Invisible String escrita por Sunny Deep


Capítulo 2
UM. Palavras e destinos cruzados


Notas iniciais do capítulo

OIEEE! Aqui estou eu para mais um capítulo!

Eu tô muito feliz com o retorno de vocês, cada comentário trouxe um sorriso de orelha a orelha em mim! Não estava esperando por isso, MUITO OBRIGADA ♥

Vocês verão as várias fases de Scorose ao longo dos anos, assim como as mudanças nos pensamentos e ações de ambos os personagens. Essa fase, em especial, é bem fofa. As demais... é segredo! Hahaha!

Por motivos óbvios, alterei o ano de nascimento dos personagens. Qualquer dúvida só chamar.

Boa leitura! Espero que gostem ♥



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UM

Green was the color of the grass
Where I used to read at Centennial Park
I used to think I would meet somebody there

 

2004

Mansão Malfoy – Londres, UK

A primeira vez que os olhos cinzas de Scorpius encontraram os azuis de Rose, não houve qualquer estardalhaço de borboletas no estômago. Não para ela. A sensação aproximava-se mais de alarde e incerteza - era o que a menina de treze anos conseguira reconhecer.

— Não acredito que você trouxe uma revista para um jantar.

Rose virou-se em direção à fonte daquele comentário julgador, encontrando um garoto alto e loiro parado a metros de distância dela. Pensara que estaria a salvo naquele local do jardim, porém ter sido encontrada por um dos convidados da festa provava o completo oposto.

— Que entediante — ele completou, no silêncio dela.

A garota deu de ombros, trazendo as pernas para próximo do corpo. Estivera sentada na grama verde, encostada na base da fonte de água há um certo tempo, refugiando-se daqueles “boa noites” e “ela tem a cara de uma Weasley mesmo” das pessoas do salão.

Nem seu pai aguentava mais, ela tinha certeza.

Felizmente não era adulta e não precisava suportar conversas chatas com um sorriso no rosto. Na primeira oportunidade, sumiu por uma das portas gigantes que permitiam o acesso à varanda e ao jardim. Aliviada pelo ar livre.

Na próxima vez que seus pais mencionassem um jantar da alta sociedade, ela fingiria pneumonia e desfalecimento. Maldito trabalho de sua mãe como Prefeita.

— Menos entediante que esse jantar — resmungou e tentou concentrar-se no papel que segurava.

O garoto sorriu e, sem qualquer noção de espaço ou educação, sentou ao lado dela. O material do blazer preto encostou em seu braço descoberto e Rose conseguiu sentir o calor emanando do corpo dele.

Bem, assim ficava difícil saber que diabos era a palavra que significava três tacadas abaixo do par num jogo de golfe! Esse garoto não poderia pelo menos sentar um pouco longe dela? Palavras-cruzadas exigiam concentração.

Totalmente ignorante aos pensamentos da Weasley, ele continuou ali.

— Você sabe que eu sou o neto da anfitriã, né?

Rose sequer teve capacidade de arregalar os olhos. Respirou fundo e balançou a cabeça. Inacreditável. Sua mãe provavelmente lhe dissera isso quando a garota fingia prestar atenção em suas orientações para o evento.

Bem, se o jantar da família dele era assim, imagina ele.

— Perfeito.

O que mais poderia verbalizar? Ó, grande neto da anfitriã, peço-te mil perdões por ser sincera? Aquilo não era a cara da Weasley. Sua família não perdia perdão, nunca, jamé.

— Isso são palavras cruzadas? Precisa de ajuda com alguma?

— Não, estou ótima sozinha. 

— Ah. Quer que eu vá embora? — questionou, o tom da voz um pouco mais baixo.

E então, pela primeira vez, ela virou-se e o percebeu.

O cabelo cor de areia tinha um corte muito polido e contido pelo gel. Usava um terno largo demais e seu queixo carregava um furinho charmoso. E olhando para seus olhos cinza-azulados, Rose soube que se dissesse “sim” ele levantaria e levaria consigo o cheiro exagerado de perfume sem titubear.

Imaginou que o garoto deveria também estar fugindo do jantar. Talvez não fosse tão ruim assim ter uma companhia naquele tédio.

Nah, tudo bem.

A insegurança que ele apresentara foi substituída por um sorriso de canto. Impressionou-se com aquela mudança repentina. O garoto estendeu a mão.

—  Scorpius Hyperion Greengrass Malfoy.

— Você tá me xingando?

— Bem-humorada você. Estou sendo educado.

Ela riu, apertando a mão dele em resposta. Implicara, era claro. Seu nome poderia ser exótico, porém não ganhava de certos primos que ela tinha. Às vezes questionava-se sobre a possibilidade dos pais odiarem seus bebês e por isso escolhessem nomes péssimos.

Ainda bem que era muito amada.

— Rose. Apenas Rose.

— É, sei quem você é. Veio com os... Weasleys?

— Isso.

Ele balançou a cabeça e apoiou ela na pedra mármore.

— Sabe, eu também acho isso tudo muito blé. Mas sou obrigado a vir mesmo assim.

— Seus pais te obrigam?

— Não. Eles fogem dessa casa como o diabo foge da cruz.

Rose riu, levantando a sobrancelha. Scorpius compreendeu a pergunta.

— Bem, eles estão na Suíça agora, morando por lá. Estou de férias na casa dos meus avós e... Tem sido chato.

Agora sentia genuína compaixão pelo garoto.

— Foram eles que te vestiram também? Seus avós, quero dizer.

Scorpius olhou para si e fechou os olhos. Ao que parecia, sequer ele estava contente com a roupa.  Era antiquada demais.

— Minha vó — confidenciou. Seus olhos passaram do rosto dela com minuciosa atenção. — Você tá linda.

A Weasley sentiu o calor familiar nas orelhas.

Ahm... Obrigada?

Não era sempre que um garoto bonito a elogiava. Não soube exatamente o que dizer.

— É a primeira vez que vem aqui?

Assentiu, largando a caneta e revista no chão. Afinal, o Malfoy já havia interrompido seus planos de paz no jardim encantador da propriedade.

— Deveria vir um dia conhecer o lago, fica depois da mansão. É lindo lá. Principalmente de dia.

— Você está me convidado?

Scorpius abriu um sorriso.

— Sim.

Aquele “sim” tinha saído com tanta naturalidade que a chocou.

De súbito, seu coração começou a bater mais forte. O que sua mãe sempre dizia? Ah, sim. “Nada de garotos. Nada de namoros.” Seu foco era os estudos. Uma mulher bem sucedida pode escolher o homem que quiser.

Rose sempre fora boa em seguir as regras impostas, mas aquele deslize parecia tão tentador... Pigarreou, desviando o olhar.

— Vou pensar sobre isso. Então... mora na Suíça há quanto tempo?

— Eu não moro lá, só meus pais. Faz um três anos.

— Pensei que tivesse dito que estava só de férias aqui.

— Eu estou. Estudo em um internato, na verdade. Durmstrang. Fica bem no leste. Normalmente divido minhas férias entre ficar aqui e ir pra Zurique.

Rose virou a cabeça tão rapidamente que sentiu o pescoço estalar. Não deu bola, uma risada incrédula saindo dos lábios.

— Não acredito que você estuda em Durmstrang. Somos rivais. Sou de Hogwarts.

— Ah, não!

Ambos riram. Hogwarts e Durmstrang carregavam a rivalidade nas competições acadêmicas e esportivas em muitos campeonatos nacionais. Era história de séculos. Estavam sempre no topo das escolas da Inglaterra, sempre competindo, sempre se provocando.

Rose deveria ter percebido aquele ar de esnobe que Scorpius trazia consigo, mesmo que de forma quase imperceptível.

— Tudo bem, acho que podemos abandonar a rivalidade por alguns minutos. Além do mais, eu-

Um grito grave atravessou os jardins, assustando-os. Rose percebeu o corpo do garoto tensionar, os nós dos dedos ficando brancos. Espiando em direção ao salão, agradeceu que o homem de cabelos cumpridos não conseguia enxergá-la ali.

Lembrava do senhor Malfoy e de sua ignorância ao não cumprimentá-la mais cedo, quando ela e sua família chegaram no jantar. Daquele homem, queria distância.

Relançou um olhar para garoto. Ele respondeu com um sorriso triste.

— Desculpa, Rose, eu... É melhor eu ir. Se ele vier me procurar e nos achar aqui, vai ser pior. Sorte a sua de conseguir se esconder.

Quase sem reação, percebeu ele levantar e afastar-se do pequeno esconderijo. Sentiu o coração começar a palpitar, sem saber o que fazer. Algo não parecia correto ali.

— Espera!

Scorpius virou-se e esperou.

Rose arquitetou possibilidades em sua hábil mente, tentando compreender o porquê do ar parecer mais tenso. Talvez sua relação familiar não fosse boa. As pistas estavam ali, não? Distanciamento dos pais, estudante de colégio interno... Enquanto isso, seu lado emocional também exaltava perguntas. Ele não poderia ficar mais? Ignorar o chamado do avô? Com certeza não deveria ser correto deixar uma pergunta sem ser respondida. Rose agora parecia querer saber até o sorvete favorito dele. Gostava de sorvete, pelo menos?

Falar isso em voz alta a faria parecer doida. Pensou em uma desculpa qualquer, uma forma de adiar a despedida.

— Você... sabe alguma coisa sobre golfe?

Ele concordou, voltando alguns passos. Rose pescou com as mãos o pequeno objeto esquecido no chão.

— Que palavra significava três tacadas abaixo do — forçou os olhos por conta da fraca iluminação, tentando compreender as palavras escritas no papel. — abaixo do par no golfe? Terceira letra é “b”.

Alcançou as palavras-cruzadas. Com aquele sorriso convencido ele logo devolveu.  

— Ah, essa é fácil! Albatroz.

Riscou no papel com o lápis que segurava e sorriu ao perceber que ele tinha acertado. Levantou os olhos e encontrou o lugar onde Scorpius estava, já vazio. Ao longe, viu-o subir a escadaria da Mansão.

Não soube bem o porquê, mas escreveu na borda da página aquele nome. Como se significasse algo. Scorpius Hyperion Greengrass Malfoy. Um puro xingamento.

No final da noite, já no carro com sua família, Rose foi pega de surpresa com as inquisições dos seus pais. “Onde foi? Sumiu para que canto da Mansão? Não sabe o susto que nos deu? Nunca mais faça isso!”.

Em sua perspectiva, estavam sendo exagerados com tamanha preocupação. Rose não era mais uma criança.

— Pelo menos aquele engomadinho não arrastou asas pra você, né, filha? O tal neto do Malfoy.

Encontrou os olhos atentos do pai pelo retrovisor. Balançou a cabeça.

— Rose sabe muito bem que não tem idade pra esse tipo de coisa, Ronald.

A garota virou para o lado, encontrando o irmão vidrado em seu Tamagotchi. Bem, pelo menos ele conseguia safar-se daquele tipo de conversa.

Não esperou que o convite dele fosse realmente verdadeiro. Contudo, teve esperanças de encontrá-lo novamente. No próximo jantar de granfinos, talvez. Poderia ter um conhecido para conversar no refúgio dos jardins, um confidente para reclamar sobre a comida pouco apimentada.

Suas esperanças logo deram sinais de serem inalcançáveis, porquanto seus pais e tios nunca mais mencionaram o sobrenome com “M” e a mansão permaneceu apenas em sua memória.

Apenas depois de questionar à mãe, é que entendeu.

— Os Malfoy não são o tipo de pessoas que queremos por perto. Devemos manter distância, certo?

A ruiva assentiu, mordendo os lábios.

Ninguém nunca soube do garoto de cabelos cor de areia que Rose conversara nos jardins. Infelizmente, ao recordar de Scorpius, manter a distância não era mais seu primeiro pensamento.

2006

Florean Fortescue – Tinworth, Cornwall, UK

— Não acredito que ninguém aparece! — Alice reclamou, tirando seu boné e apoiando o quadril na bancada. — Bem que seus primos podiam vir ajudar comprando algo né?

Rose estava tão frustrada quanto a amiga. Quem diria que no segundo dia de experiência na sorveteria, o tempo seria inimigo e uma chuva incomodativa afastaria todos os turistas da praia.

Aquele plano todo estava provando ser um desastre.

Deveriam ter ouvido a tia Fleur. Sua mãe. Seu pai. Todos que contrariaram seu planejamento de férias. Porém, não queria dar o braço a torcer, esperara tantos meses por aquilo – e não voltaria atrás agora.

 O clima naquela pacata cidadezinha litorânea da Cornualha não era o ideal para passar o recesso de agosto. Muito menos para decidir trabalhar de meio período na sorveteria Florean Fortescue. No entanto, Rose colocara na cabeça (e na da amiga) que se tinha uma parente morando na praia, era esse o destino naquele verão.

— Louis já passou aqui três vezes, Alice. Você vai fazer ele gastar toda a mesada. E a Dominique tá no ballet, você sabe.

A Longbottom assentiu, suspirando.

Estavam hospedadas no chalé dos Delacour-Weasley, no antigo quarto de Victoire. Recentemente a primogênita fizera as malas e embarcara para a Beauxbatons Université, na França. Ou, como Rose costumava dizer, para o paraíso na terra: sua própria independência.

— A gente deveria ter convidado seus outros primos também. A viagem poderia ser mais divertida.

A ruiva sorriu, sugestiva.

— Principalmente um com sobrenome Potter, uh?

Alice revirou os olhos, colocando o boné de volta.

— Não faço ideia do que você tá falando.

Claro que não faz. 

O sininho da porta avisou a presença do único cliente que elas teriam. Uma sorte, Rose não reclamaria disso. Virou-se para a entrada com o maior sorriso no rosto.

Queria sentir-se eficiente. Queria poder sentir-se adulta e independente. Era por isso que viajara até ali, certo? Um pouco para provar que não era uma garotinha mimada, a qual precisava ganhar tudo de mão-beijada.

Rose Weasley estava farta de tantas coisas em sua própria casa que passar as férias na companhia dos pais e do irmão era a última coisa que gostaria. Seu pai chamou de “crise adolescente” e deu de ombros, autorizando a viagem, junto com a mãe. Ela, por sua vez, denominara “birra da filha”. Rose chamava de única solução possível para não fugir de casa e acidentalmente ser raptada por estranhos.

Para sua sorte, Alice conseguira ir junto. Mesmo que preferisse ficar em Londres, se fosse sincera com a amiga.

No instante em que sua visão focalizou a imagem do cliente, o mundo pareceu entrar em velocidade 0.75, como nos filmes de romance que sua prima Lily adorava. Seus olhares encontraram-se, reconhecimento brilhando na íris cinza-azulada.

Abriu um sorriso. Ele também.

Rose?

Lembrava do nome dela. Não, provavelmente não. A Weasley recordou que usava uma insígnia com ele escrito, identificando-a. Ela lembrava do dele, no entanto.

— Em carne e osso — sorriu. — Scorpius.

— Que isso, me xingando?

Riram.

Scorpius estava definitivamente mais alto. Ou era sua memória enganando-a. Seus cabelos estavam maiores, mais rebeldes e ela não conseguiu frear o pensamento de que a Rose do passado era uma burra. Ele era lindo, muito lindo, e a idiota de 13 anos que ela fora não tivera a decência de beijá-lo?

Caramba, Rose!

— Você me deu um bolo. Nunca mais apareceu na Mansão.

Comprimiu os lábios. Não poderia dizer em voz alta que seus pais expressamente indicaram a falta de moralidade da família dele, certo? Seria ridículo, levando em conta que ela não se importava muito com aquilo.

Afinal de contas, o garoto era só... Um garoto. Não necessariamente estava envolvido ou ciente dos podres da família. E ela já mencionara que o Malfoy era lindo em um nível absurdo?

Sua mãe teria um infarto se soubesse do tipo de pensamento que o cérebro da filha era capaz de criar.  

— Contratempos. Meus pais nunca mais foram para lá.

— Uma pena. Meu verão teria muito melhor com alguma companhia.

Ouviu o pigarrear da amiga ao lado. Encarando-a, percebeu que deveria estar aproveitando a oportunidade não para jogar conversa fora e sim lucrar um pouco.

Deslizou o cardápio da sorveteria para frente de Scorpius.

— Ah, ahm você pode ficar à vontade pra escolher seu pedido.

Ele assentiu, ainda com aquele maldito sorriso no rosto. Sua escolha fora um milk-shake de morango, que Alice habilmente (para alguém que aprendera a fazer em menos de dois dias) preparava enquanto os outros dois ficavam naquele silêncio ansioso.

— Sabe... — ela começou, antes que perdesse a coragem. — Eu saio daqui em um hora e meia.

Aquelas palavras foram o suficiente.

— Passo aqui? A gente pode dar uma volta na praia.

Tentou não transparecer a animação que a consumia por dentro.

— Claro.

Alice depositou a bebida no balcão.

— Isso, aproveita e compra mais um milk-shake. Ou dois — Alice piscou.

Scorpius riu e concordou, despedindo-se. Antes de sair pela porta, porém, fitou Rose - aqueles olhos intensos grudados nela. Impossível não sentir as orelhas queimando. O coração em batida frenética.

Diferente da primeira vez, não houve apenas alarde ou incerteza.

— Vocês se conhecem? — a amiga questionou sutilmente, como sempre fazia.

— Um pouco, é.

Tentou fingir plenitude pela hora seguinte, atendendo os poucos sobreviventes da chuva fria que molhava a areia do lado de fora. No entanto, estava nervosa. Não costumava fazer aquilo, sair com um cara aleatório que conhecera em uma noite aleatória e nunca mais vira.

Porém era tão tentador.

No horário combinado, Rose já havia abandonado a camiseta verde da sorveteria e soltado os cabelos. Agradeceu internamente pela Longbottom não ter dito nada além de “pode deixar sua tia comigo”, porque estava uma bagunça internamente.

Ele a beijaria? Será que apenas queria conversar? Tornara-se um chato? Meu Deus, precisava de uma bala para ter certeza de não estar com mau-hálito.

Quando ouviu a batida no vidro do pequeno comércio, sorriu.

— E então, o que está fazendo aqui em Tinworth? — perguntou, caminhando ao lado dele na orla da praia, pelo caminho de cimento e grama.

— Viagem de família. Ou era, até ontem. Você?

— Um respiro da presença da minha família. O que houve ontem?

Scorpius olhou para frente, fazendo uma careta.

— Meus pais brigaram. Agora estar no mesmo ambiente que eles é insuportável. — então apontou para trás deles. — Estamos num resort no norte da praia.  

— No resort? Uau.

O garoto logo arregalou os olhos e balançou as mãos.

— Ei, não é legal, acredite em mim. É meio esotérico, baboseira pura. Eles andam com um incenso atrás de você. Sim, muito estranho. — ela riu da atitude dele. Deveria avisá-lo que poderia ostentar seu dinheiro sem problemas, ela não se importava muito com isso. — Então você decidiu vir pra essa praia de gente velha ou...

Abriu a boca, consternada.

— Não é uma praia de gente velha! Ok, talvez um pouco. Minha tira mora aqui e eu queria fazer algo diferente.

— Por isso tá trabalhando na sorveteria?

— Se você me zoar, eu soco sua cara de privilegiado.

Scorpius gargalhou e então, da forma mais natural do mundo, passou o braço pelos ombros dela. Rose mordeu os lábios com a proximidade e tentou refrear um sorriso. Completamente em vão.

— Não estou zoando! Queria ser assim, livre pra fazer o que eu quero também. Mas com certeza eu não escolheria essa praia gelada pra passar minhas férias.

Se estivesse em um resort, com certeza não reclamaria da chuva. Ou do péssimo clima da região

— Qual é, tem algo melhor que areia úmida e um céu nublado? Isso aqui é o paraíso!

Eles riram. Devido ao vento gelado, Rose aproximou-se ainda mais do corpo de Scorpius. Agradeceu internamente pelo ótimo perfume dele.

Seria muito invasivo questioná-lo sobre aquele assunto dos pais? Antes mesmo de refrear esse questionamento interno, sua boca já pronunciava as próximas palavras.

— Mas você tá bem com esse negócio dos seus pais?

Ela entenderia por completo se ele ignorasse a pergunta. Era um assunto bem particular. Culpava o estranho sentimento de familiaridade que sentia no momento, com ele, pela ousadia. No entanto, Scorpius não demorou a responder.

— Eles tem esse... não sei explicar, uma atitude passiva-agressiva. Fingindo que está tudo bem, mas dando gelo um no outro — suspirou. — É terrível.

Rose compreendeu. Era impossível não identificar aquele sentimento em sua própria experiência com seus pais. Hermione sempre dona da razão, o lado racional do relacionamento, enquanto Ronald mantinha-se aferrado no coração, o completo oposto.

Seu irmão, Hugo, costumava prender-se no quarto com seus videogames no volume máximo enquanto Rose tentava concentrar-se em um livro qualquer.

— Meus pais são mais explosivos, discutem toda hora. É péssimo também. Acho que é o que casais de meia idade fazem, sei lá.

O garoto soltou uma risada seca.

— Tá aí uma coisa que me deixa muito confuso. Por que escolher viver com alguém sendo que vocês só discutem? Não faz sentido.

Pensou sobre isso por alguns segundos, enquanto ouvia o barulho das ondas batendo nos rochedos irregulares da costa.

— Talvez porque você ama a pessoa. Toda aquela coisa de “o lado bom é maior que o lado ruim” e “não dá pra ser cem por cento feliz”.

— Ou seja, todas as frases decoradas de autoajuda. Mas será que não é melhor ser feliz sozinho que tornar a vida de outra pessoa mais infeliz ainda? Me parece mais altruísta.

Rose franziu o cenho, encarando-o com atenção.

— Meu Deus, Scorpius, você não acredita no amor?

Rose não se considerava romântica – muito pelo contrário. Enquanto suas amigas e primas babavam por garotos mal-educados, não conseguia sentir nada além de mera atração física ou admiração.

Entretanto, esperava um dia se apaixonar. Realmente esperava por isso. Perder o sono, sentir borboletas no estômago e todo o resto. Até então, nada disso havia se concretizado ainda.

Ele riu, balançando a cabeça.

— Claro que acredito, mas não supervalorizo ele.

Revirou os olhos.

— Acho que você tem medo.

— Eu?

Você. Aposto que vai se apaixonar e morder a própria língua.

— Bem, melhor aproveitar a vida enquanto isso não acontece, certo?

Iria comentar sobre o quanto aquilo era pessimista, porém os pingos de água a impediram. Em uma velocidade absurda, a garoa tornou-se chuva e ambos os adolescentes corriam em busca de uma proteção. Encontraram uma pequena casinha de madeira que servia para os salva-vidas e ali ficaram, encostados na parede, sentindo o respingar de água nas canelas.

— Tá vendo, chuva gelada no verão. Paraíso. — Rose brincou.

Ele riu, puxando-a pelos passadores de seu short jeans.

— Você gosta de ter razão, hein?

— Decepcionada que você só reparou nisso agora.

Scorpius sorria, algumas gotículas de água escorrendo pela têmpora até o queixo. Estavam próximo, próximos o suficiente para ela compreender que, de todos os garotos com quem já tivera alguma intimidade, ele era o mais abençoado pela genética. Porém não apenas isso. Havia um brilho, algo diferente naqueles olhos. Algo que ela não esqueceria jamais.

— Preciso te dizer uma coisa — sussurrou ele. 

O quê?

— Vem cá.

Ao se aproximar mais ainda, foi surpreendida pelos lábios macios de Scorpius. O toque foi gentil, porém determinado. Passou os braços pelos ombros dele e aprofundou o beijo. 

Na segunda vez que o viu, eles se beijaram. Não uma ou duas vezes, mas incontáveis vezes. Ele a emprestou seu moletom quando o frio tornou-se insuportável e caminhou com ela de mãos dadas até alguns metros de distância do chalé da tia.

Rose subiu as escadas da casa e jogou-se na cama que usava, mesmo ainda molhada. O maior sorriso bobo nos lábios.

Não prometeram se ver mais, ambos sabiam que era apenas um romance de verão. Porém, sem admitir sequer para si mesma, esperou pela visita dele no outro dia, na sorveteria.

Scorpius não apareceu.

A Weasley compreendeu e, se fosse sincera, a chateação sumiu depois de alguns dias. Pelo menos teria uma boa lembrança do verão de 2006. Nada estragaria a memória dela e do Malfoy, de mãos dadas, caminhando na garoa fina. Ou do cheiro que permaneceu na blusa dela depois de devolver o casaco.

Nada estragaria, ela tinha certeza.

A não ser a realidade.


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Notas finais do capítulo

E ENTÃO????

Esse capítulo foi inteiramente flashback para que vocês entendam o início de tudo, PORÉM os próximos serão intercalando passado e presente.

Me contem o que acharam das primeiras interações Scorose nos comentários! Vou adorar saber a opinião de vocês ♥

Se quiserem checar o cast da fanfic: https://twitter.com/lyanstrid/status/1286866227311382529

Beijinhos e até o próximo!
Sunny ♥