The Chosen Ones — Chapter One. escrita por Beatriz


Capítulo 26
Akemi: o irmão que eu pensava ter perdido para sempre.




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Em dezoito anos eu nunca havia sentido uma dor tão forte e tão profunda como a que eu estava sentindo agora. Quer dizer, quando meus pais morreram, eu pensei que fosse morrer também. Eu quis morrer junto com eles. Mas, quando alguém muito próximo e querido por você morre, um dia você se vê conseguindo conviver com a dor. Aquela vontade de morrer junto com a pessoa nunca é eterna e em um momento dói como se arrancassem o seu coração do peito e no outro você já não sente quase nada. Está entorpecido.

Oito anos se passaram desde a última vez em que vi meu irmão ela última vez. A última lembrança que tenho dele é do momento em que ele salvou minha vida naquela fatídica noite. Nossa casa estava desabando e um pedaço grande da parede teria caído bem em cima de mim se ele não tivesse sido mais rápido e me empurrado para longe. Eu pensei que ele tivesse morrido naquele momento. Nossos pais já estavam mortos. Gaara estava em cima da nossa casa, transformado em Shukaku. E eu pensei que tivesse perdido Takashi para sempre, que aquele pedaço da parede tivesse caído em cima dele quando era para ter caído em cima de mim.

Eu me culpei. Todos esses anos eu me odiei todos os dias por não ter morrido no lugar de Takashi naquela noite, por não ter dado a chance dele sobreviver àquilo tudo. Eu não suportava o fato dele ter ido no meu lugar. Eu não suportava a falta dele porque, de toda a minha família, Takashi era meu porto seguro, minha válvula de escape, minha prova mais real do que era o amor e de todo o seu significado. Não poderia existir uma Akemi sem um Takashi e, na minha cabeça, não poderia existir um Takashi sem uma Akemi.

Eu ainda penso isso até o momento em que ele me ataca pela segunda vez, se precipitando na minha direção como se eu fosse o inimigo, como se não me conhecesse, como se não fôssemos do mesmo sangue. Em seus olhos, que era tão brilhantes e felizes anos atrás, eu ainda consigo ver um brilho. Mas é um brilho ruim, Takashi sente tanto ódio (ou até mais) quanto Gaara quando se deixa ser dominado pela Bijuu. Eu não reconheço essa Takashi que está na minha frente, não o reconheço como meu irmão. E o pior de tudo é ver que ele também não me reconhece, nem como sua irmã, nem como parte de si. Eu sou apenas um oponente.

Para me defender de seu ataque, eu faço um paredão de madeira rasgar o chão na minha frente, mantendo-o do outro lado por hora. O jutsu não demanda nenhum esforço de mim, mas me sinto como se tivesse passado o dia lutando. Não posso fazer isso, penso, apoiando minha mão no paredão à minha frente, sentindo a aspereza da madeira e ouvindo o grunhido de raiva de Takashi do outro lado. Não posso lutar contra meu próprio irmão.

Não sinto mais Gaara por perto e não o vejo enquanto ele deve estar lutando contra Shion. Nesse momento, só existe eu e meu irmão aqui. Não posso fazer isso, não consigo. Sinto lágrimas escorrendo por minhas bochechas e eu fecho o punho com força o suficiente para fazer rachar o próprio paredão que eu fiz.

— O que foi, Akemi?! — Takashi grita do outro lado. — Vai ficar se escondendo?

Um jato muito forte de água é lançado contra o meu paredão e sou obrigada a me afastar, pois se ele conseguir quebrá-lo posso acabar afogada. É ridículo, não é? O fato dele estar conseguindo usar o estilo água em um deserto, mas Takashi é extraordinário. Sempre foi. Era o shinnobi mais forte que eu conhecia e percebo que isso não mudou com o tempo. Ele herdou o estilo água de Tobirama Senju, tem uma força em seus ninjutsus equivalente ao do Segundo Hokage. Ele era considerado o gênio da geração dele e eu sei que ele já provou que realmente é um.

A água começa a penetrar pelo meu paredão, rachando a estrutura, enquanto mais água escorre por baixo e por cima. Eu não faço nenhum esforço para reforçar meu jutsu e, quando ele é quebrado, vejo Takashi claramente enquanto lascas de madeira voam em todas as direções e eu fico encharcada de água. Seus olhos brilham em um tom de vermelho, o castanho característico dos Senju deixou seus olhos.

— Você não é mais meu irmão — eu digo, tão baixo que acho que ele nem ouviu. Até que ele dá uma gargalhada, jogando a cabeça para trás.

— Eu? EU, AKEMI? Olha para você! Eu que não te reconheço mais! ­— ele diz quando para de rir. — De mãos dadas com o cara que matou os nossos pais! E ainda por cima usando uma roupa igual a que a mamãe usava — ele me olha com escárnio, com nojo. — Você é uma vergonha para o nosso clã!

— Você não entende — digo, sentindo meu lábio inferior tremer.

— Claro que não entendo — ele ajeita sua espada em posição de ataque. — Claro que não entendo, Akemi, e nem quero.  Porque se eu tentasse, eu ia te odiar ainda mais do que odeio nesse exato momento.

Ele investe para cima de mim de novo e, dentro de mim, sinto como se meu coração tivesse rachado ao meio e nunca mais fosse voltar ao normal. Eu me defendo do ataque dele com o bastão da minha mãe que estava nas minhas costas. Ele aumenta de tamanho e eu consigo parar a espada do meu irmão. Ele continua atacando e eu continuo me defendendo, sem conseguir dizer nada. Enquanto ele investe para cima de mim, eu acabo me perdendo em lembranças de quando éramos crianças.

Eu estava andando pela vila da areia, procurando por Takashi, quando o encontro sentado no paredão que fica na entrada da vila. Ele estava sentado ali, abraçando as pernas e olhando para o céu, que estava cheio de estrelas brilhantes. Com dificuldade, eu consigo subir até onde ele está, fazendo um esforço sobre humano para acumular chakra nas solas dos meus pés. Eu havia acabado de entrar na academia ninja.

— Takashi? — chamo seu nome, mas ele nem se vira para mim, está muito concentrado nas estrelas. — Takashi — eu repito, me sentando ao seu lado. Está muito frio aqui em cima e eu começo a tremer um pouco. —, mamãe está chamando para o jantar. Ela fez aqueles bolinhos de arroz que você gosta. Vamos?

— Ouvi dizer que ia ter uma chuva de estrelas hoje — ele diz, olhando para mim agora. Eu olho em seus olhos e o reflexo das estrelas os fazem brilhar mais que o normal. — Vamos esperar um pouco para vermos e fazermos um pedido.

— Não acredito nisso — digo, fazendo bico. — Eu acho que a gente tem que realizar nossos próprios desejos e não esperar que as estrelas façam isso por nós.

Ele ri e bagunça meus cabelos, o que me deixa mais emburrada.

— É claro que nós temos que correr atrás de realizar nossos desejos, mas se as estrelas puderem nos dar um força, não ia ser legal?

— Acho que sim — digo, tentando ajeitar meus cabelos mesmo que o vento só os bagunce mais.

— Ah, olha só, Akemi! — ele aponta para o céu e nós vemos as estrelas passando como um borrão diante de nossos olhos, mergulhando em direção à terra. — Faça um pedido, rápido!

Mesmo contrariada, eu fico de pé, fecho os olhos e digo bem alto como se realmente estivesse falando com alguém:

— Senhoras estrelas, meu pedido é que eu, mamãe, papai e Takashi fiquemos sempre juntos e felizes. E que a mamãe e o papai adotem o Gaara para ele ser nosso irmãozinho porque o papai dele é muito malvado com ele.

Depois de falar, eu abro os olhos e as estrelas continuam caindo no céu. É um espetáculo e eu fico hipnotizada até perceber que Takashi fechou os olhos também e está murmurando alguma coisa. Assim que ele abre os olhos novamente, olha na minha direção e sorri.

— O que você pediu? — pergunto, curiosa.

— É segredo — ele diz, sorrindo e com as bochechas coradas de felicidade. Eu faço um bico e ele sorri. — Como está na academia? Fazendo muitos amigos?

— Não — digo, abraçando minhas pernas assim como ele estava quando cheguei. — As outras crianças parecem não gostar muito de mim por eu ser de outra aldeia. Mas eu sou amiga de Gaara. Isso é bom, certo?

— É sim, Akemi — ele sorri novamente e eu coro um pouco, sorrindo junto. — Mas você precisa encontrar outras pessoas para fazer amizade também. Porque um ninja tem que ter um time e muitos amigos que o protejam.

— E se eu não conseguir?

— É claro que vai — ele se levanta e estende a mão para mim, que eu seguro e fico de pé também. As estrelas refletem nos olhos dele, deixando-os em tom lilás. — Até lá, você tem a mim.

— E depois?

— Não se preocupe, eu sempre estarei com você, irmãzinha.

Saio dos meus pensamentos como se tivesse sido sugada de volta para a realidade. Observo os olhos de Takashi enquanto ele me ataca com sua espada (que foi presente da nossa mãe). Tudo parece em câmera lenta. Como eu me defendo e como ele investe na minha direção. Você não esteve sempre comigo, Takashi. Pelo contrário.

— Por que você está fazendo isso? — pergunto, pulando para longe do alcance da espada dele. — Por que você está do lado desse pessoal, Takashi? O que aconteceu com você?

Ele me encara como se eu fosse a maior idiota do mundo.

— Aquele cara ruivo com uma tatuagem ridícula na testa foi o que aconteceu comigo, Akemi. E depois disso, advinha! Aconteceu você se apaixonando e ficando do lado desse mesmo cara. Traindo nossos pais, traindo à mim! Eu te observei por muito tempo e sempre que eu te via sofrendo por ele ou, mais tarde, se apaixonando por ele, eu sentia nojo. Você me enoja.

— Você não sabe nem da metade das coisas pelas quais o que eu passei...

Você que não sabe nem a metade do que eu passei. Se Yuna não tivesse me salvado naquele dia, talvez eu estivesse igual você: traindo minha família, meus amigos, meu time...

Um sorriso de incredulidade surge em meu rosto, combinando com as lágrimas que continuam se acumulando em meus olhos. Não posso acreditar que ele está dizendo isso e no quão injusto está sendo comigo.

— Time? Amigos? — eu devo parecer uma louca agora, o sorriso ainda está no meu rosto. — Olha só o que você está falando, Takashi — eu me aproximo dele, erguendo uma mão, com a palma virada em sua direção. — Foi você quem disse para eu “fazer amigos” e “que você sempre estaria comigo". Mas no momento em que eu mais precisei de você, você me deixou completamente sozinha! — minha voz já está tão alta nesse momento que eu acredito que toda a vila poderia me ouvir se ainda tivesse alguém aqui.

No momento em que termino de falar, eu libero um jutsu onde vários pedaços de madeira surgem do chão em uma velocidade incrível e vão na direção de Takashi, envolvendo seus tornozelos, pulsos e pescoço. A madeira que envolve o pescoço dele começa a apertá-lo aos poucos e as outras fazem quase ser impossível que ele se mova.

— Você me fez sofrer todos esses anos por absolutamente nada! — grito, fechando ainda mais a madeira em torno de seu pescoço. Ele engasga e a espada cai de suas mãos, no chão. — Eu me culpei todos esses anos, Takashi. Eu me odiei. Eu não suportava nem olhar no espelho porque eu desejava ter morrido no seu lugar. E se você me observou mesmo como diz, você viu tudo isso. Você presenciou a minha agonia e não fez nada! Você é meu irmão mais velho, você tinha o dever de me proteger e tudo o que você fez foi me abandonar!

— Tudo isso só... serviu para te... deixar patética — ele diz com dificuldade. — Você acha que... me comove? Eu não sinto absolutamente... nada... com essas suas palavras. Você não é... mais a irmã que eu... amei.

Água começa a se acumular atrás dele como se as gostas estivessem saindo do corpo de meu irmão. Elas começam a ganhar forma e viram lanças. De longe pareceriam uma miragem, que ele apenas estava moldando a água, mas, há muito tempo, eu vi Takashi usando esse jutsu em seus treinamento. E eu sei que aparência de água é só por causa da distância, pois, se ele jogar isso na minha direção, atravessará meu corpo como se fosse uma lâmina de verdade, forjada em aço ou qualquer outro material feito para matar.

Eu poderia me proteger disso? É claro que sim. Mas não conseguiria. Não depois do que ele disse. Mais uma vez, eu vejo as coisas em câmera lenta. As lâminas vêm em minha direção e eu começo a cair de joelhos no chão, me rendendo. Eu sei que não poderei viver sabendo que meu próprio irmão me odeia ao ponto de querer, desejar, a minha morte. É demais para mim. É pedir demais de uma força psicológica que eu não tenho. Eu sinto muito se te magoei, Takashi. É a última coisa que penso antes de começar a me preparar para morrer pelas mãos do meu irmão.

Mas não é nada disso que acontece. É obvio que não. Nada para mim nunca foi tão fácil assim. Como poderia? Eu devo ser vigiada 24 horas por algum deus muito sádico que nunca deixaria eu me livrar das coisas de uma forma tão simples assim.

Sangue espirra no meu rosto e nas minhas roupas quando o Kazekage, pai de Gaara, surge, como um fantasma, na minha frente e aguenta o impacto de todas aquelas lâminas lançadas por Takashi em seu próprio corpo. Meus olhos se arregalam quase instantaneamente quando eu vejo a ponta das lâminas despontando pela frente do corpo de Rasa. É uma cena horrível, principalmente quando meus olhos encontram os dele e eu consigo perceber que ele fez isso por livre e espontânea vontade. Para me proteger.

Os olhos dele ficam encarando os meus por um tempo longo demais. Ou talvez tenha sido só por uns segundos, eu não saberia dizer. Até que um fio de sangue escorre dos seus lábios para o seu queixo e ele desaba em cima de mim.

— K-kazekage... — o que sai da minha boca é menos que um sussurro. Meus braços encontram o corpo dele quase instantaneamente e eu praticamente caio sentada no chão. — Kazekage! — agora sai mais alto. O que ele fez?

— Akemi... — ele diz com dificuldade, virando a cabeça para cima, para me olhar.

Meu corpo começa a tremer violentamente enquanto observo o Kazekage cuspir sangue no chão. Isso não pode estar acontecendo. O Kazekage sendo morto pelas mãos do meu irmão e por minha culpa.

Mais a frente, o meu jutsu se desfaz e Takashi cai sentado no chão também, puxando o ar com força para os pulmões por culpa do estrangulamento. Quando parece melhor, ele se estica para pegar sua espada que está caída a alguns centímetros de distância e faz menção de se levantar. Seus olhos estão cravados nos meus e eu não vejo nenhum pingo de remorso neles.

De pé, ele cambaleia na minha direção e eu penso que ele vai tentar terminar o que de fato começou, mas alguém aparece ao lado dele. Tão rápido quanto o Kazekage se colocou na minha frente, um homem de cabelos pretos, pele extremamente pálida e olhos vermelhos como o sangue surge ao lado do meu irmão, tocando em seu ombro. Não faço a menor idéia de quem seja, mas está usando a capa da Doragon.

— Já chega, Takashi. — ele diz em um tom que não admite discursão. — Vamos embora.

— Mas... Akemi... — meu irmão é interrompido.

— Eu disse que já chega! — o outro diz, firme, e eu percebo meu irmão estremecer. — Você já fez mais que o suficiente.

Me lançando um último olhar, meu irmão desaparece junto do homem desconhecido.

— Akemi — a voz fraca do Kazekage chega até mim de novo. Eu olho para baixo, em seus olhos. — Eu... — ele tosse, o que faz escorrer mais sangue pela sua boca. — Preciso dizer uma coisa a você antes que...

— Não! — digo, começando a olhar de um lado para o outro, procurando alguém para ajudar. — Você precisa guardar suas forças. Eu sei que temos nossos desentendimentos, mas não vou deixar você morrer em meus braços. Sem chance. SOCORRO! — grito, na esperança de algum ninja médico ouvir e vim correndo. — O KAZEKAGE, ELE ESTÁ...

— Escuta, Akemi! — o Kazekage me interrompe, segurando meu pulso com uma força que eu não sabia que ele ainda poderia ter nessas condições. — Escuta o que eu tenho para dizer. É sobre Gaara... — a voz dele diminui assim como o aperto em meu pulso. — E sobre você.

Um arrepio percorre meu corpo no mesmo instante em que um vento gelado começa a soprar, jogando areia e meus cabelos para todos os lados. Eu não saberia dizer se esse arrepio era de medo do que Rasa poderia falar ou de frio.

O Kazekage continua me olhando nos olhos. A típica expressão de raiva desapareceu de seu rosto e tudo o que posso ver em seus olhos escuros é tristeza e medo. Nunca imaginei que o Kazekage teria medo de morrer, mas é claro que tem. Quem não teria?

— Eu cometi muitos erros — a mão dele continua segurando meu pulso e eu sinto sua pele ficando cada vez mais gelada. — E cometi muitos erros em relação a Gaara, mas nenhum deles talvez tenha sido tão terrível quanto o erro que eu cometi há oito anos atrás.

Meu coração acelera tanto ao ouvir isso que eu poderia ter um ataque cardíaco a qualquer momento.

— Você se lembra de Yashamaru, não lembra? O tio de Gaara.

Eu balanço a cabeça, concordando.

— Naquela noite, há oito anos, eu mandei que Yashamaru provocasse Gaara ao ponto dele perder o controle. E ele conseguiu. Não tenho tempo de te dar os detalhes do que aconteceu entre eles dois, Akemi, você devia perguntar à Gaara sobre aquele dia, mas você sabe que ele matou Yashamaru naquela noite — eu balanço a cabeça novamente, concordando. — O que eu quero dizer... — ele fecha os olhos com força, provavelmente sentindo muita dor, e depois volta a olhar para mim. — Akemi, escute. A culpa de Gaara ter provocado a morte de seus pais é minha. Ele nunca teve culpa de nada. Se os seus pais morreram naquele dia, foi porque eu desejei isso. Porque eu sentia tanta raiva de ter perdido a mãe de Gaara e de você me lembrar tanto ela e ainda ter o poder de controlar a besta dentro do meu filho.

O peso de passar oito anos tentando odiar Gaara e me odiando por não conseguir parece se abater sobre mim e eu quase caio ao lado do Kazekage, sem forças até para me manter sentada. Eu quase poderia pensar que estou sonhando, que nada disso é real, se não fosse pelo peso de Rasa em cima de mim e a pressão de seus dedos em meu pulso, me lembrando de que sim, tudo isso é mais que real.

Ao longe eu consigo ouvir passos correndo em minha direção, algumas vozes e ofegos de surpresa quando chegam perto o suficiente para verem a cena, mas tudo parece longe e baixo, como se eu estivesse debaixo d’água.

— Foi tudo culpa minha, Akemi. Na tentativa de afastar você da arma que eu havia criado para a vila, eu destruí não só a vida do meu filho, como a sua e de seu irmão também. Eu não espero que você me perdoe e eu não estou em posição de pedir nada, mas eu quero lhe pedir uma coisa.

Meus olhos voltam a encher de lágrimas e Rasa se torna um borrão na minha visão até que minhas lágrimas desçam pela minha bochecha.

 — Você me lembra Karura, a mãe de Gaara, muito mais do que eu gostaria — ele solta meu pulso finalmente e encosta as pontas do dedo em minha bochecha, quase como se estivesse acariciando meu rosto. — Sua força, sua determinação e o amor que você sente por Gaara... Eu posso ver Karura em cada parte sua e isso dói como nunca — ele abaixa a mão. — Dói, mas eu fico feliz que Gaara tenha na vida dela uma pessoa igual a mãe dele. É muito mais do que eu poderia pedir, considerando tudo o que fiz para ele. Não achei que ele fosse capaz de encontrar alguém como você, mas que bom que encontrou. Eu só quero te pedir para cuidar dele, Akemi, assim como a mãe dele teria cuidado se estivesse viva e assim como eu deveria ter cuidado, mas não cuidei. A relação dele com os irmãos não é a melhor de todas e eu imagino que se ele tivesse que escolher entre você e eles, ele não hesitaria em escolher você, como ele já vem fazendo há muito tempo. Então, se você tiver que odiar alguém, odeie a mim e não a ele. Ele nunca teve culpa de nada.  

Ele para de falar por um tempo enquanto eu soluço como um bebê. Lá no fundo, eu sei que já sabia de tudo isso. Ou pelo menos desconfiava. Ele não havia perdido o controle propositalmente. Eu já sabia, eu sempre soube, só precisava de uma confirmação porque não pude confiar no homem que amo. Você não foi o único que magoou ele, Rasa, penso.

— Eu sei que é uma responsabilidade muito grande o que eu estou pedindo — Rasa diz. — Considerando tudo o que está acontecendo, seu irmão...

Eu balanço a cabeça de um lado para o outro, fazendo Rasa parar de falar.

— Eu amo o seu filho — digo, tão baixinho que eu nem sei se Rasa escuta. Dentro de mim, sinto um alívio de finalmente estar colocando isso em palavras. — E eu o amo tanto que cuidar dele nunca seria um fardo. Tudo bem você me pedir isso, porque eu não pretendia fazer diferente.

Rasa sorri e é a primeira vez que eu vejo um sorriso no rosto dele desde que o conheço.

— É muito bom saber disso, Akemi. Muito bom. — ele olha para o céu, que por acaso está cheio de estrelas. — Só espero que Karura me perdoe. — Rasa tosse mais uma vez, mais sangue sai de seus lábios e seus olhos escurecem. Eu sei que ele está morrendo e sei que eu deveria odiá-lo mais que nunca agora que ele confessou tudo isso, mas não consigo. Simplesmente não consigo sentir raiva, apenas alivio. Alivio por saber que eu estive errada todo esse tempo e por saber que eu finalmente posso me entregar ao que eu sinto sem me sentir culpada. — Diga ao meu filho que eu sinto muito. Por tudo.

É a última coisa que Rasa diz antes de dar seu último suspiro. Ele morre em meus braços e seu rosto, por incrível que pareça, demonstra estar em paz.

— AKEMI!

Escuto a voz de Gaara ao longe e eu levanto a cabeça quase instantaneamente, procurando por ele. Finalmente percebo que várias pessoas se reuniram ao meu redor e do Kazekage, mas que estão mantendo uma distância segura, talvez porque estejam com medo, talvez porque não consigam acreditar no que aconteceu.

Mas eu ignoro todo mundo e só observo Gaara correndo na minha direção. Lentamente, eu começo a ficar de pé, encostando a cabeça de Rasa com cuidado no chão. Quando eu finalmente consigo me equilibrar, Gaara me envolve em um abraço, segurando minha cabeça junto de seu peito. E eu só consigo chorar e envolver a cintura dele com meus próprios braços. Percebo que ele está sem a cabaça de areia, mas não tenho forças nenhuma para perguntar o porquê. Até Shion parece ser algo distante e sem importância.

— Você está bem? — Gaara pergunta, aparentemente ignorando todo mundo ao redor e segurando meu rosto com as suas duas mãos. Eu tenha plena consciência do meu estado: cabelos bagunçados, sangue seco por todo lado, rosto inchado e lágrimas misturadas com muco. Mas realmente nem me importo, afinal não é como se ele não tivesse me visto pior. — O que aconteceu aqui? A Shion me fez ir para o outro lado da vila e...

— Gaara — eu digo, segurando seus pulsos. —, o Kazekage.

Gaara vira o rosto para o lado e olha para baixo, finalmente parecendo reparar no pai que está deitado no chão, de olhos fechados. Se não fossem os múltiplos buracos em seu torso e todo o sangue, ele poderia muito bem estar dormindo.

Não sei definir a expressão de Gaara e nem o que ele poderia estar sentindo ao ver o pai morto. Talvez tristeza? Talvez alívio? Talvez... nada? Ele passa um tempo só encarando o rosto sem vida do pai. Eu vejo Kankuro e Temari se aproximando correndo. Eles param não muito longe, observando a cena, chocados.

— Gaara — eu o chamo, segurando em seu colete. Ele vira o rosto para mim, olha em meus olhos, mas não sei se realmente me enxerga. — O Takashi, ele...

— Tudo bem — ele me abraça de novo, escondendo meu rosto em seu peito mais uma vez, como se o pai no chão fosse meu e ele não quisesse que eu o visse naquele estado. — Vamos para o hospital ver se você está machucada.

Ele praticamente começa a me arrastar dali e a última coisa que escuto, ao longe, é o grito de Temari, mandando que cubram o corpo de seu pai e o tirem dali o mais rápido possível.


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