Ensaios escrita por Vanilla Sky


Capítulo 2
Capítulo Dois - Encontro


Notas iniciais do capítulo

Eu sei que estou atrasada. Alguns meses, inclusive.
Muita coisa que não me deixou focar na história, mas agora prometo que os capítulos serão mais frequentes!
Obrigada novamente ao Shini, Areiko e Lis, pela paciência e pelo carinho de vcs sempreeee ♥ são pessoas fundamentais na minha escrita e na minha vida ;3
Boa leitura!



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(Quatro semanas antes do primeiro beijo)

 

— Acho que vou chamar o Visão para ir ao cinema comigo.

Natasha levantou o olhar do livro em suas mãos apenas para ver o rosto de Wanda a dois palmos de distância. Ela estava abaixada, com a ponta do nariz encostada na capa escura da obra, os grandes olhos verdes animados como os de um filhote, e um enorme sorriso enfeitando seus lábios.

— Desculpe, mas você vai fazer o quê?

— Estou pensando em perguntar se ele quer ir assistir um filme. Um cinema no centro da cidade vai exibir alguns filmes estrangeiros essa semana – ela levantou-se do chão, pondo as mãos na cintura e caminhando pelo quarto da amiga – Pensei que ele iria gostar de ver. E seria uma oportunidade de ele sair um pouco da Base. – Ao perceber a expressão séria estampada a face de Natasha, Wanda aproximou-se novamente:

— Não faça essa cara!

— É a única que eu tenho.

Natasha estava visivelmente contrariada por não ser incluída no plano, cruzando os braços sobre o peito. A feiticeira sentou-se novamente no chão, ao lado dela, encostando a bochecha em seu joelho.

— Eu preciso da sua ajuda. Por favor.

— Com o quê, exatamente?

— Pensei em dar uma volta com você para renovarmos nosso guarda-roupa. Só nós duas. – Natasha permanecia inflexível. — Podemos comer um crepe com chantili, daqueles que você gosta, mas não quer deixar os outros saberem. – Wanda intencionalmente aumentou o tom de voz, ao passo que Nat moveu o indicador em direção aos lábios para mandá-la não dizer aquilo em voz alta. As duas riram e se levantaram apenas para se sentarem novamente ao chão, e a feiticeira mexeu os dedos devagar, usando seus poderes para encostar a porta do quarto.

— Mas por que o Visão? Você tem algum motivo específico?

— Nada demais. – respondeu Wanda, enrolando uma onda do cabelo castanho nos dedos – Apenas gosto de ver a reação dele aprendendo coisas novas. E o filme que gostaria de ver é comprido e envolve temas políticos, talvez ele goste.

— E isso justifica um encontro?

Wanda paralisou.

— Encontro?

— Lógico! Duas pessoas saindo juntas para irem ao cinema são características de um encontro.

— Acho melhor você ir comigo, então. Pois não tenho nenhuma intenção romântica para ser considerado um encontro.

Natasha riu sonoramente.

— Agradeço o convite, porém, acho melhor ficar por aqui e te dar cobertura. Pode se tranquilizar que eu não vou contar para ninguém — Ela se esgueirou para observar o corredor por uma fresta aberta na porta — Ele está sozinho agora, perto do laboratório. Por que não vai chamá-lo?

— E como eu posso chamar a atenção dele, Nat?

— Eu costumo amarrar os homens em uma cadeira e deixar uma pistola na cintura, nunca falha.

Wanda olhou-a com a expressão atônita, enquanto Natasha deixou uma risada escapar de seus lábios e se deitou sobre sua cama. O quarto dela era grande, porém minimalista, com as paredes pintadas de branco, a cama de casal com a colcha escura em que se deitara, uma poltrona munida de duas almofadas e um criado-mudo com uma xícara de café ao lado, um tapete preto e uma estante repleta de livros e revistas. Mesmo assim era um espaço aconchegante, e Natasha adorava aquele canto da Base, principalmente quando tinha companhia.

— Estou brincando, Wanda. Acho que você pode tentar ser sincera com ele, abrir seu coração. Dizer “oh, querida torradeira, gostaria de, por obséquio, acompanhar-me em uma sessão de cinema no centro da cidade? Não romanticamente falando, é claro” — Natasha explodiu em risadas antes de terminar a frase, ao passo que sua colega pegou uma almofada e jogou-a na outra, gargalhando ao deitar-se junto dela. Aqueles momentos tornavam o clima do complexo mais leve e agradável, uma sensação legítima de lar.

Após recuperarem a respiração, Natasha prosseguiu:

— Você deve convidá-lo antes de sairmos. Eu fico aqui te esperando. — A Viúva Negra fez um gesto com a mão, mandando-a sair do quarto.

Wanda prontamente obedeceu, deixando o cômodo com a porta entreaberta e seguindo em direção ao corredor. Visão usava um suéter azul escuro e calças pretas, distraidamente mexendo em alguns hologramas em uma pequena sala com paredes de vidro ao lado do laboratório. Ela tentou ao máximo abrir a porta sem fazer barulho, todavia, o mínimo movimento chamou a atenção da audição aprimorada do Sintozóide.

— Ah, Senhorita Maximoff — ele cumprimentou-a ao virar-se em sua direção, olhando-a com ternura — Posso ajudar em algo?

O coração de Wanda palpitou dentro de seu peito, e ela agradeceu silenciosamente por não haver nenhum outro colega de equipe próximo naquele momento – o laboratório estava vazio, assim como o corredor que levava aos quartos. Fechando a porta atrás de si, ela adentrou o pequeno espaço para estudos, no qual Visão estava em pé com alguns papéis em mãos. Sentando-se em uma cadeira giratória ao lado dele, Wanda percebeu que não sabia como iniciar o assunto. Limpando a garganta, disse:

— O que está fazendo por aqui a essa hora?

Podia escutar a risada de Natasha em seus ouvidos quando contasse a ela como havia procedido. Afastando esse pensamento, ela apoiou o queixo na mão esquerda, encostando o cotovelo no braço da cadeira, enquanto o escutava falar.

— Estou fazendo alguns cálculos. Veja, o senhor Stark está pensando em aprimorar algumas invenções para apresentá-las em uma faculdade, por isso, preciso ver o quanto elas podem ser melhoradas sem causar destruição. – Ele hesitou ao perceber o silêncio e olhar sério da feiticeira, encarando-o diretamente nos olhos — Perdão, senhorita. O assunto está agradável? Não gostaria de me tornar enfadonho.

Ela suavemente sorriu, pensando no quanto o sintozóide parecia adorável ao explicar seu trabalho. Balançando a cabeça negativamente, fez um sinal para que ele continuasse sua fala, cruzando as pernas e observando com atenção.

— Bom, esse cálculo aqui – ele pegou um holograma no ar com movimento de pinça, sua voz calma e monótona revigorada após perceber que não estava incomodando — mostra que essa invenção, em específico, não pode ser aprimorada, pois poderia ter uma consequência devastadora. Já essa – ele puxou outro holograma e o ampliou — pode ser facilmente aprimorada, e apresenta-se mais no cotidiano dos jovens da Instituição que o Senhor Stark irá visitar. Seria mais fácil apresentá-la. E essa aqui, Senhorita...

— Quer ir ao cinema comigo?

Visão congelou por um momento, deixando cair os papéis em suas mãos. “Perdão”, disse abaixando-se para pegá-los ao mesmo tempo que Wanda. Ela terminou de juntá-los antes dele e entregou-os nas mãos do sintozóide com um sorriso, encostando suavemente seus dedos nos do sintozóide. Seus rostos estavam próximos, e ele conseguia sentir o perfume levemente adocicado dos cabelos compridos dela. Em sua mente, milhões de neurônios sintéticos processavam a informação da origem e composição do shampoo que ela usava, todavia, ele ignorou esses pensamentos e só conseguiu pensar no quanto aquele aroma era agradável, e no quanto aquela proximidade causava sensações estranhamente boas em seu corpo robótico. Levantaram-se meio sem jeito, porém ainda desejando estar sob a mesa, congelando a primeira vez que se viram tão de perto.

— Desculpe por interromper, Vizh, acho que não era o melhor momento.

— Não precisa se desculpar. Na verdade, era o momento perfeito, Senhorita. – Ele jogou todos os hologramas para o lado e apoiou-se em uma das cadeiras – Eu vou apenas aumentar o volume de captação de meu sistema auditivo para ter certeza que entendi corretamente.

— Gostaria de saber se você quer ir assistir a um filme comigo. – Wanda tentou falar da maneira mais calma possível, ainda sentindo seu coração pular — Um cinema no centro da cidade vai exibir alguns filmes estrangeiros essa semana. Poderíamos ir juntos, passear. Você só fica aqui dentro, então seria bom sair um pouco, conhecer novos espaços – temeu acabar falando mais do que devia e entregar o momento, e sua voz foi começando a falhar.

Visão exibiu um largo sorriso, algo que ela não estava acostumada a ver.

— Claro, Senhorita Maximoff! Eu iria adorar acompanhá-la. – Ele cogitou uma hipótese rapidamente e perguntou, mesmo sem ter vontade de fazê-lo: – Devemos convidar os demais para nos acompanhar?

Wanda pensou um pouco antes de responder.

— Eu chamei a Nat, porém ela não quis. Acho que seria melhor irmos nós dois. Sozinhos.

“Sem ser um encontro” – acrescentou mentalmente.

— Claro. Como a senhorita considerar melhor – ele respirou fundo, aliviado por irem apenas os dois — Quando você gostaria de sair?

— Depois de amanhã fica bom para você? O filme começa às sete da noite. Podemos sair final da tarde para dar tempo de pegarmos o trem e comprarmos o ingresso. 

— Correto. Aguardarei a senhorita no lado de fora depois de amanhã à tarde.

Eles trocaram um aceno de cabeça, e Wanda se afastou devagar, fazendo menção de sair. Quando ela estava chegando próximo a porta do cômodo, ouviu Visão chamá-la.

— Senhorita?

— Sim, Vizh?

— Muito obrigado por me convidar. Sinto-me honrado em ter sua companhia.

Ela ficou tensa, sem saber como responder. Sorrindo, encarou o chão e sussurrou:

— Eu quem agradeço por aceitar. – E deixou o local apressadamente.

O sintozóide acompanhou-a com o olhar através da parede de vidro, vendo-a abrir a porta do quarto de Natasha. Pela primeira vez, seu sistema sintético e robótico trazia-lhe uma sensação diferente no peito, aconchegante e quente. Ele estava acostumado a ter outros sentimentos, como empatia e felicidade, porém, essa novidade ainda não conseguia ser nomeada. Abriu novamente as contas que Tony pedira, todavia, perdeu a concentração inúmeras vezes ao lembrar do olhar da Senhorita Maximoff observando-o enquanto falava, o nervosismo em sua voz falhada quando chamou-o para irem ao cinema, e a proximidade de seus rostos momentos depois. Ela era adorável, e Visão sentia-se feliz por ela lembrar dele ao chamá-lo para saírem um pouco da Base. Respirando fundo, voltou a se concentrar nos cálculos, um pequeno sorriso escapando dos lábios.

Ao girar a maçaneta da porta e adentrar o quarto de Natasha, a feiticeira foi surpreendida pela amiga aguardando-a na entrada, dizendo:

— O Vis ficou feliz como se você tivesse pedido ele em casamento, estou certa?

Wanda fechou a porta atrás de si riu, genuinamente feliz. Tanto por estar com Natasha e ter o seu apoio, quanto pelo sintozóide que tanto a fascinava ter aceitado seu convite para saírem juntos. Sentia-se caminhando nas nuvens, com certo nervosismo batendo no mesmo ritmo de seu coração.

— Mais ou menos por aí. Vamos sair depois de amanhã.

— Bom, então quer aproveitar o dia sem treinamentos para irmos comprar roupas?

A feiticeira balançou a cabeça afirmativamente, dizendo que precisava trocar de roupa. Voou corredor abaixo até alcançar seu quarto, pegando as primeiras roupas que vira no armário. Vestiu uma calça de agasalho preta, um casaco da mesma cor e uma touca branca sobre a cabeça, juntamente de botas escuras de cano longo. Logo ouviu uma batida na porta, e a voz de Natasha chamando-a em seguida. Assim que deixou o quarto, recebeu um olhar de cima a baixo da colega, que passou o braço ao redor de sua cintura dizendo:

— Podemos começar com algumas roupas que realcem sua pele.

Deixando a base, pediram um táxi até o shopping mais próximo, e percorreram todos os andares, olhando diversas lojas, até encontrarem uma ou outra peça de roupa mais chamativa. Deixaram o estabelecimento e desceram uma rua movimentada de Nova Iorque, caminhando sem pressa, admirando as vitrines tentando achar algo bonito e não tão caro. Perto dali havia um pequeno espaço cor-de-rosa o qual vendia crepes doces, e Natasha adorava fugir para lá, apesar de não admitir na frente dos outros Vingadores. Com algumas sacolas em mãos, sentaram-se em uma mesa próximo à porta. Wanda pediu um crepe de chocolate, enquanto sua amiga pedira um crepe de morango com chantili e um café quente. Comeram em silêncio, até que Natasha disse:

— É melhor você não falar para o Tony sobre o encontro.

A feiticeira limpou o canto da boca.

— Mas ele vai ficar desconfiado.

— Eu posso te dar cobertura. Dizer que você não está bem e dormiu no meu quarto. Quanto ao Visão eu não sei, mas de sua parte você estará segura.

Wanda sorriu e esticou o braço, apertando a mão de Natasha em agradecimento. Pela mentira que se comprometera dizer a Tony, pelo dia incrível de compras, por ela tê-la incentivado a chamar Visão em primeiro lugar. A amizade das duas se consolidava mais a cada dia, e era ótimo ter alguém com quem contar nesses momentos.

— Mas por que você acha que o Stark não deve saber?

Natasha tomou um longo gole de café, encarando-a por cima da xícara branca.

— Você vai ver que, quando chegarmos na base, ele vai fazer alguma brincadeirinha. Estou acostumada com o jeito do Tony. Agora, se você sair com o robô dele, à noite, e voltar tarde, meu bem, você pode explicar diversas vezes sobre terem ido ao cinema inocentemente, sem intenções românticas, porém não vai ter perdão. Ele vai torrar a sua paciência.

A outra balançou a cabeça, ponderando a situação.

— O que estou dizendo, Wanda, é que você precisa de um tempo para você. Esqueça um pouco a base e as missões. Aproveite para conhecer melhor a cidade junto com o Vis. Olhem as luzes de Natal, tomem um café, visitem lojas, conversem sobre o filme. Voltem a hora que bem entenderem. Tire esse momento para curtir. – Natasha esticou o braço e puxou a bochecha de Wanda com um movimento de pinça, depois levantou-se e seguiu para o caixa.

Enquanto ela pagava, a feiticeira observou seus arredores. Viu pessoas diferentes no espaço apertado do café: casais cujo relacionamento havia recém começado, colegiais após a aula e algumas senhoras mais velhas fugindo do frio, tomando uma quente xícara de café. Pensou no quanto sua vida mudara de alguns anos para cá. Lembrou de sua cidade natal, e no quanto ela já fora parecida com aquelas colegiais dando risada e mexendo em seus celulares. Seu coração apertou ao pensar em Pietro, e em como estavam sempre juntos em seus passeios. Havia tanto que gostaria de falar para ele, contar sobre suas mudanças, simplesmente se sentar e conversar como nos velhos tempos.

— Vamos embora? – Wanda foi subitamente tirada de seus devaneios pela delicada voz de Nat chamando-a para a realidade. Assentiu com a cabeça e seguiram seu caminho.

Ao colocarem o pé sobre a soleira da base e fecharem a porta da frente, a voz de Tony ecoou sonoramente pelo corredor:

— Mas olha se não é meu casal favorito chegando!

A feiticeira disfarçou com um sorriso, e recebeu um olhar de Natasha confirmando o que dissera mais cedo.

— Querido, chegamos! – disse Nat, sorrindo ironicamente. Wanda seguiu reto até chegar no hall e encontrar Visão sentado em uma poltrona, absorto com um livro em mãos. Ela tentou atravessar o salão sem desconcentrá-lo, todavia, quando percebera, ele estava materializado em sua frente.

— Necessita de ajuda, Senhorita? – antes que ela pudesse responder, ele delicadamente puxou as sacolas que carregava de sua mão, virando-se em direção ao quarto dela.

— Muito obrigada, Vizh. Não estavam muito pesadas, porém agradeço o cavalheirismo.

Ele sorriu enquanto caminhava um pouco a frente dela.

— Não se preocupe. É o mínimo que posso fazer para ajudá-la. Aliás, como foi o passeio?

— Foi ótimo, nos divertimos bastante! Demos uma boa renovada no guarda-roupa. A Nat é incrível.

— Fico feliz que tenham se divertido tanto, Senhorita. É ótimo ver você com um sorriso tão bonito estampado no rosto.

Wanda encarou o chão, levemente sem graça. Visão adentrou o quarto e pôs os pacotes sobre a cama dela, triunfante por tê-la ajudado. Era uma pequena maneira de agradecer o convite do cinema. Ela adentrou o cômodo em seguida, ficando ao lado dele e pondo as mãos na cintura.

— Você realmente me poupou certo esforço. Muito obrigada, Vizh!

— Não há de quê, Senhorita. Com licença...

Ao que ele virou para deixar o local, a pequena mão de Wanda segurou a barra de seu suéter, impedindo-o de ir. Visão virou o pescoço e olhou para trás, curioso, perguntando em seguida:

— Há algo que eu possa fazer pela Senhorita?

Ela respirou fundo.

— Você poderia não comentar nada com o Tony?

— Sobre agora? Sobre irmos ao cinema? Ou ambos?

— Ambos.

Wanda exalou demoradamente o ar de seus pulmões, torcendo para que ninguém se aproximasse da porta naquele momento.

— Correto, Senhorita. Algo mais?

— Wanda. – Ela disse após alguns segundos de silêncio.

— Perdão?

— Em nosso encontro, me chame apenas de Wanda, por favor. – A feiticeira estava tão nervosa que nem percebeu o uso equivocado da palavra “encontro”. – Não gostaria que as pessoas lhe vissem como um mero serviçal meu.

Visão, em princípio, apenas concordaria com o solicitado e deixaria o quarto, como de costume. Porém, aquele olhar tímido da moça e sua pequena mão segurando a barra de seu casaco, tão fortemente que os nós de seus dedos estavam esbranquiçados, fez com que seu sistema reagisse de maneira diferente. Virando-se sutilmente, ele segurou a mão de Wanda entre as suas, e levou a palma de sua mão em direção à sua bochecha metálica e fria.

— E como você gostaria que as pessoas me vissem? Ou vissem a nós dois juntos?

O coração de Wanda batia fortemente por baixo da blusa preta, fazendo o sangue de seu corpo subir rapidamente por seu corpo com um arrepio, até deixar seu rosto totalmente corado. Ele continuou a encará-la com o mesmo jeito formal de sempre, e a mesma voz monótona que apresentava, todavia, havia algo em seu olhar trazendo certa ternura para o ato. Pela primeira vez, Wanda conseguiu perceber um misto de sentimentos por trás daqueles olhos azuis, os quais a observavam como se ela fosse o que mais importava em todo o universo naquele singular momento. Um longo minuto se passou, até que ela disse, por fim:

— Como um amigo de longa data. – E arrependeu-se no minuto seguinte.

Ele virou a cabeça para o lado, em dúvida, depois soltou a mão dela e sorriu.

— Certo... Wanda. – O coração dela perdeu o ritmo quando ouviu-o pronunciar seu nome pela primeira vez – É um nome muito sonoro, posso me acostumar com ele. A Senhorita sabia que significa “andarilha”? Acho que combina com você. – Ele pigarreou e pediu licença para sair do quarto.

Em questão de segundos, a sombra de Natasha apareceu na porta.

— “Como um amigo de longa data”, Wanda? Verdade? – Ela ostentava uma expressão incrédula.

— Eu disse que não possuía intenções românticas, Nat! – Disse Wanda, sem jeito.

— Mas isso acaba com a moral de qualquer um. Você tem muito a aprender. – Ela jogou a cabeça para o lado, enquanto a outra cruzou os braços sobre a cintura, observando a noite se alastrando pela janela de seu quarto.

O dia seguinte pareceu se arrastar. Wanda caminhou pela base, encarando o relógio a cada cinco minutos, aguardando que logo chegasse o momento de ela e Visão irem ao cinema. Até deitou-se cedo para tentar dormir antes, sem sucesso. Foi para seu treinamento junto com Nat, porém dificilmente se concentrava, apenas encarando as horas, e correndo para se arrumar quando os ponteiros marcaram duas da tarde. Depois de um demorado banho, ela penteou os cabelos castanhos para trás, vestindo uma calça jeans, com uma blusa discreta bege e um grande e bonito casaco branco que comprara com Natasha naquele dia. Passou em seu rosto uma maquiagem leve, apenas contornando as bochechas e delineando os olhos, e, em seguida, vestiu uma touca branca e suas botas pretas novas, atrapalhando-se um pouco para caminhar no início, mas logo pegando o jeito. Com duas batidas na porta, Natasha adentrou o quarto onde essa se vestia.

— Você está absolutamente linda, Wanda. – A Viúva Negra aplaudiu a moça, sorrindo pelo trabalho bem feito que fizeram. – A maquiagem mais clara realça seu tom de pele. Ficou excelente.

Wanda sorriu e encarou o chão, absolutamente feliz. Estava quase na hora de encontrar com Visão, e seu coração palpitava dentro de seu peito, ansiosa pelo momento a sós com o Sintozóide que tanto admirava.

— O que você vai dizer para o Stark?

— A desculpa mais básica da história. Problemas femininos. Pode ficar tranquila, você está segura comigo. – Natasha se aproximou e abraçou-a, transmitindo confiança. – Agora vá, sua companhia espera você na entrada.

— Não vai ficar chato para você ficar a noite toda no seu quarto? Vou voltar o quanto antes.

— Claro que não, vou aproveitar para colocar minhas leituras em dia. Deixe a preocupação de lado e aproveite.

Wanda e Natasha separaram-se na porta, uma seguindo em direção ao elevador, a outra descendo o corredor para seu quarto fechando a porta devagar, certificando-se que ninguém, especialmente Tony, estivesse perto para vê-la.

Wanda desceu o lance de escadas que levava à porta de entrada tão rapidamente quanto seu salto permitia, abrindo a porta apenas para ver uma imensidão de neve à sua frente. Um sorriso infantil escapou de seus lábios, pois ela gostava de ver a neve cair todo final de ano. Inspirando profundamente o ar gelado, colocou o pé na soleira da porta e, ao invés de Visão, viu uma pessoa que nunca havia visto: um homem alto, de cabelos loiros, usando uma calça de agasalho preta e uma blusa azul-escura, com um cachecol branco enrolado no pescoço. Respirando fundo, ele olhava para os lados sem prestar muita atenção. Wanda aproximou-se com cautela, temendo a presença desconhecida, ao passo que a misteriosa figura olhou em sua direção e sorriu calorosamente.

— Ah, Wanda, que coisa boa ter você aqui! – Ele se aproximou e segurou as mãos dela entre as dele, ao que ela respondeu com um olhar assustado. – Sou eu, Visão!

— Vizh? Mas você... Você está...

— Diferente? Parecendo um humano? – Ele respondeu piscando os olhos – É apenas uma de minhas várias facetas, Senhorita. Digo, Wanda. Perdão. – Pigarreando, continuou: – Tive receio de as pessoas estranharem minha presença nos locais. Achei que assim, pareceria mais confortável para a... Para você. O que achou?

Wanda olhou-o de cima a baixo, fitando a mudança de visual. O sol ainda à vista naquele final de tarde iluminava os fios de cabelo dourados do homem alto o qual a encarava com ternura. Suas bochechas erubesceram com aquele olhar repleto de carinho, e pela beleza estampada pela transformação do sintozóide. Ela afirmou com a cabeça, dizendo:

— O novo Visão está aprovado. Inclusive, acho que deveria se vestir assim mais vezes – Ele sorriu em resposta. – Podemos ir?

— Claro, Wanda. Para qual direção é o metrô?

Percorreram o caminho até a estação em silêncio, observando o sol se pôr por trás das montanhas que rodeavam a Base. De vez em quando, Wanda observava Visão pelo canto dos olhos, encarando o chão quando este respondia ao olhar. Seus pés afundavam na neve fofa, e por um momento ela se irritou por ter vindo de salto alto. Descendo as escadas no meio das pessoas voltando para suas casas após o expediente, ela se distraiu ao olhar os horários, e por muito pouco perderam o trem. Bufando, Wanda encarou sua companhia com os olhos irritados.

— Não acredito que fiz isso. O próximo sai apenas em treze minutos. Se pegarmos outro que saia antes, teremos que caminhar um pedaço até o cinema, mas eu posso acabar me perdendo um pouco. O que prefere fazer?

Visão esfregou a mão absurdamente real pelo queixo, pensando em alguma hipótese. Um sorriso diferente estampou seu rosto, algo que Wanda não vira em sua forma original. Uma mistura de malícia com alegria tomou conta daquele rosto totalmente novo, porém, bastante familiar. Ele segurou a pequena mão da moça, e puxou-a devagar para longe da multidão.

— Eu tenho uma ideia, Wanda. Mas você precisa confiar em mim.

Ele parou na metade da escada da saída coberta pela neve e encarou-a com os olhos esperançosos. Wanda apenas assentiu com a cabeça, sorrindo para o chão enquanto imaginava onde o súbito ânimo daquela figura iria levá-los.

O sintozóide adentrou uma ruela próxima, subindo rapidamente as escadas laterais de um típico prédio novaiorquino, levando Wanda pela mão atrás dele. Ela nada conseguia fazer além de admirar, sentindo seu coração bater rápido e a respiração ofegar pela corrida. Pensou que deveria comer menos cookies natalinos tão comuns naquela época, e manter o foco nos abdominais que Natasha lhe passava nos treinamentos quase diários. Ao chegarem no último andar, Visão continuava animado como um filhote, enquanto Wanda necessitou de uma pausa para recuperar a respiração.

— Vá mais devagar, Vizh, por favor! E por que me trouxe até aqui?

Visão nada disse, apenas fechou os olhos e concentrou-se para que sua capa dourada aparecesse novamente em suas costas. Ela estranhou o porquê de ele fazer aquilo, porém, permaneceu em silêncio, admirando as luzes acesas na imensidão da noite que se alastrava pelo céu. Respirou fundo com a beleza da vista em sua frente. Subitamente, ele pegou sua mão e puxou-a para perto, encostando a cabeça de Wanda em seu tórax.

— Pronta?

— Para que, exatamente?

— Vamos chegar lá em um instante.

Apertando o corpo da moça contra o peito, Visão impulsionou-se para o alto, levantando voo. Ela sufocou um grito assustado, cerrando os olhos com força, temendo cair dos braços fortes do homem. O robô, porém, manteve a calma e serenidade de sempre, sorrindo para Wanda. Suspendendo seus corpos no ar gelado daquela noite, ele disse:

— Confia em mim, Wanda?

— Estamos acima das nuvens. Meio difícil confiar agora. – Ela se acomodou no colo dele, os olhos ainda trancados, e uma arritmia descompassada em seu peito, tão presente que ela se perguntava a possibilidade de Visão também escutar.

— Eu não vou deixar você cair, Wanda. Abra os olhos, por favor. Quero compartilhar isso com você.

Wanda abriu os olhos lentamente, obedecendo o comando, e perdendo a respiração ao olhar para imensidão em sua frente. A vista noturna de toda a cidade era de tirar o fôlego, iluminada pelas pequenas luzes vindas das janelas dos apartamentos, os carros passando pelas ruas e dos enfeites de Natal marcando a festividade que se aproximava espalhadas por toda a extensão de onde a vista alcançava. Um largo e infantil sorriso tomou conta de seu rosto, e ela suspirou extasiada.

— Estou encantada com essa vista. Obrigada, Vizh.

Com cuidado, ela encostou a cabeça no ombro dele, ainda sorrindo para o visual a sua frente. Apesar de não possuir um batimento cardíaco, sentia uma mudança em seu sistema ao tê-la tão perto. Podia sentir o subir e descer de seu peito, vendo o bonito colo da moça mexer com o movimento. Podia sentir o coração dela através do casaco branco, e o mesmo aroma que chamou sua atenção no dia em que ela o convidou para o cinema. Sentiu um ímpeto de abraçá-la o quão fortemente seu corpo lhe permitiria, sentindo aquele pequeno corpo em seus braços pelo restante da noite. Todavia, conteve seu desejo, e apenas observou o brilho de seus olhos sob a maquiagem clara que usava. Wanda olhou uma última vez antes de fazer um sinal para prosseguirem. Visão estava um pouco desnorteado após aquele momento, necessitando recompor-se para encontrar o caminho correto para o filme. Após voarem juntos por um curto período, com os olhos dela a todo momento intercambiando entre as luzes no solo e o rosto humano de Visão, ele pousou em um prédio na rua em frente. Ele fez desaparecer a capa de suas costas e ofereceu o braço para Wanda, a qual aceitou com um sorriso tímido.

— Gostou do passeio, Wanda?

Eles desceram as escadas devagar, Visão cuidadosamente guiando-a, para evitar que ela tropeçasse na neve com o salto alto preto.

— Adorei. Foi algo incrível, nunca imaginei ver a cidade desse jeito. Geralmente, quando estamos nas naves, acabo não prestando muita atenção no visual lá fora. Vou passar a prestar mais atenção para lembrar dessa noite – a voz da moça falhou ao final, porém ele estava atento e captou tudo o que ela dissera, levando seus lábios a um quase imperceptível sorriso.

A bilheteria do cinema não estava muito cheia, e eles conseguiram comprar os ingressos em um bom local, uma pipoca pequena e um chocolate para Wanda, e adentrar a sessão antes da sessão iniciar. Um filme em preto e branco exibido em película 85mm estampou o telão branco do charmoso cinema, uma sala com capacidade pequena, todavia, bastante cheia para aquela época do ano. Debates políticos costumavam deixar as pessoas com sono, todavia, Wanda estava na ponta da cadeira, analisando cada palavra que diziam. Visão analisava o filme imóvel, de vez em quando soltando um sorriso quando entendia alguma indireta ou discussão. Sem perceber em um primeiro momento, sua mão encostou devagar na mão dela. Wanda assustou-se, porém, em seguida cedeu, entrelaçando seus dedos com os do homem ao seu lado. Seu rosto permaneceu quente e vermelho, enquanto ele apertava a mão pequena da outra em um gesto carinhoso. Ao final, eles se levantaram e permaneceram com os dedos cruzados, parecendo cada vez mais um casal saindo pela primeira vez em um encontro. Ela, todavia, não queria soltá-lo, pois alguma força mística fazia com que ela quisesse ficar mais próximo daquele ser robótico o qual naquele dia estava deslumbrantemente bonito como um humano.

— Deseja voltar para a Base, Wanda?

— Não. Ainda não. Vamos tomar um café, está cedo, Vizh!

Seguiram rua abaixo, olhando as vitrines prontas para as festividades natalinas. Wanda sentiu um encanto particularmente infantil, pela quantidade de anos desde que passara por lojas assim a última vez. Visão, por sua vez, estava encantado, por ser o primeiro Natal que passava desde que fora criado. Um mostruário lindamente montado em uma loja de joias possuía em destaque um colar de ouro branco com um pingente de rubi pendurado. Ela respirou fundo, encantada com a peça, e perguntou ao vendedor delicadamente quanto custava, o qual respondeu o preço com um sorriso, sinalizando um valor promocional (o qual, convenhamos, continuava um tanto caro). O simpático senhor de terno tirou o colar do mostruário e prendeu-o no pescoço dela, que ficou lindamente contrastado com sua pele clara.

— Não gostaria de presentear sua namorada, Senhor?

Wanda ficou nervosa com a menção, e achou que Visão iria negar veementemente. Ele, todavia, sorriu com o canto da boca e disse:

— É bonito como ela. Mas, no momento, irei passar. Muito obrigado pela atenção, senhor, tenha uma ótima noite. – E eles saíram enquanto o homem guardava novamente o colar.

Dessa vez andando um ao lado do outro, sem encostar as mãos, eles seguiram seu caminho, parando em um café para tomar um chocolate quente e comer um croissant. Wanda não conseguia parar de pensar no quão humano Visão pareceu, embarcando na brincadeira do vendedor e não negando veementemente o que ele dissera sobre serem namorados. Enquanto ela bebericava a bebida e comia o croissant, Visão comentava animadamente sobre o filme, fazendo ligações com histórias reais. De repente, parou e disse:

— Posso provar o que você está comendo?

Wanda estranhou.

— Você gostaria? Sabia que poderia comer, mas não que sentia gostos também.

— Posso analisar a composição das coisas. Gostaria de provar a bebida.

Pegando com delicadeza a xícara, levou a bebida fumegante aos lábios, assoprando (apesar de não haver qualquer necessidade) antes de tomá-la. Piscou algumas vezes ao engolir e sorriu.

— Isso tem gosto de felicidade líquida.

Ela encarou-o antes de rir novamente. Estar com Visão era divertido, e ela apreciava sua companhia, mais do que imaginava ser possível. Finalizando a comida, eles pagaram e desta vez voltaram de metrô para a Base. O transporte estava bastante vazio, então eles se sentaram no mesmo banco, ela na janela olhando as luzes, e ele no corredor analisando as pessoas. Suas mãos se encontraram novamente, e, embaraçadamente, eles entrelaçaram novamente os dedos, permanecendo em silêncio até chegarem ao seu lar. Entraram pelos fundos, em silêncio; por sorte, não havia ninguém por perto naquele momento. Antes de se despedirem, Wanda aproximou-se trêmula de Visão, beijando sua bochecha com carinho.

— Obrigada por toda a noite. Foi maravilhosa. Espero que possamos fazer isso mais vezes.

Ele segurou o braço dela, e em resposta, beijou as costas de sua mão delicada, como vira diversas vezes em filmes antigos juntamente com Steve Rogers.

— Eu quem agradeço, Senhorita. Por tudo. – E desapareceu pelo corredor, ao passo que ela lentamente adentrou o quarto de Natasha.

— Eu sabia que alguma coisa ia rolar. – Disse Natasha sem tirar os olhos da revista em suas mãos.

Wanda escondeu o rosto, envergonhada, e se deitou sobre a cama de Nat.

Visão observou a janela de seu quarto, ainda em sua forma humana. Olhou para o relógio, inquieto. Naquela época do ano, as lojas costumavam fechar mais tarde, para todos terem tempo de comprarem os presentes de Natal. Pensou no conceito da festividade, e no quanto queria presentear Wanda. Lembrou dos sorrisos e expressões envergonhadas dela. Dos momentos de lazer que passaram juntos. Algo em seu corpo robótico tentava dizer algo, uma mensagem que não sabia decifrar, um ímpeto de sair naquele exato momento para comprar algo para a moça. Sabia que o Senhor Stark iria perceber o dinheiro que gastaria.

Mas quem se importa?

Sabia que fariam piadas sobre uma possível segunda intenção ao entregar o presente na frente dos outros Vingadores.

Mas quem se importa?

 

Sabia que não deveria se aproximar mais dela. Que já estava satisfeito com o beijo no rosto, e às vezes que cruzaram os dedos pela rua, no cinema e no metrô.

Mas quem se importa?

 

Ele queria estar próximo dela. Bagunçar seu cabelo. Beijar sua testa e seu rosto. Sair pela rua sem hora para voltar. Ir ao cinema. Deitar-se com ela. Não se esconder. Não ter medo de deixá-la constrangida.

Eu a amo? Eu a amo? Eu a amo?

 

Essa dúvida pairou em sua cabeça, indecifrável como o mais difícil enigma proposto. Não saberia tão cedo a resposta para aquilo. Precisaria estudar a fundo o tema. Porém, naquele momento, sabia que queria obedecer a seu ímpeto. Trazendo novamente a capa para suas costas, ele voou pela cidade depressa, flashes dos momentos com Wanda quase causando-lhe curto circuito. Parou na cobertura de um prédio, e desceu as escadas correndo, pois viu que a loja estava começando a encerrar suas atividades. Correu e correu com precisão, sem errar um passo no meio da neve fofa, até parar na frente do vendedor com quem conversara, apontando para o colar no mostruário.

— Boa noite. Gostaria que embalasse para presente, por favor. Irei levar para a minha...

Ele não completou a frase.


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Notas finais do capítulo

Bom... Capítulo maior dessa vez, pelos meses de atraso. Espero que tenham gostado e aproveitem essa história! Amo o ship ScarletVision e mal posso esperar para escrever mais sobre eles ♥



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