Pontos Cardeais escrita por Coffee


Capítulo 3
Três: Norte


Notas iniciais do capítulo

Agradeço muito pelos comentários maravilhosos! Boa leitura!



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PONTOS CARDEAIS

Escrita por Coffee

Três: Norte

 

Na terceira vez, Sasuke não foi pego de surpresa.

Pelo menos não totalmente.

Estava tomando café da manhã em uma estalagem em que passara a noite, no País do Trovão, quando ouviu alguém da mesa ao lado dizer que um grupo de médicos do País do Fogo estava em uma missão humanitária em Yukigakure, no País da Neve, há apenas um dia de viagem de onde ele estava nesse momento.

Primeiramente, ele não deu muito valor a informação, mas então, ouviu a mulher contando a outra:

— Parece que grandes médicos vieram, ouvi que a Godaime pode estar entre eles.

Instantaneamente sua mente o levou a pensar em cabelos róseos e olhos verdes. Se a ex-Hokage estava ali havia grandes chances de Sakura também estar. Levou menos de dois segundos para ele tomar sua decisão e levantar-se da mesa.

Voltou ao quarto, pegou suas coisas, pagou pela noite e pela refeição e partiu para o norte. Demorou um dia e meio para que ele atravessasse a fronteira e fosse recebido pelo clima ainda mais frio.

Enrolado em seu casaco grosso, ele andou por Yukigakure observando a paisagem montanhosa e branca de neve, era fim de tarde, mas o sol já tinha se despedido e as luzes da pequena vila começavam a se acender.

Não nevava, mas havia um suave vento frio que o fez estremecer mesmo dentro do pesado casaco. No centro da cidade, onde ele imaginou que um dia havia sido uma praça, havia uma grande tenda branca, de lona grossa, presa com muito cuidado em todos os lados. Tinha o tamanho de quatro ou cinco casas e ocupava toda a paisagem central.

Ele imaginou que aquele era um hospital de campanha.

E era ali que ela poderia estar.

Ele poderia ter entrado, inventado que gostaria de uma consulta, ou até mesmo perguntado por ela, mas não o fez.

Tentando ser o mais discreto possível, ele encostou-se ao muro de um comércio já fechado e ficou observando o entra e sai na tenda a sua frente.

Ficou ali duas ou três horas, as pontas dos dedos já sentiam o frio tempestuoso de Yukigakure, e ele se pegou pensando na idiotice que estava fazendo, ao ficar ali parado feito um imbecil, sem nem ao menos saber se ela realmente estava naquela vila, movido apenas por uma fofoca de estalagem.

Nesse momento, contudo, com as luzes ao redor já completamente acessas e o vento ficando mais forte, ele a viu saindo da tenda.

Vestia um casaco bege e provavelmente inúmeras blusas por baixo, imaginou pelo volume, e espirrou cinco vezes seguidas antes de se despedir de alguém e dar alguns passos à frente.

Imediatamente ele desencostou-se da parede onde aguardava, e aproximou-se a passos incertos, e, mais uma vez, ela instantaneamente se virou para ele como um imã, reconhecendo o seu chakra.

Na pequena distância que os separava, não mais do que cinco metros, ela espirrou mais três vezes até alcançá-lo, e ele a ela.

— Sasuke-kun!

O sorriso dela fez o seu coração dele bater descompassado. Parecia que o ver ali era a melhor coisa do mundo, e o seu interior se aqueceu instantemente.

— Sakura.

Ele cumprimentou.

Ela espirrou mais uma vez, e ele notou que ela tinha as bochechas e a ponta do nariz vermelhos.

— Desculpe, Sasuke-kun, eu não sou muito adepta ao — outro espirro — tempo frio.

Ele fez um gesto com a mão sem nem ao menos saber o que queria dizer.

— O que faz aqui? Está no País da Neve faz tempo?

— Sim, algum tempo. Vim ver a região.

Ele não teve coragem de dizer que viajara um dia e meio porque ouvira alguém dizer que ela podia estar ali.

— Eu estou aqui com Tsunade-sama, viemos ajudar os médicos daqui. Um desastre natural destruiu o hospital local há algumas semanas, e infelizmente alguns médicos faleceram no acidente. Estamos aqui para organizar as coisas e ajudar com o que pudermos.

Acenou positivamente como incentivo para que ela continuasse a falar, e foi o que ela fez.

— Não era para eu vir, inicialmente. Era Shizune quem viria com Tsunade-sama, mas ela pegou uma bactéria intestinal um dia antes da viagem e bem... Ficou complicado viajar.

Outro aceno e mais um espirro.

— Céus, você não faz ideia de como estou sentindo falta do sol de Konoha. Aqui quase nunca faz sol, e quando ele aparece é somente por algumas horas durante o dia. Meus pés estão sempre gelados e eu não consigo parar de — outro espirro — espirrar!

Ele queria dizer alguma coisa e contribuir para aquela conversa, mas não fazia a mínima ideia do que falar. Perguntar de Naruto, de Kakashi? Perguntar da última missão dela? Falar sobre o último encontro dos dois?

Todas as opções pareciam patéticas.

— Eu acabei de sair do meu plantão, e estava indo comer alguma coisa, quer vir também?

Antes de anuir com a cabeça ele pensou que deveria ter tido a sensibilidade de perceber que ela provavelmente estava exausta e faminta, que devia estar trabalhando desde manhã e não merecia ficar em pé naquele tempo gelado.

Eles tomaram um caminho guiado por ela, andando pelas ruas de terra iluminada da Vila Oculta da Neve.

— Tem um lugar não muito longe daqui onde tenho comido nos últimos dias, o que acha?

Concordou com a cabeça, e eles seguiram o caminho lado a lado.

— Como você está?

Ela perguntou, tentando quebrar o silêncio entre eles mais uma vez.

— Bem.

— O braço?

— Ótimo.

Sakura deu um sorriso ao olhá-lo e depois voltou os olhos verdes para o percurso que seguiam.

— Confesso que esse é o último lugar que imaginaria te encontrar. É muita coincidência, não?

Acenou com a cabeça, tentando disfarçar o rubor das bochechas.

— O trabalho aqui está me deixando louca, e exausta. Havia tantas pessoas sem atendimento, há tanto tempo, que os dias têm sido caóticos. Um paciente atrás do outro e a gente acaba não tendo tempo nem para comer. Só quando o plantão acaba mesmo.

Ele notou as olheiras roxas embaixo dos olhos verdes, o cansaço estampado na face, e pensou em dizer que ela não deveria se esforçar tanto, mas sabia que seria inútil. Era Sakura, afinal, e cuidar dos outros era sua vida.

— Naruto e Kakashi-sensei estão ótimos. Naruto ficou muito chateado por você não comparecer ao casamento dele.

— Eu não...

— Não precisa dar explicações, apesar de chateado ele te entende.

E você? Ele quis perguntar, mas simples frase ficou enroscada na sua garganta.

— Foi uma cerimônia linda. Hinata estava tão radiante quanto o sol. Tirando a parte que Naruto derrubou champanhe em Hiashi tudo ocorreu muito bem.

Ele deu um sorriso de canto, imaginando a cena. Naruto nunca decepcionava.

— Eu não estou pronto.

Ele finalmente conseguiu dizer alguns minutos depois.

Sakura entendeu também o que ele não disse.

Não estou pronto para voltar. Não estou pronto para encarar todo mundo. Principalmente os cidadãos de Konoha.

— Está tudo bem, Sasuke-kun. Como eu disse, Naruto entende, e isso não foi de forma alguma uma cobrança. É apenas para você saber que sentimos sua falta.

Agora as bochechas dela pareceram se avermelhar mais do que já estavam pelo frio.

Ele acenou com a cabeça e eles andaram mais alguns metros, até um estabelecimento construído todo em madeira. Não era muito grande, mas parecia aconchegante, com mesas na calçada e dentro de um salão.

— É aqui. Se importa se sentarmos lá dentro? Está muito frio aqui fora.

Deu os ombros, e ela tomou esse sinal como incentivo para empurrar a porta de madeira e vidro. Lá dentro foram recebidos por um ambiente mais quente, com uma lareira queimando forte na parede oposta da entrada e luzes amareladas pendendo do teto.

Um garçom, não muito mais velho do que eles, veio recebê-los.

— Boa noite. Mesa para dois?

Sakura concordou, e eles foram levados até uma mesa perto da lareira.

— Querem tirar os casacos?

— Prefiro ficar com ele, se não houver problemas.

— De jeito algum, fiquem à vontade.

Eles sentaram-se sendo instantaneamente aquecidos pelo fogo crepitante, e o garçom os deixou com cardápios e um aviso que logo voltaria para recolher os pedidos.

Sakura folheou a pasta em suas mãos, embora já tivesse comido ali outras vezes, e estranhou quando ele não fez nenhum movimento para ler os pratos.

— O que foi, Sasuke-kun? Não gostou do lugar? Podemos—

— Está ótimo, Sakura.

Ela o olhou em dúvida.

— Pode escolher.

Viajando tanto Sasuke havia se desapegado um pouco de comidas. Desde quando saíra de Konoha na juventude, na verdade, ele não se importava muito com o que comia. O fazia somente para manter seu corpo funcionando, mas muitas vezes nem se atentava com o gosto daquilo que consumia.

— Nossa, que responsabilidade!

Sakura disse se ajeitando na cadeira, e parecendo feliz com a possibilidade de escolher.

— Importa-se de bebermos suco? Estou tão cansada que se tomar saquê acho que não serei capaz de acordar para o meu plantão de amanhã.

Ele fez um gesto com a mão, deixando-a à vontade para escolher o que quisesse.

O garçom veio até eles e Sakura fez o pedido para os dois, como ele dissera, e logo eles estavam sozinhos novamente.

— Viu algo interessante nesse último ano? Por onde andou?

Ele contou um pouco das suas últimas viagens, da pequena aldeia que ajudou a se livrar de mercenários que estavam sequestrando crianças no País da Lua Crescente, da cultura exótica que presenciou no País das Invocações, onde todos andavam vestidos com peles de animais, seguiam uma religião onde veneravam um deus metade cachorro e metade águia, mas comiam somente legumes e frutas. Contou também dos incríveis espécimes de facas, shurikens, kunais e katanas que viu no País da Arma, e das danças de colheita estranhas do País do Trovão.

Nesse meio tempo, a comida chegou, Sakura escolhera um filé de peixe, acompanhado de uma massa que ele não sabia o nome e tomates assados, tanto para ele quanto para ela. Eles comeram enquanto conversavam.

— Parece tudo tão incrível, Sasuke-kun! Às vezes ficamos tão reclusos no nosso próprio mundinho, na nossa própria vila que acabamos esquecendo quanta cultura e coisas diferentes tem por aí.

Ele anuiu.

— Tenho gostado cada vez mais de viajar também, tem tanto conhecimento ao redor do mundo! Você não faz ideia do tanto de técnicas de cura, de cirurgia, de alívio da dor que encontramos em diferentes países, aqui mesmo, no País da Neve, nesse pouco tempo em que estamos aqui, já tivemos contato com cinco plantas medicinais que não conhecíamos! Estamos separando algumas mudas para levar para Konoha, se conseguirmos fazer com que elas se desenvolvam mesmo no clima quente de lá, vai ser muito bom para produzirmos novos remédios e antídotos.

Eles continuaram trocando algumas experiências até acabarem de comer. Depois pediram a conta, que Sakura fez questão de dividir, e logo deixaram o ambiente aquecido do restaurante para serem recebidos pelo vento gelado do lado de fora.

Sakura espirrou mais três vezes seguidas.

— Céus!

Ele sorriu discretamente, enquanto andava ao lado dela, com ela liderando o caminho. Olhando para o horizonte escuro, podiam distinguir altas montanhas cobertas de neve.

— Sabe, no primeiro dia em que chegamos aqui, admito que fiquei com medo de ir dormir e acontecer alguma coisa com toda essa neve, sei lá, uma avalanche. Tsunade-sama riu da minha cara e me mandou tomar um saquê para dormir tranquila, mas toda vez que o vento bate forte na janela da estalagem em que estamos ficando, eu temo que toda essa neve possa nos soterrar.

Sasuke tremeu levemente, somente de pensar na ideia de Sakura soterrada por tanta neve.

— É ridículo, eu sei, o desastre natural que atingiu o hospital daqui foi o rompimento de uma barragem que eles mantinham aquecida para não congelar, nada relacionado com a neve das montanhas e os aldeões já me garantiram que elas estão aqui há séculos e a neve sobre elas é muito firme, mas bem... Minha imaginação é muito criativa.

— Não vai acontecer nada, Sakura.

Foi tudo que conseguiu dizer como forma de confortá-la.

— Sim, acho que é somente essa imagem que me assusta sabe, — ela apontou para as montanhas a frente deles — notar o quanto somos pequenos perante a natureza, e como realmente não temos controle de nada.

A médica deu os ombros e ele assentiu com a cabeça. Sabia que ela tinha razão, quanto mais viajava e quanto mais via, mais tinha essa mesma noção que ela falava, de que os seres humanos não eram nada, que havia algo muito mais belo e grandioso por trás. Que, na verdade, ao contrário do que pensavam, era a natureza que os deixava viver ali.

— Eu entendo.

Foi tudo o que ele conseguiu dizer, novamente.

— Vai continuar aqui no País da Neve?

Ela perguntou, mudando de assunto.

Acenou negativamente antes de responder.

— Não, pretendo voltar para o País do Trovão.

Só depois que falou foi que percebeu a gafe que cometera.

Mas Sakura pareceu não perceber, e continuou andando sem comentar nada.

Realmente pretendia voltar para o País do Trovão, ainda havia muito de lá que ele gostaria de descobrir, algumas vilas que gostaria de visitar, e estava muito frio para permanecer ali no País da Neve, talvez pudesse voltar no verão, pois embora o País do Trovão também estivesse com um clima frio não era nada comparado a Yukigakure.

— Nós vamos ficar aqui mais uma ou duas semanas. Algumas outras vilas vizinhas também pretendem enviar médicos até a completa recuperação dos sobreviventes daqui, e não podemos ficar muito tempo longe do hospital do Konoha, embora eu tenha certeza de que Shizune está fazendo um ótimo trabalho, é muita coisa para ela administrar sozinha.

Eles andaram mais alguns quarteirões, somente com os espirros de Sakura quebrando o silêncio, e Sasuke refletiu que essa fora uma das vezes em que mais conversaram em muito tempo.

Sakura pareceu pensar o mesmo.

— Estou muito feliz de tê-lo encontrado aqui, Sasuke-kun. Da última vez que nos encontramos eu estava em missão oficial pelo País do Fogo, e não podia me desviar, nem conversar muito, mas encontrá-lo agora, com mais tempo e liberdade me fez muito bem. Como eu disse antes, sentimos muito a sua falta. Eu sinto muito a sua falta.

Sasuke não sabia o que dizer. Nunca fora bom em lidar com declarações, embora não fosse uma propriamente dita, Sakura estava abrindo uma parte do seu interior para ele, e ele não fazia a mínima ideia de como lidar com isso.

Dando mais alguns passos, ainda pensando no que dizer, ele só percebeu que ela parara de andar quando estava um metro longe dela.

Ele olhou para trás, e andou até ela.

— Estamos ficando nessa estalagem.

Ela apontou e ele acenou positivamente. Era tarde, e ela devia estar exausta, precisava dormir.

— Eu também.

Uma sobrancelha rosa se elevou em um arco.

— Está ficando nessa estalagem?

— Não.

Sakura pensou alguns segundos antes de entender.

Eu também sinto sua falta.

Foi o que ele tentou dizer.

Sakura sorriu.

— Você é uma caixinha de surpresas, Sasuke-kun.

Ele não fazia ideia do que ela queria dizer com isso, e ele permaneceu parado feito um idiota, com as mãos nos bolsos, enquanto ela trocava o peso de uma perna para a outra. Os dois parados no meio da rua, em frente a estalagem que em que ela estava hospedada.

— Eu devo entrar. Amanhã meu plantão começa de madrugada. E você também deve estar cansado da viagem.

Dessa vez, ele não conseguiu disfarçar a surpresa.

Cansado da viagem?

Como diabos Sakura sabia que ele não estava ali no País da Neve, mas sim tinha viajado somente para encontrá-la? É claro que ele dera um fora antes, mas ela havia deduzido tanto assim somente com uma frase?

Sakura sorriu, parecendo perceber o que ele pensava, mas não deu explicações, apenas se aproximou alguns passos dele, até estarem frente a frente, suas respirações se misturando, e, por mais que Sasuke nunca tenha gostado de contato, não fez nenhum movimento para afastar-se dela.

Ela ergueu-se nas pontas dos pés, usando o ombro direito dele com apoio, e aproximou seus rostos. Seu coração bateu acelerado quando as fumaças das suas respirações quentes no vente gelado se misturaram, e ela aproximou os lábios dos seus.

Mas ela os desviou, no último segundo, tocando somente o canto da sua boca com a dela. Os lábios dela acariciaram o arco final da sua boca por uma fração rápida de tempo, antes dela se afastar com as bochechas vermelhas.

— Muito obrigada por vir me ver, Sasuke-kun.

Foi a última coisa que ela falou, antes de virar as costas e entrar na estalagem.

Ele ainda permaneceu paralisado, alguns segundos, pensando que Sakura provavelmente tinha um sexto sentido muito afiado, antes de mexer os pés e partir novamente rumo ao País do Trovão.


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Notas finais do capítulo

Tá acabando! O próximo capítulo será o último, onde será esse encontro? Até breve! Instagram de atualizações: @historiasdacoffee



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