Até você chegar escrita por Little Alice


Capítulo 4
Wait for the signal, and I’ll meet you after dark


Notas iniciais do capítulo

Oi, tudo mundo! Como você estão? Aqui estamos nós para mais um capítulo.

Eu quero dedicar esse capítulo à Lady Anna, por recomendar a história. Eu sinto que nem mereço isso, mas fiquei muito feliz quando li, por isso, muito, muito obrigada! Você é maravilhosa demais! ♥



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Wait for the signal, and I’ll meet you after dark

Ele daria um sinal... ainda naquela noite. As palavras de Scorpius dançavam incessantes em sua mente, fazendo-a sorrir quase sem querer. Rose se ajeitou na cama, muito atenta a qualquer indício de movimento lá fora. Ela deixara a lamparina de querosene acesa e a cortina meio aberta, para que o rapaz pudesse entender: aquele era o quarto dela. Rose tinha certeza de que pensara em tudo, em cada mínimo detalhe daquela pequena travessura. 

Quando chegou em casa horas antes, a garota foi a última a passar pelos portões de ferro e, deliberadamente, não os fechou. Enganou sem hesitar os pais e o mordomo quanto àquilo e tampouco permitiu que alguma criada a ajudasse a se trocar. Ainda usava as suas roupas de festa, por mais desconfortáveis que fossem. Depois de tudo o que fez, só esperava que Scorpius conseguisse encontrá-la com tranquilidade. Ela não sabia que tipo de oferta o amigo lhe faria, mas tinha algumas suposições. Algumas delas moralmente questionáveis. 

No entanto, estaria disposta a aceitá-las se isso significasse poder desistir da sua última temporada e voltar para Burrow Hall. Talvez pudesse ser diferente se fosse mais como Lily ou suas outras primas, mais expansiva e mais adequada. Rose, porém, sempre fora introvertida e desajeitada. Gostava de festejar ao lado das pessoas que amava, mas não sabia como se portar ao lado de estranhos. Ao menos, em Burrow Hall, estaria novamente só, em seu laboratório improvisado, e poderia se dedicar a sua primeira linha de perfumes, cosméticos e velas aromáticas. Não podia fazer nada daquilo estando em Londres e ocupada com bailes, espetáculos e passeios. 

Rose estava disposta a aceitar qualquer proposta que Scorpius lhe fizesse, mesmo que isso pudesse eventualmente magoar os pais. Uma parte sua achava que eles mereciam aquilo, quase como uma espécie de lição. Era egoísta pensar assim, tinha ciência disso, e isso talvez fizesse dela uma pessoa horrível, mas tanto amor e tanta preocupação às vezes sufocavam. Rose não podia evitar: ela estava com raiva. Com raiva de discutir e de ser tantas vezes ignorada. Só que, claro, existia também uma parte sua que sabia que se arrependeria daquilo depois. Que sabia que aquilo seria errado de todas as formas.

Poderia calá-la por agora, contudo, por quanto tempo poderia permanecer assim? Por quanto tempo poderia agir como se as coisas não tivessem consequências? 

Com a cabeça apoiada sobre o travesseiro, ela ouviu alguns galhos secos estalarem do lado de fora. No mesmo instante, Rose sentiu o coração disparar. Disparar de um jeito bom. Era uma expectativa que não sentia há muito tempo. Novamente, deixava-se encantar por aquele tipo de fantasia; novamente, sentia-se como uma heroína de livros, apenas aguardando pela próxima aventura. Costumava ser sempre assim quando pequena, lembrava-se muito bem. James, Albus e Scorpius jogavam pedrinhas em sua janela e Rose, no mesmo instante, fugia sorrateira de casa, na pontinha dos pés. 

Quando Hugo e Lily ficaram maiores, os dois passaram a fazer parte daquilo também ― não tiveram muita escolha, ou os mais velhos os aceitavam ou eram dedurados. Eles montavam a cavalos, corriam pelos campos, faziam fogueiras, nadavam no Lago Negro ou roubavam as maçãs do velho Lord Slughorn. Eram coisas que podiam fazer durante o dia, mas havia algo de mágico em fazê-lo às escondidas, na calada da noite. Era um segredo compartilhado. Era quando as crianças se sentiam mais espertas do que os adultos.

Eles eram pequenos então, agora eram adultos. Entretanto, Rose ainda podia sentir a mesma animação de antes, o mesmo formigamento nos dedos. Enquanto se esgueirava pelos jardins da casa dela, Scorpius experimentava aquilo também? Às vezes, ela se permitia pensar na leitura que Lily fizera pela manhã. Sobre como aquele dia representaria um ponto de virada em sua vida. Nada de especial acontecera, exceto Scorpius. Exceto seu amigo de infância ter voltado depois de tantos anos fora. E, em menos de três horas, tudo já parecia diferente. Se não diferente, ao menos um pouco mais bagunçado. 

Havia, porém, o pressentimento do pai e este a inquietava. A previsão da prima não era sobre almas gêmeas ― pensando claramente, poderia ser sobre qualquer coisa ―, mas a intuição de Ron, sim. Rose não achava que Scorpius pudesse ser sua alma gêmea. Como poderia? Eles sempre foram amigos. Amigos especiais, que se amavam, mas ainda assim… somente amigos. Isso poderia sequer mudar, transformar-se em algo mais? Rose já vira acontecer… Contudo, não aconteceria com eles. Com certeza não. Com certeza o seu pai se enganara. Ela balançou a cabeça, sentindo-se estúpida por levar em consideração qualquer tipo de adivinhação. Até mesmo a de Lily. 

Tudo não passava de uma coincidência. 

De acaso.  

E então a primeira batida, a primeira pedrinha a ser atirada em sua janela, pulsou junto com o seu coração já bastante acelerado. Rose se levantou em um salto, jogando os cobertores para um lado, calçou os sapatos, pegou a lamparina e espiou o extenso jardim de sua casa. Ali estava ele, trajado todo de preto, como um cavaleiro misterioso do Leste que vinha buscar a princesa do Oeste. Rose sorriu ao vê-lo abaixar o capuz do seu sobretudo e acenar em sua direção. Vestindo-se com um manto, apenas para se proteger mais do frio da madrugada, a jovem abriu a porta e desceu as escadas pé ante pé. Estava prestes a fazer o que muitos considerariam inapropriado, especialmente para uma “dama”. 

No entanto, também era divertido e, por isso mesmo, Rose queria continuar. Por sorte, não esbarrou em nenhum vaso nem pisou em nenhuma parte solta do assoalho de madeira ― coisas que, sabia bem, fariam um barulho forte o suficiente para acordar seus pais ou o seu irmão. Sequer tropeçou nas escadas ou teve dificuldade em sair da casa em silêncio. Talvez o universo estivesse ao seu favor daquela vez, considerou com um sorriso travesso. 

Quando atravessou a porta dos fundos, em direção a Scorpius, não pôde deixar de rir. Ela corria para ele, gargalhando, como se corresse para a sua liberdade… ainda que uma liberdade bastante ilusória.

 

 

Scorpius sentiu que engasgava com a imagem de Rose. Como se fosse uma feiticeira ou uma criatura mágica, ela cruzava a madrugada, correndo até ele. A garota usava um manto laranja e dourado, segurava uma lamparina entre as mãos e ria sem se conter, igual a alguém que realiza um grande feito. Ele sentiu o peito se apertar um pouco. Já tinha visto muitas coisas durante os seus vinte e seis anos de idade, porém, nada como aquilo. Nada como Rose. Ela o lembrava de sua infância. 

Toda aquela noite, aliás, estava sendo de uma nostalgia imensa. Primeiro, Albus e todos os outros membros da família Weasley. Depois, Rose na fonte de Eros. Agora, as antigas travessuras na madrugada. Apesar disso, havia algo mais sobre aquele momento, algo que não tinha qualquer relação com o passado. Algo como o desconhecido. Talvez como o futuro. Scorpius ainda não saberia como explicar, mas tinha certa ciência de que não se tratava apenas da proposta que estava prestes a fazer. Era quase como um presságio. 

Ela o alcançou segundos depois, o rosto corado pelo esforço e a respiração vacilante. Sorrindo abertamente, Rose parou e se curvou um pouco, tentando parar de rir e, assim, recuperar o fôlego. 

― Sabe há quanto tempo não faço isso? ― perguntou, entre uma risada e outra. ― Desde que tinha dezessete anos. A última vez foi quando você e Albus voltaram para passar as férias de verão, bem entre o sexto e o sétimo ano de Hogwarts, lembra? Eu tinha até me esquecido como era a sensação de escapar durante a noite. 

― Também não invado casas alheias há muito tempo ― sorriu. 

― Sério? Nem mesmo em Edimburgo?

― Eu invadiria a casa de quem?

― Bem, não sei ― Rose deu de ombros. Ela se endireitou, aparentando possuir um controle maior de si própria. ― De alguém que você tenha conhecido por lá. Aliás, como entrou aqui? Me diga que percebeu que os portões estavam abertos, eu os deixei assim. ― Scorpius não respondeu, apenas fez uma careta constrangida. Compreendendo, a garota colocou a mão sobre a boca. ― Não me diga que pulou os portões de ferro?

― Sim. ― Ele estendeu as mãos, mostrando as palmas vermelhas e machucadas. ― Ideia estúpida?

― Muito. Deveria ter checado primeiro se estavam abertos ou não, antes de sair pulando. ― Rose deixou a lamparina no chão e pegou as mãos dele entre as suas, contornando as marcas com as pontas dos dedos. ― Eu diria que sinto muito, mas você não foi exatamente esperto e ainda subestimou a minha inteligência. Não adiantou nada eu ter pensando em tudo. 

― Como você é cruel, Rosie. 

― Eu? Cruel? Você que é estúpido! ― Os dois se encararam por um instante e, então, caíram na risada. Riram sem parar e sem qualquer motivo aparente, como duas criancinhas. ― Céus, eu não posso mais continuar! ― Deu batidas no ombro dele. ― A minha barriga já está doendo! E desse jeito, parecendo duas hienas, vamos acordar todo mundo. 

― Duas hienas! Você por acaso já viu hienas rindo?

― No zoológico, meu caro. ― Buscando ficar séria, ela olhou para as janelas da casa, todos os quartos estavam voltados para eles. ― Anda, vamos sair daqui. Vamos entrar no labirinto. ― Apontou para as sebes atrás deles e pegou a lamparina de volta.   

― Você sabe como sair? ― brincou.

― Depois de muitas tentativas que deram errado, eu acabei aprendendo. O meu senso de direção é péssimo, mas não a minha memória. Papai e mamãe o construíram depois que compraram a casa, quando eu tinha mais um menos uns quatorze anos. Na época, nem eu nem meu irmão gostávamos muito de ficar em Londres… Bom, ainda não gosto. De todo modo, eles queriam fazer algo que nos divertisse e que estimulasse a nossa inteligência. Mas não foi divertido, não para mim. Eu fiquei presa aí um tanto de vezes, até finalmente decorar o caminho. Ei, você está rindo disso?

― Não ― mentiu. 

― Pare! ― Rose parecia encantadora brava daquele jeito, o que o fez  rir ainda mais. ― Ok, eu desisto!

Jogando os braços para o alto, ela avançou com passos firmes até a entrada do labirinto. Sem querer ser deixado para trás, Scorpius se recompôs e a seguiu. 

― Algum minotauro aí dentro? 

― Não um de verdade ― sorriu. ― Mas temos uma réplica no centro. Foi uma das minhas ideias… eu queria que remetesse ao labirinto de Dédalos. Bom, você me conhece… Isso é algo que eu pediria, ainda mais o meu eu de quatorze anos. 

Scorpius assentiu, divertido. Eles andaram em silêncio por um tempo, Rose mantinha a lamparina à frente dos seus corpos e guiava o caminho. Vez ou outra, seus ombros se tocavam. Quando estavam a uma certa distância, ela parou e o encarou com certa insistência. Ele soube, então, que não poderia continuar fugindo do seu propósito principal. Com as sobrancelhas arqueadas, a pergunta estava estampada no rosto dela. 

― Sobre a minha proposta ― iniciou. Ele fez uma pausa prolongada e continuou: ― Você provavelmente vai achar uma loucura. Meio que é uma loucura. Mas nós dois podemos ganhar muito com ela. 

― Eu acho que sei do que se trata ― falou.

Sabe?

― Você quer que finjamos ser almas gêmeas. Não é isso?

― É uma proposta muito horrível? ― Ele coçou a nuca. 

― Horrível ou não, eu aceito. 

O quê? ― espantou-se. ― Fácil assim? Não vou precisar convencê-la? Eu realmente preparei muitos argumentos, Rosie. Posso enumerá-los, se quiser. 

― Não, eu já refleti bastante sobre isso. Já pensei em todos os prós e em todos os contras, Scorpius… Aceitar essa proposta significaria desistir da temporada, poder voltar para Burrow Hall e seguir a minha vida, da maneira como eu quero. Não vou mais precisar perder o meu tempo aqui.  

― Para mim, significaria voltar para Edimburgo e terminar o meu curso.  

― Sem bailes, sem pretendentes correndo atrás do meu dote, sem situações embaraçosas… ― devaneou.

― Podemos dizer aos nossos pais que pretendemos nos casar no próximo ano, quando eu me formar. É uma justificativa plausível, eles não iriam se opor. Nós, então, estaríamos livres de tudo por um ano inteiro. 

― Depois disso, meus pais não poderiam mais me obrigar a nada, já que tudo estaria perdido… qualquer chance de encontrar a minha alma gêmea.  

― E eu saberia que meu avô está mentindo sobre a doença. Eventualmente, eu terei mesmo que me casar, mas isso me daria um tempo a mais… Tempo para me formar, tempo para encontrar alguém que possa gostar, seja durante ou fora das temporadas sociais. Meu Deus, eu tenho apenas vinte e seis anos, não preciso decidir toda minha vida agora. É um crime querer um pouco mais de tempo? 

― Um pouco mais de coragem?

― Eu preciso desse tempo para ter coragem ― concordou. ― Talvez eu já tenha tido muito, mas…

― Não precisa se justificar, Scorpius. Cada um de nós precisa de uma quantidade específica de tempo até estar pronto para algo, é o mundo que nunca entende isso.

― Nós estamos lutando contra o mundo então. E só teríamos que nos ver algumas vezes ao longo desse mês. Não seria um sacrifício, seria?

― Não, não seria nenhum sacrifício ― sorriu. ― Sendo sincera, eu até gostaria disso. No entanto… ― Rose respirou fundo antes de prosseguir: ― No entanto, nem tudo é assim tão simples. Nós vamos mentir para pessoas que amamos e isso é, certamente, muito ruim. Nós vamos magoá-los de um modo ou de outro. Uma hora teremos que lidar com a verdade e, bom, eu não acho que será algo agradável de se fazer. 

Rose voltou a andar pelo labirinto e Scorpius a acompanhou, meditativo. Ele ainda não tinha parado para pensar sobre aquilo. Sobre a ideia de mentir para a sua mãe ou para o seu pai. Uma coisa era enganar Lucius, outra era enganar Draco e Astoria.

― Tudo parece fácil agora, mas não sei por quanto tempo vou conseguir manter essa mentira viva ― admitiu Rose. ― Não sei se consigo ser uma boa mentirosa. Não sei nem se gosto disso.  

Scorpius não tinha uma boa resposta para aquilo, para ser sincero; por isso, apenas permaneceu calado. Em silêncio, os dois chegaram ao centro do labirinto, onde um minotauro inanimado os encarava com as suas feições assustadoras e furiosas. Aquele monstro de concreto era a testemunha dos seus futuros erros. Do declínio que os esperava ao fim de tudo.  

― Pensaremos nessas consequências depois ― resolveu dizer. Rose anuiu, embora já não parecesse tão animada como antes. ― Por enquanto, só temos que elaborar uma história que soe convincente. 

― Suponho que seja um bom plano.

Outra vez, o silêncio se instaurou sobre os dois.  

― Rosie… ― chamou, quando ela contornava a estátua do minotauro. 

― Sim?

― Você não tem medo de desistir da temporada? Digo, é sua última chance de encontrar a sua alma gêmea.

Ela sorriu, fraquinho. 

― Eu não tenho medo disso, Scorpius. As temporadas existem para facilitar esse processo, mas há tantas pessoas... tantas pessoas que não vivem dentro da alta sociedade inglesa, que encontram esse tipo de amor fora delas. Se tudo é uma questão de destino, então não faz diferença desistir ou não da temporada. Se estou predestinada a ter uma alma gêmea, então eventualmente o fio da minha vida, que é tecido por moiras ou por alguma outra força, encontrará com o fio da vida dessa pessoa, porque simplesmente tem de ser assim, não importa em que lugar eu esteja. Meu pai acredita que temos algum poder sobre isso, que nossas escolhas podem interferir… Mas, no fim, não importa muito qual perspectiva é a verdadeira. Porque desistir dessa temporada é o meu destino e é também a minha escolha. 

Scorpius concordou com um maneio de cabeça. Antes de continuarem a caminhada entre as sebes, ele fitou o minotauro uma última vez, com certa preocupação. Era perfeitamente possível que eles estivessem, naquele exato momento, transformando suas vidas em um labirinto complicado e desconhecido, cujo caminho para a saída se mostraria difícil e doloroso. E o pior de tudo, não haveria qualquer fio de Ariadne para ajudá-los e, talvez, os dois sequer possuíssem a força de um Teseu para destruir os monstros à espreita. Ainda assim, decidiram por aquilo.

 



Rose sabia que se arrependeria daquilo, só não sabia que se arrependeria tão cedo… já no dia seguinte. Encostada no limiar da porta e com as mãos suadas de nervosismo, a garota observava sua mãe conversando com a sua tia Ginny. Estava ali há alguns minutos, com um pé no corredor e outro na sala, indecisa quanto ao que fazer. Ninguém aparentava ter notado sua presença, o que era bom, porque dava-lhe um pouquinho mais de tempo. Tanto Hermione quanto Ginny estavam absortas demais definindo os últimos detalhes para a publicação do Semanário das Bruxas, que ocorreria em duas semanas. Vez ou outra, Lily tentava participar do diálogo, mas era ignorada pelas duas mulheres mais velhas, que não pareciam tão interessadas assim em criar uma página de horóscopo na revista. 

― Se minha madrinha estivesse aqui, ela me ouviria ― reclamou a prima, cruzando os braços e deixando-se afundar na poltrona. ― Por que tia Luna não veio hoje? Ah, olá, Rosie! ― Lily transformou sua careta em um sorriso ao vê-la parada do outro lado da sala. Imediatamente, ela apanhou um conjunto de cartas que estavam em seu colo e começou a embaralhá-las. ― Você não quer escolher uma? Ainda estou aprendendo tarot, então não posso garantir uma leitura realmente excepcional. De todo modo, seria interessante se escolhesse, assim eu pratico um pouco mais. 

Com um sorriso sem graça, Rose negou. Definitivamente, não queria nenhuma previsão sobre o seu futuro. Não naquele dia. Não nos próximos meses. A garota torceu as mãos e repassou em sua mente a história que Scorpius e ela combinaram na noite passada. Era algo simples. Não requeria muito. Ainda assim, a ideia de dizê-la em voz alta era um tanto quanto intimidante, porque, uma vez dita, Rose não poderia mais voltar atrás. Deu um tapa na própria testa, como se aquilo pudesse lhe dar alguma coragem, e avançou pela sala até estar próxima o suficiente das três mulheres. Ela tinha uma única obrigação no momento: contar ― ou melhor, mentir ― para sua mãe. Aquela era a melhor oportunidade que possuía, era mesmo o seu melhor plano. Seu pai não estava em casa, e isso facilitava muito as coisas. Primeiro, contaria para a mãe ― que, embora se mostrasse mais cética em relação a tudo, não nutria ressentimentos tão fortes em relação à família de Scorpius ― e, então, as duas poderiam lidar juntas com o restante. 

― Por que está com essa cara? ― indagou Lily, que ainda não havia tirado os olhos de Rose. Na verdade, a menina encarava a prima mais velha com uma expressão engraçada no rosto, como se estivesse tentando desvendar um mistério particularmente difícil.

― Que cara? ― Por Deus, Rose era tão transparente assim? Como ela poderia mentir por meses, se não conseguia nem esconder os seus sentimentos direito?

― Não sei dizer ainda ― refletiu ―, mas é esquisita. 

― É a cara de quem precisa contar algo, mas não sabe como fazê-lo ― explicou Hermione, que, enfim, voltara sua atenção para a filha. ― Você tem algo que queira nos contar, Rosie?

― Sim. ― Engoliu em seco e deu um passo à frente, com a cabeça baixa. Ela de fato não sabia como fazê-lo, mas supôs que ser direta seria menos doloroso. Para si mesma, ao menos. Fechando os olhos, suspirou e soltou: ― Scorpius e eu somos almas gêmeas. 

Fez-se um breve silêncio enquanto todas assimilavam aquela nova informação. Passados alguns segundos, que para a garota pareceram uma eternidade, Hermione colocou uma mão sobre o peito, Ginny sorriu com carinho e Lily se levantou, deixando as cartas caírem sobre o chão, e se pendurou no pescoço de Rose. 

― Eu sabia! Sabia que seria Scorpius!

― Sabia?

― Sim! Quando vi os dois na fonte de Eros ontem à noite, eu senti uma energia diferente. ― Isso certamente ajudava a história parecer real, ter Lily como testemunha daquele momento. A prima a soltou do abraço e caminhou de um lado para o outro, animada. ― As folhas de chá e a intuição do tio Ron estavam certas, no final das contas. Eu nem acredito que acertei. Quero dizer, acredito sim, só que às vezes eu duvido da minha própria capacidade de compreender as coisas corretamente. Mas isso coloca um fim na minha insegurança.

― Fico contente por você, minha querida ― disse Ginny para Rose. 

― Durante todo esse tempo, sempre foi o Scorpius! ― emendou Lily. Ela parou de andar e agarrou a prima pelo braço, fazendo-a se sentar ao seu lado na namoradeira. ― Vocês sempre tiveram uma ligação forte, não acha? Desde… 

― Como você soube? ― interrompeu Hermione. 

― Foi como todos dizem que é. ― Rose encolheu os ombros, tentando fingir naturalidade. Deveria parecer feliz, mas não de um jeito forçado. Deveria aparentar um pouco de timidez também. Em geral, era assim que se comportava e sua personagem não poderia destoar muito de quem ela era. ― Scorpius e eu nos reencontramos ontem à noite e, no momento em que os nossos olhos se encontraram, foi como se o mundo à nossa volta tivesse congelado de repente. Centenas ou talvez milhares de estrelas nos envolveram e, então, simplesmente soubemos. ― Abriu um sorriso sonhador. ― Não havia nada além, nada além daquele brilho dourado e da certeza que sentimos. Como todos dizem, as manifestações sempre ocorrem em um momento significativo e importante, e o que poderia ser mais significativo e importante do que um reencontro? Depois de tantos anos sem nos vermos, esse foi o nosso momento. 

Hermione assentiu. A sua postura, no entanto, mantinha-se cautelosa e seu semblante ainda estampava aquela ruguinha típica de desconfiança. 

― Isso explica porque você demorou tanto para encontrar a sua alma gêmea, Rosie! Você não poderia saber, não enquanto Scorpius não voltasse para a Inglaterra… e ele custou muito a fazê-lo! ― exclamou Lily, seu entusiasmo ainda muito palpável. Rose sorriu-lhe, agradecida. Aquele era um ponto que Scorpius e ela haviam discutido na noite passada. Era uma explicação lógica, coerente, que trazia veracidade à história deles. Ficava internamente grata por Lily ter se adiantado naquele tópico, fazia as coisas parecerem ainda mais críveis. 

― Sim! Faz todo o sentido, não? Eu nunca fui uma alma única, a minha alma gêmea só estava a milhas e milhas de distância de mim… exatamente como aconteceu com James. 

― Por que não nos contou ontem à noite? ― quis saber Hermione. Ela imaginou que a mãe perguntaria, por isso não se surpreendeu nem se inquietou. Já tinha a resposta memorizada. Uma resposta boa o bastante. 

― E-eu me senti… não sei, meio confusa com tudo. Meio fora do eixo, acho. Durante tanto tempo, acreditei que seria como vocês e que encontraria a minha alma gêmea ainda nos meus anos dourados. No entanto, quando essas fantasias não se realizaram, eu tratei de enterrá-las como pude, quase como uma forma de me autoproteger. Eu já havia me habituado à ideia de ser uma única. Só que, agora, todas essas fantasias voltam como realidade e tudo isso ainda é estranho demais para mim. Eu precisava de um tempo para colocar os pensamentos no lugar. 

― E não se sente mais confusa?

― Ainda me sinto, na verdade. Terrivelmente ― suspirou. ― Mas eu precisava contar, ao menos para você

― Não precisa se preocupar com o seu pai. ― Hermione abanou a mão. Como Rose esperava, a mãe soubera ler os seus anseios. Soubera enxergar as estrelinhas do que lhe dissera. ― Eu mesma lido com o Ron. Ele não vai ficar exatamente empolgado com a ideia de ter Scorpius como genro. Apesar disso, ficará feliz por você, Rosie. Eu também estou.

Sua mãe, enfim, sorriu-lhe. A garota tentou retribuir o gesto, porém, este veio com um gosto amargo na boca. Ela desviou o olhar o mais rápido que pôde.  

― Imagine quando o duque de Wiltshire souber que o neto se casará com uma Weasley? ― lembrou-se Lily, com um ar dramático. ― Ah! Não é romântico, Rosie? “Estas alegrias violentas têm fins violentos. Falecendo no triunfo como fogo e pólvora, que num beijo se consomem” ― recitou. ― Você e Scorpius são uma versão menos trágica de Romeu e Julieta!

― Ou talvez uma versão tão trágica quanto ― disse Ginny em tom de brincadeira.

Mãe! 

― Ninguém aqui será como Romeu e Julieta ― cortou Hermione, levantando-se e indo até a filha. Sentando-se ao lado de Rose, ergueu o queixo da garota e ajeitou um dos cachos que lhe escaparam do penteado. ― Você não precisa se preocupar com nada, Rosie. Se vocês são almas gêmeas, tudo dará certo, eu mesma garantirei que seja assim.

Ela assentiu, sentindo-se um pouco trêmula. De fato, eles jamais seriam como Romeu e Julieta. Não porque não vivenciariam um fim trágico, mas porque não eram almas gêmeas e nunca seriam. Eram apenas dois mentirosos que se aproveitaram de uma situação.


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Notas finais do capítulo

A Rose é esperta e entendeu o plano mesmo antes do Scorpius propor rs. Apesar da Rose ter um lado mais malvadinho, ela também se sente um pouco culpada pelo que eles vão fazer. Eu sei que eu me sentiria culpada tendo que mentir para as pessoas que são importantes para mim. Sem saber, Lily serviu muito para a mentira dos dois HAHAHA. E agora eles entram nesse labirinto confuso e vai dar muito ruim. Sim ou claro?

O que vocês estão achando? Me digam nos comentários.

Beijos e até a próxima :*



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