Ensaios escrita por Vanilla Sky


Capítulo 1
Capítulo Um - Distância


Notas iniciais do capítulo

Oi, gente! Essa é a primeira fic que posto nessa conta, e a primeira que escrevo em alguns anos. Espero que gostem! No final deste capítulo tem alguns agradecimentos especiais ♥



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Vizh? O que está lendo?

 

Nada de interessante, Senhorita. – respondeu Visão no mesmo tom de voz sereno de sempre, todavia, rapidamente guardou o livro em suas mãos e levantou da poltrona em seguida.

 

É mesmo? Então posso ler? – Wanda sorriu carinhosamente.

 

É um livro técnico, o qual a Senhorita vai considerar extremamente tedioso.

 

A medida que falava em tom monótono, Visão caminhava em direção à ela, tentando impedir sua chegada ao exemplar virado de ponta cabeça misturado com os livros sobre a mesa de centro do salão.

 

Enfim, ficaram frente a frente. Wanda encarou-o, desconfiada sobre o que Visão estava planejando.

 

Tudo bem, então – disse a moça, afastando-se devagar e dirigindo-se até a janela – Queria avisar que o pessoal vai discutir aquela missão daqui a pouco. Estão nos aguardando na sala de reuniões.

 

Sim, é claro. Devemos ir, Senhorita...?

 

Em um momento de distração, Wanda correu na direção oposta, sendo parada antes de alcançar o livro que tanto despertava sua curiosidade pelo sintozóide abruptamente materializado em sua frente, bloqueando a vista da moça.

 

O que está prestes a fazer, Senhorita Maximoff?

 

Vizh, você não sabe mentir. Não para mim. – ele a segurava pelo pulso. – Vamos, o que tem de tão importante nesse livro?

 

Visão não respondeu. Ao invés disso, empurrou-a com delicadeza para longe da lareira acesa aquecendo o hall da base naquele dia de inverno.

 

Não me faça usar meus poderes, Vizh. Sabe muito bem que eu posso controlá-lo. – ela balançou a mão livre, uma névoa escarlate escapando da ponta de seus dedos. Apesar de ser mais baixa que ele, seu corpo aparentemente frágil suportava uma energia incrível. Ela era infinitamente mais forte do que aparentava.

 

Não há necessidade para isso.

 

Ele parou de empurrá-la quando chegaram ao lado de uma grande janela fechada. As árvores lá fora estavam cobertas por uma espessa camada de neve, porém, mesmo com o frio insistente, alguns raios de sol batiam no vidro e iluminavam os cabelos castanhos da Feiticeira Escarlate. Visão escorregou os dedos pelos fios, em um gesto carinhoso.

 

Eu apenas estava curiosa...

 

Orgulho e Preconceito, Jane Austen, 1813. Pesquisei inúmeros livros para entender o que se passa aqui. – ele encostou o indicador direito sobre a têmpora dela – Lizzie é forte e determinada, como você.

 

Então por que quis esconder isso de mim? – ela parecia amuada, reação que arrancou um sorriso do sintozóide.

 

Teimosa, também.

 

Visão envolveu as bochechas quentes dela com as mãos, inclinando seu rosto delicado ao encontro do dele, a poucos centímetros de distância.

 

Wanda... – em um quase inaudível sussurro, ele abaixou o pescoço e levou os lábios sintéticos em direção aos lábios rosados da pequena em sua frente. Ela arregalou os olhos por um breve momento, antes de fechá-los e aproveitar o momento. Sua respiração estava bastante acelerada, o coração batia tão forte que parecia querer sair de seu peito, e, além de retribuir o carinho, envolveu os ombros largos de Visão com os braços.

 

Afastaram-se devagar. Ela olhou para o chão, o rosto vermelho denunciando a timidez do momento. Visão parecia transtornado; aquele movimento corajoso fora totalmente imprevisível e diferente do que estava acostumado a fazer. Não entendia muito bem qual era o próximo passo a ser dado, e sentiu medo de constrangê-la novamente. Por isso, saiu de perto, movendo-se em direção à sala de reuniões.

 

Precisamos ir. O restante do grupo pode estranhar nossa demora. – e seguiu caminhando, deixando-a no salão.

 

~.~.~.~.~

 

Alguns dias se passaram desde que eles se beijaram pela primeira vez.

O pensamento de Wanda divagava para aquele instante e voltava à realidade como uma onda quebrando na areia da praia. Ela observou alguns enfeites nas paredes de seu quarto e passou os dedos delicadamente sobre os móveis do cômodo – a estante repleta de livros, o rack sobre o qual estava a televisão, o globo terrestre giratório sobre uma escrivaninha com diversos papéis. Por fim, sentou-se sobre a colcha escura da cama enquanto tentava tomar uma decisão a respeito de um devaneio insistente:

Desde que Visão a beijara, eles não haviam falado propriamente sobre seus sentimentos.

A culpa não era exclusivamente dele, porém. Ela sentou perto de Natasha na reunião que sucedera o beijo, e passou a ficar mais tempo com ela, evitando-o, pois sentia seu rosto enrubescer com o misto de sentimentos permeando seu coração quando estavam próximos. O sintozóide, por sua vez, dirigia-se a ela de maneira distante, sem qualquer resquício do jeito carinhoso que demonstrou anteriormente, apenas comunicando sobre o jantar ou alguma missão que necessitavam discutir com o grupo. O clima não estava favorável, e ela imaginava em sua mente diversas maneiras de chegar ao assunto, ensaiando baixinho o jeito perfeito de falar, mas não se sentia preparada para encarar aqueles olhos claros novamente sem voltar o rosto para o chão totalmente corada.

“Vizh? Percebi que você está me evitando, e eu acabo fazendo o mesmo também. Tem sido muito estranho te encarar desde... desde aquele momento. Mas eu gostaria que voltássemos a ser como antes. Eu...”

— Senhorita Maximoff?

Sua digressão foi abruptamente interrompida pela voz neutra de Visão adentrando seu quarto, atravessando a parede ao invés de simplesmente chamá-la na soleira da porta aberta.

— Aparentemente, velhos hábitos perduram, não é mesmo? – Disse Wanda com seu lindo sotaque sokoviano, e um sorriso tímido nos lábios.

Ele sorriu em resposta, um sorriso mecânico, cordial. A Feiticeira Escarlate desviou o olhar, levantando da cama e mirando a parede oposta, tentando formular uma frase do texto que ensaiara antes.

— Vim avisar que o café da manhã está servido. Gostaria de juntar-se a nós? – continuou Visão. Apesar de não necessitar fisicamente de alimentos, o Sintezóide gostava de sentar-se à mesa e aguardar o final da refeição, para muitas vezes guardar a louça, ou apenas interagir com seus colegas de equipe.

“Força, Wanda. Você consegue, está treinando há dias. Coragem.”

Ela respirou fundo e começou:

— Vizh?

— Sim?

— Posso falar com você um momento?

— Claro, Senhorita Maximoff. – respondeu, caminhando até alcançar a metade do quarto, porém ainda mantendo um relativo espaço entre eles.

— Eu... Eu sei que estamos em uma situação complicada...

Wanda olhava para as próprias mãos, entrelaçando os dedos, até que tomou coragem e virou-se, caminhando em largos passos em direção ao sintozóide, inclinando a cabeça levemente para cima e encarando-o diretamente nos olhos.

Todas as palavras que estava prestes a dizer simplesmente sumiram de seu pensamento, como se não existissem primeiramente. Visão encarou-a da mesma maneira cordial de sempre, e por um momento ela ponderou sobre o quanto tudo havia mudado. Não havia mais ele a chamando por “Wanda”, apenas seu sobrenome dito de jeito estritamente formal. Seu olhar carinhoso fora substituído por uma expressão séria. Não existiam mais passeios, conversas, nem encostar as mãos timidamente sob a mesa e deixá-las entrelaçadas, escondido dos outros Vingadores. Sentia falta daqueles momentos. Sentia falta de estar junto a ele.

Apesar de estarem a apenas dois palmos de distância, uma parede invisível os separava. Ela procurava as melhores maneiras de chegar ao assunto, de entender qual o motivo de se afastarem após o beijo. Não sabia descrever o que sentia; animação e nervosismo rodeavam sua mente. Wanda respirou e percebeu que não sabia o que dizer. Apenas ficou parada, encarando o rosto dele e segurando a barra do vestido preto que vestia.  

— Vocês dois precisam de um convite especial para vir comer?

O tom de brincadeira na voz de Rhodes fez Visão tirar os olhos de Wanda por um instante e virar-se na direção do companheiro. O Sargento parou na soleira da porta, e encostou o ombro na parede ao seu lado, aguardando uma resposta. Ela ficou na ponta dos pés e olhou por cima do ombro do sintozóide.

— Sinto muito, Sargento Rhodes. A Senhorita Maximoff gostaria de falar algo comigo antes de irmos. – ele voltou a encará-la – O que seria, Senhorita?

Wanda sentiu as pernas amolecerem ao ver que Rhodes continuava na mesma posição, sorrindo para ela. Nenhum membro da equipe sabia sobre o beijo trocado. Seu rosto enrubesceu, e ela balbuciou algumas palavras antes de finalmente dizer:

— Não era nada demais. Apenas iria avisar que a Natasha estava procurando por você outro dia, mas acho que ela já resolveu o que precisava.

Wanda caminhou em direção à porta do cômodo. Ao perceber que o Sargento saíra da entrada, Visão segurou a mão dela, e delicadamente puxou-a para perto, até que seu corpo estivesse totalmente virado para ele.

— A Senhorita Romanoff não precisava de mim, correto?

Ela suspirou.

— Não. Mas pouco importa agora. – ela deu de ombros – Não se preocupe, Vizh. Teremos outras oportunidades para falar sobre isso.

Sorrindo, ela apertou a mão dele levemente e soltou-a logo após, deixando o quarto em seguida. Visão novamente sentiu uma perturbação em seu sistema. Não diretamente em seu corpo robótico, mas em sua consciência. Sua mente não conseguia achar uma maneira de expressar aquele sentimento novo. Diversas fórmulas e sentenças científicas circulavam por seus neurônios sintéticos – tanto conhecimento armazenado e nenhuma maneira de externar seu afeto. Quando pensava no que ocorrera aquele dia, imaginava o quanto teria sido constrangedor para a Senhorita Maximoff se alguém da equipe os visse, mesmo sendo apenas uma demonstração de carinho comum aos humanos. Balançando a cabeça, seguiu em direção à cozinha, imaginando que ela gostaria de falar sobre o assunto anteriormente, sem saber o que fazer para amenizar a situação. 

Ao adentrar o pequeno espaço da cozinha com seu prato em mãos, Wanda sentiu um braço ao redor da sua cintura. Nat cumprimentou-a, usando sua regular regata preta juntamente com um par de calças da mesma cor, e uma jaqueta vermelha protegendo-a do frio naquele dia gelado em meados de janeiro.

— Está usando a jaqueta que peguei ano passado? – perguntou Wanda, que por sua vez usava um fino casaco branco, um colar discreto e meias compridas pretas combinando com o vestido, acompanhadas de botas de cano longo.

— Exatamente.

— Particularmente, acho que ela fica melhor em mim. – disse a feiticeira, piscando, e recebeu um sorriso em resposta da ruiva. 

As duas observaram os pratos com comida exposta no balcão de granito da cozinha apertada. Wanda aparentemente estava com pouca fome, servindo-se apenas de duas panquecas com manteiga e uma pequena porção de ovos mexidos, juntamente com uma xícara de café.

— Não está com fome? – perguntou Steve Rogers, que também colocava comida no prato – Você precisa comer, mocinha.

Ela riu da maneira que o Capitão falou, cuidadoso como um irmão mais velho. Ele vestia uma blusa polo azul e calças cáqui, um estilo chique que o definia incrivelmente bem.

— Sem apetite. – respondeu, e ele afagou seus cabelos enquanto dirigiam-se para a mesa.

A grande sala onde os Vingadores realizavam suas refeições estava animada naquela manhã. Tony alegremente conversava com Rhodes, explicando sobre sua nova invenção. Steve saiu do lado de Wanda e juntou-se a Sam para comentarem as notícias do jornal impresso daquele dia. Ela correu os olhos pelo local, procurando por Visão. Ele estava sentado em um divã próximo à televisão, na parede oposta à mesa retangular de madeira, e observava o noticiário matinal. A moça apressou-se e sentou ao lado de Nat, ao passo que Vizh levantou e lentamente aproximou-se, sentando na ponta da mesa, ficando a uma braçada de distância das moças. Natasha percebeu que os músculos de sua colega se contraíram, parecendo desconfortável com a situação. Ela observou com sutileza, e dentro de sua mente pequenas engrenagens rodavam, juntando peças de um possível quebra cabeça.

Sam e Steve sorriram para as únicas moças da Base, que sentaram frente a eles. Rhodes puxou uma cadeira e sentou-se na diagonal da mesa, entre o Capitão e Tony, que ocupara na ponta livre, buscando se inteirar na conversa. Wanda olhou para Visão carinhosamente, como se nada tivesse acontecido, porém seu coração batia rápido e seus músculos continuavam rígidos. Visão percebeu incômodo pairando no ar, e seu olhar normalmente neutro apresentou confusão. Todos pararam de falar, e silêncio estranho permeou o ambiente, até que Sam resolveu quebrá-lo:

— Era um dia frio de inverno. Os Vingadores se juntavam em seu covil para salvar o mundo... – disse em tom espirituoso, pegando uma fatia de bacon em seu prato e mirando na distraída feiticeira - ... da ameaça Maximoff!

Wanda riu e deu um pequeno peteleco no ar para mandar o pedaço gorduroso de bacon da mão do Falcão para o lado oposto da sala. Seus companheiros aplaudiram, assobiaram e bateram na mesa, encorajando-a. Ela levantou e mexeu os braços em movimentos circulares, como se clamasse pela torcida, com um sorriso estampado no rosto. Visão sentiu novamente aquela agitação dentro de si, ao vê-la alegre e brincando como antes. Sentiu vontade de fazê-la sorrir da mesma forma, então juntou-se aos demais para exaltá-la.

— Obrigada, obrigada – ela sentou-se novamente – Acho que ninguém aqui é páreo para a ameaça Maximoff, mas isso eu já imaginava – disse, com o sotaque acentuado e um sorriso triunfal.

— Bom, para início de conversa, eu tenho certeza que iria te vencer rapidinho, moça. – desafiou Tony, mastigando um pedaço de panqueca.

— Pode trazer seu melhor exército de robôs. Eu irei detonar um a um. – respondeu a feiticeira, tomando um grande gole de seu café.

— Na verdade, eu não preciso de um exército de robôs, como você acha. – o Homem de Ferro levantou-se e estendeu a mão, apontando o dedo indicador para a ponta oposta da mesa – Eu preciso apenas de um, senhorita.

Visão surpreendeu-se com o movimento brusco de Tony. Wanda olhou primeiramente para a figura paterna com o canto dos olhos, depois fitou o outro personagem da história. O sorriso murchou em seu rosto, e ela pigarreou, sem saber o que dizer por um momento. O sintozóide se apressou em formular uma frase e falar, temendo deixá-la desconfortável novamente:

— Tenho certeza que meus poderes não são páreos ante uma ameaça como a Senhorita Maximoff.

Tony voltou a se sentar e ergueu os braços, espreguiçando-se na mesa.

— Tem certeza? Seus cálculos dizem isso para você? Eu criei uma mente capaz de calcular tudo, e você me vem com essa? Você é um super robô com uma joia poderosíssima na testa. – riu sarcasticamente e encarou Wanda – Viu como eu iria vencer?

— Tony, você está esquecendo que os poderes dela provém da mesma fonte que os do Vis. Ela poderia facilmente controlá-lo. – apontou Natasha, que estava em silêncio até então.

— Ela tem um ponto. – apoiou Steve, e Tony olhou para ambos desdém.

— Os poderes da Senhorita Maximoff vão além da telecinese. Ela possui uma ligação muito maior com a magia que eu. – Visão deixou seu lugar na mesa e caminhou ao redor desta, animadamente explicando sobre os poderes de Wanda – Ela possui uma energia tão forte que a permite fazer coisas incríveis.

Neste momento, ele parou ao lado de Rhodes, e o Sargento olhou de maneira duvidosa, desconfiado de seu entusiasmo repentino ao falar sobre os poderes dela.

— Espera, como você sabe de tudo isso? – perguntou, interrompendo sua fala.

— Eu tenho estudado, Sargento Rhodes. Tentando entender o que se passa aqui – ele apontou para a joia em sua própria face – e no interior da Senhorita Maximoff. Essa força me fascina. Ela pode mover objetos, imobilizar pessoas, e até alterar a polaridade molecular, causando mudanças na realidade, se assim desejasse.

Todos encararam a afirmação com certa estranheza, inclusive a própria Wanda, que ainda não tinha noção da real dimensão de seus poderes, muito menos sabia que ele estava pesquisando a respeito.

— Ela poderia transformar o mundo em um lugar fantástico. Ou em completo caos. Apesar de muitos acharem que ela não deveria fazer isso...

Visão saiu do lado de Rhodes e parou ao lado dela, lentamente passando os dedos pela extensão de seus cabelos.

— ... Eu realmente não me importaria se ela alterasse a minha realidade.

Não, Visão. Não era para você ter dito sobre alterar problemas do mundo. A Senhorita Maximoff vai se sentir desconfortável novamente. Não sei o que está havendo. Por que estou sentindo e agindo de maneiras tão diferentes? Por que não consigo me concentrar e dizer algo tão simples para ela? O que está acontecendo?”

 

Mas era tarde demais.

— O que exatamente você quis dizer com isso, Vis? – Natasha cruzou as pernas sob a mesa e apoiou o queixo na mão direita, levemente inclinando o corpo para encará-lo. Wanda sorriu sem jeito e encarou o chão, pensando em uma resposta que deixasse o clima menos tenso.

Sam trocou olhares com Steve e Rhodes, desconfiado do que aquela frase poderia significar. Tony, pela primeira vez, ficou sem saber o que dizer por um momento, assim como seu robô.

— Visão, a qual realidade exatamente você está se referindo?

— A minha... Caso eu tenha algum problema. Ou um conflito iminente. – ele realmente não fazia ideia do que dizer para melhorar a situação, e manteve seu lugar ao lado de Wanda, encarando os colegas, clamando por ajuda com o olhar.

— Se isso fosse realmente possível, gostaria de voltar para o conflito de Sokovia no ano passado. – Wanda suspirou e olhou para Visão com a expressão séria.

— Nat, você não tinha algo para pedir para o Visão? – Rhodes se intrometeu para tentar apagar o incêndio, ao que a Viúva Negra respondeu com confusão.

— Eu tinha? – ela sentiu a Feiticeira Escarlate cutucá-la com o pé, suplicando que ela entrasse na mentira que contara mais cedo – Ah! Claro que tinha! Visão, preciso que você revise os Arquivos da última missão. Encontrei uma inconsistência, porém não lembro em qual deles.

— Mas Senhorita Romanoff, o total da última missão ultrapassa três mil arquivos. A Senhorita deseja que eu observe todos manualmente?

— Sim, é o suficiente para mantê-lo ocupado por uma boa parte do dia. Quando terminar, venha me procurar – ela levantou-se da cadeira e pousou a mão sobre o ombro da moça ao seu lado – Estarei na sala de treinamentos com a Wanda.

— Nós vamos treinar hoje? Achei que iríamos... – Natasha levemente apertou o ombro de Wanda afim de afirmar que tudo fazia parte de um plano – Sim, claro, nós vamos treinar.

— Precisam de ajuda? Eu poderia... – começou Steve, porém foi interrompido por um “não” uníssono das duas.

— Deixe as mulheres treinarem sozinhas, companheiro. – disse Sam, dando tapinhas nas costas do Capitão – Nós iremos achar um jeito de nos divertir também.

— E você só vai pegar meu super robô emprestado para rever arquivos, Natasha? Rever arquivos? – falou Tony, incrédulo – Preciso de ajuda com invenções no laboratório.

— Eu ajudo você enquanto o Visão estiver ocupado. Com alguns pitacos. – pigarreou Rhodes, recebendo uma singela piscada em resposta de Nat, a qual continuou em seguida:

— Agora, todos fora da cozinha. Eu e o Tony iremos lavar a louça.

O Homem de Ferro soltou uma gargalhada alta, pousando a mão sobre a blusa preta que vestia.

— Você hoje está tão engraçada, Natasha. Eu? Lavar a louça com você?

Todavia, a face do restante da equipe permaneceu séria, e o sorriso de Tony gradualmente desapareceu de seus lábios.

— Se quiser, posso lavar a louça por você. – Ofereceu-se Visão, sem sucesso, ganhando um olhar censurador da ruiva.

Ela apoiou-se na mesa com o braço, querendo proteger Wanda do sintozóide:

— Quanto mais rápido você checar esses arquivos, mais rápido você pode ajudar o Tony.

Visão assentiu, e mirou Wanda uma última vez antes de sumir pelo corredor. Um olhar aparentemente neutro carregava desculpas esperando para serem ditas a ela por tê-la incomodado perante seus companheiros. “Eu sinto muito por todas as vezes que a deixei em situações ruins e desconfortáveis. Estou me esforçando para expressar o que sinto de maneira mais humana” era o que ele gostaria de dizer, e seu rosto se contraiu enquanto descia as escadas em direção a sala de reuniões, querendo dar meia volta e voar até o quarto de Wanda para dizer-lhe isso, porém, ao mesmo tempo, temendo fazê-la infeliz. Seguiu seu caminho desejando que os incríveis poderes da Feiticeira lhe permitissem comunicar-se com ela por telepatia.

Natasha sorriu, e começou a juntar os pratos a medida que os outros Vingadores deixavam a cozinha. Disse em um sussurro para Wanda descansar em seu quarto, e que logo a encontraria para irem treinar. Tony bufou ao se aproximar da pia carregando duas xícaras.

— Não sei por que você está tão brabo. Parece que nunca lavou a louça na vida.

— Primeiro você manda o meu robô rever os arquivos da missão um a um. E ele obedece, porque é a droga de um robô subserviente. E agora você me manda lavar a louça sendo que não é meu dia! – Tony passou a esponja com sabão por alguns pratos – Quem você pensa que é? A mãe de nós todos?

— Do jeito que vocês são infantis, eu acredito que sim. Eu e a Wanda somos ótimas mães.

— Acho que vocês formariam um casal ideal. Duas mandonas.

— Mas não é esse o ponto que eu preciso falar com você, Tony. Eu mandei você lavar a louça comigo porque estou percebendo algumas situações diferentes envolvendo a novata e seu super robô. Precisava falar com você em particular.

— Diga-me o que te incomodas e te direis se é de meu interesse.

Natasha revirou os olhos, suspirou e largou as louças na pia. Apoiando a palma das mãos na bancada escura da cozinha, suportou o peso do corpo magro nos braços e, inclinando a cabeça para o lado, disse:

— Acho que o Visão está apaixonado pela Wanda.

Tony Stark soltou uma gargalhada alta, tanto que era capaz de boa parte daquele andar da base ter escutado. Riu a ponto de precisar secar pequenas lágrimas formadas no canto de seus olhos. Ele largou o pano que usava para secar as xícaras e respondeu:

— Nat, quanta inocência. Só por causa daquele lance de “mudar a realidade”? – ele lavou mais alguns pratos, colocando-os no escorredor – Acho que vou pensar em um robô que possa alterar a minha realidade nesse momento. Que lave a louça por mim enquanto tiro um cochilo.

— Não mude de assunto. Você viu o quanto ele foi carinhoso, entusiasmado ao falar dos poderes dela. Passou a mão pela cabeça dela. Até utilizou uma indireta quando falou sobre a realidade!

— Mas que merda, Nat, ele é a droga de um robô! – Stark largou as louças ensaboadas sobre a bancada e virou o corpo para ela – Ele não entende o conceito de indireta. E quanto a passar a mão na cabeça, é algo que o Rogers faz sempre. O Visão deve ter, sei lá, visto esse gesto e tentado imitar. Depois que ele literalmente fez brotar uma capa como a do Thor, eu não duvido de mais nada.

— Visão não é só um robô, Tony. Não mais. – Natasha secou algumas louças e começou a guardá-las no armário – Ele está evoluindo. Os dois estão. Você mesmo viu, na festa de ano novo. – Ela parou o que estava fazendo após fechar a porta do móvel, apoiando um braço neste e novamente virando o corpo para encarar seu colega, que estava terminando de arrumar a mesa.

— Acho que você percebeu. Só não quer admitir.

Tony ficou parado na mesma posição, escorando-se em uma das cadeiras e observando as próprias mãos. O reator em seu peitoral emitia uma luz fraca. Pensou em JARVIS, em sua relação de amizade com ele, os problemas com Ultron, e quando criara Visão. Uma criação queria destruir o planeta, enquanto outra busca a paz desde que nascera. Ele nunca iria concordar com sua colega, mesmo com alguns sinais beirando a obviedade, como o dia de Natal e a festa de ano novo. Visão era como um filho, ainda aprendendo a viver em um mundo tão hostil, e era difícil pensar que ele estaria apaixonado por uma feiticeira. Por fim, ao sentir Natasha se aproximar, falou:

 – Eu nem sei o que dizer sobre isso. É ridículo. – Suspirou, movendo-se para guardar o restante da louça – Queria que o Banner estivesse aqui Ele com certeza iria concordar comigo. – ela estremeceu de leve com a menção de Bruce, todavia, manteve-se firme para que ele não percebesse sua recaída.

— Eu acredito que não, Tony.

Sargento Rhodes adentrou o cômodo, atrapalhando os pensamentos de ambos.

— Peço desculpas por isso, eu realmente não queria escutar a conversa de vocês. Mas eu sou obrigado a concordar com a Nat.

Ela sorriu e agradeceu com a cabeça, enquanto Tony bufou.

— Até tu, Brutus?

— Eu vi o Visão e a Wanda conversando mais cedo, no quarto dela. Não consegui saber qual o assunto eles estavam discutindo, mas vi que ela ficou bem nervosa quando eu cheguei na porta. – disse, aproximando-se de Tony – Pelo pouco que entendi, eles se afastaram de uns dias atrás para cá.

— Era exatamente nisso que eu queria chegar. Obrigada, Rhodes. – Natasha chegou mais perto deles e deu um tampinha no ombro do Sargento – Eles estão distantes. Isso faz com que a Wanda fique distraída nos treinos, e eu tenho receio de atrapalhar em futuras missões importantes.

— Certo. Certo. Então vamos fazer isso da maneira antiquada. – Tony ficou de frente para Natasha e Rhodes, esticando uma das mãos – Se você estiver certa, e meu super robô realmente estiver apaixonado pela novata, por mais que eu não consiga acreditar nisso, eu dou o braço a torcer e ajudo vocês... Seja lá com o que estejam planejando.

— Eu não estou gostando nem um pouco disso. – Respondeu a ruiva, pendendo a cabeça para o lado enquanto aguardava o final da fala de Tony.

— Mas se eu conseguir provar que isso é invenção e ela está distraída por qualquer outro motivo – ele fez uma pausa dramática, e olhou para o chão antes de terminar a frase – Eu quero o seu quarto para ampliar meu laboratório.

Ele olhava diretamente para Natasha, a qual soltou uma risada sarcástica.

— E você quer que eu durma com a Wanda, por acaso?

— ... Eu não tinha pensado nisso, mas sabe que é uma boa? Vocês poderiam-

— Não queremos saber, Tony, obrigado – Rhodes botou a mão sobre o reator dele, virando-se para Natasha em seguida – Tem um quarto com algumas caixas ao lado do meu. Podemos arrumá-lo para você, se for o caso.

— Eu sei que não vai ser o caso, meu bem. Mas eu concordo.

— Fechado, então?

Tony esticou novamente a mão direita, esperando um aperto de mão que selasse o acordo. Apesar de achar a situação ridícula, Natasha sabia que era intrínseco da natureza Stark. Respirou fundo, estendeu a mão esquerda e apertou a dele fortemente, tanto que poderia imobilizá-lo ali mesmo. “Perdão, força do hábito”, sussurrou antes de piscar e responder:

— Fechado.


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Notas finais do capítulo

Essa história saiu das minhas ideias com a ajuda de algumas pessoas muito especiais: Shini, o melhor namorado do mundo, que me incentiva todo dia a escrever; Areiko, meu melhor amigo que aguenta a falação sobre essa fic (e esse casal) todo dia; e Elisa, minha leitora mais antiga, e que sempre apoiou todas as minhas histórias. Gente, essa fanfic é para vocês! E eu realmente espero que vocês gostem tanto quanto eu amei escrevê-la! Muito obrigada pelo carinho de sempre, e nos vemos no próximo capítulo!