Noturno escrita por EsterNW


Capítulo 3
São Paulo




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Castiel colocou o capuz da blusa sobre a cabeça, fechando o moletom e enfiando as mãos nos bolsos. Cumprimentou algumas poucas pessoas nos corredores, sendo capaz de ver Mirela parada em frente à porta dos fundos, os inconfundíveis cachos rosa visíveis ao longe.

— Já tão esperando por você lá fora — ela contou, desligando a tela do celular e guardando-o no bolso da calça. — Deve ter pelo menos umas vinte pessoas.

O guitarrista bufou e tateou o bolso em busca de alguma caneta para autógrafos.

— Eu conheço a saída dos funcionários, se você quiser — a baixista continuou a conversa. — Duvido que alguém vá te encher o saco por lá.

— Como é que você conhece esse lugar? — ele questionou surpreso, parando de passar as mãos por todos os bolsos disponíveis. Para completar, não tinha nada para assinar o que quer que fosse.

— Eu gosto de explorar os lugares. — Ela deu de ombros. Castiel fez a mesma coisa e deixou-se ser guiado para um corredor lateral alguns metros atrás. — Se eu fosse você, eu tiraria isso. — Mirela apontou para os óculos escuros no rosto do guitarrista. — Assim é difícil você passar despercebido em qualquer lugar.

Em um gesto que surpreendeu o cantor, Mirela tomou o acessório, colocando-o sobre os cabelos rosados.

— Mas você é abusada, hein? — Castiel disse um pouco irritado, no que a moça apenas riu, dando de ombros mais uma vez.

Não foi preciso caminhar muito para logo atingirem uma pequena porta metálica. A baixista empurrou, dando espaço para o ruivo passar.

— Boa sorte e aproveite a cidade — desejou com uma certa ironia. — Falando nisso, cadê os outros integrantes da sua banda?

— Inventaram de fazer um after de novo, parece que não podem ficar um dia sem festa — ele reclamou, fazendo a moça dar uma gargalhada sonora. — Mas e você? Do hotel pra casa de shows e depois pro hotel, vai nem conhecer Sampa? 

— Ninguém da banda conhece São Paulo, vamos fazer o que? — Ela deu de ombros pela terceira vez em menos de dez minutos, deixando o rapaz surpreso. Mais pela fala do que pelo gesto.

— E vocês vieram da onde por acaso? Do meio do mato? — provocou, fazendo a moça franzir as sobrancelhas em irritação. — Até meu amigo do interior sabe andar por aqui. — Riu-se, lembrando-se de Lysandre em sua pequena fazenda. Bons tempos.

— Não é isso não! — ela exclamou em uma tentativa de defesa. — Nós somos do interior do estado, só não tínhamos vindo pra capital antes.

— Dá pra perceber pelo sotaque — ele provocou outra vez, fazendo com que a baixista fechasse a cara e começasse a dar as costas. — Quer dar uma volta pela Paulista? 

Mirela parou antes de dar dez passos, girando nos calcanhares e encarando o ruivo de volta.

— Pra fazer o que?

— Andar. — O guitarrista inventou, não parecendo convencê-la. — Tem um monte de coisa aberta ainda, vai saber o que a gente acha.

Mirela encarou-o com os olhos castanhos, deixando Castiel com vontade de contar quantas sardas ela tinha espalhadas pelo rosto. Antes que começasse, Mirela se manifestou novamente:

— Olha o buraco que você vai me meter — alertou, deixando claro que ia com ele. — Só vou avisar os outros pra voltarem sem mim.

Enquanto Mirela pegava um celular para mandar uma mensagem no grupo da Silver Chain no WhatsApp, Castiel fechou a porta metálica, os dois saindo do interior quente da casa de shows.

— Você fala de mim, mas e você? É da onde? — a baixista questionou, ambos saindo do estabelecimento pela lateral.

Alguns postes da via sequer acendiam, dando a escuridão como camuflagem para os dois passarem despercebidos. Na parte de trás, os fãs ainda esperavam pacientemente por qualquer integrante da Crowstorm cruzar a soleira da porta.

— Sou da Zona Oeste, vivi aqui a vida total — Castiel respondeu despreocupado, colocando as mãos nos bolsos da calça.

Poucas pessoas andavam pela rua àquela hora e, abaixando um pouco a cabeça com o capuz ainda tampando os cabelos ruivos, o guitarrista poderia se esconder de possíveis fãs que ainda transitassem por ali.

— Só eu sou a caipira, então.

— É você mesma que tá dizendo que é caipira — ele rebateu, fazendo a moça torcer o nariz. Ambos acabaram compartilhando uma rodada de risadas juntos.

Quanto mais deixavam a casa de shows para trás, mais as ruas iam tomando forma de veias de uma cidade grande. 

— Tá aí — Castiel anunciou após poucos minutos. — A Avenida Paulista.

Mirela capturava as imagens com seus olhos castanhos, levantando e abaixando a cabeça para olhar os céus e os arranha-céus que, dali de baixo, pareciam mesmo que poderiam tocá-los.

São Paulo pulsava como a cidade grande que era. Os prédios negros na noite, pontuados por algumas luzes acesas, sendo tocados pela sinfonia que nunca parava, com buzinas, carros, conversas e música. Ali em baixo, as pessoas caminhavam pra lá e pra cá. E também faziam música por si mesmas.

— Pensei que os músicos só tocassem na rua no final de semana — Mirela comentou quando passaram por um homem no violão e uma mulher que cantava alguma canção em espanhol, provavelmente do país de origem do casal.

— Sempre tem — Castiel respondeu e os dois se aproximaram mais para assistirem a apresentação. — São músicos de rua, sempre tão aqui. 

Após a breve explicação — sucinta como qualquer informação que viesse do ruivo —, ficaram em silêncio, apenas admirando um pontinho de música na sinfonia da capital paulista. 

Quando a canção terminou, aplausos soaram do pequeno grupo de pessoas que assistia ao casal. Mirela fez igual algumas delas e colocou uma nota de dois reais dentro do chapéu que o homem passava pelos espectadores.

— Quer andar mais ou vai ficar só por aí mesmo? — o guitarrista convidou daquele jeito dele e deixaram o casal para trás, retornando para sua atividade anterior, de ser uma pequena parte na grande sinfonia.

— Dá pra gente ir até o final da Paulista? — Mirela questionou, seus olhos analisando atentos inúmeros bares e restaurantes com as portas abertas e as mesas lotadas do lado de fora.

Quando alguns comércios fechavam durante a noite, era a vez de outros abrirem. A cidade nunca parava. 

— Se tiver disposição de andar uns 3km, vai em frente — ele respondeu de forma engraçadinha, dando um sorriso de canto e vendo a baixista unir as sobrancelhas, a testa franzida. Era interessante a expressão irritada da garota. Ela não revirava os olhos, como algumas pessoas faziam. — Porque eu vou ficar por aqui.

Apontando com a cabeça para o lado, entraram em um dos tantos bares na avenida. O guitarrista deveria ser familiarizado com o estabelecimento, pois conseguiu facilmente caminhar por entre as mesas até encontrar uma vaga. 

— Então pra que me convidou, se você vai parar por aqui? — Mirela soltou, sentando-se na cadeira de frente para o cantor.

— Eu disse que ia te mostrar a Paulista, não disse? — Enquanto falava com ela, Castiel ainda fez um sinal para chamar o garçom, que atendia outros clientes. — E eu fiz.

A baixista cruzou os braços, naquela mesma expressão que o vocalista achou interessante instantes atrás. Ela sequer bufou. 

— Eu te pago uma cerveja. — Ele tentou convencê-la quando viu que o garçom estava se aproximando deles.

Mirela descruzou os braços, deslizando-os pelo colo, dando-se por vencida.

— Quero se você me pagar um chopp.

Dando de ombros, Castiel apenas fez o pedido dos dois, vendo o garçom ir embora. Quando isso aconteceu, as conversas dentro do bar foram interrompidas por uma gritaria de alguns e reclamações e caras feias de outros.

— Tá tendo jogo? — Mirela questionou, analisando o ambiente do estabelecimento e vendo uma TV presa em uma das paredes, onde todos prestavam atenção. Ou pelo menos aqueles que não comemoravam e abraçavam os outros.

— É da Libertadores — Castiel explicou, cruzando os braços sobre o peito e fazendo o mesmo que todos, agora que pararam as comemorações, assistindo a TV. — Por que você acha que eu vim até aqui? — questionou com um sorriso de gente travessa.

Mirela riu, compreendendo toda a situação. 

— Não acredito que me deixei passar a perna assim. — Ela também olhou para a TV. — Não sabia que você também torcia pro Palmeiras.

— Aqui é Corinthians desde criança, garota! — o guitarrista exclamou, quase como se fosse um insulto ser confundido com um torcedor do outro time.

— Estamos em lados opostos dessa vez… — Antes que a baixista dissesse qualquer coisa mais, foi a vez dela e de todos os outros palmeirenses dentro do bar explodir em comemoração após um gol.

Aquela seria uma longa noite para os torcedores dos times rivais… Castiel e Mirela, é claro, estavam inclusos. 


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Notas finais do capítulo

Quem diria, Castiel gente como a gente xD
Até mais, povo o/



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