Vila Baunilha escrita por Metal_Will


Capítulo 51
Cambelot


Notas iniciais do capítulo

Obrigado por continuar aqui. Boa leitura! :)



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As meninas entraram na casa do professor Otávio convidadas por ele. Era hora de descobrir o motivo de todas aquelas faltas. Ele pediu que elas se sentassem no sofá da sala e preparou um café.

—Ai, amargo - reclamou Anne.

—Não uso açúcar - explicou o professor - Vivem dizendo que faz mal.

—É, isso é verdade - concordou Kelly - Meu pai sempre fala isso.

—Tanta coisa para fazer mal e tinha que ser justo açúcar. Mas aposto que gengibre e jiló faz bem que é uma beleza - reclamou Otávio.

—Não tem um...

—Não, não tem adoçante - disse Otávio, interrompendo a frase de Anne - Acabou. Preciso comprar mais. Enquanto isso, vamos tomando café amargo mesmo.

—Err...lembrei que não posso tomar muito café - disse Anne, deixando a xícara de lado - Então, professor. Por que o senhor está faltando tanto?

—Ah, então...não estou muito a fim de ir para a escola.

—Mas não é o seu trabalho? - insistiu Anne.

—Já sou aposentado. Só dou aula por não ter disponibilidade de outro professor de humanas. 

—Mas e nós? Precisamos das suas aulas! - reclamou Anne - Não é, Kelly?

—É? - disse Kelly, imediatamente recebendo um olhar de reprovação de Anne - Digo...é, é isso mesmo. Como vamos aprender a matéria sem o senhor?

—Estamos falando de humanas. É só ler e pronto - disse o professor - Encontrei algo mais interessante para fazer.

—Mais interessante? - perguntou Kelly.

—Sim. Se já sou aposentado e não preciso trabalhar porque vou me preocupar com serviço quando acho algo mais interessante?

—Errado não tá… - concordou Anne, mas logo censurou a si mesma e continuou - Espera! Mas e seu senso de dever? Quer dizer, alguns alunos até podem aprender só lendo, mas outros precisam da ajuda das suas aulas.

—Logo, logo eles arranjam outro professor - disse Otávio, sem ligar muito para os apelos da garota - Não precisam se preocupar. Isso é tarefa da escola.

—Mas, afinal, o que o senhor achou de tão interessante? - perguntou Kelly, curiosa.

—Carbelot - disse o professor, tomando mais um gole de café.

—O quê? - disse Anne com estranhamento.

—O que é isso? - indagou Kelly.

—Vocês são jovens, mas estão bem por fora do mundo dos games, heim? - disse Otávio - É um RPG online. Até que tem bastante gente jogando.

—Um jogo? - disse Anne com perplexidade - Vai deixar de dar aula para seus alunos por causa de um joguinho.

—Você só fala isso porque não avançou tanto como eu - disse Otávio, sem se deixar abalar - Meu Cavaleiro Mago já está no nível 60. E já tenho vários itens raros que negociei com vários jogadores por aí. Estou vendo que tenho grandes chances de conseguir a lendária Excalidrum.

—Pode traduzir para a gente, por favor? - disse Anne.

—Resumindo… - o professor deu outro gole em seu café e continuou - Meu personagem no jogo está bem forte e eu posso me tornar o jogador mais forte de todos pegando a arma mais rara que se chama Excalidrum. Finalmente minha vida ganhou um sentido!

—Espera...isso é coisa que um educador diria? - perguntou Anne.

—Provavelmente não diria isso uns quarenta anos atrás quando comecei meu magistério - explicou o professor - Mas como não verei um mínimo de melhoria na educação ainda em vida, o melhor que faço é me jogar nos games e deixar o futuro da educação para os professores mais jovens.

—Mas, professor…

—Bom, é isso. Relaxem, como eu falei, logo terão outro professor - disse Otávio - Querem mais alguma coisa? Não tenho muito a oferecer aqui.

Para um viúvo, até que a casa de Otávio era bem arrumadinha, com diversos itens antigos, entre fotos em preto e branco, pequenos quadros, livros e tudo aquilo contrastando com o computador que ele tinha com um jogo tão moderno quanto Cambelot. As meninas agradeceram a hospitalidade do professor e saíram, não muito satisfeitas.

—Nunca imaginei que o professor tivesse deixado as aulas por um motivo tão idiota - comentou Anne.

—Bom, ele é adulto, né? - disse Kelly - Ele deve saber o que está fazendo.

—Mas isso não tá certo - disse Anne - Quer dizer, é bem claro que ele dá aula de mau humor e detesta quando discordamos da opinião dele, mas não vai ser a mesma coisa ter aula de história, geografia, filosofia e sociologia com outro professor.

—Isso é. Vai ser difícil achar alguém com a experiência do professor Otávio - concordou Kelly.

—Deve ter um jeito de fazer ele mudar de ideia - Anne estava pensativa.

No dia seguinte, ao chegar na escola, Kelly correu para encontrar com Anne.

—Anne, Anne - disse ela - Acabei de lembrar de uma coisa!

—O quê? Fala!

—Sabe o jogo que o professor tá viciado? - disse Kelly, recuperando o fôlego da corrida.

—Sei. O que tem?

—Sabia que aquele nome não me era estranho. Acho que já ouvi o Carioca comentando sobre ele uma vez.

—Será que ele ainda joga? - perguntou Anne.

—Talvez. Ele gosta de games - disse Kelly.

—Cadê o Carioca? - Anne tentou olhar pelo pátio e logo o viu chegando. O garoto parecia de bom humor e chegou na escola cantando.

—Surfista zona sul de manhã come mamããão {1] - cantarolava Carioca até ser abordado por Anne e Kelly.

—Carioca - disse Anne.

—Opa. E aí? Beleza? - cumprimentou ele.

—Pode ir falando tudo que você sabe sobre Cambelot - disse a garota, com um olhar sério.

—Tá falando do game? Putz, não sabia que você também curtia? Em que nível tu tá?

—E eu lá tenho tempo pra ficar brincando com joguinho? Minha vida é praticamente estudar, trabalhar e dormir! - retrucou Anne - Só que...o professor Otávio está viciado nisso aí e parou de dar aulas pra gente por isso.

—Serião? - disse Carioca espantado - Caraca! O professor curti uns games. Por essa eu não esperava.

—A gente também não - explicou Kelly - Ele disse que não iria parar...ainda mais agora que estava querendo alguma coisa rara. Como era o nome…

— “Exca” alguma coisa - falou Anne.

—É. Isso aí. Você sabe o que é? - perguntou Kelly.

—Caraca. Excalidrum. É a espada lendária. Precisa conseguir muita coisa para ter ela no jogo. Pouca gente chegou nesse nível. Tem uns caras que até vendem a conta quando conseguem e tiram um grana preta disso.

—Dá pra tirar dinheiro com isso? Bom, então não é tão inútil assim - disse Anne.

—Tem gente que joga sério. Parece que o professor é um desses. Eu só jogo pra me divertir mesmo.

—Sei - disse Anne - Escuta...eu tava pensando...se o professor conseguir logo essa arma, ele não pode voltar a dar aula pra gente?

—Provavelmente - disse Kelly.

—Quanto tempo você acha que alguém consegue essa exca-sei-lá-o-quê no jogo? - Anne perguntou ao Carioca.

—Sozinho? Pode levar meses, dependendo do tempo que a pessoa dedicar.

—E se tiver alguém ajudando? - Anne continuou a perguntar.

—Bom, aí pode ser mais rápido - falou Carioca - E dá pra fazer isso. As lutas no jogo ficam mais fáceis em equipe.

—Você acha que consegue ajudar o professor a conseguir logo essa coisa e voltar a dar aula pra gente? - perguntou Anne.

—Bom, não ligo muito pra aula, mas pode ser divertido - disse o garoto - Qual é o nick dele?

—Boa pergunta, também não sei - disse Anne.

—E o servidor que ele joga? - perguntou Carioca.

—Ai, tem isso também? - Anne já estava confusa - Não manjo nada dessas coisas.

—Ele disse que é um Cavaleiro Mago nível 60 - falou Kelly.

—Cavaleiro Mago...nível 60 - repetiu Carioca - Caraca, aí! Vi um Cavaleiro Mago que falava no chat de um jeito parecido com o professor um dia desses.

—Será que era ele? - perguntou Anne.

—Acho que lembro o nick dele…”Atila Wizard”, isso aí. Era esse mesmo

— “Átila Wizard” - repetiu Kelly - Será que é?

—Átila é o mesmo nome daquele conquistador, lembra? “Átila, o Uno”, manja? - falou Anne - Para usar uma referência histórica dessas deve ser o professor mesmo.

—Beleza. Eu vou atrás dele hoje mesmo! Claro que não vou me identificar, né? Vai ser mais divertido assim!

—Você faria isso pela gente, Carioca? - perguntou Anne.

—Claro. Tamo junto - respondeu o garoto.

—Legal! - Anne e Kelly comemoraram juntas.

Será que com ajuda para obter o que quer, o professor termina logo seus assuntos com esse jogo?

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[1] É um trecho do Rap do Surfista (https://www.youtube.com/watch?v=p6Su9DWgYko). Por algum motivo fiquei viciado nessa música uns tempos atrás.


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