Correio Elegante escrita por Sirena


Capítulo 6
Primeira Correspondência e Sexta Carta


Notas iniciais do capítulo

Muito obrigada a Isah Doll e Joshua de Vine pelos comentários ♥



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/787543/chapter/6

Sentei na cama, usando um caderno para apoiar a folha de canson em que estava para escrever, eu tinha desenhado linhas nela com um lápis e assim que acabasse de escrever iria passar a caneta por cima e apagar as linhas. Semicerrei os lábios pensando.

Reli as cartas que tinha recebido nos últimos anos, buscando ideias. Eram tantas, tantas coisas para responder...

Encostei a ponta da caneta no papel e comecei a rascunhar, quando a reli, risquei várias frases, mudei várias palavras e troquei alguns parágrafos de lugar, até me dar por contente. Quando fiquei satisfeito com o resultado, comecei a passar a limpo, escrevendo devagar tentando forçar uma letra minimamente bonita.

“Você também se sentiu estranho na primeira vez que me escreveu?

Porque eu estou me sentindo muito estranho... Veja bem, eu vou sair da escola. Esse vai ser o último ano em que receberei suas cartas. Um amigo então me deu a ideia de escrever e tentar te responder... Decidi que é algo que você merece.

Eu não faço ideia de como é sua aparência, não tenho uma mínima pista sobre seu rosto, nem consigo imaginar quais são seus gostos. Qual sua cor favorita? Seu filme predileto? O livro que mais gosta? Que musicas você mais escuta? Perguntas intensas que revelariam muito sobre você, mas para as quais eu não tenho resposta nenhuma.

Tudo que eu sei é que você sempre esteve aqui, desde que entrei na escola você se faz presente através dessas palavras bem escritas que me envia, seus elogios bem pensados no melhor estilo Don Juan... Você sabe fazer alguém se encantar com palavras.

Enfim, eu não tenho realmente muito que dizer, além do fato de que você merecia saber que estou para sair da escola e o quanto escreve bem.

E no entanto, parece ter tanto que eu devia falar sem saber como pronunciar, nem em português e nem em espanhol. Só o que posso dizer, é que se há algo nesta escola que eu com certeza sentirei falta, são suas palavras."

***

Escrever a carta foi difícil, mas ainda assim, foi mais fácil do que tentar explicar para a Adriana.

— Por que acha que eu sei pra quem entregar? – ela arqueou a sobrancelha. — Você sabe quantas cartas eu entrego todo ano? Trabalho tanto quanto um duende do Papai Noel na véspera do natal! E todas as outras coisas que eu tenho que fazer nesse lugar...

Tentei acompanhar os passos apressados da Adriana pelo pátio enquanto ela ia entregar provas recém-impressas em diversas salas. — Nana, por favor!

— Você devia estar na sala! – ela bufou, os olhos fixos em algum ponto na parede oposta. — Não tem prova não?

— Só nas últimas aulas. Por favor, Adriana, eu te imploro! – em um ato desesperado, me coloquei de joelhos na frente dela.

A Adriana arqueou ambas as sobrancelhas e cerrou os lábios como se tentasse não rir da situação completamente desgraçada na qual eu me encontrava.

— Você quer que eu entregue uma carta pra uma pessoa que você não conhece? Isso é loucura, tá sabendo, né?

— To sabendo. – garanti.

Ela deu um longo suspiro antes de tirar a carta da minha mão. — Tá, vou ver o que posso fazer. Mas, não fique muito esperançoso!

— Tá bom!

***

Depois do lanche, enquanto a sala ainda estava uma enorme bagunça, a Adriana entrou, sem roupa de festa junina, apenas com pintas desenhadas na bochechas e os olhos com umas vinte camadas de maquiagem e rímel. A professora ainda não tinha entrado na sala, então ela foi bem breve.

— Gabriela, Pedro, Paulo e David.

Como a sala ainda tava bagunçada, ninguém deu atenção pra ela e continuou conversando. Adriana chamou mais duas vezes e como continuou sendo prontamente ignorada. Então, ela pegou o apagador da lousa e começou a batê-lo contra a palma da mão. Os ventiladores estavam ligados, fazendo o pó de giz se espalhar rapidamente pela sala, atacando a rinite de muitos e a alergia dos outros.

— Ou, tá maluca Adriana?

— E você tá surda, Laissa? To aqui faz tempo e tenho mais o que fazer, agora quem tiver carta pra pegar, venha logo pegar. Gabriela, Pedro, Paulo e David, aqui e agora!

Arregalei os olhos, totalmente pego de surpresa pelo estresse da Adriana, mas, ignorei me focando no desenho de palitinho que estava fazendo atrás do caderno. Uma família inteira de palitinhos, com um cãozinho de palitinho e um gatinho de palitinho.

Tava ficando bem fofo.

— Recebeu carta de quem? – perguntei pro Paulo quando ele se sentou ao meu lado, logo depois de receber um pescotapa da irmã. Ele olhava para o envelope fazendo cara feia.

— Gabi.

— Gabriela? A nossa Gabriela?

— Aham.

— Você gosta dela?

— Se eu gostasse, não estaria fazendo careta, Marcos!

— E como vai dar um fora nela? Ela é nossa amiga!

— Vou pensar nisso depois de abrir a carta e confirmar que é uma carta de amor. Não tem umas garotas que fazem carta para os amigos? Vai ver é isso. – ele murmurou enquanto abria a carta, parecendo nervoso. — Eu não sei dar fora, então não pode ser uma declaração! De verdade, não pode!

Gargalhei, achando graça de seu desespero.

***

No dia seguinte, Adriana passou na última aula em nossa sala. Era o ultimo dia do correio elegante e eu estava roendo as unhas, ansioso pra saber se o Quinze tinha recebido minha carta e se a teria respondido. Só a ideia já me dava arrepios.

— Com licença, professora! – ela estava mais calma hoje, apesar do olhar cansado. Não se deu nem ao menos o trabalho de fazer uma maquiagem temática e trazia as cartas na mão como quem traz um monte de giz. — É rapidinho!

— À vontade. – a professora de inglês sorriu, gentil.

— Marcos e Gabriela. – ela chamou tentando forçar uma voz animada enquanto nos oferecia as cartas.

Não me dei nem o trabalho de disfarçar a animação enquanto pegava o envelope de folha de caderno com adesivo da Tinker Bell, os mesmos números escritos como remetente. A folha em que a carta estava escrita era verde e a caneta era cor-de-rosa.

O Paulo observava com sobrancelha arqueada e as bochechas vermelhas.

— Ele mandou outra carta?

— Mandou. Eu mandei uma pra ele também... – mordi os lábios, tentando controlar minha respiração, ele deu risada, sorridente. — Ai, merda! Eu to soando como uma menina de doze anos, não to?

— Tá. – ele concordou, mexendo no cabelo. — O que tem aí? Posso ler?

Hesitei, olhando do Paulo para a carta e da carta para o Paulo umas três vezes antes de negar com a cabeça.  — Pessoal demais.

— Tá bom.

— Como ficou a carta da Gabi? - perguntei, hesitante. Ele fez careta apontando para o outro lado da sala, onde a Gabriela lia a carta que tinha recebido quase chorando.

— Eu escrevi uma resposta pra ela. Dar um fora por escrito é mais fácil do que falado. Tentei ser gentil. Mas, não sei como ela vai reagir... - ele explicou, começando a roer as unhas. — Eu conheço a Gabi desde que era criança, não quero que as coisas fiquem estranhas.

— Bom, logo você descobre como vai ficar. - opinei.

Me voltei para o papel em minhas mãos. Tinha duas folhas verdes dentro do envelope, à primeira tinha escrito bem no meio: “Se prepare para uma dose de drama.”

Franzi a testa, mas respirei fundo tentando me preparar para o que quer aquilo quisesse dizer enquanto ia até a carta realmente.

“Os céus se encheram com as cores do ano-novo, as flores desabrocharam e os oceanos se ergueram em alegria. Eu nunca, jamais, nem nos meus mais lindos e belos sonhos, poderia imaginar que algum dia você viria a me enviar uma carta! Estou até chocado por isso ser possível. Como você conseguiu isso afinal? Pensando bem, não importa, eu já sei e a resposta é de fato muito simples: Suas capacidades estão além da minha imaginação!

E sim, eu fiquei nervoso na minha primeira vez que te mandei uma carta. Não sabia o que dizer e o que você acharia, tive medo da sua reação e tive ainda mais medo quando fui escrever a segunda, pois, você pode não recordar talvez, mas, sua reação com a primeira não foi das melhores.

E embora eu tenha ouvido você falando para seus amigos que sairia da escola, fico muito tocado por ter se preocupado em me contar você mesmo.

Sua comparação entre mim e Don Juan também massageou meu ego, cariño. E mais ainda: estou profundamente tocado e deliciado por sua declaração, afirmando que sentirá minha falta, especialmente porque eu também a sentirei. Profundamente, enlouquecidamente e insaciavelmente.

E como meus gostos pareceram deixá-lo tão curioso, deixe-me satisfazer suas duvidas. Verde é minha cor favorita; vai soar bobo, mas meu filme favorito é Hércules, da Disney; não tenho um livro preferido, mas, estou começando a ler as sagas do Rick Riordan e estou apaixonado; e a música que mais ouço atualmente é Velha Infância (sim, aquela musica de novela do SBT), mas, normalmente escuto mais pagode ou qualquer outra coisa que estejam escutando aqui em casa.

Espero que consiga por em palavras as coisas que tem para dizer-me, mi hermoso, pois adoraria lê-las. Estou ciente que o correio elegante está chegando ao fim, mas, se por acaso desejar me escrever mais, porque sou esperançoso o bastante para acreditar nisso, ninguém usa os armários da escola e eles estão sempre destrancados. Vivo guardando minhas coisas lá quando não tem ninguém olhando. Caso deseje me escrever mais, pode colocar as cartas no armário P1. Podemos fazer dele nossa caixa de correio. Nosso próprio correio elegante para o ano inteiro.

Com todo meu carinho, minha surpresa e meu êxtase para você, Soldeville."


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Pensa numa carta melosa essa ksjkghk ai amo ♥ ♥
Qualquer erro me avisem.
Beijosss



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Correio Elegante" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.