O Mistério da Lua - Livro I escrita por salutetrangeer


Capítulo 6
La Primera Muerte


Notas iniciais do capítulo

Amorxs agora as coisas começam a esquentar, ainda tem muito pela frente.
Espero que gostem ♥
— Lu



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     As viaturas da polícia não demoraram a chegar, tudo aconteceu muito rápido, quando dei conta de mim mesma estava sentada numa ambulância pequena com cheiro de remédio forte e de desinfetante, com um casaco marrom escuro de um policial aquecendo-me. Toda a magia da noite havia terminado ali, eu estava prestes a enlouquecer com tudo isso, não podia ser verdade, não podia.

— Com licença senhorita Stoned. – O policial baixinho e carrancudo, com bigode grosso, e olhos pequeninos, usava seu uniforme com uma pequena plaqueta dourada escrito Xerife Martinz em letra preta cursiva, a cara de tédio denunciava que estava exausto da investigação dos desaparecidos, só queria chegar em casa e talvez abraçar os dois filhos, ou colocar os pés para cima na banqueta central da sala e assistir canais de Reality Shows enquanto toma uma cerveja barata— Precisamos do seu depoimento novamente, caso tenha lembrado de algum detalhe, tem certeza que não viu ninguém saindo do banheiro?

— Eu já falei o que vi. – Respondi chorando novamente.

     É tão dolorosa a maneira como as coisas podem se transformar de um momento para o outro, como uma bela serpente trocando de pele pronta para dar o bote no primeiro infeliz que ousar apreciá-la em sua transmutação. A noite estava sendo perfeita com Pablo, mas tudo terminara quando abri a última cabine do banheiro e me deparei com ela.

     Seus olhos eram apenas duas grandes órbitas negras sangrando, em seu corpo nu marcas de símbolos desconhecidos para mim, um grande corte profundo na barriga em formato de redemoinho com um corte central ainda mais profundo, as moscas pairavam sobre o cadáver como urubus atrás de carniça zumbindo ouriçadas, o cabelo loiro dourado agora era emaranhado molhado manchado de vermelho, o cheiro podre do corpo se decompondo e a expressão de pavor naquela mulher me fariam ter pesadelos ao longo dos seis meses seguintes. E então eu gritei, gritei o mais alto que podia até meus pulmões doerem e o ar faltar, meu corpo não obedecia pelo choque da cena de terror incomparável até mesmo com o pior dos piores dos castelos mal-assombrados, aquilo era diferente, uma vida havia sido perdida, ela claramente havia sido assassinada e a sensação de estar presente na cena de um crime era incomparável.  

     Meu corpo inteiro se contraiu enquanto eu gritava e lagrimas marejavam sem controle, embora não a conhecesse eu sabia exatamente quem era e isso tornava tudo mais difícil, o colar dourado com pingente que vi ontem, Sra. Dulce, a última desaparecida e primeira encontrada.

     Pablo ao ouvir os gritos correu para dentro do banheiro e me abraçou tirando-me daquela cena de terror, meus ossos e células tremiam como nunca, afundei o rosto em seu peito enquanto o cenário retornava à mente como um castigo milenar.

— Eu estou aqui. – Dizia me envolvendo em seus braços para me acalmar.

     Ele chamou a polícia e informou a tragédia para um dos funcionários que logo se aprontou em anunciar nos grandes alto-falantes que devido à um acidente, o parque seria fechado mais cedo.

— Senhorita Stoned, preciso perguntar mais uma vez, tem certeza que não viu... - O interrompi.

— Por que o senhor ainda está aqui? Eu já falei tudo o que vi, tudo o que sei, mas ao invés de ir atrás do assassino o senhor prefere ficar aqui me fazendo milhares de perguntas e obrigando-me a relembrar toda aquela cena, está ignorando o fato de que o criminoso poderia estar nesse parque. Por que não faz seu trabalho de verdade, xerife? – Despejei todos meus sentimentos de raiva encima do dele que, confuso e irritado com o trabalho odiado, virou as costas e saiu para conversar com outros policiais.

— Como você está? – Levantei a cabeça e Pablo me olhava, ele se sentou ao meu lado na ambulância, sua expressão tranquila era como a calmaria do mar após intensas tempestades.

— O final da noite não foi dos melhores. – Respondi cabisbaixa, me entregou uma garrafa gordinha de água, agradeci e bebi um gole fechando em seguida.

— Seu pai já está a caminho, achei que gostaria que ele viesse então liguei e... Bem, contei o que havia acontecido para te poupar de lembrar mais uma vez. – Suspirei, a noite ainda seria longa.

— Obrigada. – Falei, por fim.

— Pelo que?

— Por me tirar de lá, ainda estaria olhando aquilo em choque se não fosse por você, e por ter falado com meu pai. – Senti minhas bochechas corarem.

— Não deixaria nada acontecer com você. – Assenti como forma de agradecimento e vi a pick-up willys azul sendo estacionada e papai saltando de lá, um policial tentou discutir com ele dizendo que não podia entrar na área restrita por ser cena de um crime.

— Eu não posso entrar? – O ouvi gritando – Então eu vou derrubar esse parque inteiro até estar com a minha filha, carajo*!

— Senhor, se acalme. – A policial novata com coque bem feito e batom rosa dizia para ele e tentava, novamente, dizer que não poderia passar.

     Meu pai é o homem mais carinhoso e calmo que conheço, mas em seus momentos explosivos se torna outra pessoa voltando até mesmo ao sotaque espanhol e misturando algumas palavras. Por fim, invadiu o local rasgando a faixa amarela, o Xerife num gesto rápido, impediu que os policiais fossem para cima dele.

— Filha! Como você está? – Seu abraço quente e caloroso sempre me reconfortava como um Oásis no meio do deserto – Venha, vamos embora antes que eu seja preso por agressão.

     Tirou o casaco de minhas costas, deixou no banco da ambulância e se virou para Pablo:

— Pode vir conosco se quiser. – Disse com rapidez balançando as chaves do carro.

— Preciso ir para casa Sr. Stoned, amanhã terminarei a reforma. – Fiz menção de devolver a garrafinha de água, mas Pablo negou e nos acompanhou até o carro.

— Foi ótimo ter saído com você, embora o final tenha sido trágico. Sinto muito por isso. – Disse cabisbaixo.

— A culpa não foi sua. – Respondi segurando o ursinho – Eu adorei e podemos marcar mais uma vez se quiser.

— Claro. 

— Bem, até amanhã. - Sorri e entrei no carro.

— Até. – Ele disse e partimos, olhei pelo retrovisor e ele ainda estava lá, parado estático como uma bela escultura grega.

· • • • ✤ • • • · ·

     A noite era tão quente quanto o dia, a floresta parecia diferente, algo havia mudado em sua essência, algo havia sido transmutado. Caminhava lentamente por entre os pequenos arbustos perante a luz do colossal e brilhante luar, avistei um grande buraco à minha frente que outrora havia sido uma armadilha feita por algum caçador.

     Continuei caminhando, não sabia onde estava e nem para onde estava indo, mas sabia a direção certa.

    Avistei a clareira ao longe, flores e ervas cresciam no jardim da frente, floresciam lindamente, os diversos sinos de vento balançavam mesmo que não houvesse brisa como se tivessem vida própria e recitassem uma bela melodia.

“Venha...”

     A voz era diferente, feminina e sutil, um tanto quanto acolhedora como uma grande mãe ou grande avó. Adentrei na mesma cabana de antes, completamente iluminada, a mesa posta com uma grande abobora central, pães, biscoitos, leite e mel completavam a refeição.

     A temperatura já não era tão quente, nem tão fria, era confortável o suficiente. Caminhei para a sala, as luzes amarelas e o crepitar da lareira eram como um belo chalé onde famílias e casais passariam as férias de fim de ano.

“As coisas vão acontecer mais rápido do que se espera...”

     A voz calorosa dizia em minha cabeça, percebi então que havia alguém sentado à poltrona mexendo com um objeto, talvez fosse crochê ou tricô.

— O que vai acontecer? – Perguntei preocupada observando quando a senhora sentada molhou biscoitos no leite e mordeu um pedaço, de algum jeito eu sabia que ela era a dona da voz mesmo que não abrisse a boca para falar.

“Você sempre foi diferente, sempre se sentiu diferente como se algo faltasse em si própria e no mundo, tudo vai fazer sentido mais rápido do que imagina. Apenas tome cuidado em quem confia, nas pessoas que conhece e nas que conhecerá, existem tantos lobos em pele de cordeiro.”

— Certo, isso tudo é bizarro. Eu vou acordar, sei que este sonho é meu e tudo isso é loucura. – Respondi virando as costas para sair da casa, a porta bateu com toda a força numa fração de segundos, tentar girar a maçaneta era inútil.

“Ouça menina, tudo isso é para te proteger, tudo o que está acontecendo é maior do que imagina.”

— Certo, definitivamente eu estou enlouquecendo. – Murmurei.

“Tudo fará sentido, todas as coisas tem suas peças porque tudo faz parte de um gigantesco quebra-cabeças universal e logo encontrará todas as respostas que precisa, deve apenas abrir os olhos do coração e parar de ver somente com a visão.”

     A senhora se levantou, calmamente mergulhou mais um biscoito no leite e mordeu, colocou uma colcha de retalhos dobrada na poltrona e se virou para mim fazendo-me arregalar os olhos. 

· • • • ✤ • • • · ·

     Despertei suando intensamente, perplexa com tudo, abraçando o ursinho. Eu estava ficando louca não era possível. Sonhar com pessoas que vimos não é o problema, se torna um problema quando os sonhos são lúcidos e reais. Olhei para o pequeno filtro dos sonhos preso na janela titubeando com a leve brisa da noite, lembrando que a dona da voz de meu pesadelo era a Senhora da conveniência.

 


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Notas finais do capítulo

Carajo*: Palavrão em espanhol para “caral**”



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