Race in Heels - Corrida em saltos escrita por badgalkel


Capítulo 23
Vingt-deux




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12 de setembro

Circuito de Zandvoort – Holanda

As reuniões pré-treino geralmente eram tranquilas e apaziguadoras, a maior parte delas tediosas também.

As equipes e pilotos tinham espaço para falar sobre pontos referentes às corridas que já ocorreram, tirar dúvidas, esclarecer regulamentos e era encerrada com o repetitivo discurso de Nicolas sobre segurança e como os fiscais avaliavam as punições.

A parte burocrática que desviava a atenção da grande farsa que era a Fórmula 1, na opinião de Liza. Afinal o que determinava os resultados não tinha nada haver com tudo aquilo e regras eram feitas só para se pensar que existiam limites ou transparência.

Ainda assim, raras eram às vezes onde se havia alguma emoção do tipo discussão entre pilotos, estresse com os fiscais da Federação ou, mesmo, estardalhaços por razões quaisquer nessas reuniões.

No entanto, naquela fatídica sexta-feira o anfiteatro do autódromo da Holanda estava em completa agitação. Isso porque Duncan Petrov acertara um soco no rosto de Max Vandemanen pouco antes do início da reunião.

— Seu traidor, filho da puta! – Petrov gritava na direção do holandês enquanto era contido por alguns membros das equipes. – Como pôde?

— Eu sinto muito. – Max dizia de volta, com as mãos rendidas, rosto vermelho e marcado pela direita do, agora, ex—amigo.

— Senhores, por favor, se contenham! – Nicolas pedia no meio na confusão.

As cadeiras haviam sido lançadas a todos os lados devido ao impulso dos apaziguadores em separar os dois pilotos, uma roda – como da época de ensino fundamental – havia sido aberta no meio do anfiteatro onde de um lado estava o traído e do outro o traidor, com os seus espectadores atentos ao redor.

Liza observava a cena de longe desgostosa.

 A que ponto a testosterona chegava pela honra de um ego ferido e traído.

— O que acha que aconteceu? – Orlando pergunta abismado, ao lado da pilota. – Em uma hora estavam conversando perto da mesa de café numa boa e na outra o Petrov começou a socar o Max. – ele ri baixo – Eu nunca vi o Duncan tão possesso.

— O Max merece uma chacoalhada para acordar pra vida. – ela diz dando de ombros – Não vou mentir, acho bem feito.

Muito bem feito.

Os dois ficam lado a lado acompanhando o desenrolar da situação quando Daniel se aproxima dos dois com a face estupenda.

— O Max pegou a mulher do Petrov. – ele solta a fofoca de uma vez.

— O que? – Orlando sopra chocado. – Não acredito! Que cuzão! – xinga em português.

— E parece que eles têm um caso já tem um ano. – Richarts releva e Orlando tapa a boca horrorizado. Seus olhos azuis estavam tão esbugalhados que Liza jurava que saltariam das orbitas a qualquer momento.

— Para de ser fofoqueiro Danny, - Liza diz – o assunto cabe somente aos dois.

Apesar de repugnar a ação tanto quanto, Eliza sabia separar as coisas e não se via no direito de meter o bedelho na vida alheia. Afinal não era da conta dela e de nenhum daqueles dentro do anfiteatro além dos dois envolvidos.

— Não quando eles decidem lavar roupa suja bem na reunião da FIA. – o australiano dá de ombros – Nunca imaginei que o Max pudesse fazer uma coisa dessas. Isso me deixa profundamente decepcionado. É bom saber que já veto da minha lista de amigos.

Liza encara o piloto, sendo pega de surpresa por aquela frase.

Ela não via qualidades na personalidade de Max, isso não era nenhuma novidade, mas ainda assim haviam aqueles que enxergavam algo. Como Orlando uma vez disse, bem lá no fundo.

Tanto ele quanto Danny, Alessandro, Charlie e até mesmo Houston, afirmaram o fato com a mesma convicção. E, se realmente existisse alguma coisa relativamente boa, seria certo condenar alguém por um erro?

— O mesmo vale comigo. – Orlando diz determinado. – Essa é a pior das traições possíveis. Com mulher de amigo não se mexe.

— Isso não é amigo, não. – Daniel comenta balançando a cabeça em desaprovação. – Foi um belo de um chute no saco o que ele fez.

Eliza observa a reação dos amigos e segue os olhos para os demais da sala, os que não estavam impedindo que o Petrov se aproximasse de Manen encaravam o holandês com olhos decepcionados e comentavam coisas entre si. Suas faces eram maldosas e as palavras provavelmente eram ácidas.

Charlie e Pierre eram os únicos que estavam completamente indiferentes com a situação e tinham uma conversa concentrada sobre algo em específico.

O foco de Liza muda completamente.

Ter Charlie tão perto e ao mesmo tempo tão longe, justo naquele dia, deixava-a mais emotiva. Ela tentava distrair sua cabeça com diversos outros assuntos para não se deixar desmoronar, como a briga polêmica que acontecia bem na sua frente, porém era como o condenado à forca mirando a causa da sua destruição minutos antes dela se concretizar. Uma hora ela iria cair.

Contudo, Liza havia prometido á Cris que tentaria melhorar seu humor e passar o dia inteiro dentro de um quarto chorando estava longe disso. Por isso ela tinha aceito voltar a fazer a terapia que ela nunca devia ter parado, desde que voltara as pistas,  e mesmo que a psicóloga nova soubesse somente da ponta do iceberg, ela tinha que colocar as suas dicas em prática. Não ficar remoendo pensamentos que te fazem mal era o principal, e era óbvio o quanto ela era falha naquilo.

Pouco tempo depois, quando os nervos se acalmam, Nicolas comunica no microfone para os presentes: - A reunião será adiada para após o almoço, uma hora antes do treino. Estão, por hora, dispensados. – ele mira diretamente os dois pilotos – Recomponham-se cavalheiros, espero que a situação esteja resolvida até lá.

O primeiro a sair da sala é Petrov, acompanhado de alguns dos integrantes da Alfa Toro em passadas pesadas.

Liza olha na direção de Max, a quem é inevitavelmente encarado por rostos desgostosos e automaticamente recriminado pelo grupo. Ele suspira pesadamente, sopra uma despedida inaudível à própria equipe e se retira da sala.

Sozinho.

Não vou me sentir culpada por isso, Liza pensa ao cruzar os braços.

(...)

Eliza nunca antes havia realmente reparado em Max Vandemanen fora das pistas, por isso não saberia dizer se ele sempre fora tratado com tamanha inferioridade como naquele dia.

Ela queria acreditar que não fora devido o acontecimento revelador de mais cedo, mas estaria só tentando enganar a si mesma.

Por mais que o rapaz fosse insuportável de tão arrogante, prepotente, extremamente implicante, competitivo, hipócrita e tinha causado a maior desgraça na vida da pilota, seu coração mole não evitou sentir compaixão pela situação decadente do holandês, que estava em plena cinco horas da tarde sentado no balcão do luxuoso bar do hotel bebendo whisky puro sozinho.

Ela nunca tinha visto-o daquele jeito.

— Você é uma otária, Eliza Benedetti. – ela sopra pra si mesma enraivecida enquanto se encaminha na direção de Max para sentar-se na baqueta ao seu lado, acomodando a sua bolsa de mão em cima do balcão.

Ele vira a cabeça de leve para conferir quem se aproximara e ri de forma escárnia quando identifica a pilota. Max volta à mirar a sua frente, a parede extensa com as mais variadas bebidas dispostas atrás no balcão, e toma um gole de seu copo antes de questionar: - Veio rir da merda que você causou?

Liza franze a testa virando-se para Max.

— Eu não contei nada a ninguém.

Mesmo que quisesse.

Max umedece os lábios vagarosamente e admira o líquido no copo que dança com o balanço da sua mão direita. Ele dá outro gole seco e a indaga com a garganta rouca: - Por quê?

Ele sabia que ela não havia dado com a língua nos dentes, como ele mesmo havia feito, mas precisava de uma razão mesmo que questionável que o fizesse voltar a sentir antipatia por ela.

— Não cabia a mim. – ela dá de ombros – Duncan era seu amigo e marido dela, pensei que quem deveria contar fosse um dos dois.

Max arqueia as sobrancelhas levemente e assente uma vez.

O barman se aproxima dos dois.

— Bebida? – ele questiona a pilota.

Ela merecia um pouco de tranquilidade, sim. Esquecer os seus problemas, nem que fosse por uma noite ou algumas horas era o seu maior desejo.

E já que ela era amadora nas técnicas terapêuticas que a psicóloga a introduziu, faria como nos velhos tempos. Beberia até esquecer-se do próprio nome.

Liza deixa os ombros caírem, rendida, e diz: - O mesmo que o dele.

O rapaz sai em busca do pedido e em menos de dois minutos pousa o copo com liquido dourado na frente dela: - Faça bom proveito.

— Pensei que usaria isso como seu triunfo nessa guerra que nós decretamos um contra o outro. – Max revela, pedindo para o rapaz atrás do balcão completar o seu copo com um aceno de mão.

Liza toma um gole do próprio copo, sua garganta coça pelo ardor da bebida com alto teor alcoólico.

— Max, por mais raiva que você me faça, e acredite, é muita. – ela intensifica a expressão com os olhos – Eu não teria coragem de interferir no bem estar de uma família só por vingança. Isso é puro egoísmo.

Ele a encara e engole em seco.

Os dois viram os copos juntos.

— Como ele realmente ficou sabendo? – ela pergunta depois de bater o copo vazio no balcão. – O Petrov.

— Ketlyn contou. – ele dá de ombros – Disse que já tínhamos passado dos limites e que tinha percebido o quão errado era o que estávamos fazendo. – Max indica ao barman para encher os copos vazios novamente – Terminou comigo mesmo que ele não fosse querê-la de volta.

Liza não consegue controlar o semblante de indignação.

— Sério Max, uma mulher casada? – ela pergunta – Com tanta mulher no mundo você escolhe justo a mulher do seu amigo?

O holandês ri tristonho.

— Eu nem sei como isso começou. – ele balança a cabeça, tomado por lembranças – Nós nos conhecemos em uma corrida, Duncan me convidou para passar alguns dias na casa dele enquanto divulgávamos a marca, Ketlyn sempre foi muito simpática e... – o holandês suspira pesadamente – acho que eu me encantei pela ideia de ter uma pessoa como ela. – ele dá de ombros. – Meus últimos relacionamentos foram um fracasso.

Liza balança a cabeça em desaprovação.

— Isso foi tão errado. – ela comenta.

— Eu sei, tá legal? – ele diz impaciente. Logo se recompõe. – Desculpe.

— Não pense que eu vou diminuir o quanto isso foi uma puta falta de caráter só porque você tá aí todo pra baixo. – ela diz firme – Mas, sério, por mais que eu ainda duvide da sanidade mental delas, existem muitas mulheres por aí que dariam tudo para estar contigo. Você poderia ter qualquer uma delas.

Max ri, estupendo.

— Esse é o seu jeito de tentar fazer eu me sentir melhor?

— Não. – ela pede outra rodada de whisky – Eu não estou tentando fazer você se sentir melhor, continuo não gostando de você. – ele assente em meio á risos fracos, Liza era tão transparente quanto água e ele achava graça em como ela tentava não deixar nítido que estava sendo gentil com ele. O que ele admirava, ainda mais depois do que ele havia feito à ela.

— Eu sou só uma ferrada sentada no bar com outro ferrado.— ela insiste em deixar claro.

Max ergue o copo e Liza brinda com ele.

— Aos fodidos.

Os dois bebem depois de uma risada fraca.

— Se realmente quer saber, acho que eu só não queria ficar sozinho. – ele admite depois de bater o copo vazio no balcão – O que é irônico porque destruí umas das amizades mais integras que tinha aqui dentro.

— Além de hipócrita você não é muito esperto. – ela o alfineta.

— Eu sei que sou meio desagradável às vezes... – ele declara.

— Às vezes? – Liza o interrompe arqueando uma sobrancelha.

— Tá legal, pega leve. – ele pede e ela ri. – Eu sei que é uma parte que tenho que trabalhar em mim. Gostaria que fosse mais acessível, como você é, mas eu sou meio holandês e meio belga, sou ogro por natureza.

— Como assim eu sou acessível? – ela franze a testa.

Ah, você sabe. – ele solta o ar – Todo mundo conversa com você, é simpático com você; Vocês riem juntos, tem coleguismo e, às vezes, nem é com pessoas da sua própria equipe. – ele relata – Eu vejo que você realmente se diverte enquanto compete...Bom, se divertia. – ele entorta a boca, a culpa tomando a sua face – Você faz amizades e realmente se importa com as pessoas, da mesma forma que elas se importam com você. Parece ser um ambiente agradável de se trabalhar.

— A gentileza leva à isso.

Max suspira.

— E ter um coração bom. – ele sopra, mais para si mesmo que para a pilota. - Todo mundo diz que sou provocador, arrogante e metido, mas é o único jeito de eles perceberem que eu estou aqui. Se não, sou só mais um dos vinte pilotos no grid. Igual aos demais. – o rapaz pronuncia e rapidamente pega o copo, que já estava cheio com o líquido, para virar na boca. Ele sequer causava o ardor mais.

— Sim, porque ser um dos melhores do grid não basta, você têm que ser insuportável. – ela declara sarcástica.

Max gargalha.

— Como é?

— Se disser para alguém que eu disse isso eu falo que é mentira. – ela se adianta em esclarecer séria, mas acaba o acompanhando na risada. – O fato é que: ser impulsivo é a pior forma de você conseguir a simpatia das pessoas. Porque tem uma grande diferença em ser sincero e ser mal educado, ter personalidade e ser um idiota. E as pessoas te veem da pior forma.

O rapaz deixa os ombros caírem meio ao peso da verdade.

— Eu realmente sinto muito, Eliza. – ele diz sentido. – Eu fiquei com inveja e estava tão possesso que todos estavam te idolatrando e falando sobre como você era determinada e honesta que não pensei em quão baixo seria esse golpe.– ele se vira em sua direção – Você não teve culpa de se apaixonar por um dos seus adversários.

Liza encara os olhos de Max, esses caídos pelo peso da culpa e envergonhados ao ponto de se desviarem depois de um tempo.

— Assim como você não teve culpa de se apaixonar pela mulher do seu amigo. – ela sopra, finalmente compreendendo.

Max Vandemanen  era um homem mal compreendido por grande parte da sociedade. Por ser bruto, rude e explosivo as pessoas não consideravam que poderia existir um jovem rapaz com sentimentos atrás de toda essa máscara, que por algum motivo necessita de atenção, pois se sente sozinho. 

Max era um ser humano que como tantos e tinha direito ao erro, e a as vezes a sua postura fazia as pessoas se esquecerem que tinha apenas vinte e três anos. Era apenas um menino metido naquele mundo desde muito jovem.

Liza havia se deixado ser influenciada pelas primeiras impressões que tivera dele e as más línguas, diga-se de passagem de Guida, quem ela descobriu em pouco tempo que falava mal de todo mundo. 

Quanto às desavenças na pista, quem nunca?

Lizzie já teve problemas com Kimi, Weber, Russo, Rodríguez e até mesmo com Orlando. Só que nestas situações ambos souberam diferenciar o trabalho da relação fora das pistas e tudo ficou bem. Os pilotos tinham que saber que são dois setores completamente diferentes e um nunca podia influenciar o outro para uma boa dinâmica. E ela admitia vergonhosamente não ter feito o mesmo com Max.

Liza tinha que parar de ser tão empática e boazinha, lá estava ela já considerando ser amiga do piloto a quem tanto odiou.

No entanto, seus dizeres eram reais e suas ações impensadas, ele não seria a primeira pessoa que cometia erros e nem o único. Mas poucos eram aqueles que verdadeiramente se arrependiam. E Liza conseguia ver nos olhos dele a íntegra verdade, pois ela já não os via como tão sombrios.

— Quer saber? – ela diz levantando de súbito e recolhendo sua bolsa. – Vamos.

— Vamos aonde? – Max questiona perdido.

 - Precisamos tomar um porre decente. – ela diz e deixa umas notas em cima do balcão. – Ficar loucos.

— Mas amanhã tem corrida. – o holandês diz levantando-se a contragosto da banqueta.

— Agora são, - ela olha no relógio de pulso – quinze para as seis da tarde. Até as dez da manha são dezesseis horas. – ela espreme os olhos para fazer os cálculos rápidos mentalmente – Considerando que vamos ficar bêbados em menos de três horas, vamos ter por volta de treze horas de recuperação. Até lá a ressaca já vai ter passado e boa parte do álcool já vai ter saído do corpo.

— Nossa, você é boa em matemática. – ele diz recolhendo seu casaco pendurado no apoio da banqueta e seguindo-a bar afora.

— Não, só em cálculos para bebidas. – ela diz e ri.

Eles mereciam um pouco de tranquilidade, afinal.

 

(...)

 

— Como faz o Fatality com o Sub-Zero? – Carlos pergunta à Orlando com o controle remoto na mão enquanto na tela da televisão seu personagem no jogo de luta estava com vantagem em cima do personagem do amigo.

Eles estavam sentados no chão do quarto de hotel, entre travesseiros, almofadas, guloseimas e bebidas industrializadas para mais uma noite de videogames.

— Não vale pedir ajuda. – o britânico diz.

— Mas você está à mercê, essa é a hora do Fatality. – Carlos diz aprontando para a tela. – O que custa me dizer a sequência para eu terminar bem a luta?

— Meu orgulho. – Orlando ri.

O espanhol vê Charlie retornar do banheiro ao quarto e indaga à ele: - Lacroix, qual a sequência para dar Fatality com o Sub-Zero?

— Frente, baixo, frente e bolinha. – o monegasco responde distraidamente com os olhos focados na tela do celular em suas mãos.

— Não, Charlie! – Orlando reclama. – Não valeu!

Carlos aperta a sequência e logo o seu lutador aplica um golpe super violento e sanguento, finalizando a luta. O espanhol comemora e se joga em cima de Orlando rindo, este ri da intensa felicidade do amigo.

Eles rolam perlo carpete, mas logo se separam aos risos.

— Próximo. – Carlos diz alto e ele e Orlando olham Charlie, que ainda está com o semblante franzido e olhos no celular. – Lacroix?

— Sim? – responde sem erguer os olhos.

— É sua vez. – Orlando diz levantando-se e caminhando tranquilamente até o monegasco. – O que tem de tão interessante aí?

Charlie finalmente sobe os olhos à Orlando e mostra a tela em sua direção: - Lizzie me ligou.

— O que? – o britânico indaga e puxa o celular para as próprias mãos. – Já tem uns trinta minutos, como você não viu isso?

— O celular estava no vibra e estávamos jogando, só vi agora. – ele explica – Será que é alguma coisa importante? – indaga preocupado.

— Não sei. – Orlando dá de ombros enquanto Carlos se aproxima. – Liga de volta e pergunta o que é.

Charlie ergue uma sobrancelha, considerando.

— Se fosse importante ela teria insistido. – ele deduz.

Quando Charlie viu a ligação seu coração acelerara na mesma hora. Depois de dias sem contato ela estar ligando justamente naquele dia seria significativo. No entanto seu receio de ter sido somente um engano era demais para o seu ego ferido.

— O que é agora? – Carlos questiona – Você fica chorando pelos cantos que ela não manda mais mensagens, que mal conversam cara-a-cara, que ela te esqueceu e quando ela te liga você fica com frescura?!

Vai se foder. – Charlie grunhe e toma o celular da mão de Orlando. – Você sabe onde ela está?

— A última vez que a vi foi na reunião estratégica, depois disso ela foi fazer uma massagem e disse que passaria a noite no quarto assistindo uma série que não me recordo o nome. – o britânico diz dando de ombros – Lizzie não é mais a mesma, antes a gente sempre inventava alguma coisa para fazer no tempo livre, se divertia e agora ela prefere se esquivar de tudo.

Charlie suspira pesadamente.

— Você acha que ela pode ter... – ele umedece os lábios vagarosamente para tomar tempo antes de questionar, levemente envergonhado: - que ela já seguiu em frente?

— Não – Carlos diz veemente – Acho que se isso tivesse acontecido ela estaria mais leve e feliz. O que não é o que temos visto.

Charlie assente lentamente.

— Alguma coisa aconteceu. – Orlando declara exaltado. – Não é possível.

— Eu te disse, nada aconteceu. – Charlie relata cansado, sentando-se na cama.

— Na noite antes da entrevista com o Will Smith, em Mônaco. Vocês brigaram? – Orlando pergunta.

— Não. – o monegasco nega veemente. – Nós fomos à casa da minha mãe, elas conversaram normalmente. Foi uma tarde divertida. Voltamos para o apartamento e ficamos jogando videogame até tarde, você viram: ela estava normal. Quando fomos dormir ainda estava tudo bem.

Orlando bufa alto.

— Na manhã da entrevista ela estava estranha. – ele se recorda. – Disse que estava tudo bem, mas era óbvio que estava super preocupada com alguma coisa. – respira fundo – Por pouco ela não chorou na minha frente, foi a primeira vez que a vi emocionada. Sabe o quanto ela é osso duro, né?!

 - Ela não te disse nada? – Carlos questiona.

— Não. – Orlando nega. – Assim que saímos da reunião eu ia chama-la para almoçar com a gente, mas ela já tinha ido embora. Cris disse que ela estava com dor de cabeça e que iria voltar ao apartamento para tirar um cochilo. Depois disso não voltou mais.

— O que? – Charlie indaga com a testa franzida. – Ela foi ao apartamento antes do almoço?

— Sim. – Orlando dá de ombros. – Por quê?

— Ela havia me mandado uma mensagem dizendo que iria passar o almoço refazendo umas fotos do marketing, que a Cris tinha insistido.

Orlando arqueia as sobrancelhas, surpreso.

— Ela não refez foto alguma, cara.

Charlie olha para o celular em mãos, a visão focada na chamada perdida com o nome de Lizzie na lista. Ele pouco reflete antes de se recordar: - Ela recebeu uma ligação àquela noite.

— De quem? – Carlos pergunta.

— Não sei. – o monegasco informa – Era de um número desconhecido.

— Ela foi lá para fora para atender, não foi? – Orlando questiona puxando em sua memória – Foi quando você pegou o controle e virou o jogo.

— Exatamente! – Charlie solta alvoraçado. – Depois da ligação...pode ser que ela tenha ficado mais quieta. Não é?! Eu não me recordo direito.

— Sim ela ficou, não jogou outras partidas. – Orlando atenua. – Nem de Mortal Kombat, que ela gosta.

— O que quer que seja que essa pessoa tenha falado para ela, fodeu com o psicológico na menina. – Carlos declara.

O trio suspira ao encontrar algum indicio para uma razão na incógnita que assolava não só Charlie, como todos os amigos do ex-casal. Eles queriam vê-los juntos e felizes novamente e se aproximar de uma explicação era o primeiro passo para conseguirem.

O quarto fica em silêncio por um tempo, exceto pelo som da música tema da tela inicial do jogo que corria na televisão em volume baixo. O trio reflexivo se assusta quando um estridente telefone toca.

Orlando apalpa os bolsos do shorts rapidamente, sob os olhos dos outros.

— Falando no diabo. – ele diz ao constatar o nome na tela do celular antes de atender – Oi, Lizzie.

Charlie prende a respiração inconscientemente.

— O que? – Orlando franze o cenho ao questionar confuso. – Max, como assim, qual Max? – ele aguarda a resposta da mulher – O Vandemanen? Não! – sopra descrente.

— O que? – Carlos questiona incrédulo.

— Fala mais alto, não escuto você. – Orlando diz para o telefone, mas a batida da música alta que tocava de fundo não o deixava ouvir com clareza, além da voz embaralhada de uma Liza provavelmente bêbada. – Onde é este lugar?

Charlie e Carlos ficam observando Orlando atentamente, procurando entender aquela conversa desconexa.

— Lizzie? – Orlando chama – Não! – ele tira o telefone do ouvido para checar a tela que indicava que a ligação havia sido finalizada. O rapaz tenta retornar a ligação, visivelmente preocupado, mas suas tentativas caem direto na caixa postal. A bateria do telefone devia ter acabado no meio da chamada.

 Quando seus olhos voltam aos dois amigos, suas faces com interrogações o induzem a explicar: - Aparentemente Liza está tri bêbada em uma escola em Amsterdam junto com Max Vandemanen.

— O que? – eles questionam juntos em incredulidade.

— Foi isso o que eu entendi. – Orlando dá de ombros – Tinha uma música alta tocando, não dava para ouvir muita coisa.

— Ela disse que estava em uma escola? – Charlie questiona confuso.

— Sim. De School ainda significa escola na Holanda, ou não? – o britânico pergunta.

De School é uma balada em Amsterdam. – Carlos explica. – Fomos lá com o Jorge, Al e o Richarts no ano passado, não se lembra?

— Não.

— Não me surpreende, você mal parava em pé. – o espanhol ri.

— Por que ela estaria em uma balada com o Max? – Charlie indaga, retornando ao assunto. – Eles se odeiam.

— Temos que ir até lá. – Orlando declara convicto. – Ela deve estar drogada para sair na véspera de uma corrida e ainda por cima com o Manen.

Charlie sente um frio percorrer pelo seu estômago. Aquele não estava sendo um bom dia para ele, e talvez Liza estivesse mesmo em apuros devido a forma como poderia estar lidando com aquela situação. Ainda que estivessem separados ele não havia deixado de se importar com ela ou amá-la.

O trio não pensa duas vezes antes de sair na fria noite da Holanda.


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Notas finais do capítulo

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