Ele é Will escrita por Laís Cahill


Capítulo 7
Explicações


Notas iniciais do capítulo

Atualização fresquinha!
Queria agradecer à Themis Magalhães por ser a única leitora "não fantasma" que eu tenho aqui no Niah hahaha
You are great
E tudo bem, fantasmas, eu perdoo vocês u.u Mas queria que viessem me assombrar de vez em quando.

Acho que, quanto a esse capítulo, o título é autoexplicativo. Aproveitem!



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— Certo, Bill — Dipper disse de braços cruzados, ao entrar no sótão. — Eu acho que você me deve algumas explicações.

Desta vez, o garoto loiro estava sentado de pernas cruzadas no móvel em que descansava, aos pés da janela semiaberta, olhando para a paisagem através do vitral vermelho. Não parecia estar a fim de fazer isso, mas, por outro lado, sabia que não tinha escolha. Dipper havia esperado até o próximo dia e o deixado descansar um pouco, mas deste dia não iria passar.

O garoto Pines ainda ponderava se tinha tomado a decisão certa. Com certeza seria mais seguro denunciar Bill e não ter mais que pensar sobre isso. Afinal, era Bill Cipher: Os cidadãos de Gravity Falls não hesitariam em sentenciar à pena de morte quem um dia transformou todos seus entes queridos em pedra. Além disso, ele não sabia se era justo restringir a decisão do que fazer com o demônio para si próprio, já que Bill devia tanto a tanta gente.

Por outro lado, ontem Bill Cipher havia feito uma coisa que Dipper nunca tinha achado que ele seria capaz: Ele havia chorado. Podia não parecer muita coisa, mas era impossível imaginar o Bill que ele conhecia chorando. Dipper duvidava que um dia ele sequer demonstrasse tristeza, fraqueza, arrependimento e principalmente compaixão, e, no entanto, lá estava ele. Apesar de ter podido espancar Dipper e lhe causar muito mais problemas, tinha escolhido parar. Depois disso, o garoto não teve coragem de denunciá-lo. Talvez, afinal de contas, o demônio pudesse mudar.

— Tudo bem. — Bill virou-se e acenou em direção à sua cama para que o outro sentasse. — O que você quer saber?

Dipper sentou-se, sem pressa.

— Tudo. Mas, primeiramente... — Ele apontou com o queixo para o corpo do outro. — Como você retornou e ganhou esta forma. Você não possuiu alguém, possuiu?

O demônio bufou com desprezo.

— Ora, pirralho, por favor, você é mais esperto que isso. Se eu tivesse possuído alguém, já teriam me encontrado com todos aqueles cartazes, né? Quanto a como eu ganhei essa forma, eu sei de muitas coisas, mas não sou adivinho. Posso lhe contar minhas teorias se quiser.

— Vá em frente.

Depois de olhar de um lado para o outro, inquieto, Bill continuou.

— Não tenho mais motivos pra esconder isso de você, então deixa eu te falar francamente... — Ele limpou a garganta. — Eu não perdi totalmente meus poderes.

Dipper arregalou os olhos enquanto o outro ainda falava.

— Eu ainda consigo fazer coisas simples, tipo influenciar os sonhos das pessoas, aparecer neles e coisas assim. Claro que não faço isso o tempo todo, porque seria suspeito pra caramba, mas vai ser mil vezes mais fácil de te explicar isso se eu te mostrar o que aconteceu em um sonho.

— Espera aí... — O garoto raciocinou e seu rosto se iluminou ao finalmente compreender. — Então é por isso que eu estava dormindo tão bem ultimamente!! Você influenciou meus sonhos pra eu não ter pesadelos!

— Uau, descobriu as Américas — Bill desdenhou. — É, é, claro que eu não podia deixar você achando que seus sonhos lunáticos aconteciam por minha culpa. Agora será que dá pra, por favor, deitar na cama pra eu te mostrar o que você quer?

— Certo, certo... — Dipper riu e fez o que o outro pediu.

Os dois garotos estavam deitados lado a lado na cama, encarando o teto de vigas de madeira. Bill levantou a mão e a pousou suavemente na testa de Dipper. Sem demora, eles fecharam os olhos e a mente de ambos pareceu entrar num estado entorpecente enquanto embarcavam no mesmo sonho.

Quando abriu os olhos novamente, Dipper se viu no meio de uma floresta de pinheiros completamente cinza. O céu monótono parecia branco, e o tom da cena inteira era deprimente. A única coisa colorida por ali era ele mesmo e Bill, que tinha voltado à sua antiga forma amarela e triangular. Aparentemente, no campo da mente os dois podiam assumir que forma quisessem.

— Foi aqui que eu acordei mais ou menos uma semana atrás. — Bill apontou para uma estátua de pedra com o mesmo tamanho e formato de si mesmo, cuja presença Dipper só reparou agora. A pedra estava rachada em alguns pontos e sua superfície coberta de musgos. — Parece que foi isso o que aconteceu com o meu corpo físico depois de... Você sabe. Ei, olha lá, eu vou levantar.

Abismado, Dipper observou um garoto magro emergir em meio às gramíneas e terra da base da estátua. Parecia que havia brotado de lá. Imundo, o garoto tossiu várias vezes antes de abrir os olhos, começando a se desvencilhar das raízes e limpar um pouco a sujeira do corpo. Bill notou o desconforto de Dipper ao ver que o menino que surgiu da terra estava nu e suspirou, revirando seu único olho.

— Melhor pra você? — Ele estalou os dedos e sua versão humana ganhou uma roupa instantaneamente.

Dipper soltou a respiração. Sabia que as roupas eram só uma ilusão criada por Bill no sonho, mas se sentiu aliviado.

— Bem melhor.

— Certo. Bem, eu fiquei aí um tempo sem saber o que fazer e blá, blá, blá... — o triângulo amarelo disse, fazendo um movimento de mão que fez a cena acelerar e mudar como em um filme. — Aí estou eu descobrindo que nem todas as pinhas são comestíveis... Pronto. Cheguei à cidade.

Por todos os lados, as pessoas olhavam de atravessado para Bill, como se ele fosse uma aberração. Algumas mulheres até gritavam quando o viam. De repente, o velho McGucket apareceu em uma esquina e começou a rir ao ver o menino pelado.

— Hahahaha!! Não acredito, finalmente assinaram minha petição para deixar as pessoas andarem peladas em Oregon! Uhuhuhu!! — Então arrancou a roupa ali mesmo e começou a dançar.

— Argh, esse velho de novo — Bill bufou e adiantou mais algumas cenas. Enquanto isso, Dipper se encolhia em um canto e se esforçava para esquecer o que acabara de ver, traumatizado. Bill parou quando a imagem de dois policiais apareceu.

— Parado aí, moleque! — gritou o policial negro e gordo, apontando para o Bill humano.

— É! Você está preso por atentado ao pudor! — O seu parceiro veio atrás com sua voz de taquara rachada.

O garoto tentou correr, mas, ao ser encurralado pelos policiais, tentou se explicar inutilmente. O Bill triangular levou a mão à testa, irritado.

— Tipo, sério? Eu ainda não entendo o senso de justiça de vocês, humanos.

Enquanto isso, no sonho, os dois homens pareceram ficar com pena do pobre garoto, que mal tinha o que comer, quanto mais vestir.

— Ah, está bem, garoto. Não vamos prender você. Espere que eu lhe dou uma das minhas roupas... — disse o policial negro.

O Bill do sonho olhou bem para o policial, que era muito gordo.

— Mas suas roupas vão servir em mim? Quer dizer, olha o seu tamanho...

O homem magro pareceu mais ofendido que o outro, e abraçou seu parceiro de forma protetora.

— Seu desalmado! Não ligue pra ele, Blubs, você está em perfeita forma de um donut!

Blubs coçou a nuca.

— Hã, tudo bem, Durland. Na verdade, acho que o garoto tem razão. Vai ser melhor se você emprestar suas roupas pra ele.

Bill e Dipper assistiram o garoto vestir as roupas que o outro policial deu rapidamente. Como os dois tinham tipos físicos semelhantes, as roupas serviram bem.

— Agora vamos dar uma carona pra você até a associação de ajuda a moradores de rua, ok? — falou o xerife Blubs.

Assim que o garoto consentiu, os três entraram no carro rumo à associação. Bill acelerou todo o trajeto no automóvel com um movimento de mão.

— Ah, a sensação de ajudar alguém — comentou o homem de voz esganiçada quando chegaram ao destino.

— É por isso que eu sou policial — o outro concordou, estacionando o carro, e logo acrescentou animadamente.

— E aí, que tal dar uma passada no Greasy’s Dinner agora?

— Vambora!

O Bill humano foi deixado na recepção do local pelos policiais rapidamente, e logo os dois já estavam saindo para a pausa do almoço. Lá dentro, o garoto se encontrou com uma funcionária que lhe apresentou o local. Pelo que ela disse, a associação oferecia café da manhã e janta todos os dias para moradores de rua na entrada, porém as vagas dos dormitórios eram limitadas e era preciso esperar numa fila para garantir sua estadia às sete horas da noite. De manhã, todos deveriam deixar o local.

— E é isso... — Bill foi adiantando as cenas que flutuavam no ar. — Depois eu dei uma passada no ferro velho para ver se encontrava alguma coisa útil para construir o portal, mas foi difícil achar algo que prestasse. Aí eu voltei para o abrigo umas seis horas, para a janta, e já tinha alguns caras na porta esperando pra entrar. Olha só.

— Ora, ora, o engomadinho é novato por aqui! — um sujeito mal encarado zombou das roupas emprestadas de Bill, enquanto se aproximava com seu amigo. Apesar do Bill humano não ser baixo, perto daquele cara ele parecia minúsculo.

— Ah, esse cara — o demônio amarelo resmungou ao lado de Dipper. Abaixo deles, Bill tinha ido a um lugar meio afastado ao lado da construção para comer sua janta. O jovem sem nome continuou falando.

— Que bom que apareceu! A gente tá morrendo de vontade de te ensinar como as coisas... — Ele estalou os dedos das mãos. — funcionam por aqui.

Apesar de não ter casa, o adolescente enorme tinha dinheiro suficiente para fazer várias tatuagens no braço. O amigo dele riu, o sorriso cheio de dentes tortos aparecendo embaixo do capuz que usava.

— É o seguinte, ô ciclope. — Ele acabara de inventar o apelido graças ao olho que Bill mantinha fechado. — Vamos fazer um trato. Você nos dá esse prato de comida e, em troca, a gente não te dá uma surra, beleza?

Bill não reagiu, apenas trouxe a comida um pouco mais pra perto do corpo. Não queria encrenca com aquele tipo de gente, mas também não iria ceder tão facilmente. Os outros se aproximaram.

— O que foi, fracote? — Um dos caras o empurrou. — Além de caolho você é surdo?

Dipper estava com medo de ver o que aconteceria em seguida, mas a funcionária que tinha recepcionado Bill mais cedo interveio.

— Ei, babacas, o que pensam que estão fazendo? É, eu tô falando com vocês. — Os dois se viraram para olhar a mulher, que surgira com uma vassoura que subitamente pareceu ameaçadora. — É só um prato por pessoa. Querem ser banidos daqui, por acaso? Nós ajudamos pessoas pobres, e não delinquentes.

Quase instantaneamente, aquela funcionária ganhou o respeito de Dipper. Os valentões olharam um para a cara do outro, provavelmente pensando que um prato de comida não valia a pena tendo em vista todos os que perderiam.

— Não, senhora...

Então lançaram um último olhar para a mulher e Bill, não sem antes trombar com o menino de propósito. Sem nenhuma emoção no rosto, ele olhou para quem tinha acabado de salvar sua pele.

— Qualquer coisa é só chamar, tá? — ela avisou antes de voltar de onde tinha vindo.

Em questão de segundos, toda a paisagem em volta de Bill e Dipper desvaneceu e tudo o que havia era uma imensidão escura. Não havia nada sob seus pés, só os dois.

— Depois disso eu voltei para a floresta, fiquei passando frio e encontrei a cabana. — O triângulo continuava conferindo as memórias. — Pronto. Já te mostrei tudo.

As memórias desapareceram. Dipper estava pensativo.

— Tá, mas isso ainda não responde a minha pergunta. Como isso foi acontecer?

— Pode ficar aí pensando quanto tempo quiser, pirralho. Eu adoro ficar no campo da mente.

Num piscar de olhos, o cenário todo mudou. Agora estavam no fundo do oceano, e de repente uma lampreia gigante surgiu. Bill montou nela como em uma montanha russa e o animal escancarou sua boca com dentes horríveis para Dipper, que soltou um grito. Bill gargalhou e voltou a passear em cima da lampreia.

— Tá bom, Bill, já chega. — Dipper irritou-se. — Vamos sair daqui. E pare de me chamar de pirralho.

— Ai, você é sério demais.

O demônio logo estalou os dedos e os dois reapareceram na cama dele, levemente atordoados. O moreno foi o primeiro a sentar-se.

— E então, quais são suas teorias?

Bill sentou-se lentamente ao lado do outro, com uma mão na testa e sobrancelhas franzidas.

— Minha... Ai! — resmungou ao ser atingido por uma dor de cabeça repentina, mas logo se recuperou. — Teoria é que... Bom, quando o seu tio avô apagou a mente dele comigo dentro, ele não se esqueceu de tudo, não é?

— Na verdade, por um momento achamos que o Stan tinha mesmo se esquecido de tudo. Só que, quando a Mabel começou a ler o diário das lembranças dela em Gravity Falls, ele começou a lembrar. — Dipper recordou com nostalgia. Aquele verão tinha sido inesquecível. — Pareceu que, de alguma forma, as lembranças de tudo o que tínhamos passado juntos estavam desativadas na mente dele, e foram voltando na medida em que as trazíamos à tona.

— Interessante... — Bill coçou o queixo. — Então, assim como essas outras coisas, eu não devo ter sido apagado, apenas... Adormecido. Em algum momento o seu tio avô deve ter se lembrado de mim, e eu fui reanimado. Só que eu ainda estava preso dentro da mente dele, e a única forma de retornar ao mundo real seria... assumindo outra forma. Aparentemente, a de um humano.

Enquanto Bill falava, Dipper encarava o vitral vermelho com o desenho de Bill à sua frente, perdido em seus próprios pensamentos.

— E aí você retornou a Gravity Falls, a cidade onde o seu corpo físico foi transformado em pedra.

— Sim — Bill confirmou. — Na verdade, eu nem sei se consigo sair desta cidade. Lembra daquela barreira de energia que me mantinha preso aqui durante o Estranhagedon?

Dipper concordou com a cabeça. Claro que ele não seria ingênuo o suficiente para acreditar que o garoto enigmático tinha lhe contado tudo. Sabia de grande parte, mas não havia nada que garantisse que Bill não estava mentindo ou escondendo algo. Ainda era preciso manter os olhos abertos.

 Depois de um tempo pensando, ele se levantou.

— Certo. Eu acho que essa é toda a explicação de que eu preciso.

— Beleza. Então não vai contar sobre mim para os outros?

Dipper soltou uma risada.

— Não tão fácil. Sabe, Bill, você é quem gosta de fazer acordos, não é? Vamos combinar uma coisa.

— Não é como se eu tivesse escolha, não é mesmo? — O demônio se levantou. — Ah e, primeiramente, me chame de Will. Não quero que acabe soltando um “Bill” no meio da conversa sem querer.

— Bem lembrado, Will — Dipper concordou. — Voltando ao assunto, esse é o meu acordo: Eu não conto nada sobre você, mas em troca, você não vai construir portal nenhum para tentar recuperar seus poderes. Nunca mais. — Estendeu a mão para o outro. — Fechado?

O garoto pôde sentir seu inimigo ficar abismado e engolir a raiva. Francamente, o que ele esperava? Que o deixasse continuar seus planos? Relutante, Bill apertou sua mão.

— Fechado.

A imagem de chamas de coloração azulada percorrendo sua mão veio à mente de Dipper ao tocar a mão do demônio. Antigamente, era isso o que acontecia quando alguém selava um trato com Bill. Agora não havia como voltar atrás.

Dipper acenou com a cabeça e se dirigiu à escada, mas antes de descer deu uma pausa.

— Ah, mais uma coisa. — Ele se virou para olhar para Bill. — Se você fizer qualquer coisa, qualquer coisa contra a minha família, eu vou fazer questão de eu mesmo arrancar esse seu tapa-olho bem na frente do Stanford.

Sem olhar para trás, o garoto deixou o sótão.


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