Wicked Love. escrita por Beatriz


Capítulo 15
Capítulo 15.




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Não demorou nem 24 horas para que a notícia de que haviam duas caçadoras humanas na Academia dos Vampiros se espalhasse. No mesmo dia em que Kaori e Yori se instalaram no prédio abandonado da academia, algum vampiro fofoqueiro que esteve na reunião espalhou a novidade para todos no horário de aula. As reações foram diversas: alguns ficaram receosos, outros excitados com a possibilidade de provar um caçador só por diversão, e, mais alguns, como Kaname, sentiram incômodo.   

No caso do Puro-Sangue, não era incomodo por elas estarem ali. Não, ele estava bem ansioso com a possibilidade de estar mais próximo de Kaori imediatamente. Ele estava receoso, pois havia prometido que cuidaria dela e da amiga, mas se todos os vampiros se juntassem contra ele para matá-las, será que ele teria alguma chance fraco como estava? O fato de não tomar sangue humano há muito tempo já vinha cobrando seu preço há um bom tempo e, mesmo que estivesse tomando o sangue de Kaori agora, ainda não estava suficientemente forte como aqueles vampiros que se alimentam de sangue humano desde sempre. Cada cochicho que ele ouvia entre os estudantes parecia uma sentença de morte para a caçadora.

As aulas se passaram em uma lentidão horrível. A aula de Reiji foi a pior, pois Kaname não conseguia se concentrar em nada e o vampiro chamou a atenção dele mais vezes do que foi possível contar. No fim da aula, o Sakamaki pediu para que ele ficasse enquanto todos os alunos saíam e disse que aquele comportamento não era típico dele e que era para Kaname ficar mais atento, pois teria um teste semana que vem e ele não toleraria notas baixas. Kaname mal escutou, apenas balançou a cabeça, concordando, para sair logo dali.

No intervalo, Kaname teve que ser forte o suficiente para passar pela sala dos escravos de sangue, onde alguns alunos estavam se alimentando de humanos, e não sair correndo atrás de Kaori de novo. Ele tinha que fazer um esforço para se lembrar de que ela era sua única fonte de sangue e que poderia mata-la.

Momentos depois, o vampiro se encontrou com seus amigos no refeitório. Todos se sentaram juntos sendo uns dos poucos que estavam se alimentando com sangue de animal ou comida humana. Ruka foi a última chegar e sentou-se ao lado de Kaname, lhe lançando um sorriso e corando um pouco. Kaname tentou não ligar para a demonstração de afeto da vampira.

— Sua mãe pediu para lhe entregar — Ruka disse, passando um caixa pela mesa até as mãos de Kaname. Ele olhou para o objeto e percebeu que era um celular novo.

— O que significa isso? — ele perguntou, olhando a vampira nos olhos.

— Sua mãe deixou com Rido e, como ele não encontrou você depois da reunião, deixou comigo para que eu entregasse.

— Ah... — Kaname disse, desviando o olhar para o aparelho. — Obrigado.

Ele desembrulhou o celular e o guardou no bolso do uniforme, sem se importar em ver como era. Kaname não sabia como sua mãe havia descoberto que ele estava sem celular, mas esperava que ela não soubesse o que o levara a jogar o celular no rio mais próximo depois do que fez na cidade. Também não ficou muito tempo dando atenção para Ruka, não queria que ela desconfiasse de algo.

Logo a conversa na mesa se tornou sobre as caçadoras e o fato de que elas ainda não haviam aparecido ainda pela academia. Estavam curiosos para vê-las apesar de já terem visto Kaori. Rima e Akatsuki provavelmente eram os únicos que não estavam tão interessados assim nelas, apenas contribuíam com a conversa para não ficarem em silêncio.

— Você está com um cheiro estranho, Kaname-sama — a voz de Aidou encerrou as conversas e todos os olhares se voltaram para o Puro-Sangue.

Do lado direito de Kaname, ele sentiu os olhos de Ichijou queimarem seu rosto. Ele o estava encarando fixamente, provavelmente percebendo o cheiro agora e começando a entender o que havia acontecido um pouco antes do horário das aulas.

— Parece algo como... — Aidou foi interrompido por Kaname antes que ele falasse algo muito comprometedor.

— É impressão sua, Hanabusa — ele disse, desafiando qualquer um a contrariá-lo. Do outro lado da mesa, os olhos de Kaname encontraram os de Shiki e o olhar do primo o incomodou muito. Ele sabia de algo? — Não estive muito bem esses dias, talvez seja isso.

— É algo sério, Kaname? — Ruka o encarou, bastante preocupada. — Se o senhor permitir, posso...

— É apenas a pressão de ser um Kuran — Kaname a interrompeu, levantando-se da mesa, ignorando o melhor que pôde o olhar de Ichijou. — Se me derem licença, preciso ficar um pouco sozinho.

O mais rápido que pôde, ele se afastou da mesa, caminhando na direção das portas duplas de entrada e saída do refeitório. Atrás do Puro-Sangue, Ichijou levantou-se da mesa, dando a desculpa de que iria ao banheiro foi atrás do melhor amigo tentar descobrir se seus temores haviam se tornado realidade.

 Contudo, antes que os dois pudessem cruzar as portas, elas foram abertas e por elas entraram três pessoas: duas humanas e um vampiro. Kaori, Yori e Rido. Kaori e Kaname quase se trombaram, mas o vampiro rapidamente se afastou, não querendo ser visto muito próximo dela para sua própria segurança. O refeitório inteiro ficou em silêncio quando os alunos notaram a presença dos três, mas Kaname não prestou atenção em nada. Ele apenas encarou Kaori. Ao seu lado, Ichijou se remexeu, desconfortável.

O Puro-Sangue percebeu que ela havia tomado banho e trocado o uniforme. Ela estava com os cabelos castanhos-avermelhados soltos e molhados. Sua franja quase cobria seus olhos cor de âmbar, porém eles estavam visíveis o suficiente para que Kaname percebesse que ela estava fazendo o máximo para não olhá-lo. As marcas no pescoço da caçadora haviam sumido, ele havia dado seu sangue para ela antes de deixar o dormitório da menina.

Ichijou se colocou ao lado do Puro-Sangue e Kaname percebeu que ele já havia sentido o cheiro do sangue em Kaori também. Quase imperceptivelmente, Kaname percebeu o melhor amigo sussurrando: “Ah, Kaname...”, sem acreditar. Kaname não o julgava, também quase não acreditava no que estava acontecendo entre ele e a caçadora, mas se perguntassem a ele se estava arrependido de ter começado tudo isso ele diria não.

— Boa noite — Rido quebrou o silêncio, chamando as atenções para si. — Gostaria de apresentar à vocês as duas caçadoras que ficaram conosco por um tempo — ele ergueu uma mão, indicando as duas. — Kaori Ozu e Sayori Wakaba – as duas não falaram nada, apenas continuaram imóveis, olhando para ninguém em especial. — Espero que não haja nenhum... Incidente — ele deu ênfase nessa palavra. — enquanto elas estiverem aqui.

— Isso vai depender delas! — alguém gritou no fundo do refeitório. A fala foi seguida por algumas risadas. Os punhos de Kaori automaticamente se fecharão ao lado do corpo e ela deu um passo à frente.

— Não estamos aqui para causar confusão ou criar qualquer tipo de problema — ela disse, em alto e bom som.

— Você pode não causar problemas, mas pode causar um orgasmo em mim mais tarde! — algum vampiro gritou e mais risadas irromperam entre os alunos. Os olhos de Kaname brilharam, vermelhos, e Ichijou colocou uma mão em seu ombro.

— Silêncio! — Rido disse, sério. – Mais alguma brincadeira do tipo e as consequências não vão se agradáveis. Para quem acha que isso é uma brincadeira, as caçadoras iram começar uma investigação aqui e irão revistar os quartos de cada um de vocês.

Uma onda de protestos e palavras indignadas tomaram conta do refeitório. Os amigos de Kaname e os Sakamaki levantaram de suas respectivas mesas. Há alguns metros de distância, os olhos de Kaori e os de Maya se encontram e algo silencioso se passou entre elas. As duas iriam conversar no momento em que Kaori colocasse os pés no quarto da vampira.

— O que acontece se eu não aceitar isso? — a voz de Ayato se fez ouvir acima da balburdia.

— Silêncio todos vocês! — Rido disse mais uma vez, calando à todos. — Isso são ordens que vieram acima de nós. O Rei já está sabendo dos assassinatos e não está feliz com nada disso. Dois vampiros já foram mandados para a Academia dos Caçadores e irão fazer o mesmo que as caçadoras farão aqui. Quem se recusar, senhor Sakamaki — ele olhou para Ayato. —, será expulso da Academia, acusado de possível envolvimento no assassinato. Então, sugiro que se comportem e aceitem tudo isso.

— Isso é um absurdo! — alguém gritou.

— Estamos em uma prisão, por acaso?! — outro se fez ouvir.  

De uma hora para outra todos tinham plena consciência de seus direitos e deveres na escola e queriam até mesmo fazer protesto, mas Rido ignorou todos e pediu para que meninos e meninas seguissem em grupos separados para a entrada de seus respectivos dormitórios. Mesmo contrariados, os alunos acabaram cedendo e seguindo em fila para fora do refeitório e da academia. Kaname passou por Kaori como se não a conhecesse e ele percebeu que ela relaxou um pouco quando ele fez isso.

Reiji foi chamado por Rido para ajudar a supervisionar a revista dos quartos e estava próximo do vampiro e das caçadoras. Uma vez na frente dos dormitórios, meninos e meninas estavam em seus respectivos grupos com Kaori, Yori e Rido de frente para eles. Mais uma vez Kaori tomou a frente, chamando a atenção de todos e silenciando os mais teimosos.

— Antes de começarmos, gostaria de pedir para que os vampiros Puro-Sangue que estão aqui deem um passo à frente — ela disse. — Por favor.

Os vampiros trocaram olhares, alguns gritaram que era um absurdo uma humana dar ordens, mas, no fim, eles fizeram o que ela pediu. Os Sakamaki, incluindo Maya, foram os primeiros, ficando lado a lado. Reiji se juntou à eles um segundo depois. Por último, Kaname abriu passagem entre os alunos homens e ficou junto dos outros, ficando ao lado de Maya.

— Apesar do que todos vocês devem pensar, na Academia dos Caçadores não somos ensinados a apenas matar vocês vampiros quando necessário — ela disse. Ayato e Laito reviraram os olhos, achando aquilo uma perda de tempo. – Aprendemos muito sobre vocês e a comunidade de vocês, que, diga-se de passagem, é bem diferente da nossa – agora ela olhava apenas para os Puro-Sangue. — Talvez não saibamos tudo o que há para saber, mas aprendemos muitas coisas. Uma delas é que há uma hierarquia entre vocês, sendo o topo dela os vampiros Puro-Sangue. Aprendemos que há um respeito para com esses vampiros entre todos os outros e, em nome do tratado de paz que há entre todos nós, demonstrarei tal respeito como se fossem um de nós.

Para a surpresa de todos os presentes, Kaori desembainhou sua espada, longa o suficiente para instalar um pouco de medo no coração de alguns alunos. A apreensão tomou conta do local, mas os ânimos se acalmaram quando a caçadora se abaixou, ficando apoiada em um joelho e deixando a espada no chão ao seu lado. Aquilo feria gravemente seu orgulho, mas ela não deixou que aquilo lhe dominasse. Ela queria que, na medida do possível, os vampiros confiassem nela e em Yori, pois realmente não estava ali para causar qualquer mal. Kaori não sabia dizer se a amiga se ajoelharia também e não a obrigaria, mas se sentiu agradecida quando escutou a amiga repetindo o movimento.

— À frente desses Puro-Sangue e de todos os outros, gostaria de deixar claro que não estamos aqui para causar confusão — Kaori continuou. — Estamos aqui à trabalho e apenas por isso. Um dos nossos morreu e não foi um acidente. Assim como um de vocês. Com todo o respeito que lhes apresento agora, gostaria de pedir compreensão e colaboração de vocês. Posso não concordar com muitas coisas entre nossas espécies, mas o tratado de paz não é uma delas. Concordo com ele completamente e pretendo mantê-lo tanto quanto possível durante os dias em que estaremos por aqui. Porém, assim como os respeito, exijo que respeitem à mim e à minha parceira de trabalho ou as coisas podem ficar desagradáveis.

Depois que Kaori terminou de falar o único baralho que era possível ouvir era o balançar das folhas das árvores pelo vento. Sem expressar nenhuma reação, Kaname ficou encarando Kaori ali no chão, de joelhos. Nunca em sua vida ele imaginou ver um caçador se curvando à um vampiro. Por dentro, ele estava muito surpreso, mas por fora achou melhor não demonstrar isso.

Contudo, inconscientemente, ele se aproximou dela, chamando a atenção para si. O vampiro se agachou em frente à caçadora e ele escutou o coração de Kaori errar uma batida e depois acelerar descontroladamente. Ele sabia que a reação não passaria despercebida entre os outros vampiros, então, para poupá-la da desconfiança, estendeu a mão em sua frente. Kaori ergueu a cabeça e o olhou nos olhos. Ela se perguntava se ele estava louco de fazer isso em frente à todos, mas não discutiu, apenas colocou sua mão na dele e se deixou ser erguida. Apesar de querer dar atenção apenas à ela, Kaname ajudou Yori a se levantar também, antes que as coisas ficassem mais estranhas, mas logo depois voltou para frente de Kaori.

— Em nome de todos nós, agradeço à vocês pelo gesto e pelas palavras — ele disse, olhando a menina nos olhos. — De minha parte posso dizer que farei o possível para que tudo seja resolvido o mais rápido possível — ele se virou para os outros Puro-Sangue. — E quanto à vocês?

— Apesar de ninguém ter te nomeado nosso líder — Maya começou. —, concordo. Faço minhas as suas palavras, Kuran.

Os outros Sakamaki murmuram algo em concordância, sendo Reiji o único que falou em alto e bom som que concordava também. Laito bocejou e perguntou se elas poderiam se apressar, pois o sol iria nascer dali algumas horas. Kaori lançou um olhar feio para o ruivo, mas não contrariou o vampiro, e assim foi feito.

 A revista nos quartos foi feita, começando primeiro pelo dormitório feminino. As alunas ficaram aguardando na sala comum do dormitório, conversando e especulando o que poderiam encontrar em seus respectivos quartos. Reiji ficou encarregado de ficar de olho nelas enquanto Rido seguiu Kaori e Yori para dentro dos quartos.

— Foi bem surpreendente o que você fez lá embaixo — Rido disse no momento em que ele e o Kaori ficaram juntos no mesmo quarto.

Kaori escutou as palavras do vampiro com atenção enquanto mexia em uma mesa de estudos. Ela não gostou do vampiro desde o primeiro momento em que colocou os olhos nele, mas tentou não demonstrar.

— Se eu quiser respeito preciso primeiro respeitar — ela disse, simplesmente.

— Você é uma garota interessante — ele continuou. Kaori podia senti-lo andando atrás dela, encarando sua nuca. — São poucos os caçadores que se ajoelhariam perante um Puro-Sangue.

— Como eu disse... — ela tentou falar, mas foi interrompida.

— Quando escutei seu nome pela primeira vez, sabia que não era estranho — o vampiro continuou. — Conheci seus pais. Foi uma pena o que aconteceu com eles, de verdade.

De costas para ele, Kaori trincou o maxilar, segurando uma caneca com café pela metade que estava largada por ali com uma força que poderia quebra-la. Sempre que possível, Kaori tentava não falar sobre seus pais, principalmente com um vampiro, considerando que os dois foram mortos por um. O assunto sempre a pegava desprevenida e era sempre doloroso reviver aquela noite com quem quer que fosse. Kaori sempre respeitou muito seu trabalho como caçadora e sempre teve o tratado de paz entre humanos e vampiros como um manual de instruções a ser seguido, mas isso não significava que ela gostaria de expor sua vida pessoal nesse nível para um deles.

— Sim, foi uma pena — ela disse, se afastando de Rido. — Aqui aparentemente não tem nada, irei para outro quarto.

O mais rápido que pôde, ela saiu e entrou no primeiro quarto disponível. Fechou a porta atrás de si e encostou-se à ela, respirando fundo diversas vezes até conseguir acalmar as batidas de seu coração. Após alguns segundos assim, ela sentiu a porta ser forçada por fora e se afastou apenas o suficiente para a pessoa que estava do outro lado colocar a cabeça para dentro do quarto. Era Maya. As duas meninas se encararam por um segundo e Kaori deu passagem para que Maya entrasse no local também. Sem hesitar, a vampira entrou e fechou a porta atrás de si.

— Nossa, quando meu irmão quer ser uma pedra no meu sapato, ele consegue — ela revirou os olhos, passando uma mão pelos cabelos escuros. — Quase não consigo me livrar dele e vir até aqui.

— Seu irmão? — Kaori perguntou, confusa.

— Aquele de óculos. O professor — Kaori lembrou-se do vampiro que estava ajudando Rido e ficou um pouco surpresa. — Sim, pois é. Todos aqueles que estavam lá embaixo são meus irmãos, com exceção de Kaname, ainda bem — Maya sentou na cama e desabou no colchão, encarando o teto. — Não que aqueles sete não sejam insuportáveis de lidar, mas Kaname é pior ainda — a vampira virou de lado, apoiando-se em uma mão.

— Deve ser um saco mesmo ter família grande — Kaori disse. Sentando-se em uma cadeira, exausta. — Aliás, como você me encontrou aqui?

— Bom — Maya deu de ombros. —, não foi muito difícil. As batidas do seu coração estão loucas desde que Kaname se ajoelhou na sua frente lá embaixo.

A caçadora apoiou os cotovelos em uma perna e escondeu o rosto nas mãos. Não era apenas por causa de Kaname que o coração dela estava descontrolado, mas Maya estava certa, ele era sim um dos motivos e isso tirava Kaori do sério. Quem ele pensava que era afinal de contas para deixa-la nesse estado?

— Enfim, Kaori — Maya sentou-se novamente. — Quero saber se você perdeu a cabeça de vez aceitando fazer tudo isso aqui? Você e Kaname deveriam ficar separados o máximo possível. E, pior, você fede ao sangue dele.

Kaori se levantou da cadeira, dando as costas para Maya, e ficou observando a floresta pela janela do quarto. Baixinho, ela disse:

— Ele tomou meu sangue logo que eu cheguei e me deu o dele para que eu me curasse mais rápido.

A expressão de Maya foi de surpresa pura diante da declaração da caçadora.

— Sinceramente — Maya disse. —, considerando que Kaname é o vampiro mais certinho que eu conheço, pensei que ele seria mais prudente, mas parece que ele já jogou a merda no ventilador e não está mais nem aí para nada.

— O que eu deveria fazer?! — Kaori olhou para Maya, incomodada. — Ele simplesmente vem atrás de mim a hora que bem entende.

— Sei lá, usa essa sua espada nele — Maya deu de ombros.

— Você enlouqueceu? Claro que não! Se souberem que eu ando ferindo um Puro-Sangue, sabe deus o que pode acontecer — Kaori olhou feio para ela.

— Olha, só toma cuidado, principalmente com a Cordelia e com esse otário do Rido. Eles não hesitariam em ferrar a vida de vocês caso descobrissem algo.

Kaori sentou-se novamente e olhou nos olhos da vampira.

— Seu irmão, Luke, pediu para que eu cuidasse de você enquanto estivesse aqui, mas...

— Acho que seu eu quem tenho que cuidar de você — Maya riu.

As duas sorriram uma para a outra. Elas ainda estavam de lados opostos e, caso algo muito ruim acontecesse, lutariam de lados opostos, mas, nesse exato momento, nada impedia que uma amizade se iniciasse.

 — x —

— Me desculpe, Kaname, mas qual é o seu problema? Está tentando morrer?

Ichijou fechou a porta atrás de si com um estrondo. Depois que a revista no dormitório feminino começou, os meninos foram obrigados a ficarem do lado de fora, esperando sua vez de entrar no próprio dormitório, porém Ichijou deu um jeito de levar Kaname até o dormitório deles e os dois se trancaram no escritório. Kaname imediatamente sentou-se em sua cadeira, atrás da mesa. Ele encarou o amigo que parecia prestes a explodir, seu rosto estava muito vermelho. Fazia um tempo desde que Kaname viu Ichijou com tanta raiva.

— Por que está tão surpreso, Ichijou? Você sabia que eu me alimentaria dela — Kaname respondeu, com a maior calma do mundo.

— Dentro da escola?! Com todo mundo podendo descobrir?!

— Eu não me importo — Kaname fechou os olhos.

— Você tem noção das consequências caso alguém além de mim e Maya descubra? Você sabe que isso é...

— Uma sentença de morte — Kaname completou. — Eu sei, Ichijou. Não precisa me lembrar.

— Bom, eu acho que preciso sim, Kaname — Ichijou bateu os punhos na mesa. — Não sei que diabos está acontecendo com você, mas você parece outra pessoa. Não vou deixar você acabar com a sua própria vida assim.

— Me deixa em paz, Ichijou — ele virou a cadeira na direção da janela.

—DEIXAR VOCÊ EM PAZ?! — Ichijou deu a volta na mesa e forçou Kaname a encará-lo. — Você é nosso líder, Kaname! Um herdeiro Kuran! Quem você acha que vai ser o próximo a liderar a nação quando os Sakamaki caírem?

— Esse é o problema, Ichijou, eu não quero liderar nada! — ele empurrou o loiro, levantando-se. — Não quero ser herdeiro de nada e nem de ninguém. Já estou cansado dessa vida.

Antes que Kaname saísse da sala, Ichijou segurou seu braço, o fazendo para no meio do caminho. Os dois ficaram em silêncio por um segundo.

— Se você morrer por causa dela eu nunca vou te perdoar, Kaname — Ichijou disse, a voz mais baixa agora.

Aquelas palavras acertaram Kaname bem fundo em seu coração já tão destruído. Por um momento, uma vida inteira de lembranças passou pela sua mente. O fato de seus pais terem lutado tanto para tê-lo, pois passaram anos tentando ter um filho, sem sucesso. Até ele. O milagre. O bebê mais esperado. A esperança de que o mundo entrasse nos eixos novamente.

Um fardo muito grande foi colocado em seus ombros desde antes de seu nascimento. Apoiadores do clã Kuran faziam questão de depor o rei Sakamaki, achavam que os Sakamaki não eram bons o suficiente para governarem a Transilvânia e queria que um Kuran assumisse o lugar. Por causa de seus ideais pacifistas, as pílulas de sangue, a privação de sangue humano. Eles eram a imagem perfeito do tratado de paz. Seus pais apostavam tudo nele, mas esqueceram-se de algo muito importante. Kaname não pediu para nascer, não pediu por nada do que pediam a ele agora. Ninguém nunca perguntou quais eram os desejos dele, quais eram seus planos, o que ele queria para a vida. Ele não podia mudar o fato de ser um vampiro, apesar de odiar, mas podia mudar todo o resto.

Por isso ele escolheu Kaori. Por isso não se tratava apenas de sangue humano. Havia fantasmas em seu passado que Kaname não podia ignorar, não podia esquecer, mas Kaori seria sua redenção. Ele acreditava nisso tanto quanto um cristão acreditava em sua fé. Apesar de todo o mal que causou e causava à ele, ele achava que era digno o suficiente de tê-la. E Kaname não se importava se morresse por isso.

— Eu nunca pedi pelo seu perdão — Kaname puxou o braço da mão de Ichijou bruscamente, dirigindo-se até a porta.

Antes que o loiro pudesse responder, as vozes das caçadoras e de Rido foram ouvidas no andar de baixo. Os dois saíram da sala sem falar mais nada. Não havia mais nada a ser falado sobre isso, Ichijou sabia que Kaname já havia tomado uma decisão e que seria muito difícil fazê-lo mudar de ideia. A única coisa que podia fazer era ficar ao lado do amigo até o fim.

A revista no dormitório masculino começou assim que os dois desceram as escadas e foi mais constrangedora do que a revista no quarto das meninas. Kaori e Yori encontraram tantas coisas de procedência duvidosa que saiam enjoadas a cada quarto que entravam. Os alunos ficaram com Reiji no andar de baixo enquanto Rido ajudava as duas, assim como foi no dormitório anterior.

Por ironia do destino ou por falta de sorte, Kaori acabou terminando a revista no quarto de Kaname. Era um quarto enorme, mas muito estéril, sem vida. Ela não mexeu em muitas coisas, não por medo de encontrar algo estranho, mas por vergonha. Havia apenas um porta-retrato com uma foto atual de Kaname e aqueles que ela imaginou que fossem seus pais. Ela ficou observando a foto por um tempo. Kaname era extremamente parecido com seu pai, poderiam até mesmo serem irmãos gêmeos. A mãe dele era bem alta, quase do tamanho do pai e de Kaname que pareciam ter a mesma altura, uma cabeça mais baixa apenas. Por um segundo, Kaori se imaginou parte daquela família e se assustou com o rumo de seus pensamentos. Apesar dela sempre ter desejado ter uma família, nunca pensou em ser parte de uma família de vampiros. Era impossível.

— A família Kuran é bem interessante mesmo.

O coração de Kaori quase para em seu peito ao ouvir a voz. Voz essa que ela já havia escutado. Quando ela virou-se para o intruso, reconheceu Senri no exato momento em que seus olhos encontraram os dele. Ela sentiu um arrepio em sua nuca, lembrando-se do momento em que ele mordeu sua mão na floresta. Ele era um garoto muito estranho, para dizer o mínimo.

— O que você está fazendo aqui? — ela perguntou, mantendo distância.

— O mesmo que você — ele se desencostou da parede e caminhou até ela. — Investigando.

— Não tem nada para você investigar aqui — ela disse, franzindo o cenho.

— Está enganada, caçadora — antes que ela pudesse fazer algo, ele segurou o pulso dela, puxando-a para perto. Ela tentou se afastar, mas ele a segurava com força. Com apenas um movimento, ele colocou o cabelo dela para o lado e cheirou seu pescoço, fechando os olhos em seguida. — Você tem o cheiro do sangue dele.

— Do que você está falando? — Kaori sentiu o coração acelerar entre as costelas.

— Não se faça de boba, caçadora — ele a virou de costas para ele, segurando o corpo dela com o seu. — Eu adoraria prova-la. Sabia que o sangue de um vampiro Puro-Sangue é o melhor que existe? Infelizmente você só entenderia o sabor caso fosse vampira, sendo humana o sabor é apenas como o de sangue normal.

— Me solta, Senri — Kaori disse, ameaçadora. — Eu não vou pedir de novo.

— E você vai fazer o que caso eu não solte? — ele sorriu e Kaori sentiu a respiração dele em sua bochecha. — Felizmente, ou infelizmente, sou primo do Kaname. Sou metade Kuran, você não poderia me matar sem provocar o resto da família, está disposta a correr o risco?

Ele a soltou bruscamente, fazendo Kaori se desequilibrar e quase cair no chão. Ela segurou o pulso que Senri havia prendido segundos atrás contra o peito e o encarou com uma expressão de raiva.

— O que você quer afinal, Senri? Está aqui para falar sobre Kaname?

— Na verdade, não — ele se recompôs e olhou nos olhos dela. — Sei que há algo acontecendo entre você e o meu primo. Não sei exatamente o que, apesar de ter minhas suspeitas, mas não me importo. O que eu quero realmente é ajudar com a investigação — ele disse e Kaori franziu o cenho. – Posso ser uma fonte de informações muito boa já que sou vampiro e posso me misturar, coisa que você e sua amiga não podem.

— E o que você ganha com isso? — Kaori perguntou, desconfiada.

— O prazer de sua companhia, caçadora — ele fez uma reverência, sorrindo.

— x —

— Por que você aceitou essa investigação ridícula? — Laito perguntou, sem cerimônia, entrando na sala de Cordelia.

— Agora entramos nos aposentos uns dos outros sem bater? — Cordelia ergueu os olhos dos papéis que estava lendo e sorriu. — Foi essa educação que eu lhe dei?

— Me poupe do discurso — Laito se aproximou da mesa. — Qual é a sua ideia com todas essas caçadoras aqui?

Muito calmamente, Cordelia levantou-se de sua cadeia e deu a volta na mesa. Ao se aproximar do filho, deu um tapa tão forte no rosto do garoto que fez Laito cambalear alguns passos para trás, surpreso. A expressão divertida de Cordelia logo foi substituída por uma de raiva.

— Primeiro você aprende a tratar sua mãe, depois eu penso em contar o que quer que esteja passando pela minha cabeça — ela o olhava com superioridade. — Entendeu?

— Sim, senhora — ele disse, hesitante.

Ela voltou a sorrir novamente como se nada tivesse acontecido, cruzou os braços finos por cima dos seios e continuou encarando o filho que se recuperava do tapa alguns centímetros de distância.

— Aceitei aquelas duas parasitas aqui por um motivo bem simples: manipulação — o sorriso dela se alargou. O batom em seus lábios parecia sangue.

— O que você quer dizer? — Laito perguntou, confuso.

— Você é tão bobo, Laito — ela riu e andou até o filho, dando a volta nele e parando às suas costas. — Essa investigação toda é uma piada, não percebe? É claro que elas não irão encontrar nada. Você acha mesmo que algum desses adolescentes idiotas que estudam aqui teriam coragem de quebrar o tratado de paz?

— Não entendo... — Laito franziu as sobrancelhas, encarando os próprios pés.

— Com essas caçadoras aqui posso induzi-las a pensar o que eu quiser — ela continuou, sem explicar o que queria dizer ao filho. — Vou fazê-las comerem em minha mão e depois me livro delas como se nada tivesse acontecido — ela segurou a gola do uniforme de laito, abaixando um pouco a blusa e expondo o ombro do mesmo. — Isso é manipulação — ela passou a língua vermelha na pele e Laito estremeceu. — E se você for inteligente irá aprender uma coisa ou outra com a mamãe.

Cordelia afundou os dentes no ombro de Laito e o menino fechou os olhos com força, impotente. Ela sugou o sangue dele por um tempo até estar plenamente saciada e, quando terminou, se afastou tão rápido quanto havia se aproximado, sem ao menos olhar no rosto do filho. Laito continuou no mesmo lugar, um fio de sangue escorrendo por seu peito. Os olhos dele brilhavam. Era como um mosquito ingênuo que caía toda vez na teia da aranha.

— Quero que você saiba absolutamente tudo o que elas estão fazendo, pensando e encontrando aqui dentro — a vampira disse. — E me diga tudo.

— Por que eu...?

— Porque eu estou mandando — ela olhou para ele novamente, os olhos brilhando de raiva. — E se você só pensar em me desobedecer, vai se arrepender — ela sentou-se novamente. — Vai embora. Cansei de olhar para você.

Laito não protestou, apenas saiu da sala, com bem menos determinação do que havia entrado. Ele andou devagar pelo corredor, humilhado, ajeitando o uniforme no lugar certo, sem se importar que o sangue manchasse a blusa branca. Ele sentia uma raiva tão grande e sufocante da mãe que poderia tê-la matado bem ali naquela sala, mas, por outro lado, no fundo de seu coração, sabia que nunca o faria, pois algo além do respeito ou do medo o impedia. Ela o usava como uma marionete, movimentava suas cordas como bem entendesse e não se arrependia de cortá-las e machucá-lo quando bem entendesse. Era assim desde que era criança. As coisas nunca mudariam.

Naquela noite, Laito procurou alguma menina qualquer pela escola e descontou a raiva e a humilhação que sentia no sexo que fez com ela. Foi algo tão além do que ele fazia, tão bruto e dolorido, que no fim ele não estava satisfeito e a menina saiu do quarto como se ele fosse um monstro, cheia de hematomas. Ele não se importou com o olhar que ela lhe lançou ou com o fato de que na noite seguinte todas as amigas dela estariam planejando sua morte e falando mal dele pelas costas. Ele abriu uma garrafa de vodca e bebeu tudo, nu, olhando para a noite fora da sua janela. Se o álcool não estivesse no sangue de alguém, não fazia efeito nele. Ele jogou a garrafa do outro lado do quarto, deixando vidro estilhaçado pelo chão. No auge de sua loucura, ele pegou um desses pedaços e fez um corte profundo bem onde a mãe o havia mordido. Queria se livrar de qualquer rastro dela em seu corpo. O sangue jorrou da ferida aberta, manchando seu peito nu em uma quantidade alarmante, mas a ferida se fechou em segundos e tudo o que restou foi o cheiro metálico, olhos verdes vidrados e muito sangue.

Laito se curvou e vomitou até não restar mais nada em seu estômago. Ele se arrastou para cama, os olhos cheios de lágrimas pela força feita para colocar tudo para fora, deitou-se em sua cama em posição fetal e pediu silenciosamente para que morresse antes que não restasse mais nada dele para Cordelia destruir.   


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