Dois dias depois da “visita” de Tamires à escola de nossos amigos, Anne estava tranquilamente fazendo sua tarefa de varrer a entrada do restaurante. Depois do horário de almoço, o movimento diminuia bastante e ela podia até se dar ao luxo de varrer devagar e observar a calmaria do lugar.

“Incrível como o tempo dilata nesse lugar”, pensou ela. “E olha que eu praticamente só estudo e trabalho o dia todo!”

Durante esse breve momento de pausa, dois homens enormes de óculos escuros, terno e chapéu aparecem próximos à garota.

—Com licença - disse um deles - Estamos procurando por Anne Montecarlo.

—Estão falando com a própria - respondeu Anne.

—Oh, foi mais rápido do que pensávamos - disse o outro - Gostaríamos que viesse conosco.

—Epa, epa, epa, muita calma nessa hora! - reclamou a mocinha - Eu nem sei quem vocês são.

—Somos agentes de moda - falou o homem - Você tem o perfil que precisamos para nossa campanha!

—Acham que eu vou acreditar nisso tão fácil, é? - falou ela - Já vi muito golpe com essa cara.

—Nosso cartão - mostrou um dos homens - Somos de uma empresa real.

Anne pegou o cartão, mas ainda não estava confiante.

—Sei não, viu…

—Anne! - gritou Carla, a mãe da menina, já irritada por ver a garota de conversinha durante o expediente - Você é paga para trabalhar, não para ficar de papo!

—Ah, é que esses dois vieram com um papinho estranho…

—A senhora é a mãe? - perguntou um dos grandalhões.

—Sim, mãe e patroa. Minha filha tá incomodando vocês?

—Essa é a primeira coisa que você fala?! - reclamou a menina.

—Na verdade, queremos que sua filha seja modelo para uma campanha que estamos fazendo - disse um dos homens - Ela tem o perfil que estamos procurando.

—Bem, modéstia à parte, caprichei nessa filha - disse Carla, orgulhosa.

“Sério mesmo?”, pensou Anne.

—Pode nos dar permissão para que ela seja nossa modelo?

—Depende. Depende de quanto estamos falando.

Um dos agentes tirou um papel do bolso e mostrou para a mãe.

—Esse é o contrato - falou ele.

Acostumada com negócios e com leitura dinâmica quando se trata desses assuntos, Carla leu rapidamente, incluindo as letras miúdas, e arregalou os olhos com o valor.

—O preço é esse mesmo?

—Se concordar, podemos pagar agora mesmo.

—Feito - disse Carla - Dinheiro na mão e ela pode ir agora mesmo.

Os dois agentes sorriram satisfeitos.

—Mãe! - reclamou Anne - Esqueceu do pequeno detalhe de perguntar se eu quero fazer isso?

—Tá achando que eu sou amadora? Li todas as cláusulas do contrato e não tem nada de ruim aqui. Se você tivesse que posar de biquíni ou algo assim eu até ficaria com o pé atrás, mas é só uma campanha para um nova marca de roupas. 

—Além disso, vocês podem ficar com uma cópia do contrato com todos os dados da nossa empresa - disse um dos agentes.

—Não sei, não…

—Deixa de frescura, Anne. Você só precisa tirar umas fotos experimentando roupas caras e ainda vai ganhar por isso. Tem ideia de quantas meninas gostariam de estar no seu lugar?

—Nunca me interessei em ser modelo nem nada disso. Quero ser uma médica.

—Um job de modelo não vai atrapalhar. Além disso, não era você que ficava reclamando de não ter nada de interessante aqui?

—É, isso é verdade.

—Então pronto! - decidiu Carla - Ela aceita. Podemos falar do dinheiro, agora?

Não demorou muito para Carla receber uma boa quantia em sua conta e assinar o contrato. Anne foi praticamente jogada no carro que eles vieram e levada para o trabalho na mesma hora.

—Ué? Cadê a Anne? - perguntou Briana - Queria perguntar se ela podia me ajudar com a lição de casa…

—Eu te ajudo, meu amor - disse Carla - A Anne agora vai ser modelo.

—Sério? Que demais! - falou Briana, sorrindo.

Já Anne não estava tão feliz assim. Ao se recuperar depois de ter sido praticamente jogada no carro dos agentes, a garota percebe que não estava sozinha no banco de trás.

—Ora, ora - disse Tamires, a filha do prefeito da cidade vizinha, com um olhar malvado - Foi mais fácil do que eu imaginei.

—Você?! - exclamou Anne - Também vai ser modelo, é isso?

—Não, não, nada disso - falou ela - Pelo contrário, eu serei sua chefe.

—Como? 

—A agência que você foi contratada é só fachada. Montei essa empresa apenas para conseguir te levar comigo - explicou Tamires.

—Espera. Você montou uma agência de moda só para falar comigo? Não seria mais fácil vir conversar comigo, criatura?

—Mas se eu fizesse isso não conseguiria convencer meu amado Ian.

—O Ian? Ah, então tem alguma coisa a ver com ele…

—Tudo a ver com ele! Você vai ficar comigo até ele concordar em ser meu namorado!

“Totalmente fora da casinha!”, pensou Anne.

—Já que ele só tem olhos para você, vou chamar a atenção atingindo no ponto mais fraco!

—Esse papo tá começando a ficar perigoso - reclamou Anne - Você é maluca.

—Só estou lutando pelo meu amor - explicou Tamires - Finalmente achei o amor da minha vida e não vou perdê-lo para umazinha qualquer. 

—Umazinha qualquer é a sua…

—Não me interrompa! - interrompeu Tamires - Você será meu passaporte para o coração do Ian. Pode chorar à vontade.

—Não estou nem aí para o Ian - falou Anne.

—Mas ele só pensa em você e isso já é suficiente para eu te odiar - continuou Tamires - Você vai ficar comigo até ele ficar comigo! É só dizer para seus pais que o trabalho vai demorar. Posso esperar quantos dias forem necessários.

—Mas isso é sequestro! - protestou Anne.

—Como sequestro? Sua mãe deu toda permissão para você ficar comigo. 

—E você gastou toda essa grana só para isso?

—Dinheiro não é problema quando se fala em amor!

“Ela é pior que o Ian e a Ema juntos. Por que todo rico é maluco?”, pensou Anne.

Na mesma tarde, enquanto tomava seu chá da tarde olhando pela milésima vez paras as fotos da rede social de Anne, Ian recebeu uma mensagem. O vídeo era de Tamires mostrando que estava com Anne.

—Boa tarde, meu amor. Espero que esteja bem - dizia Tamires no vídeo - Estou com sua namoradinha aqui comigo. Se quiser ver ela de novo, venha até a minha empresa na cidade vizinha. Vou te passar o endereço. Beijos.

—O QUÊ?! - Ian quase caiu para trás - Não pode ser! A Anne foi raptada?

Ian nunca sentiu tanto pavor antes. Como resolver essa situação?