A casa de peixes tinha um cheiro peculiar. Não era limpo, como o da casa de Virgem, mas também não fedia como a casa de Sagitário. Era um cheiro forte de incensos. Shun aspirou fundo, e logo após isso sentiu uma tontura.

— Essa deve ser a casa da senhorita Afrodite… espero que ela nos deixe passar sem pedidos absurdos.

— Também espero. Vamos, Andrômeda.

Caminharam até dentro do último templo. Parecia um matagal, todo coberto de flores e plantas. Uma figura se mostrou um pouco à frente de ambos, fazendo sinal de hang loose com a destra e segurando uma rosa na canhota. Em sua cabeça, ao invés do elmo de sua armadura, estava uma coroa de rosas brancas e flores pequenas, da mesma cor.

— Eae, jovens?

— É um homem? — Seiya ergueu uma sobrancelha.

— O que é gênero? Nada mais do que uma construção social. Senta aí, relaxa.

— Você… Você! — Shun apontou para o dourado. — Você destruiu a Ilha de Andrômeda! Agora me lembro do que June me contou!

— Eu? Quando?

— Não se faça de sonsa, sua… sua fedida! — Peixes colocou a mão no peito, ofendido. — A Ilha de Andrômeda queimou em uma rave promovida por você!

— Opa, não é assim que funciona. Primeiro você me chama de “fedida” e agora me acusa de destruir uma ilha?— apoiou a mão na cintura — Não foi bem assim que aconteceu, mocinho. Péssima fonte!

— Já tô vendo que outra “D.R” vai acontecer aqui. Posso ir embora para o Templo do Grande Mestre? É importante! — disse Seiya.

— Vai lá, apressadinho. Só cuidado com as rosas, elas te machucam se você não estiver de boa.

— Fui! — saiu correndo.

— E você rapazinho, de onde tirou que eu queimei a ilha?

— Não se faça de inocente! June de Camaleão contou tudinho! Você promoveu uma festa pique-rave e todo mundo ficou doido por causa daquelas balinhas! Restaram apenas ela, Spica e Leda para contar a história, porque eles estavam em missão e não foram seduzidos pela rave!

— Bem, eu realmente estive na ilha de Andrômeda a pedido do Grande Mestre — caminhou até um banco no estilo praça e se sentou — Ele disse que a ilha precisava de uma festinha, que quando eu promovo aqui no Santuário costuma ser um tanto... desastrosa, para os cavaleiros rasos. Também o seu mestre não estava sendo transparente com o Santuário, logo concluíram que precisavam fazer uma "festa da paz" para reatar os laços entre a Ilha e aqui.

— Como uma “festa da paz” termina em tragédia? Isso não tem sentido nenhum!

— Menino, você precisa se acalmar! Vai infartar antes dos trinta desse jeito — levantou e pegou o virginiano pelo braço — Vem cá! Vamos terminar a nossa conversa na cozinha. Você está precisando de um chá de camomila. Vou explicar o que houve, tintim por tintim.

— Está bem, pelo menos o Seiya conseguiu prosseguir…

— Se ele estiver calmo, não terá problemas — começou a pegar a camomila para fazer um chá fresco — Então, vamos a história. Eu cheguei na ilha e vi o pessoal muito estressado, eles realmente precisavam de uma festinha. Não demorou muito para que eu e minha equipe montássemos tudo.

— E a parte do fogo? Como aconteceu?

— A música por si só não estava funcionando muito e os aperitivos acabaram como água! Vocês comem mal por lá, isso sim que é preocupante! 

— Ok, a senhorita tem um ponto.

— Não precisa me chamar de senhorita ou de senhor, nem sou tão velho assim — serviu o chá — Espera aí! Eu lembrei que fiz bolinhos!

— Não há nada estranho nesses bolinhos? É que eu passei mal depois de comer um pouquinho da buchada de bode do senhor Aldebaran.

— Tem problemas com chocolate?

— Não.

— Então tá tudo numa boa! Não há nada nessa casa que vai te causar mal estar. Qualquer coisa é só eu preparar um chazinho de ervas.

— Está bem — bebericou o chá e estava bom — Então a festa estava um tédio…

— Isso! Foi daí que eu distribuí alguns doces que fez o pessoal ficar mais a vontade, desinibido. Aí que a festa ficou boa! — comia um bolinho com a pétala de flor comestível — Só que eu acho que o efeito não foi bem como eu esperava. Quando alguém vive dentro de regras demais e engessadas por um longo tempo, acabam tendo um momento desses e extrapolam. Foi o que houve, o pessoal teve um surto coletivo, quiseram se divertir tanto que começaram a atear fogo em tudo, dançaram até cair, pularam em alto mar quando estava em correnteza. Uma verdadeira lástima!

— Nossa, isso foi terrível! — Seu coração estava acelerado, ficou tão preocupado que seu rosto empalideceu.

— Come um bolinho, come. Vai te ajudar a relaxar — empurrou o doce para perto do menor, que meio tímido deu uma mordidinha.

— O senhor cozinha muito bem… não parece um bolinho de chocolate comum!

— O segredo é dar muito amor e um pouco de natureza para realçar o sabor — piscou para o rapaz.

— Natureza? O que você colocou aqui?

— Umas ervas naturais… tudo o que está no salão do meu templo é comestível e ajuda a relaxar. Precisamos ficar de boa e elevar o espírito! Vem, vou te mostrar a encomenda de rosas — levantou-se.

— Posso pegar outro bolinho?

— Quantos quiser, mocinho. 

O japonês pegou outro bolo e seguiu o mais velho até o lado da saída de seu templo. Podiam ver Pégaso correndo no meio daquele mar de rosas vermelhas, Shun ainda tentou acenar para o amigo.

— Acho que eu preciso ir até ele, mas… eu sinto que estou tão bem.

— São as rosas. As rosas soltam um perfume para acalmar, eu tentei dar algumas para o Mu, mas ele pisoteou elas… acho que ele não tem salvação — saiu do templo e se deitou em cima das rosas, fechando os olhos e sorrindo. A coroa de flores ficou levemente bagunçada. — E agora vou aproveitar que estou de boa e dormir. Quer se juntar a mim?

— Mas… mas e o Seiya?

— Confie no potencial dele, o que mata é amor.

— É… ele é o cavaleiro mais empenhado que eu conheço, acho que nem vai se importar se eu tirar um cochilo rápido. Com licença…

Sentou-se ao lado do pisciano, deitando-se com as mãos no peito. Não deu dois minutos e ambos já estavam dormindo no mar de rosas.