OMNITRANIL (Ben 10 - Força Alienígena) escrita por TarryLoesinne


Capítulo 28
Ergo sum




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Gwen abriu os olhos ao sentir seu ombro ser balançado por alguém.

Dizer que despertou seria um exagero, pois era muito cansaço para ser recuperado com apenas alguns minutos de sono. De maneira sonolenta a garota olhou para a imagem do Encanador que começava a se formar à sua frente.

― Senhorita Tennyson?

― Sim...?

― Me desculpe ter que acordá-la dessa maneira, mas o Grão Mestre está convocando a senhorita no salão principal.

― Quem tá fazendo o quê? ― Gwen coça os olhos com as pontas dos dedos.

― O Grão-Mestre, senhorita. Ele está convocando todo mundo.

Gwen piscou os olhos algumas vezes e se concentrou no Encanador. Ele possuía uma aparência de louva-deus e um olhar que esbanjava inexperiência, mas era possível sentir um alto teor de compromisso no tom de sua voz.

Quando acordamos, é comum que o cérebro demore um pouco para “pegar no tranco”. É comum também que quando algo muito importante invade nossos pensamentos, essa coisa nos força a sair da sonolência com a mesma delicadeza de uma voadora de dois pés no meio do peito:

― Ben! – A garota virou o olhar em direção a cama de hospital.

Mas ele não se encontrava ali.

Gwen levantou-se bruscamente, obrigando o soldado recuar rapidamente. A garota começou a olhar para todos os lados no quarto à procura de seu primo. A cama se encontrava desarrumada e a televisão ligada, com o volume baixinho.

― Senhorita Tennyson...

― Ben Tennyson, onde ele está?

― Perdão?

― O garoto que estava nessa cama. Onde ele está?

― Me desculpe, senhorita, mas quando eu entrei no quarto só havia a senhora.

Ele não pode desaparecido! ― pensou Gwen ― Eu fiz tudo certinho! Eu tenho certeza que fiz!

Gwen continuou procurando, olhou debaixo da cama, dentro do armário. Tentava se convencer que o garoto saiu do coma, levantou-se da cama sem acordá-la e deve ter saído para algum lugar.

O Ben está vivo! Eu tenho certeza disso! Ele deve ter saído para comer algo, é isso!

A jovem virou em direção à porta que dava para o corredor e foi então que notou uma luz vermelha piscante atravessar o pequeno vitrô da porta.

― O que está acontecendo? ― perguntou ela.

― Estamos em alerta vermelho, senhorita Tennyson, e por isso eu fui incumbido de te buscar.

Ben deve ter visto esse alerta!

A jovem novamente voltou ao armário em busca das roupas do primo. Ele não sairia daqui com o avental de hospital. Segundo suas suspeitas, as roupas não se encontravam mais lá.

O Ben não se trocaria na minha frente...

― Você! ― Gwen apontou para o soldado. ― Onde fica o banheiro mais próximo?

― Acho que do outro lado do corredor...

Gwen mal esperou o soldado terminar de falar e já partiu em direção à saída. Assim que chegou na porta do banheiro, bateu duas vezes com o nó dos dedos.

― Ben!?

Sem resposta.

― Ben, se você estiver aí, por favor, diga alguma coisa!

Ainda sem resposta.

Gwen tentou girar a maçaneta, mas além de absurdamente gelada, o eixo da maçaneta girava com muita dificuldade. Além do mais, a porta não abriu.

― Tem algo errado...

― Perdão, senhorita?

― Me desculpe, soldado. Aliás, qual o seu nome?

― Cadete Fickell, senhorita.

― Cadete, preciso que você derrube essa porta.

― Mas por quê?

― Eu explico depois. Eu estou praticamente sem magia, se não eu mesmo derrubaria. Agora, por favor, derrube essa porta.

― Mas senhorita Tennyson, eu fui apenas ordenado para vir buscar a senhorita e-

― Cadete Fickell uma pessoa muito importante pra mim pode estar machucado do outro lado dessa porta, então faça me um favor: pare de falar e derrube essa maldita porta!

― S-sim, senhorita.

O encanador dobrou seus joelhos de louva-deus, em seguida, saltou levemente no ar e impulsionou com os dois pés a porta do banheiro que se abriram de uma vez, deixando escapar uma névoa branca de dentro do cômodo para o corredor.

Assim que Gwen se aproximou, compreendeu a razão da porta estar presa. Fragmentos de gelo revestiam todo o interior do banheiro. A impressão que passava é que subitamente a temperatura daquele local alcançou níveis inferiores à zero graus célsius, congelando tudo ali instantaneamente. Mas infelizmente, sem sinais de Benjamin Tennyson.

Gwen olhou para o teto do cômodo e percebeu uma grossa camada de gelo revestindo a superfície acima de sua cabeça. Não bastou muito para ela entender o que aconteceu.

― Ben, seu garoto burro!

***

― Até daqui a pouco, pirralha ― disse Ben.

O jovem viu o corpo de sua prima se revestir de uma luminosidade irritante até se transformar numa silhueta luminosa. Em seguida, tal forma torceu-se num ponto único e desapareceu em pleno ar, deixando Ben no vazio de sua mente, sozinho.

O garoto olhou para os lados em direção à infinitude branca em que se encontrava.

― Desculpe, Gwen ― disse ele, ― mas eu menti.

Se fôssemos ser muito chatos com relação à palavra que ele usou; eu ― Narrador ― posso dizer que ele não mentiu, mas sim omitiu.

Sem ninguém para esconder seus pensamentos, Ben passou a simplesmente falar para si mesmo, deixando a mente para apenas no processamento dos fatos.

― Provavelmente foi no confronto com Albedo que tudo isso começou a desandar, mas não explica...

Ben olhou o relógio em seu pulso.

― Não explica todos os outros.

Subitamente toda aquela brancura tornou-se verde escura, com manchas pretas flutuando ao seu redor.

Inúmeras imagens de seu corpo sendo deformado começou a sumir e desaparecer em pleno ar. Num momento, seu rosto de criança preencheu-se de vasos proeminente e avermelhou-se, sua musculatura expandiu-se de forma monstruosa até que, por fim, dois novos braços emergiram a partir da altura de suas costelas.

Ben virou o rosto com a visão.

Em outra imagem, via suas mãos e braços secarem à nível esquelético, quando então sua cabeça gira no próprio eixo do pescoço, deformando-se numa caveira invertida de um olho só. Cada deformidade trazia consigo o som de ossos e ligamentos se rompendo.

Olhou para sua esquerda e outra imagem em que, de suas costas, dois pilares elétricos emergiam rasgando sua pele.

Olhou para a direita e a imagem de seu corpo se liquefazendo numa gosma quase o fez vomitar.

Caiu de joelhos e apoiou suas mãos no chão. Fechou os olhos e tentou se focar na lembrança de Gwen tentando lhe acalmar.

Inspire e expire... Inspire e expire...

Ainda de joelhos, abriu os olhos. As imagens ainda corriam ao seu redor. Lhe assustava perceber que muitas delas eram feitas a partir de uma versão mais jovem de si. De quando ele tinha dez anos de idade. De quando ele encontrou o Omnitrix.

Ben olhou para o relógio. Lembrou-se de Albedo, preso na forma de um constructo com a aparência de Ben.

―  Quem pode dizer que eu também não sou um constructo?

Afinal de contas, como eu posso ter sobrevivido a tudo isso?

― Já não sei mais dizer o quanto de Benjamin Tennyson ainda resta aqui...

As imagens então cessaram. O verde da paisagem tornou-se cada vez mais escuro até cobrir Ben numa total escuridão.

Novamente luz. Uma pequena fresta horizontal, mas era luz.

Ben abriu os olhos.

Acordou.

***

Com cuidado, Ben se afasta de sua prima adormecida e levanta da cama de hospital. Retirou de si os sensores dos aparelhos e fechou o registro do acesso venoso em seu braço.

Usando um ridículo avental de paciente, ele tomou o cuidado para não deixar suas nádegas à mostra. Reforçou o nó de sua roupa e seguiu em direção à televisão do quarto. Utilizando de métodos primitivos (pois não encontrou o controle), apertou o botão de ligar da tv e abaixou o volume até ficar um pequeno ruído de fundo no ambiente.

Antes de voltar para cama, parou junto a um pequeno suporte com uma bandeja e pegou o que seria seu jantar. Sua barriga não roncava, mas ele sentia-se vazio por dentro. Será que eles liberam alguma batata-frita com queijo?

Pegou o copo de suco, tirou a tampa e tomou um gole. Detestou o gosto. Incluir na lista de pedidos um milk-shake do Senhor Sorvete. Tomou outro gole e deixou o copo de lado. Tirou a tampa retangular da marmita e detestou o que viu. Comida saudável? Onde já se viu isso? Com o garfo pegou uma cenoura cozida e levou à boca. Até que não é tão ruim...

Ben olhou para sua prima que dormia sentada com a cabeça apoiada na cama. Não sabia nem como agradecer por todo seu esforço. Pensou em Kevin e no Vovô Max. Era grato pela família que tinha.

Mesmo baixinho, o som de “notícia urgente” chamou a atenção do jovem para a televisão. Aproximou-se para ouvir com atenção. A âncora do jornal começou a anunciar:

Temos nesse momento informações de pessoas sendo mantidas reféns no Central Park de Bellwood. Nosso helicóptero está sobrevoando o local nesse momento e trará mais detalhes. John Smith, está me ouvindo?

Sim, Mahala, ouço claramente.

Conte pra gente, o que está havendo no Central Park?

Testemunhas nos disseram que por volta de 15:40 da tarde, um grupo de espaçonaves surgiram sobrevoando o lugar. Em questão de instantes, cerca de trinta pessoas que passeavam e trabalhavam no parque foram capturadas e estão agora mantidas presas sob o poder dos sequestradores. Especialistas afirmam que é grande a possibilidade de se tratar de espaçonaves alienígenas, mas ainda não temos confirmação.

Ben olhou para as imagens aéreas que mostravam um grupo de pessoas mantidas reunidas num só ponto, próximo ao playground. Ao redor, naves triangulares circundavam os reféns e sobrevoavam os arredores disparando contra qualquer força de segurança que se aproximava.

― Muito obrigado, John ― disse a âncora ― E passamos agora para Analice Sierra que está no solo-

De repente a transmissão é interrompida.

― Mas o quê!? ― Ben olhou para sua prima pra conferir se sua fala não a acordou.

Uma imagem preta com um logo amarelo ocupa o espaço do telejornal. Uma voz metalizada passa então a falar:

Atenção portador da tecnologia galvaniana, apresente-se imediatamente nas coordenadas correspondente ao Central Park de Bellwood. Você tem uma hora. Depois desse período, um refém será executado a cada dez minutos terrestres até você se apresentar. Contagem iniciada.

A imagem então desapareceu, retornando para o rosto da âncora que de boca aberta mantinha-se em silêncio.

Ben olhou para seu pulso esquerdo por cerca de três segundos. Tempo mais do que suficiente para tomar sua decisão. Virou-se em direção ao armário em busca de sua roupa. Pensou em se trocar ali mesmo, mas pensou na possibilidade de sua prima acordar. Seguiu em direção ao banheiro mais próximo. Assim que abriu a porta do quarto, uma luz vermelha piscava no corredor. Não havia sirene, mas o sinal luminoso indicava aos trabalhadores da saúde ali presentes a gravidade da situação.

O jovem entrou no banheiro e fechou a porta atrás de si. Trocou-se de roupa e jogou o avental no chão ao lado. Pronto, e agora?

Ben levantou o braço e tocou no relógio. Suas mãos já começaram a tremer. O coração galopava ressoando em seus ouvidos.

E-eu... ― pensou ― Não! Eles precisam de mim!

Então pressionou o núcleo do Omnitrix.

Assim como ele já esperava, o relógio atravessou a barreira de sua pele e penetrou em seu braço como um parasita, irradiando uma dor lancinante.

Ben fechou os olhos e procurou respirar. Cada dor que lhe atravessava era acompanhada de um gemido baixinho e contido.

E então ele começou a tremer. Não pelo medo, mas pelo frio. Ben sentiu o ar ao seu redor começar a gelar rapidamente e seu corpo a perder calor numa velocidade absurda. Olhou para suas mãos e viu seus dedos arroxear e ficarem azul. Sentia que se tentasse mexê-los, poderia quebrá-los e perdê-los ali mesmo.

Sua pele como um todo tornou-se cianótica e, em alguns pontos, o frio foi tão intenso que se tornou uma mancha negra. O tecido subcutâneo de gordura reduziu-se bruscamente, tornando seus braços e pernas magros e esquálidos. Suas bochechas simplesmente desapareceram.

Com o frio, seus lábios começaram a rachar. Seus dentes tremiam cada vez mais. Seu corpo queimava de dor. Sentia-se enrijecido e com sua pele cada vez mais atrofiada.

Uma lágrima percorreu o lado direito de seu rosto e congelou antes mesmo de tocar o chão.

A íris de seus olhos expandiu-se e preencheu todo o globo ocular, tornando-se completamente verde. Seus lábios ressecaram e esfarelaram deixando a camada óssea dentária exposta à nível da gengiva. Seus dentes só pararam de tremer quando finalmente se fundiram um com os outros.

Ben emitia gemidos guturais do mais profundo sofrimento.

Puxou o ar e sentiu o frio lhe queimar por dentro. Sua coluna se expandiu aumentando sua altura e seus pés deformaram-se numa estrutura de dois dedos com um calcanhar proeminente.

Por fim, a pele de suas costas começou a crescer e espalhar ao seu redor como um enorme lençol cianótico. Em seguida, apêndices ósseos emergiram ao nível de suas escápulas e caminharam por dentro da pele em excesso, fixando os pontos e determinando a estrutura das asas.

Ben só queria se ver livre do sofrimento. Sem poder gritar, apenas exalava um ar de sofrimento gélido, revestindo o espaço de uma névoa branca.

O brilho da transformação finalmente se apaga.

Friagem apoia-se na pia e tenta se manter de pé. Seu corpo dói e sua cabeça se encontra atordoada com toda a agonia que acabou de passar.

Mas mais do que tudo isso: eu consegui.

Dane-se que poderia ser um constructo. Ele ainda era um herói e um herói está disposto a sempre se sacrificar pelo bem daqueles que ele protege!

Friagem torna-se intangível e voa em direção aos céus, atravessando o teto do banheiro.


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