Ele é Will escrita por Laís Cahill


Capítulo 13
A profecia


Notas iniciais do capítulo

Histórias com profecias me lembram Percy Jackson.
Vou passar adiante o seu legado :D



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Entre as altas árvores coníferas da floresta, Bill estava ajoelhado em frente à estátua que retratava sua forma original. Não era esculpida, mas feita de sua própria matéria petrificada. Com o tempo, a estrutura havia se desgastado e ficado cheia de musgos. Aquele olho no meio do rosto, sua adorada gravata e corpo triangular pareciam tão distantes. Fazia menos de duas semanas que ressurgira como humano e, no entanto, sentia-se como se houvessem passado meses. Ele se perguntava se, um dia, voltaria a viver daquela forma.

Ali, o meio da floresta, era o lugar mais isolado que ele poderia encontrar em toda Gravity Falls. Bem longe de toda a civilização e, portanto, seguro. Ao mesmo tempo, o lugar mais difícil de se construir um portal. O nível da enrascada não era pequeno.

Mais uma vez, Bill afastou os ramos de arbusto que ocultavam a inscrição entalhada na parte de trás da estátua e leu.

 

Há três anos, encarcerado em sono profundo

A prece concedida sob uma condição

Em outra forma, em outro tempo, outro mundo

A si mesmo enfrentar, assim sairá da prisão

A chance é única e finita a boa vontade

Se falhar, dirá adeus a toda realidade

 

Bill releu o quarto verso. Ele ainda não fazia a menor ideia do que cargas d’água o Axolotle queria dizer com “A si mesmo enfrentar”.

Será que era literalmente? Deveria ele criar uma cópia de si mesmo e cair na porrada? Uma ideia mais praticável seria voltar no tempo, alguns minutos atrás, e dar uns sopapos em seu eu do passado.

Mas, não, Bill duvidava que fosse isso. Sabia que provavelmente se tratava de algo mais complicado. Talvez alguma coisa que ele sabia, mas não queria encarar.

Anos atrás, quando os gêmeos Stanley e Stanford conseguiram passar a perna nele, o seu último esforço para não ser esquecido fora invocar o nome de Axolotle.

“E-L-T-O-L-O-X-A”, ele tinha terminado de soletrar, mudando de forma e lutando para continuar ali. “Stanley!” ele implorara. E então veio o soco, tudo virou completa escuridão, até ele ressurgir ao lado desta rocha de forma peculiar.

Bill releu o primeiro verso. Segundo suas estimativas, fazia quase três anos desde que a memória de Stanley tinha sido apagada. Faltavam poucos dias para o fim do verão, o final do prazo, e o que ele estava fazendo para voltar para sua dimensão? Escondendo-se na floresta, torcendo para não ser encontrado. Bom trabalho, Bill.

Sua única esperança seria voltar para o ferro-velho e continuar a construção do portal, mas, com toda Gravity Falls sabendo de sua fuga, era uma missão suicida. Depois que o prazo acabasse, nas palavras do poema, Bill diria adeus a toda realidade. Ele custava a acreditar que um ser que já viveu milhares de anos poderia ser dizimado com tanta facilidade. Parte dele mantinha-se cética. Morte era uma coisa que acontecia com os outros, não com ele.

Pelo lado bom, ao menos poderia escolher como passar os dias que lhe restavam: escondido na floresta ou numa cela de cadeia.

Seus olhos arderam, ameaçando chorar. Enraivecido, Bill se levantou e correu para longe até se chocar contra uma barreira invisível, olhou para cima e viu a superfície levemente translúcida. Era o domo que cobria toda Gravity Falls e o impedia de sair da cidade. Começou a socar a parede com toda a força, extravasando sua frustração. O impacto de seus punhos era absorvido pela superfície e refletido, e quanto mais forte Bill socava, mais forte era a força que o repelia. Depois de um soco particularmente violento, ele foi lançado para trás e caiu no chão.

As costas de Bill doíam. Ele estava se levantando com dificuldade quando ouviu vozes. Estavam gritando o seu nome, mas Bill não as reconhecia. Sem parar para pensar, escalou uma árvore e ficou empoleirado em um galho a cerca de quatro metros do chão, esperando para ver quem eram.

— Wiiiiilll! — Mabel passou gritando debaixo dele. — Will! Cadê você?

— Caaara, onde você tá? — dessa vez era Soos. Ele carregava uma lanterna, pois já estava escurecendo.

Eles continuaram chamando seu nome por algum tempo, até que se cansaram.

— Tem certeza de que ele está aqui, Mabel? Estamos andando faz tanto tempo. Uma cobra quase me picou e tem lama no meu sapato.

— Ele tem que estar aqui! — a menina respondeu, preocupada. — Bem, foi onde o Dipper me falou pra procurar.

— Por que ele não veio com a gente?

— Não sei. Parece que está bravo com o Will, mas não quer me contar por quê.

“Espera um pouco”, Bill se surpreendeu, “Então Dipper não contou nada para o pessoal da cabana?” Dipper tinha saído correndo depois do que acontecera noite passada, não fazia sentido nenhum que mantivesse segredo. Quando percebeu que os dois lá embaixo iriam voltar para a cabana, Bill se manifestou:

— Mabel! Soos! Eu tô aqui!

Ele estava pendurado pelos joelhos, de ponta cabeça, balançando os braços. Seus cabelos estavam arrepiados pela ação da gravidade.

— Will! — os dois gritaram juntos.

— Sou eu!

— Will, desce daí!

Antes que Bill pudesse dizer alguma coisa, o galho em que estava se partiu ao meio. Ele gritou.

— Eu te pego! — berrou Soos.

Os dois se estatelaram no chão, mas a queda de Bill foi amortecida pelo excesso de gordura do outro.

— Achei que ia morrer — disse Bill, zonzo.

— Will! Onde você esteve? — perguntou Mabel.

— Eu…

Sem esperar resposta, a amiga o abraçou, seguida de Soos. Bill sentiu-se esmagado, porém feliz. Pela primeira vez, estava realmente grato por ter quem se importasse com ele.

— Como você veio parar aqui?

— Hã, obrigado, gente… — Bill respirou fundo, aliviado. — Posso explicar no caminho?

 

 

 

Já era bem tarde quando o trio chegou à cabana. A lua estava alta, e uma coruja chirriava ao longe. As luzes estavam apagadas, todos já tinham se recolhido.

Soos estava extremamente cansado quando chegou, então apenas se despediu e foi para a cama. Mabel acompanhou Bill até o quarto e abriu a porta.

— Oi, Dipper. — Ela esfregou os olhos, com sono.

— Mabel? E aí? — O garoto sentou-se em sua cama. Ainda estava acordado.

— Achamos o Will. — Apontou para o garoto que estava na porta. Bill acenou com a mão, meio sem graça. Dipper não retribuiu o gesto.

Mabel bocejou e se jogou na cama.

— Boa noite, maninho.

Assim que ela fechou os olhos, Dipper encarou o outro com hostilidade.

— Nossa, que cara é essa? Não vai me dar boas-vindas? — o demônio brincou. Dipper continuou sério, obrigando o outro a ser franco. Ele suspirou. — Achei que tivesse contado sobre mim. Fiquei desesperado.

O garoto continuou em silêncio. Coçou a testa, mal-humorado.

— Olha só — Bill continuou, falando baixo. — Eu sinto muito se fiz qualquer coisa que te deixou magoado, tá bom? E-eu só estava fazendo o que vocês sempre querem que eu faça, que é fazer o que o meu corpo quer, mas aparentemente não funciona sempre assim. E não vai me dizer que você não queria. Eu sei sobre os seus sonhos, Dipper. De sair e se agarrar comigo no corredor. É assim que você quer? Tudo bem. A gente inclusive poderia estar fazendo isso agora mesmo, se você não estivesse com essa cara de…

Dipper se levantou e empurrou o travesseiro de Bill contra seu peito com certa violência, levando-o para fora do quarto.

— Você tem sorte que eu não resolvi te denunciar logo. Pega o seu travesseiro, o seu colchão e vai dormir na sala.

— O quê? — o demônio protestou.

— Você vai dormir lá hoje e, se alguém perguntar, você diz que prefere ficar lá porque é mais espaçoso.

— Tudo isso? Que exagero! Foi você que quis que eu viesse pra cá em primeiro lugar, não foi?

Ignorando as reclamações do outro, Dipper pegou o colchão encostado na parede e o arrastou para o fora do quarto, junto com um cobertor.

— E pare de bisbilhotar os meus sonhos.

Bateu a porta na cara de Bill e girou a chave.


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