sofá que havia na sala e Kaname sentiu os olhos verdes dele em cima de si. — Você foi à Academia dos Caçadores algumas noites atrás — não era uma pergunta e sim uma constatação. — Sozinho e sem nenhuma razão aparente. Posso saber o motivo?

Kaname parou de escrever a carta que estava escrevendo, o lápis congelando em sua mão como se ele fosse uma estátua. É claro que Ichijou saberia que ele havia ido à Academia dos Caçadores, e Kaname imaginava que não apenas o loiro sabia, mas também todos os outros. O motivo do conhecimento deles era simples: todos os vampiros que andavam com Kaname zelavam por ele como se ele fosse algum tipo de deus. A culpa disso era toda de seu sobrenome, Kuran. Por ser o sobrenome de uma das primeiras famílias de puro-sangue, ele tinha o respeito e a lealdade cega de outros clãs, exceto dos Sakamaki, com os quais sua família não se dava bem desde sempre. Então, seus amigos estavam sempre à espreita do que quer que ele estivesse fazendo, com quem e por que. Aparentemente, Ichijou sabia apenas que ele havia ido à escola, mas não sabia o motivo. Ainda. Kaname precisava tomar mais cuidado.

— Se eu disser que não é da sua conta, você ficaria muito ofendido? — Kaname perguntou, olhando Ichijou nos olhos.

O loiro sorriu, relaxando mais no sofá. Na mente de Kaname, ele pensava em todas as desculpas possíveis que poderia usar - e que Ichijou acreditaria - para explicar o motivo de ter ido até os caçadores.

— Ofendido não, mas ficaria preocupado — o outro respondeu. — Sei que vampiros e caçadores estão seguindo um tratado de paz, mas ainda assim é perigoso ir até eles de maneira tão imprudente. Principalmente por você ser um puro-sangue, Kaname. Eles ficariam mais que felizes se matassem alguém como você.

— Você acha que sou tão fraco ao ponto de morrer para um caçador? — Kaname ficou sério de repente e Ichijou se colocou em modo de defesa.

— É claro que não — ele disse, rapidamente. — Mas brincar com a sorte nunca foi uma coisa sensata a se fazer. Eu fiquei sabendo que eles têm uma caçadora muito habilidosa, então, sendo puro-sangue ou não, nós vampiros temos que ficar mais atentos.

Kaname desviou o olhar de Ichijou e observou as palavras que havia escrito no papel, ficando pensativo. Ele sabia bem de qual caçadora o amigo estava falando.

— Kaori Ozu — Kaname disse, distraidamente.

— Desculpe, o que? — Ichijou franziu as sobrancelhas.

— O nome da caçadora que você está falando — Kaname olhou para ele novamente. — Kaori Ozu.

Ichijou ficou encarando Kaname por um momento e, de alguma forma, o puro-sangue viu o entendimento nos olhos do loiro. Os dois eram amigos desde o nascimento, Kaname sabia que não conseguiria esconder absolutamente nada de Ichijou, nem mesmo se tentasse com todas as suas forças. E o puro-sangue não tinha tanta certeza de que queria manter isso em segredo, considerando seu passado. Ele sabia que, se quisesse levar essa ligação entre eles adiante, uma hora ou outra, ele precisaria de ajuda para lidar com Kaori. Para lidar com o sangue dela e a sede que ele sentiria.

— Por que você foi até a academia dos caçadores, Kaname? — Ichijou olhava muito sério para ele agora, provavelmente já imaginando o que ele responderia.

— No dia em que eu fui atrás daquele renegado — Kaname começou, cedendo à vontade de compartilhar a situação com alguém. Ele sabia que Ichijou era a melhor opção entre todos os seus amigos. —, encontrei com a caçadora que você acabou de falar, Kaori. Ela começou a lutar com o renegado e eu fiquei escondido, observando. Tudo foi muito rápido: ela o matou, mas, em compensação, se machucou de uma forma que a levaria a morte também. Quando eu a vi quase morrendo, eu fiz algo.

Kaname e Ichijou ficaram se encarando quando o primeiro deu uma pausa no relato. Kaname via nos olhos do amigo que ele já sabia o fim da história, mas esperaria até ouvir sair dos lábios de Kaname.

— Eu dei meu sangue a ela — Kaname disse por fim.

Ichijou ficou em silêncio, encarando o puro-sangue como se ele fosse uma coisa de outro mundo, sem acreditar em seus próprios ouvidos.

— Você se ligou a ela — Ichijou não fez uma pergunta, mas constatou um fato. Kaname balançou a cabeça, concordando. — Você enlouqueceu?! — o loiro ficou de pé, a voz aumentando uma oitava e começando a andar de um lado para o outro. Por fim, parou na frente da mesa de Kaname, os olhos um pouco arregalados e uma expressão de descrença no rosto. — Ela é uma humana, Kaname!

— Eu sei — Kaname apertou a ponte do nariz, começando a se arrepender de ter dito algo.

— Você tem ideia do que uma ligação faz com um vampiro? — Ichijou apoiou as mãos na mesa, olhando nos olhos do amigo. — A vontade que você vai ter de estar perto dela, a sede pelo sangue dela que você vai sentir!

— Eu sei! — Kaname aumentou a voz para se igualar ao loiro e ficou de pé também. Eles se encararam, cada um com muitos sentimentos entrando em conflito dentro de si.

— E você por acaso esqueceu o que acontece quando você toma sangue humano? — Ichijou perguntou, fechando os punhos.

— Não, mas… — Kaname foi interrompido.

— É perigoso, Kaname! Você precisa quebrar a ligação. O mais rápido possível.

— Não vou fazer isso — Kaname disse, se afastando da mesa e de Ichijou. O loiro encarou as costas do amigo, incrédulo.

— O que você quer dizer? É perigoso para você ter uma ligação com uma humana!

— A quebra da ligação poderia matá-la! — Kaname virou de frente, quase rosnando as palavras para o loiro. — Se ela morrer e os caçadores descobrirem o motivo, é capaz de acontecer uma guerra. Nunca vão acreditar se eu disser que fiz isso a ela  para salvar a sua vida, dá para entender?!

Ichijou ficou em silêncio por uns segundos, absorvendo as palavras de Kaname. Ele sabia que o puro-sangue estava certo, como sempre. Mas a mão invisível do medo ameaçava esmagar seu coração até não sobrar mais nada. Ele começou a temer pela vida de Kaname.

— Foi por causa dela que você usou o exemplo da carimbagem entre vampiros e humanos na aula do Reiji? — Ichijou perguntou.

Kaname não respondeu, mas o loiro já sabia que a resposta era sim. Agora era mais que óbvio.

— Se os anciãos dos nossos clãs ficarem sabendo disso, vocês dois podem acabar mortos. Eles não vão aceitar isso de jeito nenhum — Ichijou suspirou, derrotado. — Que confusão você foi se meter, Kaname — ele disse mais calmo, passando uma mão pelo rosto.

— Penso nisso todos os dias — Kaname disse, com sinceridade.

— Ela sabe? — Ichijou encara mais uma vez o amigo. — Kaori. Ela sabe sobre a ligação?

— Não — ele disse simplesmente, sem entrar nos detalhes de que ele já tinha dado todas as dicas possíveis a ela de que havia alguma coisa entre eles quando foi até a academia com Cordelia.

— Ótimo. Vamos manter isso em segredo de todos os outros também, não sei qual seria a reação deles ao saber disso, mas tenho uma leve impressão de que não seria nada boa — Kaname balançou a cabeça, concordando. Os dois ficaram em silêncio por um momento, absortos em seus próprios pensamentos e preocupações, até que Ichijou voltou a falar, dando a conversa por encerrada. — Bom, eu tenho que ir. Rido pediu ajuda com umas coisas e, como eu sou representante da nossa turma, tenho que ir ajudar. Nos vemos na aula, não faça mais nada de imprudente até lá.

Eles se despediram e Ichijou deixou a sala. Kaname desabou em sua cadeira, subitamente muito cansado de toda aquela discursão. Ele sabia que Ichijou era confiável o suficiente e não se preocupava se ele sairia ou não falando sobre a ligação por aí; mas o que o preocupava eram as mesmas coisas que preocupavam Ichijou: os anciãos, o que aconteceria quando ele provasse o sangue de Kaori. Mas ele de fato provaria o sangue dela? Talvez ele pudesse levar essa ligação sem de fato ter qualquer tipo de contato com ela, não poderia? É claro que não. Apenas de pensar em suas presas afundando no pescoço dela ele tinha que usar todo seu auto controle para não ir imediatamente até Kaori.

Com um gemido dolorido, ele fechou os olhos, incomodando com tudo o que estava sentindo. Quando abriu os olhos novamente, estavam vermelhos, seu corpo sedento por qualquer tipo de contato que Kaori pudesse proporcionar a ele. Naquele momento, Kaname sabia que teria que fazer algo drástico para que ela viesse imediatamente até ele já que dar dicas não havia funcionado.

Ele tinha certeza que ela havia sentido quando ele tomou o sangue de Ruka: a excitação, o calor pelo corpo. Ele imaginava que isso seria o suficiente para fazê-la procurá-lo. Mas não foi Quase uma semana havia se passado desde o dia em que a viu pela janela do quarto dela e ela ainda não havia aparecido na Academia dos Vampiros, ainda que ele tivesse deixado quase explícito que havia algo estranho entre eles. Pensando melhor agora, como exatamente ele queria que ela aparecesse na Academia dos Vampiros, procurando por ele para falar sobre algo que ela nem sabia que existia? Ele deixou esse pensamento de lado e pensou apenas em fazê-la chegar ali. Quando a ideia passou por sua mente, seu rosto se iluminou e ele ficou de pé, pegando seu casaco e saindo de sua sala.

— Desculpe, Ichijou, mas terei que fazer mais algumas coisas imprudentes para que ela vinha até mim — ele disse baixinho, caminhando pelos corredores do dormitório masculino.

Assim que entrou no dormitório feminino, ele agradeceu mentalmente o fato da maioria das meninas já terem saído para suas respectivas aulas e as que estavam ali não prestarem muita atenção nele, pois não era proibido meninas ou meninos entrarem nos dormitórios do sexo oposto. Ele bateu na porta de Ruka, onde já tinha batido tantas vezes antes, quando precisava de algo. O que ele ia fazer não era nem um pouco honroso, mas ele precisava. Faltaria o primeiro horário com Ruka por uma boa causa. Quando ela abriu a porta, não demorou muito para que ele também estivesse dentro do quarto.

— x —

Transar com Ruka sempre foi relativamente fácil: ela se entregava fácil para ela e não precisava de muito para fazê-la gozar. Tomar seu sangue era ainda mais fácil, ela cedia em tempo recorde, ele estando dentro dela ou não. Kaname sabia que isso era por causa da paixão que ele sentia por ele e, quando saiu do quarto dela, como se nada tivesse acontecido, a consciência dele pesou de usar os sentimentos dela em benefício próprio. Mas não durou muito, a sensação logo passou quando ele se lembrou dos vislumbres que teve de Kaori em sua cama na Academia dos Caçadores, sentindo absolutamente tudo o que ele estava sentindo.

Mais uma vez ele sentiu o incômodo dela por ficar excitada sem motivo, viu o rosto dela corando, a respiração aumentando, o pijama deslizando por sua pele enquanto ela se virava de um lado para o outro, tentando entender que diabos estava acontecendo com ela. Nada disso era novidade para Kaname, mas o excitou como se fosse a primeira vez que ela a via assim. E excitou tanto que as coisas com Ruka não demoraram muito. Ela gozou antes dele, mas ele gozou alguns momentos depois como se estivesse transando com uma pessoa que ele realmente gostasse. Entre uma estocada e outra, ele tomou o sangue de Ruka e vislumbrou Kaori tomando um copo grande de água. Ela sentia sede também, não por sangue, mas pelas presas dele.

A única coisa que surpreendeu Kaname foi o fato de que Kaori não se aliviou em momento algum. Não se masturbou e nem nada do tipo na tentativa de parar a excitação. Ele havia perdido a primeira aula, mas no meio da segunda ficou pensando que isso poderia se dar por dois motivos: 1) ela era virgem ou 2) ela era um pouco presa em relação aos seus desejos sexuais. Isso significava que ele teria que ensinar coisas para ela? Teria que introduzi-la nesse mundo? Ele apoiou a cabeça na mão no exato momento em que a aula chegou ao fim. A rotação de alunos começaria e todos começaram a se levantar ao redor do puro-sangue, mas ele continuou sentando, tentando conter a excitação que crescia dentro de si. Ele estava ficando louco.

— Você está horrível — a voz de Ichijou o tirou de seus pensamentos. Ele estava de pé ao lado de Kaname com uma expressão nada boa. — Em contrapartida, Ruka está radiante. Todos ficaram preocupados com o fato de você e ela não terem aparecido na primeira aula, mas não foi coincidência, não é? Vocês transaram.

— Algum problema nisso agora? — Kaname perguntou, mau humorado, enquanto juntava suas coisas e ficava de pé para mudar de sala também. Ele se precipitou na direção da porta, mas foi parado.

— Kaname — Ichijou segurou o braço do outro vampiro, fazendo-o virar se frente para ele. — Eu não sei qual é o seu objetivo aqui, mas tome cuidado.

Eles se encararam por alguns segundos antes de Kaname puxar o braço da mão de Ichijou e sair pela porta. Durante o percurso até a próxima aula, Kaname tentou não pensar muito no amigo e nas coisas que ele havia lhe falado, pois, se pensasse muito, veria que Ichijou tinha toda a razão e que ele estava indo por um caminho sem volta, que colocava tanto a sua vida quanto a de Kaori em risco. Mas ele era egoísta e queria a caçadora mais do que ousava admitir. E ele a teria, independente das consequências.

As outras aulas passaram normalmente e Kaname mal conseguiu se concentrar em qualquer uma delas. Quando ele saiu da última aula, teve que ir à sala de Rido pegar alguns papéis e, no caminho de volta, passou em frente ao salão onde os escravos de sangue ficavam, esperando que algum vampiro fosse visita-los. Kaname ficou parado na entrada, mesmo com as portas duplas fechadas ele ainda conseguia sentir o cheiro de sangue humano que vinha lá de dentro. Seus olhos começaram a ficar vermelhos e suas presas alongaram. Ele não podia parar, era uma reação automática de seu corpo, mostrando a ele sua verdadeira vontade que não era de pílulas de sangue ou sangue de animal.

Há alguns anos (sete anos para ser mais preciso), Kaname parou de ingerir sangue humano por um único motivo: sua falta de controle. Quando tomava sangue humano ele não conseguia parar até matar a presa e, pior, ele não conseguia parar só em uma pessoa. Ele matéria o maior número possível até se saciar — o que não acontecia rápido. O corredor da sala dos escravos de sangue estava vazio e ele encostou a testa ali, tocando na porta com a sua mão. O que o impedia de abrir essa porta e matar sua sede?

— Às vezes é difícil para mim também.

A voz de Kain Akatsuki sobressaltou Kaname e ele se afastou da porta como se tivesse levado um choque dela. Ele virou de frente parando vampiro, que estava com as mãos dentro do bolso da calça de seu uniforme, os dois eram da mesma altura então não foi difícil se olharem nos olhos.

— Controlar a sede por sangue humano — ele completa.

— Eu não sei porque vocês me acompanham nisso — Kaname disse, estava ofegante como se tivesse corrido uma maratona. Com dificuldade, ele se afastou da sala e caminhou pelo corredor.

— Não íamos deixá-lo sozinho nisso — Akatsuki respondeu ainda que Kaname não tivesse feito nenhuma pergunta.

— Vocês não são descontrolados como eu — o puro-sangue parou no meio do corredor e se encostou à parede, colocando uma mão no rosto. Seus olhos estavam vermelhos como rubi e suas presas tão aparentes quando ele abria a boca que qualquer um que passasse ia conseguir vê-las.

— Não importa — o outro vampiro se aproximou de Kaname, colocando a mão em seu ombro. — Entenda que não seguimos você apenas porque é um Kuran, mas porque é nosso amigo.

Kaname nunca chorava, mas dentro de seu peito ele sentiu uma emoção com as palavras do amigo que ameaçava transbordar pelos olhos.

— Venha, vamos caçar alguma coisa.

Os dois saíram da escola e se embrenharam na mata. Mataram alguns coelhos e tomaram o sangue deles escondidos pelas sombras das árvores. De joelhos no chão, segurando o bicho peludo contra a boca, Kaname se sentia humilhado. Não era assim que um vampiro deveria agir, muito menos um puro-sangue. Quando se satisfizeram, os dois voltaram para a escola e Kaname resolver ir para o dormitório enquanto Akatsuki foi procurar os outros vampiros do grupo.

Em seu quarto, Kaname trocou o uniforme por uma roupa comum e se trancou em sua sala/escritório, esperando que ninguém fosse atrás dele ou que nenhuma coisa que o obrigasse a sair dali acontecesse. O sol começou a aparecer no horizonte e ele se sentia cansado, mas sabia que não conseguiria dormir. Escolheu então continuar escrevendo enquanto o sol nascia. Seria uma boa distração.

Assim que a caneta encostou no papel, Kaname sentiu uma presença e uma adaga encostou em seu pescoço antes mesmo que seu cérebro conseguisse assimilar o que estava acontecendo. Ele sentiu a respiração contra seu cabelo e o coração pulsando atrás dele. Ele sentiu o cheiro e a mão do invasor recostando em sua pele. Ele não precisava se virar ou olhar para a pessoa para saber quem era. Kaname saberia quem era aquela presença mesmo que o privassem de todos os seus sentidos, se ele perdesse todas as suas habilidades de vampiro. Ter consciência dela era como ter consciência de suas própria respiração. Até mesmo após a morte, ele a reconheceria.

— Kaori… — ele começou a falar, como um gatinho ronronando, sentindo um arrepio estranho percorrer seu corpo. Ele só pensava em virar e olhar para ela.

— Se você se mexer, eu arranco a sua cabeça — ela disse, soando mais ameaçadora do que ele esperava.   


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Wicked Love." morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.