Vila Baunilha escrita por Metal_Will


Capítulo 184
Declaração e talento




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—Anne! - Luciano continuava a gritar - Você tá aí, Anne?

—Ai, ele acabou me achando - reclamou Anne - Como ele me achou?

—E agora? O que eu faço? - disse Samara, já começando a ficar ansiosa.

—Ah, não. Não quero envolver você e a sua família nas minhas tretas - disse Anne - Deixa. Eu saio e falo com ele.

—V-você tem certeza? - gaguejou Samara.

—Sim. Vou ter que enfrentar isso mais cedo ou mais tarde - disse Anne - Melhor dizer umas verdades na cara dele agora. Foi bom vir aqui. A raiva que eu estava sentindo até passou um pouco.

—Se você diz… - falou Samara, não pretendendo impedir Anne.

—Muito obrigada. Você é um amor - disse Anne, dando um abraço em Samara.

“Um abraço”, pensou Samara, quase chorando de alegria. “Alguém me deu um abraço! Não acredito!”

—Ei, meninas - disse a mãe de Samara entrando no quarto - Tem dois garotos e um urso lá fora chamando pela Anne.

—É, é comigo - disse Anne - Não se preocupe. Eu vou lá falar com ele.

—São seus amigos? Vai ser difícil caber todo mundo aqui - comentou a mãe de Samara, com um tom prestativo, mas sem mudar sua expressão cansada - Será que urso toma suco?

—Não precisa se preocupar - falou Anne - Eu vou lá fora.

E foi o que Anne fez. Ela saiu pela porta, para alívio de Luciano.

—Ah, finalmente - disse ele - Eu ficaria aqui a noite toda se fosse preciso!

—E não é que a Anne estava aí mesmo? - comentou Carioca - Tu é o bichão mesmo, heim, Amadeu?

Amadeu fez uma expressão feliz agradecendo o elogio. Anne, por sua vez, não estava com uma cara nada feliz.

—Já falei que não quero conversa com você, seu interesseiro! - reclamou a garota.

—Dá para você me ouvir? Eu não sou interesseiro coisa nenhuma!

—Não foi isso que seu pai falou! - retrucou a menina - Vocês só querem se aproveitar do trabalho dos meus pais, isso sim.

—É mentira - disse Luciano - Quer dizer, é verdade que meu pai estava pensando nisso…

—Viu só? - interrompeu Anne - E ainda tem a cara de pau de admitir isso!

—Mas o meu pai é o meu pai e eu sou eu - falou Luciano - Não tenho nada a ver com os esquemas dele!

—Seria muito conveniente para você, não seria? Conta outra…

—Para com isso, Anne - reclamou Luciano - Vai, vamos conversar direito…

Anne fez uma pausa, mas acabou cedendo.

—Tá, tá bom. Eu falo com você. Só porque não quero fazer escândalo na frente da casa da Samara.

Como se já não tivesse feito escândalo suficiente. De qualquer modo, Anne foi até os meninos. Carioca e Amadeu não falaram nada, mas também não se moveram.

—Então, gente - disse Luciano - Agradeço a ajuda, mas agora é comigo.

—Ah, entendi - disse Carioca - A gente espera ali no canto.

Os dois foram até a árvore mais próxima e se sentaram debaixo dela na maior tranquilidade. Luciano, enfim, tomou a palavra.

—Escuta - disse ele - Se eu quisesse mesmo ficar com você só por interesse, eu teria insistido para ficar com você desde o primeiro beijo, não concorda?

Anne lembrou que, de fato, Luciano concordou em esquecer do primeiro beijo deles.

—Ah, isso não prova nada - falou Anne - Você mesmo disse que nunca esqueceu daquele primeiro beijo. Isso devia fazer parte do seu plano.

—Que plano? Você acha que eu pensaria tão à frente assim? - insistiu Luciano.

Nisso, Anne mudou um pouco seu olhar para o rapaz.

—É, tem razão - disse ela - Precisaria de um mínimo de inteligência para isso.

—Não é? Ei, como assim?

—De qualquer jeito… - falou Anne, fazendo uma pausa, suspirando e voltando a falar - De qualquer jeito, você precisa concordar comigo que é muito difícil acreditar em você depois de ouvir o que seu pai falou.

—Então é isso? Minha palavra não vale nada para você?

—Eu queria muito acreditar, mas não estou conseguindo.

—Mulher de pouca fé - retrucou Luciano - Olha bem nos meus olhos e vê se estou mentindo.

Luciano estava quase chorando e Anne realmente queria dar um voto de confiança para ele, mas sua mente simplesmente não conseguia ceder.

—Eu…não sei…

—Você não sabe? Ou será que, no fundo, você não está usando isso para fugir de novo?

—Fugir? Do que você está falando?

—Fugir de nós! - falou Luciano, segurando as mãos de Anne - No fundo, você ainda está com medo de assumir seus sentimentos, não é? Achar que eu estou só seguindo o plano do meu pai é a desculpa perfeita para fugir disso! É isso, não é?

—Cala a boca! Você não sabe nada de mim! - disse Anne, desviando o olhar.

—Olha para mim! - disse Luciano - Olha para mim, Anne!

Anne acabou olhando e os olhos de Luciano nunca pareceram tão sinceros.

—Eu não estou nem aí para o meu pai e nem com o restaurante da sua família - disse ele - Se você quiser, até assino um termo me comprometendo a não tocar em nada que seja deles. Nada disso me importa. A única coisa que me importa…a única coisa…

Anne agora não conseguia tirar os olhos de Luciano.

—A única coisa que me importa é você, Anne. Porque..porque…

— “Porque” - repetiu Anne, não parando de olhar para o garoto.

—Porque EU TE AMO! - disse ele com todas as letras, finalmente.

Anne não conseguiu conter suas lágrimas diante disso. Seus verdadeiros sentimentos não conseguiram ficar mais presos depois disso.

—Eu…eu também te amo, droga! - disse ela, beijando Luciano. Sim, dessa vez a iniciativa partiu dela.

Amadeu e Carioca viram isso de longe e depois olharam um para o outro.

—Tu viu o que eu vi? - perguntou Carioca.

Amadeu apenas fez que sim com a cabeça.

Da janela de seu quarto, Samara também viu a cena.

“Espera”, pensou ela. “Eles não estavam brigados? Será que eles já se acertaram?”

—Apesar de tudo - disse Anne, depois de um longo e demorado beijo - Eu te amo, seu idiota.

—Apesar de toda a sua chatice - falou Luciano - Eu simplesmente não conseguiria viver sem você. Por favor, confie em mim.

—Tudo bem - falou Anne - Eu vou…eu vou arriscar.

Os dois se beijaram de novo e, pelo que parecia, dessa vez nenhum dos dois estava disposto a negar. Mais uma vez, os anjos do céu cantaram “Aleluia”.

Carioca e Amadeu saíram de seu canto na árvore correndo, loucos para alguma explicação.

—Espera aí - disse Carioca - Vocês estão juntos, é isso?

—Acho que não dá mais para esconder - falou Luciano - É isso aí.

—É isso aí, nada! - disse Anne, dando um tapa no braço de Luciano.

—Ai, o que foi agora? - reclamou ele.

—Você não precisa me pedir alguma coisa antes? - disse Anne.

—Tipo o quê?

Anne apenas fulminou Luciano com o olhar, mas ele finalmente entendeu.

—Ah, é claro - disse o garoto - Anne, você…você aceita namorar comigo?

—É disso que eu estava falando - disse ela - Sim, aceito.

E os dois se beijaram de novo. Amadeu e Carioca aplaudiram.

—Maneiro, aí - disse ele - Sou muito desligado mesmo. Nem sabia que vocês se gostavam.

Nem eles sabiam, Carioca. Não se preocupe com isso. No fim, Anne resolveu acreditar em Luciano, mas, para provar isso de vez, ele tinha que deixar umas coisas claras para certa pessoa. E foi isso que ele fez ao voltar para casa de mãos dadas com Anne.

—Pai - disse ele, junto com a garota.

—Luciano. Finalmente você voltou e…o que é isso? Não vá me dizer que vocês estão juntos? - perguntou Abílio, todo empolgado.

—Na verdade, sim - disse Luciano, depois de olhar para Anne.

—Ah, minhas preces foram ouvidas! - comemorou Abílio - Sempre torci para isso e…ei, que cara é essa?

—Pai, preciso falar uma coisa antes - disse ele - Não pretendo pegar um centavo da família da Anne.

—Ora, rapaz. Quem faria uma coisa dessas? É claro que estava torcendo para o sucesso do casal e…

—Para de fingir - disse Luciano - Já contei tudo para a Anne. O senhor só queria me juntar com ela na esperança de pegar uma fatia dos negócios da família Montecarlo. Sempre foi isso.

Vendo que não tinha mais onde se esconder, só restou a Abílio confessar.

—Ah, droga - disse ele - É, foi isso mesmo. Garota, desde que sua família se mudou para a nossa cidade meus lucros só foram de mal a pior. O restaurante da sua família estragou a minha vida!

—Mas nós nem somos concorrentes - disse Anne - O senhor nem serve almoço aqui.

—Só que todos preferem comer lá do que aqui - disse ele - E com razão. A comida de vocês é ótima, mas a minha é uma droga. Sempre foi. Eu sou um fracasso! Fracasso! Vou ser um fracassado até o fim dos meus dias!

Abílio começou a chorar de raiva e frustração. Anne, antes irritada, agora sentia apenas pena da patética figura de Abílio na sua frente.

—Vai, Luciano. É seu pai. Faz alguma coisa - disse ela para Luciano.

—Ah, pai - disse ele - Não precisa chorar. Eu nunca achei sua comida tão ruim assim…

—Porque você come isso desde pequeno! - falou o pai.

—Mas o senhor não precisa se preocupar com o futuro. Vou ser um cantor de sucesso e…

—Luciano. Não é isso que seu pai precisa ouvir agora - disse Anne - Escuta, o senhor já tentou de tudo? Tudo mesmo?

—Sim. Simplesmente não tenho talento para cozinhar. Só sobrevivo com a pensão da mãe do Luciano e da revenda de tubaína. Só.

—Não é possível que o senhor seja tão ruim assim - comentou Anne - Quer dizer, eu sei que seu lanche é horrível, mas como essa lanchonete durou tantas gerações com um lanche tão horrível?

—Eu tenho essa resposta - disse dona Cleide, chegando do nada na porta.

—Dona Cleide? - estranhou Anne - O que a senhora está fazendo aqui?

—Aproveitei a noite agradável para fazer uma caminhada e meditar um pouco na vida, quando passei aqui por perto e não pude deixar de ouvir a conversa - falou a senhorinha - Escuta, Abílio. Eu conheci seus avós e essa lanchonete era excelente naquela época.

—Não consigo imaginar - falou Luciano.

—Pois é, pois é, pois é - disse dona Cleide - Adorava vir comer aqui quando era mocinha.

—Não, é que não imaginava que a senhora conhecesse os avós do meu pai. Achava que conhecesse os bisavós dele.

—Que disse? - retrucou a velhinha.

—Não liga pra ele - falou Anne - Por favor, conte mais.

—Abílio, por que você nunca procurou a receita da massa dos pastéis Linhares? - perguntou dona Cleide.

Linhares é o sobrenome da família de Luciano e Abílio

—Pastéis? Acho que nunca ouvi falar disso..será que?

—O que foi, pai? - perguntou Luciano - Lembrou de alguma coisa?

Abílio correu para a mesa da sua sala e pegou o livro que servia de calço para o pé dela. Era um livro que o pai dele tinha deixado ali e nunca mais abriu.

—Agora eu me lembrei - falou Abílio, voltando com o livro - Meu pai tinha guardado esse livro desde que nasci e uma vez ele falou ser uma lembrança do pai dele, mas nunca se interessou em ver o que tinha dentro...

 

—O senhor tinha esse livro de receitas de família a vida inteira e estava suando como calço de mesa? - perguntou Luciano.

—Como eu falei, meu pai nunca deu a mínima para isso - disse Abílio - Será que tem a tal receita de massa de pastel que a dona Cleide falou?

—Só olha, cabeção - disse dona Cleide. 

Abílio começou a folhear o livro procurando a referida receita e sim, ali havia uma receita para uma massa de pastel. A questão é se Abílio poderia reproduzir essa receita.

—Mas eu nunca tentei fazer pastel antes - disse ele

—Por que não tenta? Nunca é tarde para começar - falou Cleide - Essa era a especialidade da Super Lanches anos atrás.

—A esperança é a última que morre, né? - comentou Anne.

—T-Tá bem, eu vou tentar, acho que tenho os ingredientes para fazer a massa aqui.

—Eu te ajudo - falou Anne - O meu pai é chef, lembra? Ele já me ensinou a fazer pastel uma vez.

Assim, a turma vai para a cozinha e usando uns utensílios velhos, Abílio prepara a massa e coloca para fritar. Alguns instantes depois, era a hora da verdade.

—Será que a massa ficou boa? - perguntou ele.

—Olha, o senhor parece ter facilidade para preparar massa - disse Anne - Só experimenta.

Abílio colocou na boca e, sim, o gosto estava ótimo.

—Não acredito - falou ele - É…ótimo.

Anne também comeu um pouco e concordou.

—Delícia - falou ela - Saiu boa. Seu Abílio, o senhor tem dom para fazer pastel.

—Como eu suspeitava - disse dona Cleide - O seu pai era um preguiçoso que só queria fazer sanduíches, Abílio. Mas os seus avós eram excelentes em vários tipos de lanche. Foque em pastéis e seu negócio vai melhorar muito.

—É isso…eu…encontrei a razão da minha existência. Pastel - disse Abílio, chorando.

—Parece que não fui o único que encontrou a razão da existência hoje - disse Luciano para Anne.

—Nossa, isso foi romântico - disse Anne. Os dois deram um selinho.

—Espera, vocês estão namorando? - perguntou dona Cleide.

—Sim - disseram os dois, juntos.

—Olha só, mais um casal. Felicidades - disse a velhinha - Agora, com licença. Vou continuar minha caminhada.

Dona Cleide saiu de cena. Abílio estava mais do que feliz com seu novo talento e disse que ficaria acordado à noite toda planejando como focar sua lanchonete em pastéis. Luciano e Anne, por sua vez, tinham outros planos.

—Bom, agora que nosso problema com o seu pai já está resolvido - disse Anne - Precisamos falar com a minha família.

—Oh, é verdade. Tem isso…

Será que Luciano ganhará a simpatia dos pais de Anne?


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Notas finais do capítulo

É o que veremos no próximo (e último) capítulo.

Espero que fique com a gente até o final. Até lá! :)



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