Elvenore: A Revolução Das Marés escrita por Pandora Ventrue Black


Capítulo 32
Capítulo 30




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/799801/chapter/32

Mentiras e Revanches

O almoço com Nicholas foi breve, eu não estava com muita vontade de conversar e uma dor de cabeça o atacou subitamente. Ele cambaleou até a cama e pediu encarecidamente para que eu chamasse o curandeiro, e foi o que fiz. Fiquei ao seu lado enquanto o curandeiro o deu um remédio para dor e um para o ajudar a dormir, Nicholas precisava de descanso e mesmo com a boa noite de sono que teve, seu pé ainda estava inchado.

Caminhei pelo pátio, queria encontrar Phyx, mas depois de ir até seu quarto e não a vi lá dentro, presumi que o único lugar que ela poderia estar em um ambiente como a fortaleza de Acqua fosse o mal cuidado jardim na parte interna das paredes de pedras que protegiam todo o complexo. Não estava errada.

Phyx estava olhando para os canteiros, usando roupas comuns de Acqua (uma calça confortável de um tom neutro e uma bata roxa, de um tom escuro como púrpura). Não parecia a aia que me foi fornecida no meu primeiro dia na Alta Corte, e sim uma cidadã jovem de um reino crescente. Suas mãos estavam apoiadas na cintura e pelo seu olhar, eu podia dizer que não estava nem um pouco insatisfeita com as flores.

— Olá, Phyx — Eu a cumprimentei, mas seus olhos estavam focados nas plantas.

— Boa tarde, Kyan — Ela murmurou de volta, agachando-se — Sabe onde posso conseguir um adubo? Essas plantas estão mais tristes do que a atmosfera no palácio da Alta Corte…

— Eu posso providenciar — Me sento perto dela, observando sua pele brilhar a medida que suas mãos vasculhavam a terra seca — Phyx… Podemos conversar?

— Claro — Olho ao meu redor e vejo alguns soldados de guarda, outros homens caminhando para lá e para cá. Nem um pouco privado…

— Conversar em particular.

— Ah! — Seus olhos encontram os meus e eu sorrio gentilmente, era bom ver um rosto conhecido e amigo aqui — Me mostre o caminho.

Apenas assinto e me levanto, guiando ela até os fundos, no jardim onde foi a comemoração no dia em que cheguei. A escuto suspiras quando nos sentamos em um banco de madeira retorcida, debaixo da grande árvore que dava sombra em quase todo o jardim.

— Aqui é bem mais cuidado do que a parte da frente…

— É tipo o nosso salão de festa — Expliquei, mas acho que a ninfa nem prestou atenção — Phyx?

— Ah, me desculpa… — Soprou, olhando para mim — Na Alta Corte nada é tão verde e vivo assim… Tem muita areia e mármore. Mesmo com os jardins impecáveis da rainha, tudo lá parece meio… artificial.

— Eu lembro… — Inspirei pesadamente — Eu queria saber como veio parar aqui? E como veio parar aqui com o Nicholas.

Suas mãos finas repousaram em suas coxas, pareciam triste.

— Quando Skander apareceu dizendo que você não tinha saído da área das sereias, o rei surtou — Ela suspirou, balançando a cabeça — Tropas foram enviadas para todas as ilhas que fazem parte do território de Evander, mas Dominic sentiu que algo estava errado. Que mandar vários homens para vários lugares seria uma perda de tempo…

— O que não deixa de ser mentira…

— Ele foi atrás da Zya, queria conselhos. Estava passando perto de sua sala quando ouvi eles conversando — Ela se ajeita desconfortavelmente na cadeira — Zya pediu para que Dominic escolhesse uma pedra preciosa e pela primeira vez na vida dele, ele escolheu uma granada e não uma kyanite.

Meus olhos arregalaram.

— Granadas são escamas de uma espécie de sereia que levam o mesmo nome — Phyx continuou, encarando as minhas mãos trêmulas. Tentei disfarçar, mas falhei miseravelmente — Se estivéssemos lidando com essas sereias, sua vida estaria realmente em perigo. Elas vagam por todo o oceano, muitas conseguem se infiltrar na água doce e causam sérios problemas para ninfas como eu.

— E estive em perigo… Uma delas me arrastou para dentro da água — Estremeci, tentando me esquecer da sensação de se afogar no aconchego da água do mar — Tentei lutar contra elas, mas estava em desvantagem. Eu apaguei e quando acordei estavam em uma caverna.

— Deve ter sido… horrível — Suas mãos envolvem as minhas, havia compaixão e não pena em seu olhar — Eu sinto muito, Kyan.

Sorrio, eu estava bem agora. Meus tornozelos estavam completamente curados e não doem, mesmo exibindo cicatrizes cruéis.

— Bem, voltando ao que eu estava falando — Sua mão aperta a minha novamente — Escutei Zya xingar e depois forçar Dominic a participar de uma leitura de tarot… E eu não consegui deixar de escutar o resto da conversa, afinal, você estava desaparecida e se tivesse mesmo entrado em contato com Granadas, eu temia por sua vida — Pigarreando ela continuou — A leitura deixou tudo um pouco mais claro para Dominic, mesmo eu não entendendo metade do que havia sido conversado. Ele saiu da sala como um tiro, a passos pesados e mal me viu.

— Foi ele quem me achou… Até hoje não sei onde estava — Murmurei, lembrando se seu toque firme. Naquele momento eu quis Dominic mais do que podia compreender. Naquele momento eu descobri que algo em mim queimava por ele e eu me odiava por isso.

E acima de tudo, eu o odiava.

— Ele partiu sem mais nem menos. Pegou o último navio da guarda e partiu.

— Devo minha vida a ele — Sibilei, cerrando os punhos até minhas juntas ficarem brancas — Mas nada além disso.

— O importante é que está viva — Phyx disse, sua voz era firme e forte como o tronco de uma árvore.

Respirei fundo, acalmando os meus nervos.

— Como veio parar aqui? — Indaguei, precisava chegar ao fundo disso tudo.

— Quando Dominic voltou, machucado e cheio de hematomas, falando que o navio foi invadido por piratas, por Skander, eu perdi a cabeça — Ela resmungou, revirando os olhos — Estava de saco cheio de presenciar tudo isso e não poder fazer nada por você, Kyan. Nicholas também estava assim. Sabe, o rei o deixa de lado em todas as decisões.

— Dominic é o herdeiro do trono, Phyx. Ele assumirá depois de Evander e Nicholas está ali apenas para que caso fatal aconteça com Dominic.

— Ele é um enfeite — Ela sorriu, revirando os olhos — Mas um enfeite bem útil. Aceitou minha proposta louca sem nem hesitar. Partimos para Guenivere de noite e eu sabia onde Delilah estava, ela deveria saber onde Skander estaria… Se gaba tanto de ser sua amante, mas acabou nos ajudando.

Cerro o maxilar, Delilah me dá nos nervos… Respiro fundo.

— É bom ter vocês aqui — Quebrei o silêncio entre nós — Senti sua falta.

— Eu também, Kyan.

— Kyanite — A voz de Skander correu o jardim como vento, fazendo minha pele arrepiar — Ciana que falar com você.

Ele estava na porta, sua postura era dura e militar e seus olhos me diziam que ele estava cansado, mas não sabia se era por conta de sua vida trabalhosa e árdua em Acqua ou por conta de suas noites de sono mal dormidas. Ou, pior ainda, se fosse culpa de sua amante.

Sinto meu corpo ferver. Eu estava com ciúmes?

Gargalhei baixinho, não podia estar com ciúmes, isso é impossível.

— Estou indo — Me viro para Phyx, despedindo-me — Vou ver com a minha mãe a questão do adubo, não se preocupe. Até logo, Phyx.

— Até, Kyan.

Caminho de volta para a fortaleza, sendo escoltada por Skander, que permaneceu em silêncio o tempo todo.

— Está muito silencioso — Minha voz ecoou pelos corredores.

— Não tinha o que falar, princesa — Ele disse, olhando para frente.

— Está me evitando? — Arqueei a sobrancelha.

— De forma alguma — Um sorriso tímido surgiu em meus lábios a medida que vi seus olhos brilharem na minha direção — Estou apenas mantendo a minha palavra e fazendo o meu trabalho.

Continuo caminhando, em silêncio.

— Adoro o seu sorriso — Ele soprou, pegando-me de surpresa.

— Eu… — Gaguejei, sentindo as minhas bochechas arderem — Obrigada.

— De nada — Skander tocou as minhas costas com cuidado quando viramos uma esquina — Ela não está no salão e sim em seus aposentos.

Balancei a cabeça positivamente, mas sentia o meu corpo esquentar com o seu toque dominante em meu corpo. Havia algo em Skander que me fazia desejá-lo, queria seus beijos quentes e sedentos. Queria sentir sua pele áspera e morna. Queria sentir o cheiro de sal e álcool de seu corpo musculoso e definido.

Engulo em seco, limpando a minha mente.

— Você está bem? — Ele perguntou, olhando para mim — Está vermelha…

— Skander, eu… — Desvie o olhar, afastando-me de seu toque — Está quente. Só isso.

— Claro — Skander sorriu levemente — Eu fico por aqui. Siga reto e o quarto dela é a primeira porta á direita.

Murmuro um “obrigada” e continuo o caminho, mas meu coração parecia estranho, magoado. Sem nem pensar duas vezes, giro meus calcanhares e me viro novamente para Skander, correndo até ele. Antes que ele conseguisse falar qualquer coisa, seguro seu rosto e beijo sua bochecha devagar.

Escuto meu coração explodir.

— Odeio quando me chama de princesa — Brinco, aproximando minha boca de sua orelha — Obrigada por me trazer de volta a minha família.

 

✵ ✵ ♔ ✵ ✵

 

Lá estava Ciana, sentada em uma poltrona de um tecido opaco, quase como couro, de um marrom escuro e denso. Tinha óculos finos em seu nariz e analisava uma montanha de papéis e pergaminhos, estudava as palavras de uma forma paciente que eu nunca fui capaz de imitar. Nesse sentido, eu sou muito mais parecida com meu pai, ele lia as cartas por alto, focando nas palavras que apareciam mais e tirava suas próprias conclusões com um resumo rápido de tudo que tinha lido.

— Estou aqui, mãe — Pronunciei, despertando-a de sua atenção quase que imaculável.

— Entre, Kya — Pediu, olhando para mim com seus olhos de cores diferente por cima dos óculos — Precisava conversar com você.

Respirei fundo, preocupado. Meu coração palpitava.

— Sei que você e o príncipe Nicholas são próximos, mas não podemos abrigar ele por muito tempo — Seu foco voltou para o material em sua mesa de madeira — Ele é da realeza e está em território inimigo. As pessoas fofocam muito por aqui e por mais que ele seja jovem e esteja indo contra seu pai, já tem muita inimizades — Tento falar, mas ele levanta sua mão, calando-me instantaneamente — É perigoso para ele aqui.

— Nick está ferido — Me impus, aproximando-me de sua mesa — Apesar de está tomando os remédios direito, sua canela ainda está inchada e precisa de, pelo menos, dez dias de repouso.

— Não temos esse tempo todo — Falou entredentes — Por mais que esteja na fortaleza, aqui é repleto de homens e mulheres treinados para matar.

Cerro o maxilar, ela estava certa.

— O que faremos? — Indaguei, observando ela mexer com a papelada em sua frente.

— Infelizmente ele vai ter que voltar para Guenivere, para sua casa — Nossos olhos se encontram e percebo a seriedade no brilho de sua lente — Tentarei mantê-lo seguro por um tempo, até que esteja bem o suficiente para viajar. Partirá assim que o curandeiro disser que pode.

— Mãe…

— Não quero ser culpada pela morte de alguém que não planejei — Fria e cortante — Nossa guerra é com Evander e não com seu filho.

— Mãe… — Tento mais uma vez — Nicholas pode nos servir como vantagem.

Eu estava sendo tão fria quando Evander e me sentia enojada.

— Apesar de saber que o príncipe Dominic é o verdadeiro herdeiro do trono, Nicholas ainda é seu substituto. Podemos… — Arrumo meus pensamentos, colocando tudo em ordem — Posso levá-lo para o interior de Acqua e mantê-lo seguro pelo tempo que precisa para conseguir um acordo com Evander.

— Não parece um plano tão ruim, mas Nicholas não tem todo esse valor, pelo menos não para o rei…

— Ele virá para um conflito armado mais cedo ou mais tarde — Continuei, me apoiando em sua mesa — Se… — Engulo a náusea que se formava em minha garganta — Se eu chegasse perto o suficiente de Dominic, posso matá-lo.

Ele mentiu para mim”, sibilei mentalmente, sentindo a raivar arder em minhas veias. “Ele fez com que eu me apaixonasse, mesmo sabendo que eu era apenas uma marionete no esquema dele e de seu pai”. Eu ia matá-lo, não só para proteger minha família e tudo o que eles conquistaram, mas também para vingar. Dominic partiu o meu coração, agora eu faria o mesmo com ele.

Os olhos da minha mãe se arregalam em descrença.

— Kya…

— Eu posso fazer isso — Murmurei, sentindo as lágrimas de ódio se formando — Eu consigo fazer isso — Havia uma acidez tóxica em minha língua, como se cada palavra dita de agora em diante marcaria o meu futuro — Dominic é tão ruim quanto rei Evander e se quisermos ter uma chance contra eles, matar o herdeiro do trono é a alternativa.

O quarto é tomado por um silêncio sufocante, mas eu não voltaria atrás com a minha decisão. As paredes pareciam pulsar, fechando-se contra mim, pressionando-me a negar tudo o que acabei de dizer, mas eu estava convicta do que tinha decidido. Meu sangue corria pelos meus ouvidos em um frenesi de ansiedade e apreensão.

O cenho de minha mãe franze, engulo em seco o nervosismo entalado na minha garganta. Seguro com força a beirada da mesa, meu poder estava fluindo inconscientemente e para que conseguisse a aprovação da minha mãe, precisava mostrar a ela que sou completamente capaz de controlar a energia que ferve em mim assim como as minhas emoções. Escuto a madeira rangir e saio de cima da mesa, assumindo uma postura militar.

— Kya — Sua voz é tão séria que por um momento achei que ela iria me colocar de castigo — Você já matou alguém?

A pergunta me atinge como uma avalanche, congelando por completo qualquer dúvida e questionamento dentro de mim. Nunca tinha matado ninguém, exceto, é claro, alguns animais durante meus treinamentos e caçadas em Elfdale. Porém, algo na parte mais profunda do meu ser latejava, uma espécie de escuridão silenciosa, determinada a aflorar pela minha pele no momento certo.

— Eu consigo matar Dominic, mãe — Vociferei, meus punhos estavam tão cerrados que as juntas de meus dedos estavam ficando brancas — Ele me machucou de uma forma que nunca ninguém conseguiu fazer — Caminhei para a porta, decidida — Estou pronta para a revanche.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espero que tenha gostado S2



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Elvenore: A Revolução Das Marés" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.