V E N U S - Origin (Segunda Temporada) escrita por badgalkel


Capítulo 11
2.10 Epílogo




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Sob o pôr-do-sol, sendo aquecidos pelos últimos raios solares dos sols de Asgard, o grupo de pessoas superdesenvolvidas se reuniam ao redor do interruptor dourado que os concederia a passagem para a Terra assim que acionado pela espada Hofund que Heimdall empunhava em mãos.

As despedidas não seriam muito longas e sequer precisavam ser prolongadas, visto a falta de proximidade entre eles. Os Eternos apenas acenaram a cabeça aos demais, mas Harriet sentiu a necessidade de andar até Richard e abraça-lo.

— Muito obrigada! – ela disse apertando-o com fervor. – Eu não teria conseguido sem você.

— Foi só uma mãozinha, - ele deu de ombros, modesto, quando se afastaram. – tenho certeza que daria um jeito com ou sem mim.

Ela sorri.

— Algum conselho para alguém que está longe da Terra há quase cinquenta anos?

Richard franze a testa pensativo e de repente arregala os olhos com ar risonho quando conclui: - Cara, muita coisa mudou de lá para cá! – ele suspira. – Mudanças boas, claro. Mas rapidamente você se adapta à elas.

Harriet assente.

— E quando seremos agraciados com o seu retorno, mesmo? – ela questiona divertida.

— Já está com saudades? – Richard rebate, arrancando risos dela. – Eu sei que sou marcante, mas mal nos conhecemos.

Ela empurra-o levemente pelo ombro em meio à sorrisos.

— No entanto, claro, se você estiver interessada em encontros casuais quando eu retornar não tenho como recusar. – ele continua, vendo-a corar levemente. E mirando Callisto, que os observa atentamente, ele completa – Assim terá um namorado de verdade.

O soberano revira os olhos irritado, dando as costas aos dois, e Harriet morde os lábios para evitar rir novamente.

— Detesto te decepcionar, Richard. – ela diz. – Mas já tem alguém me esperando lá na Terra. – e adianta-se em completar com a testa franzida – Pelo menos espero que ainda esteja.

— Se este cara tiver dado bobeira e arrumado outra, ou estiver mais velho que uma múmia, me deixe saber que com certeza eu vou atrás de você. – o rapaz diz e sela um beijo na bochecha quente de Harriet antes de se afastar.

Por um instante ela tende a refletir sobre o que ele havia lhe dito, mais sobre o que poderia ter acontecido na vida de James do que sobre a proposta. No entanto prefere espantar os maus pensamentos e deixa-los para depois. Em questão de poucos minutos ela saberia, afinal. Não seria inteligente sofrer por antecedência.

Logo ela vira-se para Callisto, que está há poucos passos de distancia, e se aproxima vagarosamente.

— Eu sei que o que fiz foi errado e absurdamente egoísta. – ele pronuncia sentindo a presença dela cada vez mais perto. – Mas meu coração não deixa de desejar que tivéssemos ficado verdadeiramente juntos no final. – ele adianta-se em esclarecer: - Como Harriet e Callisto, não como Vênus e Callisto.

O soberano levanta o rosto e revela os olhos úmidos.

— Eu não poderia. – ela murmura. – Tudo o que aconteceu não poderia ser apagado a modo que pudéssemos ficar juntos. Há muita mágoa e traições imperdoáveis.

— Eu sei. – ele sorri tristonho. – E sei que não importa quantas desculpas eu te peça, nunca serão suficientes. Mas, me desculpe.

Harriet engole em seco.

— Talvez se eu fosse de um mundo diferente, de uma cultura diferente e não tivesse a machucado tanto... – ele se interrompe prensando os lábios um contra o outro. – Se eu tivesse tido tempo suficiente para aprender mais com você...

— Poderia ter sido diferente. – ela assente com um sorriso fraco.

— Estou profundamente arrependido. – ele admite. – Só não de ter-te trago de volta, claro.

— Você não é como eles. – Harriet toca em sua mão. – Você sempre foi mais... Humano, por assim dizer. – ela sorri acariciando as costas de sua mão com o polegar. – E por isso eu sei que pode guia-los a ser melhores, assim como você mesmo será melhor com o passar do tempo. Eu tenho fé em vocês. Principalmente em você, Callisto.

Ele sorri e abaixa o olhar para a mão de Harriet pousada sobre a sua. Ele respira fundo e afasta a própria mão da dela para puxar um cordão de couro que está ao redor de seu pescoço e revelar o que ele havia guardado por todos esses anos.

Harriet cobre a boca com as mãos em surpresa quando o anel surge na extremidade do cordão. O mesmo anel com a pedra vermelha que havia recebido de James, ao que parecia, há uma vida.

— No dia em que Ayesha te encontrou ela ordenou que tudo o que havia sido encontrado com você fosse dizimado, para que não pudesse vir a ter lembranças de casa. – ele revelou desfazendo o nó do cordão para tirar o anel de lá. – Um dos tripulantes da nave achou o objeto bem interessante e decidiu por guardar ao invés de cumprir com a ordem. Havia achado o anel curioso.

Callisto pega a mão de Harriet e pousa o anel na sua palma.

— Há anos eu o vi usando no dedo e soube que seria seu, não temos pedras assim em Sovereign. – ele revela. – Ele cobrou uma fortuna para me entregar, barganhar não foi uma opção.

Harriet pega o anel, admirando a pedra que ainda reluzia e logo encaixa-o no dedo a qual sempre pertenceu.

— Você realmente pensava em me trazer de volta todo esse tempo, não é? – ela questiona o rapaz com a voz fanha.

Callisto assente.

— E sabendo que você iria embora assim que retornasse, queria ter algo para me lembrar de você. – ele indica o anel. – Mas deve ser de muita importância para você, por isso não me dou esse direito.

Harriet sorri, permitindo que finalmente algumas das lágrimas que estavam presas em seus olhos escorressem e abraça Callisto. Inicialmente ele se pega sem reação, surpreso pela atitude dela, mas logo fecha os braços ao seu redor.

Eles ficam por alguns instantes abraçados, mas o pigarrear de um dos espectadores os fazem se afastar.

Ela mira Heimdall, que já está com a espada a postos, e torna a se virar para Callisto.

— É bem vindo para me visitar na Terra, se quiser. – ela diz sorrindo. – Adeus, Callisto.

— Adeus. – ele sopra em resposta, observando-a se afastar e se juntar ao circulo em volta do interruptor, Heimdall e sua espada.

— Todos prontos? – o profeta questiona.

— Sim. – os eternos respondem em coro.

— Sim. – Harriet murmura entre sorrisos e o coração batendo em uma velocidade alucinante. Não acreditava que estava finalmente indo para casa.

Heimdall gira a espada no interruptor e uma forte luz colorida os puxa para baixo, em uma pressão espantosa. Eles caem, e Harriet consegue notar as cores do arco-íris ao seu redor, em um túnel que os encaminhava em alta velocidade em direção ao seu destino.

Seu estômago revirava e ela sentia calafrios pela intensidade da viagem, desta forma prendeu a respiração e fechou os olhos com força. Desmaiar não era uma opção.

—x-

Terra, Via Láctea.

2002

Mais cedo do que esperava Harriet sentiu o chão abaixo de seus pés e soltou o ar preso para puxar aquele oxigênio que tanto sentira falta para dentro de seus pulmões.

Ansiosa ela abriu os olhos e constatou à sua frente um campo de grama verde cercado por pinheiros altíssimos e um lago de águas cristalinas - não muito distante, o céu completamente azul e límpido, e o sol reluzente sob suas cabeças, que nada aquecia, pois o clima estava estupidamente gelado com o vento frio ricocheteando os seus cabelos.

Harriet ajoelha-se para pousar suas mãos sob a grama levemente úmida e fria e tem que controlar o choro que sobe a garganta pela emoção que era finalmente retornar.

— Doutora Stark? – a voz de Sersi a chama.

Harriet limpa os cantos dos olhos umedecidos rapidamente e se levanta para girar nos calcanhares e virar-se em sua direção.

— Sim?

— Vamos, ainda temos que andar mais um pouco para chegarmos a Olímpia. – ela diz apontando para a montanha há alguns quilômetros de distancia.

Aquele certamente era o Monte Olimpo, ela reconhecia aquele pico alto e famoso o qual tanto desejou visitar quando ainda jovem. As rochas serviam como escadas para o céu e o topo estava coberto pelo manto branco que era a neve. Quem diria que as histórias estariam certas, realmente deuses viviam por ai.

— Então vocês se escondem na Grécia. – o comentário escapa de sua boca e Sersi ri.

— Olímpia fica no cume da montanha, para que os humanos não possam nos encontrar com facilidade. – ela informa – É afastado do mundo da superfície para que possamos aprimorar os nossos poderes e vivermos em paz.

Harriet esfrega aos braços e se abraça, havia esquecido como podia ser fria a temperatura com a presença da neve.

— Vamos, Zuras está ansioso para te conhecer. – Sersi a chama animada e Harriet suspira.

— Eu adoraria conhecer quem quer que seja esta pessoa que você falou, mas... – ela umedece os lábios – eu realmente quero ir para casa.

O sorriso no rosto de Sersi diminuiu gradativamente e ela procura nos outros eternos apoios com os olhos.

— Agradeço por sua ajuda, mas preciso saber como estão meu irmão, meu noivo, meus amigos... – Harriet insiste, antes mesmo que eles tentassem a convencer. Ela só queria ver sua família.

O silêncio toma o lugar entre os cinco, somente o chiado do bater de asas de aves que voavam por ali ou aqui o interrompe.

Harriet poderia simplesmente sair andando, mas não queria ser ingrata e parecer uma má agradecida por eles terem saído de seu conforto para ajuda-la.

— Conte á ela logo ou eu contarei. – Ikaris diz à Sersi antes de virar-se e começar a caminhar na direção da montanha.

Sersi olha para Thena e Makkari que apenas assentem uma vez e tomam o caminho atrás de Ikaris.

Sersi se aproxima cuidadosamente de Harriet com o semblante sério, era a primeira vez que ela presenciava tal seriedade do rosto da mulher.

— Me contar o que? – Harriet indaga, a preocupação crescente em sua voz.

Sersi enlaça o braço no dela e sorri tristonha.

— Vamos dar uma volta? – a eterna questiona e não dá oportunidade para Harriet negar, em vista que começa a caminhar assim que sua boca se fecha. Elas seguem na direção contrária a montanha, adentrando o meio dos pinhais.

Enquanto andam pelo meio da floresta de pinheiros inúmeras possibilidades correm pela cabeça de Harriet, que está cada vez mais ansiosa, no entanto sabe que a mulher não dirá nada até chegarem onde quer que elas estejam indo.

Sersi para em uma clareira no meio da floresta, repleta de flores das mais diversas cores e formatos, e com a sua telecinese tira do alto de um dos pinheiros uma mochila preta, desbotada e empoeirada que estava escondida entre os galhos. Quando a mochila aterrissa na frente de ambas as mulheres Harriet levanta os olhos com ar de questionamento à Sersi.

— Aqui tem algumas roupas dos humanos. – ela revela ao agachar e abrir a mochila – Não podemos ir à cidade desse jeito. – e indica os trajes que elas estão vestindo.

Harriet solta o ar de forma pesada e explode: - Não, eu não vou á cidade com você! Não vou a lugar nenhum ao menos se me disser o que tem para dizer logo.

Sersi engole em seco e levanta-se para mirar Harriet diretamente nos olhos.

— Não posso simplesmente te contar isso, tenho que te mostrar. – e empurra algumas roupas na direção de Harriet.

Harriet segura o olhar no de Sersi por um tempo, mas logo se dá por vencida e bufa alto tomando as roupas de sua mão.

Elas se vestem em silêncio e viradas de costas uma a outra.

Quando já trocadas da cabeça aos pés Sersi torna a esconder a mochila no topo do pinheiro e estende a mão para uma Harriet distraída, que estranhava a modernidade da roupa que vestia. Calças jeans apertadas, uma camiseta preta escrito Nirvana em letras amarelas sob o peito, botas de couro de cano baixo e uma jaqueta igualmente jeans.

— Você vai ter que confiar em mim. – Sersi pronuncia, fazendo Harriet perceber a mão estendida.

— E eu lá tenho outra escolha? – ela indaga e segura a mão da mulher.

Em menos de um minuto a imagem do lugar que estão ao redor delas é trocada brutalmente. Rodeadas por um campo magnético de luz verde, elas estão agora em uma viela pequena e apertada, cheia de sacos pretos de lixo e malcheirosa. O campo desaparece.

Harriet gira em seus calcanhares e corre os olhos ao seu redor, as paredes de pedra rústica e brancas denunciam que elas ainda estariam na Grécia. A mulher caminha até a saída da viela e constata uma rua de pedras sob os seus pés e várias casinhas típicas gregas preenchendo-a até o final.

— Estamos em Atenas. – Sersi revela atrás de Harriet.

— Você... nos teletransportou? – Harriet questiona abismada virando-se para ela.

— Este é um dentre os meus inúmeros dons. – Sersi sorri.

— E o que viemos fazer aqui?

Sersi aponta uma das casas de pedra atrás de Harriet, na placa lia-se Cyber Café e a mulher observa o local mais atentamente.

Na calçada, ao lado de fora, estavam algumas pessoas sentadas nas mesas de madeira redondas com copos de plástico em mãos e conversando animadamente, uma ou outra mexia em um aparelho pequeno cheio de botões com uma tela minúscula que projetavam imagens diversificadas. Pelas janelas de madeira abertas ela podia observar o interior do local. Assemelhava-se a uma cafeteria, mas estava repleta de caixas tecnológicas sob as mesas que também projetavam imagens vivas e claras dispostas para o uso dos clientes.

Ela pode sentir o cheiro de café à distância e sente seu estômago roncar. Já havia passado um longo tempo desde que fizera a sua última refeição e ela imediatamente ansiou por qualquer coisa dentro daquela cafeteria.

Elas adentram o local, não atraindo a atenção de nenhuma das pessoas ao seu redor. Sersi segue para o balcão principal com Harriet em seu encalço e começa a conversar com a senhora de cabelos grisalhos e sorriso simpático enquanto Harriet observava os diversos doces e salgados dispostos atrás da vitrine.

Logo que finalizado o pedido a senhora agilmente se encaminha até a máquina industrial de café atrás do balcão, aciona alguns botões, e a deixa trabalhando enquanto colocava dois bolinhos em pratos de porcelana e oferece à elas.

Assim que o café ficou pronto a senhora despejou com habilidade nos copos de plástico, os tampou e entregou às duas. Sersi agradece à senhora, equilibrando bolinho e café sob uma mão para entregar algumas notas à senhora. Em seguida a eterna indica à Harriet uma mesa lateral, e elas seguem até a mesma.

Elas se sentaram e Harriet não hesita em rapidamente dar a primeira mordida no bolinho, que ela constatou ser de chocolate, e tomar um gole do melhor café que já havia provado. Sersi sorri com a ferocidade do ataque de Harriet à comida, mas nada comenta.

Enquanto comia Harriet nota que uma das caixas tecnológicas está disposta na mesa em que elas estão sentadas e de perto percebe não ser uma caixa, concluindo que assemelhava-se mais à um livro ultrafino, só que de ferro.

Sersi, ao perceber o olhar curioso de Harriet ao objeto, o posiciona na frente da mulher e o abre revelando uma tela reluzente frontal e diversos botões com letras e números acoplados à ela. Ela podia ter uma ideia do que era, mas na dúvida questiona Sersi: - O que é isto?

— É um Macbook.

— Parece um computador, mas... – ela olha a parte de trás do aparelho. – está faltando muitas partes.

— Isto é um computador. – Sersi ri. – É o computador moderno. Eles reduziram o tamanho, mas cabem muito mais informações. Por ele nós podemos pesquisar qualquer coisa e as informações aparecem em nossa frente em questão de segundos.

— E estas informações são verídicas? – Harriet indaga claramente interessada.

— São sim. – Sersi afirma.

— De onde são tiradas? – questiona com curiosidade.

— De livros, jornais, a internet...

— Internet? – indaga com a face distorcida em confusão.

— Certo, como vou te explicar isso? – Sersi indaga para si mesma. Ela umedece os lábios demoradamente e volta à Harriet: – A internet é uma rede mundial a qual pessoas no mundo inteiro têm acesso. É por ela que as pessoas se comunicam de forma rápida, trocam informações, noticiam acontecimentos e assim por adiante.

Os olhos da humana brilham de fascínio.

— Os humanos são incríveis. – Harriet sorri admirando o minicomputador à sua frente. – e eu achando que os alienígenas eram mais desenvolvidos que nós.

— Cada um é desenvolvido do seu jeito. – Sersi dá de ombros. – Em algumas áreas eles são sim mais desenvolvidos que nós.

— Incrível. – Harriet sorri e olha ao seu redor, notando novamente uma das pessoas mexendo no aparelho pequeno em suas mãos. Ela se adianta em perguntar à Sersi: - E o que é aquilo ali?

— Aquilo é um Black Berry. – Sersi explica. – É um celular, como se fosse um telefone, mas ele tem muito mais funções que os de antigamente. Tira fotos, manda mensagens instantâneas, faz ligações entre outras coisas.

— Fantástico. – elogia fascinada.

— Bom, Harrie... – Sersi chama a sua atenção, desta vez com a expressão séria de volta ao seu rosto. – O que eu queria te mostrar, na verdade...

Sersi senta na cadeira ao lado de Harriet cuidadosamente e puxa o computador levemente para o seu lado, clica em um dos lugares da tela e no teclado digita rapidamente: Acidente Howard Stark.

Imediatamente Harriet sente seu coração gelar e o chão abaixo de seus pés sumir. O falatório ao seu redor se torna silêncio e de repente ninguém além dela e a tela à sua frente estão presentes. No instante seguinte diversas imagens e palavras aparecem na tela do computador sob seus olhos.

Ela mal consegue ler, o marejo de suas lágrimas embaçavam as palavras e não a permitiam compreender. No entanto ela sabia o que aquelas manchetes diziam, a foto de um carro batido contra uma árvore deixara bastante claro.

Harriet deixa o copo de café cair no chão.

— Eu sinto muito. – a voz de Sersi pronuncia distante e abafada.

—x-

Atenas, Grécia.

2010

Nas noites de sexta-feira o bar Lancadona, que fica em uma das ruas mais movimentadas de Atenas – a Rua Ipitou –, recebe diversos turistas e não há um instante em que suas mesas não estejam cheias e o bar completamente lotado, seja pela bela música ao vivo, a bebida ou os petiscos tradicionais gregos que eram servidos.

O bar conhecido pela região como o mais animado de todos, permanece aberto até o horário da manhã do outro dia devido à grande demanda de turistas e frequentadores assíduos que se negam a encerrar a diversão antes das sete AM.

Jorge, que é um dos responsáveis pela supervisão do famoso bar, está a fechar as portas de madeira com o sol quente batendo em sua face quando se depara com uma mulher sentada desajeitadamente em uma das banquetas no balcão do barman.

O bar estaria completamente vazio se não fosse por ela. A moça está com os cotovelos apoiados no balcão e tem uma caneca de vidro à sua frente, com um resto de cerveja quente no fundo do recipiente.

Gregory, o barman, está a secar os copos de vidros usados para os drinks com um pano de prato enquanto ouvia os resmungos da mulher encantadora à sua frente.

Jorge solta o ar e se encaminha até eles. Ele senta-se na banqueta ao lado de Harriet, uma das suas mais assíduas e fiéis clientes.

— Deseja algo em especial, senhor? – Gregory indaga notando a presença do chefe.

— Três shots de tequila, meu caro. – Jorge pede passando as mãos pelos cabelos grisalhos – Merecemos depois de mais uma noite de casa cheia.

Gregory sorri alegre e se vira para preparar o pedido do chefe quando Harriet gira na banqueta para parar de frente ao gerente.

— Tequila, hein Jorge? – ela indaga risonha. – Você sabe que em poucas horas eu tenho que retornar à cafeteria. Aqueles cafés não se preparam sozinhos e a Dona Júlia não gosta quando eu apareço um caco para trabalhar.

— Eu e você sabemos que tequila não é o seu fraco. – Jorge comenta. – Aliás, nestes oito anos que você é uma frequentadora diária do bar, eu ainda não descobri qual bebida é o seu ponto fraco. Costumo conhecer bem todos os meus clientes.

— Sabe como é... – Harriet ri e seus olhos brilham quando os três copinhos são postos enfileirados à sua frente. – estômago jovem aguenta qualquer tipo de bebida.

— Desculpe a minha intromissão, Harrie – Gregory pronuncia chamando-lhes a atenção – mas me sinto até envergonhado em não saber a sua idade.

Harriet pega um dos copinhos com o líquido ardente e ergue-o no ar.

— Nunca se deve perguntar a idade de uma mulher, querido Greg.

Os dois homens rirem, também pegando cada um o copo de tequila para imitarem o gesto na mulher.

— Que a vida de vocês não seja tão desgraçada quanto à minha. – Harriet pronuncia e vira o líquido em sua boca, sem sequer fazer uma careta de repulsa.

Os homens também viram os copos e logo os batem no balcão.

— Não seja tão dramática, minha querida. – Jorge diz. – Você ainda tem muito à viver. É jovem, bonita e inteligente. Aposto que logo te surge uma oportunidade para trabalhar em uma grande empresa multinacional e deslancha em uma carreira belíssima.

Harriet ri anasalado e afirma, mesmo à contragosto.

— Bom, - ela suspira levantando-se da banqueta. – já deu a minha hora. Vou deixar vocês descansarem. – ela sela um beijo no rosto do gerente e assopra um na direção de Gregory. – Vejo vocês à noite.

Os homens observam a mulher desfilar até a saída do bar e antes que ela atravessasse a porta, acenam em sua direção.

— Pobre garota. – Jorge comenta quando a porta se fecha. – Vivendo sozinha por essa Grécia afora, aos trancos e barrancos, embebedando-se noite após noite como se não houvesse amanhã.

— Você sabe o que aconteceu com ela, Senhor Jorge? – Gregory indaga.

— Não sei ao certo. – ele dá de ombros – Ela claramente não gosta de falar sobre o assunto, sempre se desvia quando é questionada. Mas... Suspeito que tenha perdido à todos que amava e isso... Meu caro rapaz, é a pior dor existente.

— Sempre a vejo sozinha por aí, cabisbaixa. Acho que somos os únicos com quem ela realmente conversa senhor, além da Dona Júlia, claro. – Greg observa – É sempre do trabalho ao bar, do bar ao trabalho. É um ciclo incessante.

— A Dona Júlia me contou certo dia que há alguns anos a encontrou revirando o lixo da cafeteria para poder comer, só com a roupa do corpo, sem identidade, sem dinheiro algum e não pôde deixa-la desamparada. Ela a acolheu e a ofereceu um emprego, foi logo quando ela começou a frequentar aqui. Ela sempre é tão educada e simpática, coitadinha. – Jorge suspira – Rezo para que algum dia ela encontre o seu caminho e tenha um propósito para viver. Não há coisa mais triste do que ver um jovem se afundando nas mágoas de seu passado.

Caminhando pelas ruas de pedras já tão conhecidas, Harriet cambaleia quando seu pé desliza por uma das pedras soltas e ri de si mesma ao perceber que quase levara um belo tombo.

Ela gira nos calcanhares, olha ao seu redor, e constatando que não havia ninguém na rua àquela hora além dela vira-se de volta ao seu caminho para à Cyber Café. No entanto se assusta ao trombar em um corpo parado à sua frente e é segurada por mãos grandes e fortes encobertas por luvas pretas.

— Voltando de uma noite na gandaia? – a voz grave chama-a a atenção até o rosto do homem, que ainda a segurava.

Ele tinha a pele aveludada e morena, marrom feito um chocolate, vestia-se inteiramente de preto, o sol reluzia em sua cabeça que carecia de cabelos, e, para a sua estranheza, usava um tapa olho que cobria um dos olhos.

Ela segura um suspiro surpreso e endireita sua postula, para livrar-se das mãos do homem.

— De onde você surgiu? – ela questiona atordoada, mas logo se adianta em abrir o seu sorriso mais simpático. – Me assustou pra cacete.

— Não fico surpreso por não ter me ouvido aproximar. – ele sorri sem tirar seu olho dela, como se este a avaliasse silenciosamente – O álcool atrapalha os sentidos e você está coberta dele.

Harriet ri pelo nariz.

— Estou mais sóbria do que deveria e cada vez menos embriagada do que gostaria. – ela contorna o homem a sua frente, desviando-se dele, e acena pronta para sair logo dali: - Obrigada e adeus, estranho. Vai pela sombra.

Antes que ela desse um passo para longe, ele fala e a faz travar no lugar: - Surpresa mesmo é saber que alguém como você, que tem o soro do supersoldado no seu organismo, consiga ser mesmo que minimamente afetada pelo álcool.

Ela engole em seco e logo se adianta em rir descontraidamente.

— Não sei do que está falando.

Quando ela insinua se afastar novamente, ele agarra-lhe o braço.

— Muitas foram às vezes que ouvi falar sobre a sua história, mas nunca imaginei que quando nos encontrássemos cara a cara eu me depararia com uma adolescente beberrona.

Ela desvencilha-se da mão do homem num puxão bruto.

— Deve estar me confundindo com outra pessoa, senhor. – e dito isso sai caminhando em passadas firmes e sequenciadas, o leve teor do álcool já completamente fora de seu organismo.

— Tenho absoluta certeza que não estou enganado... senhorita Harriet Stark. – ele diz em alto e bom tom e ela vira-se alarmada em sua direção.

O homem sorri satisfeito.

— Quem é você? – ela volta a se aproximar do homem, agora com serenidade nos olhos. – Como me encontrou?

— Trabalho para a Superintendência Humana de Intervenção, Espionagem, Logística e Dissuasão. Uma empresa que teve como co-fundador o seu irmão, Howard. – pronunciado o nome, Harriet sente seu peito apertar. – Há algumas semanas um agente que estava em campo aqui por Atenas evidenciou uma mulher romper do nada, em meio à fagulhas azuis.

Ela desvia os olhos, desconcertada.

— Podíamos tê-lo internado na ala psiquiatra, mas levando em consideração os últimos acontecimentos ao redor do mundo... Era de se desconfiar. – ele continuou. – O rapaz observou atentamente a sua rotina e puxando pelo nosso banco de dados teve a maior descoberta de toda a sua carreira insignificante. Ele encontrara Harriet Stark, a doutora desaparecida há anos.

Harriet umedece os lábios e respira fundo antes de estender a palma da mão na direção do homem à sua frente com calma: - Com licença.

O homem observa a mão no ar por alguns instantes e duvidoso pousa a mão sob a dela, que fala: - Sem a luva, por favor.

Mesmo sem compreender o homem tira a luva da mão direita vagarosamente e a pousa sob a palma fria da mulher, que imediatamente fica com os olhos opacos e vagos. As íris desaparecem, perdendo-se no branco completo e pode-se notar algumas faíscas azuis fagulharem nele. Meio minuto depois ela suspira e pisca os olhos grandes duas vezes, voltando ao normal.

— Nicolas Fury. – ela sopra soltando a mão do homem.

— Como... – ele olha dela à sua mão erguida no ar e sorri. – Pelo visto você tem muitos mais dons do que constam nos diários de seu irmão.

Harriet dá de ombros.

— Há algum tempo eu pensei que pudesse aperfeiçoar as minhas habilidades para ajudar as pessoas, de alguma forma. – ela balança a cabeça desiludida – Mas voltei ao ponto inicial onde não me vejo fazendo qualquer coisa além de afogar as minhas mágoas por uma vida amarga em que todos aqueles que um dia já amei estão mortos.

— E tem funcionado? – ela questiona.

— Nem um pouco. – ela ri frustrada. – Nunca fico bêbada o suficiente, nem isso essa droga de super-regeneração me permite fazer. Por isso sempre tento ficar o menos sóbria possível para fazer o meu corpo enfraquecer e, com sorte, finalmente sucumbir.

Nicolas a observa em silêncio.

Os olhos estão inchados e vermelhos, os cabelos desajeitados e soltos, as roupas eram simples e o dobro de seu tamanho – como se pertencessem à outra pessoa – e a face sombria estava marcada por cicatrizes invisíveis.

— É compreensível que queira se afogar nos seus traumas e viver remoendo eles o resto de sua vida. – Nick pronuncia – Mas não acho que era isto que seu irmão esperava que você fizesse.

Harriet sorri desacreditada pela petulância e abre a boca para deslanchar uma porção de más palavras na direção do homem, mas decide se conter.

Diz após respirar fundo: - Pelo o que eu li em alguns blogs foi exatamente o que ele fez quando viu que eu não voltaria mais. Virou um alcoólatra. – ela engole o bolo que cresce na garganta – Pelo menos ele conseguiu fazer isso com louvor.

— Não posso mentir e dizer que Howard continuou sendo a mesma pessoa que você conhecia depois que você se foi, a vida dele era rodeada de melancolia. – Harriet limpa uma singela lágrima que se atreve à cair – Mas, ainda assim, ele fez grandes coisas depois disso. Superou cada expectativa e se tornou o...

— Eu sei o que ele fez! – ela o interrompe aos gritos. – Não deixo de me orgulhar pelo meu irmão, não pense que sou tão mesquinha. Ele foi brilhante, como já era esperado! Mas eu não sou e nunca fui tão obstinada quanto Howard, não posso simplesmente ignorar o que aconteceu e seguir com uma vida de realizações e feitos importantes. Mereço apreciar uma vida miserável.

Harriet limpa as lágrimas causadas pela sua explosão de emoções com as costas da mão e respira fundo. Já havia algum tempo desde que havia perdido o controle desta forma, sua cabeça latejou.

— Por isso, não adianta querer me levar de volta às Indústrias, à Nova York, onde quer que seja para me ajudar a superar os meus traumas, Fury. – ela pronuncia mais controlada – Eu não quero superar nada.

Nicolas assente vagarosamente.

— Só quer dar um fim á essa vida. – ele conclui.

— Como se fosse tão fácil para mim. – ela lhe dá as costas.

— E quanto ao seu sobrinho? – Nicolas arqueia uma sobrancelha e nota um singelo lampejo reluzir nos olhos da mulher quando ela se vira para ele automaticamente.

Harriet engole em seco para declarar: - Ele está bem longe de mim.

— E se eu dissesse que não está?

Ela o encara com a testa franzida.

— Pode ver, se quiser. – ele estica a mão em sua direção e Harriet a encara com hesitação em longos minutos.

— Não posso. – diz por fim.

— Ele é parte de Howard. – Nick atenua. – É sua família.

— E você acha que eu não sei disso? – ela volta a perder o controle, desta vez, evidenciado na luz azul que flameja em seus olhos. – Acha que já não pensei em ir atrás dele diversas vezes?

— E por que não foi?

— Porque eu sou um anjo da morte. Por coincidência ou não todas as pessoas que eu me aproximo ou me importo se machucam, ou morrem tragicamente. Eu não quero fazer o mesmo com ele. – as lágrimas caem livremente de seus olhos.

— Conversa afiada. – o homem rebate e ela se vê irritada com a arrogância do homem. – Nós dois sabemos que tem medo de ele ser muito parecido com o Howard e suprir, de alguma forma, esse vazio que você não quer que seja suprido. Sente culpa pela possibilidade de se sentir bem quando pensa que isso anularia tudo o que você quer sentir pelo luto ao seu irmão.

As luzes azuis dos olhos se apagam, a mulher esta com a respiração ofegante.

— Uma coisa não anula a outra, Harriet. – Nick continua. – E, por tudo o que imagino que você deve ter passado, merece um pouco de ar fresco depois de ter atravessado o inferno.

Ela abaixa a cabeça, mirando os próprios pés.

— Você disse que Tony não está bem. – ela observa com a voz rouca. – Veio atrás de mim porque acha que eu posso ajuda-lo?

— Eu sei que você é a única quem pode ajuda-lo. – Nicolas afirma. – Mas não foi só por isso que eu vim.

Ela ergue a cabeça mirando-o nos olhos.

— Por que mais seria?

— Porque ele também é o único quem pode te ajudar. 

 


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Notas finais do capítulo

Cá estamos ao final dessa trama.

E digo que essa definitivamente foi a história mais complexa e mais adaptada que eu já escrevi.

O tanto que estudei, assisti e li para que as datas batessem e as informações não fossem divergentes foi desgastante. Porém, compensatória, pois acredito que tivemos um resultado maravilhoso.

Inserir uma personagem feminina no meu tão adorado mundo da Marvel já era um desejo desde quando assisti ao primeiro filme do Homem de Ferro, lá em 2008 quando eu ainda tinha apenas 10 aninhos. Chame como quiser, talvez possa dizer que é o feminismo, mas eu sempre quis que as mulheres ganhassem tanta notoriedade em filmes como os homens, imaginando uma personagem tão forte e tão destemida quanto esses heróis.

Podemos notar que até hoje temos pouquíssimos filmes de heróis em que a protagonista seja uma mulher e isso me entristece em partes, porque estamos vendo essa evolução se aproximando (o que me deixa completamente satisfeita) com Viúva Negra, Thor: Amor e trovão, Mulher Maravilha como outros que estão em fase de planejamento.

O Homem de Ferro sem dúvida é o grande amor da minha vida, não tenho como explicar a empatia que tive por ele desde o primeiro instante. O importante nesse contexto é a evolução do personagem e como ele passou de um babaca à uma das personalidades mais marcantes do Universo da Marvel. Ele mudou, progrediu e amadureceu, me ensinando a amadurecer tanto quanto. E essa é a magia que os filmes e personagens fazem com a nossa vida, nos faz crescer tanto quanto. (quem é fã de filmes assim sabe do que eu estou falando)

Ele, definitivamente, é o meu herói. E minha paixão por ele me fez criar uma personagem que tivesse uma ligação muito próxima, suprindo as suas necessidades emocionais com: o amor, carinho, companhia e, principalmente, família.

Eu tenho orgulho da Harriet Stark, desde o seu empoderamento à sua entrega às pessoas que ama. Ela passou a ser um exemplo de caráter para mim e eu sinceramente queria me aprofundar mais nesta personagem e dar à ela o devido reconhecimento que merece.

Quem sabe ela nasça oficialmente em uma HQ, quem sabe nós não conseguimos colocá-la no mapa. O futuro a Deus pertence e se ele quiser muitas garotinhas ainda serão encorajadas por personagens excêntricas, não só a Harriet especificamente, mas como todas as nossas queridas heroínas.

Devo admitir que já tive muitos e muitos planos com Vênus em outras situações na minha cabeça. Contudo, nenhuma está em desenvolvimento.

AINDA.

Sei que a nota está muito longa mas não posso deixar de agradecer à todos que leram essa estória até o final, comentaram, favoritaram. A cada notificação que aparecia no meu celular ou view que crescia meu coração foi aquecido e motivado à continuar, portanto digo, essa história só teve esse final por vocês.

Espero ver vocês em um futuro próximo em um projeto, seja do Universo da Marvel com a Vênus ou outros. Um beijo em cada um de vocês. Fiquem com Deus.

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