50 Tons de uma Salvação escrita por Carolina Muniz


Capítulo 8
Capítulo 07


Notas iniciais do capítulo

Não disse que é o dia todo escrevendo? Capítulos para durarem para o resto do mês pelo tanto de tempo que demoro!!



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“O mal no mundo é o ser humano.”

 

 

Capitulo 07 – Por detrás do que me contam

Cada paciente na Clínica Priory tem seu começo, tem seu motivo. Tem um histórico familiar, tem um trauma bizarramente trágico, tem uma mente perturbada pelo passado, tem o "sangue quente". Cada paciente tem sua história, e toda história tem seu começo.

O começo de alguma coisa é sempre difícil, seja falar sobre a própria vida, começar um monólogo sobre Shakespeare e suas audácias históricas ou então uma redação. Nossa, começar uma redação deve ser o começo mais difícil que existe! Ou então Ana.

Não, sério, Ana com certeza é o começo mais difícil!

Ana, quero dizer, essa Anastasia Rose Steele, essa meio louca, fala o que der na telha e pergunta sobre tudo. 

Que começo ela tinha? 

Ninguém sabia, nem seus pais - que sempre tão protetores, perderam um detalhe importante, os psiquiatras também não sabia... Só a própria Ana. Mas até duvidava de si mesma, duvidava que aquele havia sido o seu começo.

É possível saber o que é errado quando não se sabe o que é dor?

Tudo começa no id, a mente humana é projetada e ensinada através dele, mais ou menos quando se tem uns dois anos. É uma fase importante, a fase de aprender o certo e errado da forma mais pura, aprender que existem "nãos" e o que eles querem dizer. É o seu começo, é a sua mente sendo criada. E então você cresce, sua mente cresce. Com Ana fora um pouco diferente, sua mente era a única coisa que a salvava, já que seu cérebro e seu corpo era linhas completamente diferentes quando se tratava de algo errado. Seu cérebro, como de qualquer outro ser humano, sempre associou dor ao errado, mas ela não se lembra de sentir dor. Então ela se ateou aos detalhes. Aos quatro anos, Ana decretou que errado era sentir dor, e que sentir dor era alguém gritar. Ela pedia ajuda toda vez que alguém gritava. Aos seis anos ela aprendeu que a mente associava gritos a felicidade também. 

E então tudo voltou a ficar difícil novamente. 

Tudo aconteceu tão de repente, não era possível conseguir acompanhar. Em um momento ela tinha nove anos e pensava em pedir um cachorro no Natal, e então no outro dia ela estava tentando dizer aos adultos que concluiu para si mesma que sua babá havia sido machucada; num momento ela estava voltando com Christian pelo corredor depois de mais uma consulta com Elliot e no outro havia seguranças, médicos e a Dra. Grace junto a homens de terno bem em seu quarto.  Automaticamente a garota se voltou para Christian, assim que os viu, tocando em seu braço e permanecendo atrás do mesmo. 

Seu coração acelerou, ela não gostava de aglomerações.

Grace tinha a expressão totalmente apreensiva e nem ao menos tentava esconder, os seguranças ficaram perto das paredes, observando cada canto e cada pessoa. 

Christian franziu o cenho e encarou sua mãe, estranhando os advogados do hospital e os segurança, sem contar no próprio Lincoln Timber Priory – o dono majoritário da clinica – bem ali. 

Só existiam duas coisas que faziam Linc aparecer na clínica: quando recebia visitas do povo da altíssima sociedade ou quando algum dos médicos estava sendo acusado perante a lei. 

Não havia ninguém fazendo alvoroço sobre jalecos estupidamente brancos e sapatos perfeitos. 

— O que está acontecendo? – questionou Christian. 

— Precisamos conversar, Christian – Grace se limitou a dizer e então se dirigiu à Ana. – Querida, hoje você irá jantar no refeitório, tudo bem? Seus pais estão com saudades e vieram lhe fazer uma visita. 

Christian estranhou mais ainda, era proibida a entrada das visitas na propriedade dos pacientes, e o refeitório ficava bem na ala deles, sem contar que a hora do jantar não era a mais apropriada. 

Ana engoliu em seco. 

Não sabia se queria ver seus pais, e com certeza sabia que não queria comer junto a outros pacientes. 

— Não – ela respondeu prontamente. 

Grace lhe sorriu gentilmente e se aproximou, fazendo Ana apertar o braço de Christian, movimento que foi observado por cada par de olhos ali. 

— Seus pais estão com saudade, querida, apenas alguns minutos, você pode voltar e jantar aqui, não se preocupe, mas eles querem ve-la. 

— Eu não quero – a menina insistiu. 

Grace suspirou baixinho e juntou as mãos uma na outra. 

— Dr. Grey, por favor, me acompanhe – um dos homens de terno falou. 

Ana mirou o homem e continuou apertando as mãos no braço do psiquiatra. 

Christian o reconheceu como advogado dos Steele, ele o viu muitas vezes na sala de Grace com os pais da menina tentando ve-la, sem sucesso. 

— Sr. Hadware, eu entendo que é estritamente necessária essa conversa e que seja o mais rápido possível, mas a maior prioridade é a Srta. Steele, afinal, é por ela que todos estamos aqui – Grace interveio, demonstrando impaciência. 

— O que está acontecendo? – Christian repetiu a pergunta depois das palavras de sua mãe. 

— Dr. Grey, precisamos que esclareça algumas coisas, apenas isso – Jefreey, o advogado do hospital, falou. 

— Tudo bem – Christian concordou, logo pegando a mão de Ana que estava prestes a marcar seu braço pela força que a garota usava. – Seus pais estão aqui para te ver, você também deve querer vê-los. 

Na verdade, Ana não queria. Tudo bem que ela estava há quase três semanas sem vê-los, mas não sentia saudade. Nunca esteve com seus pais o suficiente para sentir aquele tipo de coisa, não tinha momentos que ansiava ter de novo. 

— Não... – ela respondeu baixinho. 

Christian tirou uma mecha de seu cabelo dos olhos e a encarou. 

— Vai ser rápido, eu preciso falar com essas pessoas e depois eu volto para te dar boa noite. 

— Não posso ir com voce? 

— Não, Srta. Steele, é uma conversa particular – Hadware falou, ganhando um olhar de repreensão de Grace e Christian, junto à  Ana que o olhou firme e levantou uma sobrancelha. 

— Não falei com você – ela devolveu. 

O advogado engoliu em seco. 

— Isso é realmente necessário agora? Dra. Grace, a Ana precisa seguir a rotina dela como todas as noites – Christian falou. 

— Sim, Sr. Grey, é urgente – o advogado respondeu. 

— Ele também não falou com você – Ana insistiu em implicar com o advogado. 

— Menina, eu estou tentando lhe proteger – ele resmungou. 

Ana bufou. 

— Viram? Como eu disse: sem nenhuma capacidade mental de falar por si mesma – ele desdenhou. 

— Eu posso responder por mim sim! – a garota se agitou. 

— Não sabia que havia se formado em psiquiatria para expor algo sobre o estado mental da minha paciente – Christian se irritou. 

Hardware inspirou profundamente e bufou alto. 

— Sua paciente – resmungou em desgosto.

— Vamos nos acalmar, não importa o que está acontecendo, a prioridade é Anastasia e seu bem estar – dessa vez quem falou foi Linc, pronunciando-se pela primeira vez. 

— Não é possível que voces não vejam, ou se fazem de desentendidos. Anastasia está claramente dependente desse medico e com um suspeito comportamento afetuoso à ele. A única coisa que quero aqui é cuidar da minha cliente, são vocês que parece não se esforçar para a mesma coisa – Hardware se estressou. 

Ana mordeu o lábio inferior e não se afastou de Christian mesmo que o médico tenha tentado dar um passo distante. 

— E, sr. Grey, acredite, não é necessário ser um psiquiatra para entender que a Srta. Steele não  está em suas faculdades mentais, não há possibilidade de responder por si e muito menos entender o que está fazendo. E quer saber? Eu não tenho mais conversa, meus clientes entrarão com um pedido de investigação e acusação de assédio, já preparei uma liminar para um exame de corpo de delito, deixando claro que não é preciso qualquer tipo de alteração para comprovar um estupro. 

Christian arregalou os olhos. 

— Você tem problema!? Quer me acusar de estupro

— Isso é uma acusação muito grave, Sr. Hardware, e fique sabendo que quando as provas não forem infundadas, que é o que irá acontecer, o senhor irá pagar caro por difamação e calúnia de um médico renomado e público – Leonel, advogado do hospital, falou firmemente. 

— Com uma gravação tão esclarecedora e o comportamento de Anastasia Steele, calunia e defamaçao é a ultima coisa que eu me preocuparia se fosse voce, Sr. Leonel – o outro devolver. 

— Já chega, não vamos fazer isso na frente da menina, tenham senso humano, ela precisa de paz e não de uma discussão – Grace vociferou. – Anastasia, querida, Christian precisa ir nesse momento, e você precisa ver seus pais, eu sei que você entende isso e não vai fazer caso, não é? 

Ana olhou para Christian, que parecia mais concentrado em respirar fundo e não quebrar a cara do advogado a sua frente. 

— Eu não quero ir, não quero que você saia – Ana sussurrou para ele. 

Christian se virou para a garota e sorriu gentilmente. 

— Não vai demorar – prometeu. – Seus pais precisam te ver – ele completou. 

— Mas você vai voltar, não é? 

— É claro que não, o Sr. Grey jamais poderá chegar perto de voce novamente, Anastasia, irei garantir isso! – Hardware jogou a última gota no balde já transbordando. 

— Eu já disse que não estou falando com você! – ela gritou, sendo segurada por Christian quando tentou se aproximar do advogado. 

— Se acalma, está tudo bem – o médico sussurrou em seu ouvido. 

— Chamem um enfermeiro por favor... Dois, na verdade – Linc pediu a um dos seguranças. 

— Isso não é necessário – Christian falou ainda segurando Ana pela cintura, mesmo que a garota não forçasse seu corpo, apenas olhava de forma quase assassina para o advogado. 

— Infelizmente, filho, é sim – Grace murmurou. 

— Sinto muito, Christian, mas você não é mais o médico de Anastasia. E com a acusação que está recebendo dos Steele, você não pode exercer sua profissão até que tudo esteja resolvido – Linc deu a sentença no momento em que o segurança voltou com dois enfermeiros, eles tinham uma caixa com uma seringa pronta. 

— Você não pode estar falando sério – Christian suspirou pesado, tirando os braços ao redor de Ana e se afastando por completo da garota. – Eu nunca toquei nela desse jeito, eu... 

— Filho, eu sei, eu sei que nunca seria capaz de fazer algo contra a vontade de quem quer que seja, e vamos provar isso – Grace o interrompeu confiante. 

— Um beijo é o suficiente para uma acusação de assédio, Anastasia não tem nenhuma capacidade de entender a profundidade disso – Hardware de pronunciou. 

Os olhos de Christian brilharam de raiva. Ele estava confuso, ainda não entendia o que e como aquelas coisas estavam acontecendo, mas Hardware estava disposto a tacha-lo o pior possível. Sem contar que ele parecia empenhado em fazer Ana surtar.

— Não, não – Ana murmurou. - Fui eu, eu beijei ele... Ele não fez nada, na verdade me afastou... sempre me afasta – ela deu um passo a frente, e os dois enfermeiros se aproximaram. 

Eram anos de experiência, ela sabia que um deles se preparava para aplicar o sedativo que estava atrás de suas costas, o outro falaria gentilmente com ela para engana-la... e quando ela acordasse Christian já não estaria ali. 

— Tudo bem, tudo bem – ela disse como um mantra para si mesma. 

Christian tentou se aproximar, sendo parado por Grace. 

— Filho, não. Não vamos piorar as coisas, sabe o que vai acontecer, é inevitável. 

— Mas ela vai... 

— Eu estou bem – Ana confirmou a si. 

Então, quando a garota encarou a todos, quando eles esperaram pelo surto, quando Taylor já estava bem perto dela... Ana simplesmente tirou o cabelo dos ombros, virando-se, oferecendo seu braço. 

— Pode aplicar – falou. – Eu não vou gritar ou brigar... eu tô cansada de dizer a vocês que eu entendo o que está acontecendo...

Tudo ficou escuro, fumaçento... cheio de poeira. 

Era uma guerra. 

Ana estava no meio de uma guerra.

No outro dia, seus pais a vigiavam do outro lado do quarto, através de uma parede de vidro, a garota permanecia deitada, não tocava na comida, não falava com os enfermeiros, não respondia a nenhuma pergunta e se recusava a ficar acordada mais que o necessário para ir ao banheiro e tomar banho. Ao contrário do que viveu a vida desde que se lembra, agora, Ana só queria dormir, e incitava os enfermeiros a injetarem sedativos toda vez que acordava. Aquilo acontecia há três dias, quando acordou num quarto diferente do seu e de qualquer outro que já teve. 

As paredes eram cinzas e havia uma única que era completamente de vidro, mesmo que ela não conseguisse ver nada que havia do lado de fora, Ana sabia que podiam vê-la la dentro. Seus pais tentaram muitas vezes se aproximar da garota, falaram sobre saudade e o quanto estavam fazendo de tudo para as coisas se resolvessem, pelo menos no minutos que ela ficava acordada. 

Mas não era como se Ana conseguisse entender alguma coisa, tanto por seu organismo cheio de drogas tanto por ela não saber o que exatamente tinha que ser resolvido. 

Ela não vira Christian. O único que poderia faze-la entender, o único que ela se permitia escutar o suficiente para tal. Mas ele não voltou e seus pais pareciam ser alérgicos ao nome do médico. 

Ana sabia que não estava mais em Priory, sua roupa azul  dizia aquilo e também o quarto sem qualquer coisa branca. 

Ana não sabe em que momento havia acordado novamente,  mas seus olhos não se abriram e ela apenas continuou respirando regularmente. 

— E nossa filha tem que ficar aqui? Eu já estou cansada de ter que ter hora marcada para ver nossa filha. Já dois meses que não podemos ve-la, e agora só podemos fazer uma visita por dia e ela vive mais dormindo do que acordada – sua mãe sussurrou. – Imagino como deviam fazer o mesmo naquela clínica. Desde o começo falei que não concordava com isso, que ela não devia ir... 

— E o que iríamos fazer!? – seu resmungou no mesmo tom. – Hardware e Flynn deixaram claro que ela seria presa se não fosse para Priory. 

— Nossa filha não é louca para ir para uma clínica onde só tem esse tipo de pessoa, e essa Ala Z!? Você pesquisou? É o tipo de lugar onde colocam os piores pacientes, onde colocam crianças assassinas e psicopatas. Ana não é assim. 

— E como ela é então? 

— Nossa filha nunca matou ninguém! 

— Ela é agressiva, tem problemas em controlar a raiva e não dorme sem ter algo injetado nela. Isso é coisa séria e ruim, ela não é normal. Sempre soubemos disso. 

— Não importa! Não importa o que nossa filha tenha, não importa o que ela faça, ninguém deve tocar nela de forma tao suja. Aquele medico disse que estava cuidando dela, ele garantiu que tinha esperanças de que ela podia ter uma vida relativamente normal algum dia... agora vemos como ele estava cuidando dela. Meu Deus, como é possível? Quantas pessoas já podem ter sofrido naquele lugar!? 

Raymond suspirou. 

— Christian Grey é um bom homem, foi criado por uma boa família e você sabe disso. Não Acho que seja fundado essas acusações. 

— Olha para nossa filha, Raymond, e pare de pensar em negócios pelo menos uma vez na vida! – Carla se irritou. 

— Negócios não tem nada a ver com o fato de que os Grey são boas pessoas. Não vou mentir e nem esconder que não acredito nessas coisas. E “eu não parar de pensar em negócios" é o que paga todas as contas de clínicas e as indenizações das pessoas que nossa filha já mandou para o hospital. 

— Você ouviu a gravação, ouviu o que nossa filha disse, ela falou de beijos, falou sobre como eles eram próximos... Eu não consigo parar de pensar nas palavras dela! 

— Eu também não, principalmente no fato de que vi mais sentimentos vindo da minha filha em meia hora de gravação do que nos últimos dez anos, de quando esse inferno começou. 

Carla bufou. 

— Nossa filha tem sentimentos. 

— Ela tem raiva, isso nós sabemos que ela tem – Ray rebateu. – E o que ela demonstrou naquela consulta com Hyde, aquela gravação deveria ser uma felicidade para você também, ela esta se abrindo, se permitindo ter contato com outra pessoa, não importa se é o medico ou o faxineiro da clínica. Sinceramente eu ficaria feliz ate se ela tivesse sentimentos por outro paciente. 

— Não venha tentar me convencer de que esse Grey... 

— Não estou tentando te convencer de nada, Carla, eu apenas estou dizendo que não concordo com voce – ele falou de forma contida. – Não vejo as coisas por esse lado único e fechado que você insiste sempre em colocar nossa filha. Ela não é mais uma criança, não da para controlar suas decisões para sempre. 

Ana nunca vira seus pais brigarem, talvez seja porque não se lembra de ficar tempo suficiente com eles para tal coisa. Mas aquilo ali era uma briga e estranhamente era a coisa mais normal que Ana fé a com seus pais desde os nove anos. 

— Ela não pode decidir, ela não tem escolhas, é nossa responsabilidade... – Carla interveio. 

— Não, você quer que seja assim. Você quer tomar as divisões por ela porque já está acostumada com isso. 

— Está querendo dizer que eu não quero que nossa filha melhore? 

— Eu quero dizer que está na hora de você olhar para um lado mais adulto, a Ana não é mesma desde que saiu de Port Land. Você só tem começar a perceber que isso é uma coisa boa e não ruim. 

— O que adiantou? Ela teve que ir para aquele lugar horrível para não ser presa, mas agora está aqui, num presídio para pessoas com doenças mentais. Como se a nossa filha disse louca ou algo do tipo. 

— Você exigiu que ela não ficasse mais em Priory, achou que eles a deixariam ir para casa? Depois do que ela fez com os enfermeiros na Clinica Sert? Nossa filha não está acima da lei, eu tive que pagar uma fortuna na cirurgia daquele homem para ele voltar enxergar e ate hoje pago a licença dele porque ainda não pode exercer a propria profissao. 

— Ela disse claramente que o médico  a beijou – Carla insistiu. 

— E também que ele a afastava. Você viu como ela falava sobre ele. 

— Ela parecia confusa na maior parte do tempo, isso sim. 

Raymond suspirou alto. 

— Eu achei foi estranha essa gravação, tinha cortes e muitos tons confusos de Ana, ela parecia mais estar numa entrevista do que numa consulta. Sem contar que é proibida a gravação de qualquer coisa com a imagem dos pacientes - ele continuou.

— É proibida muita coisa que aconteceu naquele lugar, Raymond, e você está preocupado com a gravação!? 

— Eu não disse- Filha, você acordou – ele se interrompeu quando deu de cara com os olhos opacos e estupidamente azuis de Ana. 

— Minha princesinha – Carla murmurou sorrindo para a menina. 

Ana mordeu o lábio inferior e Raymond se aproximou devagar quando os olhos da garota se encheram d’água. 

Ela havia escutado cada palavra, ele sabia. 

Raymond Steele era um pai atencioso, não era do tipo que lia histórias para dormir e levava a menina para a escola todos os dias, mas ele reservava ao Domingos para família, deixava Ana escolher o sabor da pizza das sextas a noite e escutava com atencao sobre cada detalhe dos desenhos dela, mesmo que fossem bonecos de pauzinhos e um sol com sorriso. Ana não se lembrava daquelas coisas, claro. Ferraram demais com sua mente para ela se lembrar de coisas boas antes de tudo desabar. 

O que era uma pena, seria importante para ela lembrar que nunca esteve sozinha de verdade, que sua vida não fora apenas quartos de clínicas e sedativos, seria importante saber que seu pai sentia falta daquelas coisas, que sua mae queria sua garotinha de volta, mas seu pai a aceitava do jeito que era, do jeito que ela havia ficado. 

Há realmente coisas que são tão bonitas, mas que machucam de um modo quase irreparável, como nadar no oceano enquanto está chovendo – é perfeito, mas você pode ser atingido por um raio com a probabilidade de uns 99,9%; ir sozinho ao cinema ver um filme romântico – é uma paz, até que você começa a ver os casais se declarando ao seu redor; a neve ser tão intensa que recobre as casas e as arvores – é como se o mundo fosse feito ouro branco, mas só o pensamento de que existem pessoas no mundo que não tem como ter um cobertor e aquecimento, você se sente culpado só por achar bonito; a multidão de estrelas que aparece quando você está a quilômetros de distância das luzes da cidade – elas são lindas, mas aquilo quer dizer que você está muito longe de casa; pessoas nos bares depois das três da manhã – é o momento da honestidade, são as mais felizes e sinceras, mas não são coisas boas que acontecem para você está num bar de madrugada; as coisas que não sabemos sobre os outros... os sentimentos... 
Os sentimentos de Ana eram tão bonitos, para qualquer que entendesse, seria como o paraíso. Uma garota que não sentia nada, estava sentindo ao extremo, era bonito... e perigoso. Ana sabia que havia algo forte, sentia algo que não podia explicar, nunca sentiu saudade ou falta de algo a ponto de ter os sentimentos num turbilhão sem  começo e fim. Mas ali estava tendo. Era uma luta unilateral. Era demais e machucava, mesmo que fosse bonito. 

Ela não dizia nada enquanto havia uma guerra dentro de si.

 


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Notas finais do capítulo

falo nada e nem posso



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