Quam superesse in paradiso escrita por Lara Coimbra


Capítulo 8
Filii Ludens Innocentia


Notas iniciais do capítulo

Aêêê!
Finalmente ta aqui o bendito capítulo 8!
Um pouco mais crescidinhos, Wander, Mono, e Kuppe se divertem e criam confusões... Um aprofundamento e evolução dos personagens.

E ainda vou escrever o capítulo do desafio de outurbo quando voltar do curso de inglês proficiência.



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O sol acordava em Yath mais uma vez. O reino aparentemente tranquilo amanhecia junto dos raios que subiam os morros, enquanto feixes mornos de luz espiavam as janelas dos casebres e do castelo. Os longos e brilhantes cabelos de Mono escondiam seu semblante pacificamente adormecido. Um emaranhado de fios negros cobrindo o rosto mais belo, o coração mais puro, e a alma mais condenada. Encostada em seu braço, e na mesma cama, sonhava mais uma criança. Esta de cabelos vermelhos como sangue, e expressão intensa. Não era incomum que Wander dormisse no castelo, com a proteção de Idwal. Afinal, tanto ele como a princesa não se separavam desde o nascimento - e não havia nada mais belo em Yath que a amizade cultivada entre os dois. 

Logo, nos portões da residência real, aproximava-se uma simples carruagem, levando consigo uma família honesta e servente da nação. A governanta Hege, seu filho Kuppe, já com seus nove anos de idade, e também Tabor, que era marido, pai, e veterano de guerra. Normalmente serviçais dormiriam nas dependências, porém, por conta de Tabor, recém chegado do campo de batalha - e longe das melhores condições físicas.

“Podem seguir em frente”, consentia o guarda, enquanto outros abriam o portão.

Kuppe logo pulou do veículo, cheio de energia. “Posso chamar Wander para brincar, mamãe?”

“É claro!”, permitiu Hege, descendo logo depois. “Ele e Mono ainda devem estar na cama”. 

Kuppe nem tinha escutado a última parte da fala, por já ter corrido para dentro da majestosa construção. Pulando de braços abertos e pernas esticadas para cima das outras duas crianças, ele anunciava, orgulhoso: “Cheguei! Vamos brincaaaar!”

Mono saltou de susto e rolou para fora da cama. A reação de Wander foi mais audaciosa. O menino mais novo escorregou por baixo dos braços de Kuppe e deu um tapa em sua cabeça. 

“Ai! Por que fez isso?”, reclamou Kuppe, esfregando o cocuruto. 

“Você poderia ter machucado a Mono.”, Wander estava sério.

“Idiota, ela está rindo de você.”

Quando o ruivo olhou, era verdade. Eram pequenos risos contidos, mas estavam ali. Mono achava engraçado quando Wander tentava defendê-la. Wander ficara um pouco envergonhado, mas por pouco tempo. 

Logo depois aparecera no quarto o homem mais ilustre, Rei Idwal. Sua barba estava deveras longa, e já cedo trajava roupas luxuosas. Era sinal de que ele tinha compromissos oficiais à sua espera.

“Papai!”, Mono correu para seus braços.

“Mas que comoção toda é essa, tão cedo?”, ele perguntava, devolvendo o carinho à sua pequena herdeira. 

“A gente só estava brincando, senhor… Quero dizer, Vossa Majestade!”, gaguejou Kuppe, fazendo uma reverência qualquer.

Carregando Mono no colo, Idwal se aproximou dos dois meninos, e colocou a mão sobre a cabeça de cada um brevemente. 

“Kuppe, você sempre será bem vindo neste lar, saiba disso.”

Wander se sentia um pouco acanhado, mas o rei ofereceu palavras meigas. “E você, Wander, não faça essa cara, você é praticamente parte da família. Mono ficaria muito sozinha se não fosse por você… Vocês dois, na verdade.”

Mono estava agarrada no pescoço do pai quando perguntou: “Lord Emon vem hoje?”

O semblante de Idwal tornara-se pesaroso, assim como o de Mono. “Sim, minha filha… Mas não agora. Peça à Hege algo para comer e vá brincar.

Na mesa de café, Hege oferecera  aos três alguns pedaços de pão de centeio. O alimento era bem nutritivo para as crianças, conhecido por saciar mais facilmente a fome. Tornara-se recentemente um produto amplamente consumido em Yath, tanto por ricos, pobres, e soldados. 

Tabor passara por ali rapidamente, dando um beijo na esposa, antes de se arrumar para apresentar-se ao rei. O pai de Kuppe não era um soldado qualquer. Sua experiência, junto aos olhos e ouvidos atentos eram reconhecidos amplamente, o que lhe dera uma função extra, de relator. 

“Kuppe, seu pai está muito ferido?”, perguntou Wander, curioso, notando que Tabor mancava.

“Logo ele estará em forma novamente.”, respondeu Kuppe, com muita convicção. “Alguns derafes idiotas deram trabalho para ele.”

“O que será que tem nessas Terras Proibidas que eles querem tanto?”, indagou Mono. 

“Eu sei lá… Todos dizem que é um lugar amaldiçoado e vazio.”, Kuppe dava de ombros. 

Hege escutava a conversa de perto. “Lembrem-se das histórias, crianças. A ordem não quer que Dormin seja despertado.”

“Mas… ele não era de faz de conta?”, Wander ficou confuso.

“Mãe, você acredita que esse Dormin exista mesmo?”

“Bem, seu pai não precisaria se arriscar se não houvesse nada naquele lugar.”, Hege suspirava, um pouco irritada. 

“Às vezes eu acho que escuto Lorde Emon falar sobre Dormin quando estou na câmara com ele.”, Mono comentou, extraindo reações preocupadas. 

“O que estão fazendo aqui ainda? Já terminaram o café, agora, pra fora, vão brincar!”, incentivou a governanta, quebrando o clima de tensão.

Kuppe e Wander apanharam espadinhas de madeira e correram para os jardins do castelo. Enquanto Mono passava os olhos sobre um livro de gravuras, os meninos simulavam uma batalha feroz. No fundo, os dois tentavam impressioná-la, mas sem sucesso. Violência e guerra não faziam parte de seu gosto pessoal. Ela preferia aprender coisas mais femininas, como a natureza das flores, bordado, e costura. Já distraídos, os dois aspirantes a soldado mergulhavam cada vez mais na luta. Kuppe demonstrava-se audacioso em seus movimentos, enquanto Wander mal conseguia se defender. Num misto de criancice e perversidade, o filho de Hege e Tabor interrompeu Mono em seus pacíficos estudos e tomou-a pelo braço.

“O que você está fazendo?”

“Vamos lá Wander! Duvido que você ganha de mim! Ou Mono levará a pior!”

“Me solte, Kuppe!”, esperneava Mono.

“Deixe ela em paz!”, berrou Wander, avançando para cima de Kuppe.

O mais velho, porém, fora mais esperto. Ele jogou Mono no chão, e quando Wander se aproximou, com raiva, ele conseguiu jogar sua espada para longe e rendê-lo com a sua, que já estava contra o pescoço do caçula.

“Se fosse de verdade, você já teria perdido o cabeça.”, disse Kuppe, abaixando a guarda de forma orgulhosa. 

“Onde você aprendeu a lutar?”, Wander quis saber, com uma ponta de inveja.

“Meu pai me ensina quando ele pode.”

Wander também queria um pai para ensiná-lo, mas ele não tinha um. Enquanto isso, Mono tentava limpar a poeira de seu vestido claro. Ela não estava nada feliz.

“Seu pai também ensina a ser mau com princesas?”

“Por favor, não conte para ninguém! Posso ser expulso do castelo por isso.”, suplicou Kuppe.

“Então me ensine a lutar.”, pediu Wander, se aproveitando da situação. 

“E você Mono, o que você quer?”

“Hummm…”, a garota ficara pensativa, e infestada de ideias. “Você consegue me levar para fora? Eu nunca vi como é a cidade!”

Os dois amigos entreolharam-se, nervosos. 

“Se eu fizer isso, eu posso ser preso!”, afirmou Kuppe, em tom de desespero. “Ou pior, meus pais podem ser condenados!”

“É perigoso… Mas deve ter um jeito!”, Wander era um pouco mais positivo em relação ao desafio. 

“Você me deve isso, Kuppe.”, forçou Mono.

“Eu quero ajudar, faço qualquer coisa!”, Wander se prontificou. 

Não houve tempo suficiente para planejar, pois logo se fizera presente Lorde Emon, acompanhado de outros dois xamãs. Eles escoltaram Mono em direção às câmaras do castelo onde, normalmente, aconteciam os tratamentos pelos quais ela era submetida. No meio do caminho ela consegue ver o pai de relance, dentro do salão de reuniões. Ele estava inquieto e ela pôde ouvir palavras como “guerra”, “mortos”, “esperança”... Estava claro que Idwal não queria perder homens por uma causa tão misteriosa e injusta. 

“Vamos”, Emon apressou Mono. 

A pequena fora instruída a deitar-se na cama de pedra - um processo já tedioso e repetitivo. Os ajudantes do líder acendiam piras e grandes incensários. As substâncias preferidas dos xamãs para limpezas espirituais eram cânfora, cravo, e eucalipto. A mistura tinha um cheiro tão forte que podia ser sentido de quase todos os cômodos do castelo. O cravo cortava o azedume da cânfora, e o eucalipto aliviava a amargura do cravo.

De resto, o ritual consistia na reza incessante dos xamãs em torno de Mono, enquanto a voz de Emon fazia-se soberana, comandando o restante dos participantes da sessão.  Mono não podia fazer nada além de esperar. Não conseguia dormir por causa do odor dos incensos e da voz rouca e rasgada de Emon em seu ouvido. Se ela tinha algo de bom para tirar daquilo era paciência. 

Enquanto isso, ainda nos jardins, Wander e Kuppe estavam ocupados com mais uma competição. Escalada. Ainda tentando escapulir da promessa de levar Mono para conhecer a cidade, Kuppe foi desafiado por Wander a escalar uma seção das paredes externas do castelo. 

“Quem se cansar e cair primeiro perde!”, Wander apontava, já começando subir. “E se você perder, você me ajuda!”

“Me espere! Com certeza vou ganhar de você!”, bradava Kuppe, demonstrando falsa confiança. Ele nunca havia feito algo parecido.

O garoto ruivo não era tão ágil, mas tinha habilidade e cautela na hora de se agarrar nas vinhas que cresciam sob as pedras ou apoiar seus dedos e pontas dos pés na menor irregularidade que fosse. No final das contas, Kuppe acabou despencando, e caindo sentado. Por sorte não se machucou. Wander desceu ao poucos, sorrindo, orgulhoso. Ele foi se abeirando da câmara, devagarinho, e pôde espiar pelas frestas da porta. Nenhum xamã estava presente. Havia apenas Mono, em seu leito escabroso, cercada de vapores miasmáticos. 

“Psssiiu! Mono!”, sussurrou Wander vigiando a entrada e chamando.

Logo, a menina se levanta e sussurra de volta: “O que está fazendo aqui?”

“Nós vamos para a cidade! Kuppe arrumou um jeito!”

“Não posso…”, Mono soou deprimida. “Emon vai voltar logo.”

“Venha, antes que ele apareça!”, insistiu Wander. 

As duas crianças saíram escondidas, esgueirando pelos cantos e sombras, evitando contato com outras pessoas, principalmente com xamãs. Kuppe colocou os pequenos debaixo da lona de uma carruagem, que logo partiu para fora dos limites do castelo. Mono arfava de ansiedade, e Wander segurou sua mão.  O carro parou no meio da feira. Estava muito movimentado, então foi fácil sair sem que percebessem. Mono nunca havia visto tanta gente em um lugar só. Wander agarrou sua mão e eles saíram trotando, dando gargalhadas. De tudo fizeram, assistiram artistas de rua, conheceram cabras que andavam livremente pelos arredores, e roubaram frutas para comer. Depois, sentaram numa escadaria para fazer o lanche.

“Por que você precisa passar tanto tempo com Lorde Emon?” , Wander parecia um pouco preocupado e desconfiado. “Eu não gosto dele.”

“Eu também não.”, assentiu Mono, concordando. “Mas você sabe o porquê… Eu nasci com uma maldição, e Lorde Emon está tentando tirar.”

“Faz tanto tempo, e ele ainda não conseguiu?”, o menino demonstrava desconfiança.

“Nem meu pai sabe me explicar…”, ela expirava tristonha. 

Algum tempo depois, inesperadamente, uma carruagem real chega cortando as ruas com velocidade, causando comoção nos habitantes. E ao se aproximar da escadaria onde estavam Mono e Wander, o cocheiro puxou as rédeas com tanta força que os cavalos derraparam antes de frenar completamente. Impressionando moradores presentes, Idwal saiu desesperado do veículo, e correu até a filha e o protegido. Esboçou um choro enquanto os abraçava.

“Eu não sei o que seria de mim se perdesse vocês! Fiquei tão preocupado!”

Mono e Wander entreolharam-se, assustados. Não tinham ideia de que notariam suas faltas assim, tão rapidamente. 

“A gente não ia fugir, papai.”, Mono tentou explicar.

“A culpa é minha, eu-”, Wander tentou assumir a culpa por tudo mas foi interrompido pelo rei.

“Shhhh… Ninguém tem culpa de nada. Vamos para casa.”

Depois daquele dia Idwal começou a estudar uma forma de permitir ocasionais saídas de Mono, sempre escoltada por xamãs ou guardas, para que algo similar não acontecesse outra vez. Emon protestava, e muitas vezes fazia questão de ser o acompanhante da menina em seus esporádicos passeios. A população de Yath finalmente conheceu a cara da princesa, antes escondida do olho público. Suas aparições, curiosamente, ajudaram a melhorar a imagem do reino e tranquilizar o ânimo das pessoas, mesmo que fosse de forma superficial. A guerra ainda acontecia ao longe, consumindo esperanças, recursos, e vidas corajosas. 


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Notas finais do capítulo

Eu acho que este capítulo fecha o primeiro objetivo da fanfic, que era apresentar o mundo onde viviam Mono e Wander antes dos eventos de Shadow Of The Colossus e ambientar, enquanto a posição de Mono e Saunter e estabelecida em paralelo com essa "prequel".
Não garanto que vou continuar postando com a mesma frequência de antes, devido ao trabalho (Graças a Deus to tendo trampo né) e também por estar participando do desafio de outubro do Nyah! Ainda hoje posto o primeiro capítulo!
Até a próxima pessoal, não muito em breve, mas também não vou ficar o mês inteiro sem postar né, não sou doida.



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